BAGDÁ - Com apenas 25 anos, Nadia Murad, que recebeu nesta sexta-feira, 5, o Prêmio Nobel da Paz ao lado do ginecologista congolês Denis Mukwege, já sobreviveu aos piores horrores cometidos pelo Estado Islâmico (EI) contra seu povo, os yazidis do Iraque, e se transformou em um ícone desta comunidade ameaçada.
Esta jovem iraquiana de rosto pálido e voz aveludada poderia ter tido uma vida pacífica em sua cidade natal, Kosho, perto do bastião yazidi de Sinjar, uma área montanhosa entre o Iraque e a Síria. Mas a rápida ascensão do EI em 2014 mudou seu destino. Em agosto daquele ano, ela foi raptada e levada contra sua vontade para Mossul, bastião do grupo terrorista conquistado cerca de um ano antes.
Foi o início de um calvário de vários meses: Nadia foi torturada e disse ter sido vítima de múltiplos estupros coletivos antes de ser vendida várias vezes como escrava sexual.
Até hoje ela diz - assim como sua amiga Lamiya Aji Bashar, com a qual ganhou o Prêmio Sakharov para a Liberdade de Pensamento do Parlamento Europeu em 2016 - sem parar que mais de 3 mil mulheres yazidis continuam desaparecidas e, provavelmente, seguem em cativeiro.
Torturas e estupros
Ao receber a premiação em 2016, Nadia afirmou que os jihadistas do EI tentaram "roubar nossa honra, mas perderam a própria honra". Ela foi nomeada embaixadora da boa vontade da ONU e luta a favor da proteção das vítimas do tráfico de pessoas.
Além de sofrer torturas e estupros, Nadia teve que renunciar à sua fé yazidi, uma religião ancestral desprezada pelo EI, mas praticada por meio milhão de pessoas no Curdistão iraquiano.
Ganhadores do Nobel da Paz
"A primeira coisa que fizeram foi forçar a nos convertermos ao islã. Depois, fizeram o que quiseram (conosco)", relatou Nadia em 2016.
Assim como aconteceu com outras milhares de mulheres yazidis, ela foi obrigada a se casar com um combatente do grupo que constantemente a agredia, contou a jovem em um comovente discurso ao Conselho de Segurança da ONU, em Nova York.
Incapaz de suportar tantos abusos, decidiu escapar. Com a ajuda de uma família muçulmana de Mossul, Nadia obteve documentos de identidade que permitiram a ela chegar até o Curdistão iraquiano.
Depois da fuga, a jovem - que disse ter perdido seis irmão e sua mãe no conflito - vivem em um campo de refugiados na região, onde teve contato com uma organização de ajuda ao yazidis. Graças a este grupo ela se reuniu com uma de suas irmãs na Alemanha.
Unidos pelo combate
No país europeu, onde mora atualmente, ela se transformou em uma respeitada porta-voz de seu povo, que antes de 2014 contava com 550 mil membros no Iraque. Hoje, quase 100 mil yazidis deixaram o país e muitos estão deslocados no Curdistão.
Nadia, que lidera o "combate de seu povo", segundo suas palavras, conseguiu que as perseguições cometidas em 2014 fosse reconhecidas como genocídio. O CS da ONU se comprometeu também a ajudar o Iraque a reunir provas dos crimes cometidos pelo EI.
Seu combate também lhe rendeu algumas boas surpresas. Em 20 de agosto a jovem anunciou em sua conta no Twitter que se casará com outro ativista da causa yazidi, Abid Shamdeen.
"O combate a favor de nosso povo nos uniu e seguiremos essa caminho juntos", escreveu na rede social. / AFP