Pesquisas subestimaram Trump em 2016 e 2020. Podem estar repetindo o erro agora?


Institutos adequaram metodologias nos últimos anos. A questão que fica é se essas mudanças foram suficientes

Por Jéssica Petrovna
Atualização:

A menos de um mês da eleição, as pesquisas nos Estados Unidos não apontam caminhos claros para o que deve acontecer em 5 de novembro. Na média, a democrata Kamala Harris aparece com leve vantagem, empatada dentro da margem de erro com Donald Trump, e ainda paira a dúvida se o voto no republicano pode estar sendo subestimado, como aconteceu nas eleições anteriores.

O cenário de empate técnico se repete nos poucos Estados que realmente vão decidir quem será o próximo presidente dos Estados Unidos. Na Pensilvânia, que pode ser fiel da balança, Kamala aparece com 47,8% e Trump com 47,5% na média das pesquisas, segundo o agregador FiveThirtyEight.

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Nos outros seis Estados decisivos, a democrata aparece com leve vantagem em três (Nevada, Michigan e Wisconsin) e o republicano em três (Arizona, Carolina do Norte e Michigan). As margens são mínimas, menores que um ponto percentual em alguns casos.

Isso quer dizer que as pesquisas estão captando melhor a polarização na política americana? Ou Donald Trump pode surpreender mais uma vez? “Essa é a coisa mais importante que nós sabemos desconhecer” responde W. Joseph Campbell, professor emérito de comunicação da American University, em Washington, e autor de “Lost in a Gallup: Polling Failure in U.S. Presidential Elections”.

“Sabemos que isso é um problema, mas não sabemos se foi corrigido. A grande questão é se os pesquisadores realmente encontraram uma maneira de captar o apoio de Donald Trump de forma precisa”, afirma.

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Donald Trump enfrenta disputa acirrada contra Kamala Harris, indicam as pesquisas de intenção de voto nos Estados Unidos. Foto: John Bazemore/Associated Press

As metodologias têm sido ajustadas no esforço para detectar esse eleitor trumpista. O problema é que as falhas não costumam se repetir de uma eleição para outra, cada erro de pesquisa tem uma explicação diferente. Por isso, é difícil dizer se as mudanças feitas nos últimos anos, com base nos aprendizados do passado, são garantia de maior precisão no presente.

“Não é como se estivéssemos enfrentando o mesmo problema repetidamente”, observa Campbell, que analisa em seu livro todos os tropeços desde a eleição de 1936. “As pesquisas falham de maneiras diferentes, por razões diferentes. E essa é outra preocupação: os pesquisadores podem tentar corrigir o problema de quatro ou oito anos atrás, mas sempre pode surgir algo novo que dificulta o trabalhos dos institutos.”

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Falhas nas últimas eleições

Em 2016, todas as sondagens indicavam que a experiente Hillary Clinton derrotaria o outsider Donald Trump. As previsões, como sabemos agora, estavam erradas.

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A democrata, de fato, teve 2,8 milhões de votos a mais que o republicano. Acontece que ser o mais votado não é garantia de vitória na eleição americana, decidida no Colégio Eleitoral. Foi justamente aí que as pesquisas falharam, sem conseguir detectar o avanço de Trump em Estados decisivos, especialmente em Pensilvânia, Michigan e Wisconsin.

“As pesquisas, principalmente as estaduais, não ajustavam as amostras por grau de educação. Existe uma relação direta entre escolaridade e taxa de resposta — pessoas mais escolarizadas tendem a responder mais as pesquisas —, mas isso até então não eram um problema porque esses vieses de escolaridade acabavam se anulando”, explica Raphael Nishimura, diretor de amostragem no Survey Research Center da Universidade de Michigan e membro da American Association for Public Opinion Research (AAPOR).

O que aconteceu em eleições anteriores nesses Estados foi que os democratas tiveram bom desempenho nos dois extremos (entre os eleitores que cursaram no máximo até Ensino Médio e aqueles com nível de pós-graduação). Então, os escolarizados, que respondiam mais as pesquisas, compensavam os menos escolarizados que votavam parecido.

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“O que aconteceu em 2016 foi que os menos escolarizados penderam para o Partido Republicano. Os mais escolarizados continuaram democratas e o fato de que esses eleitores estavam mais presentes nas pesquisas criou um viés pró-Partido Democrata, especialmente nesses Estados”, acrescenta Nishimura.

Na eleição seguinte, o baque foi ainda maior: os institutos tiveram o pior desempenho coletivo em quatro décadas, apesar do esforço para corrigir o viés educacional. As pesquisas davam vantagem de até 12 pontos para Joe Biden e o que se viu foi uma disputa mais acirrada, com alguns Estados decisivos disputados voto a voto.

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A principal hipótese, dizem analistas ouvidos pelo Estadão, é que os republicanos radicalizados tendem a ser mais refratários às pesquisas e à imprensa de modo geral. É o que os especialistas chamam de problema da não resposta.

“Seria uma característica do eleitor, que está em consonância com o perfil antiestablishment do próprio Trump”, afirma Raphael Nishimura, citando o relatório da American Association for Public Opinion Research sobre o desempenho das pesquisas em 2020.

Isso não quer dizer, contudo, que exista um “voto envergonhado” em Donald Trump. ‘Não há evidências de que existam ou tenham existido eleitores “ocultos” de Trump’, destaca Peter Woolley, professor de Ciências Políticas e pesquisador veterano da Universidade Fairleigh Dickinson, em Nova Jersey. O que acontece muitas vezes, explica, é que alguns subgrupos estão mais representados que outros.

Apoiadores do ex-presidente Donald Trump participam de comício na Georgia.  Foto: Kevin Dietsch/AFP

Mudanças metodológicas

Nos últimos anos, os institutos têm implementado uma série de mudanças metodológicas no esforço para de evitar o viés partidário nas pesquisas, além de adequar as amostras ao nível de escolaridade.

Essas mudanças podem incluir a combinação de diferentes meios (ligação, mensagem de texto e pesquisa online) para alcançar maior variedade de eleitores; ajustes para garantir a representação daqueles que são menos engajados na política (e acabaram escolhendo Trump na reta final de eleições anteriores); além do controvertido recall.

Esse último consiste em perguntar aos entrevistados como eles votaram na última eleição. Assim, os pesquisadores podem comparar as respostas com os resultados para garantir que a representação de democratas e republicanos está equilibrada.

Com base nesses dados, é possível fazer correções na amostra se, por exemplo, o número de pessoas que afirma ter votado em Joe Biden estiver desproporcional aos votos que ele de fato teve.

Os críticos do método apontam que os entrevistados podem não lembrar ou mentir sobre o voto e super-representar quem ganhou o ciclo passado. Ao tentar equilibrar esse “viés do vencedor”, os pesquisadores acabam beneficiando o candidato derrotado.

Esse ano, contudo, é diferente. Biden, o vencedor, abandonou a disputa. Do outro lado, Trump nunca reconheceu a derrota (e uma parte dos seus apoiadores acredita nisso), o que pode distorcer a lembrança dos eleitores e mitigar o viés do recall.

O método, há muito rejeitado, tem se popularizado entre os institutos, ansiosos para corrigir os erros do passado, e abriu dois caminhos divergentes, observou Nate Cohn, analista político e responsável pela metodologia das pesquisas New York Times/Siena College (que não adota o recall) em artigo para o NY Times.

Os institutos que adotam o recall tem, por óbvio, números mais parecidos com os resultados de 2020. Mostram Kamala Harris com liderança mais clara no voto popular e disputas mais acirradas no Colégio Eleitoral. Aqueles que não recorrem ao método tem números mais alinhados com a eleição de meio de mandato, em 2022.

Naquele ano — em que os democratas conseguiram conter a “onda vermelha” no Congresso e garantiram maioria no Senado — as pesquisas tiveram melhor desempenho e até penderam um pouco mais para o lado republicano.

“Se você ajustarmos as pesquisas atuais com base no erro de 2020, provavelmente, Trump está à frente em todos os Estados (decisivos). Se ajustarmos pelo erro de 2022, então Kamala Harris ganha na maioria dos Estados em disputa”, observa Ana Iparraguirre, sócia da empresa de pesquisas de opinião e estratégia política GBAO.

No mundo das pesquisas, já se discute se, no esforço para não subestimá-lo, os institutos poderiam estar super ajustando seus levantamentos e pendendo para Donald Trump.

“As duas coisas podem ser verdadeiras. Podemos estar super ajustando ou subestimando Trump. Em uma eleição tão apertada, isso poderia levar a resultados muito, muito diferentes”, acrescenta Ana.

Afinal, como ler as pesquisas?

As pesquisas, é claro, tem margem de erro o que significa que, nesse cenário de empate técnico, tudo pode acontecer. E o sistema americano tem particularidades que tornam o trabalho dos institutos ainda mais complexo.

O voto antecipado, por exemplo, está em andamento. As notícias e as declarações diárias dos candidatos podem ter impacto direto sobre os eleitores que estão votando neste momento.

Outro desafio é tentar determinar o comparecimento às urnas. Sem voto obrigatório, vence a eleição o candidato que conseguir mobilizar mais pessoas, especialmente as que vivem nos Estados-pêndulo, a sair de casa no dia 5 de novembro. Qualquer variação nesse sentido pode alterar os resultados.

Exemplo disso é a disputa em Michigan, onde a comunidade árabe — cerca de 250 mil pessoas — tem expressado insatisfação com o governo democrata pelo apoio a Israel na guerra no Oriente Médio. Parte desse eleitorado, fundamental para vitória de Joe Biden no Estado, agora afirma que não votará em ninguém.

Além do comportamento dos grupos, é possível observar o desempenho dos candidatos nas pautas prioritárias para o eleitorado. Na economia e na imigração, Trump leva vantagem. No tema do aborto, caro às mulheres, Kamala tem a preferência, apontam as pesquisas.

Outro fator importante, é a capacidade dos candidatos de levantar valiosos recursos para a campanha. Esse é mais um ponto para a democrata, que tem batido recordes de arrecadação.

Kamala Harris cumprimenta apoiadores na Pensilvânia.  Foto: Ruth Fremson/The New York Times

Com tantas variáveis, é preciso levar em consideração que as pesquisas são um retrato do momento. Há algumas semanas, refletiam a empolgação dos democratas com a substituição de Joe Biden por Kamala Harris nas cédulas. Agora, apontam para a resiliência de Trump na disputa.

“É uma eleição acirrada e o instrumento que temos para medi-la não é preciso o suficiente para dar uma resposta definitiva”, lembra Ana Iparraguirre. “Existem alguns fatores que têm explicado por que Donald Trump foi subestimado no passado. Se isso foi resolvido ou não, precisaremos esperar o dia 5 de novembro para descobrir”, conclui.

A menos de um mês da eleição, as pesquisas nos Estados Unidos não apontam caminhos claros para o que deve acontecer em 5 de novembro. Na média, a democrata Kamala Harris aparece com leve vantagem, empatada dentro da margem de erro com Donald Trump, e ainda paira a dúvida se o voto no republicano pode estar sendo subestimado, como aconteceu nas eleições anteriores.

O cenário de empate técnico se repete nos poucos Estados que realmente vão decidir quem será o próximo presidente dos Estados Unidos. Na Pensilvânia, que pode ser fiel da balança, Kamala aparece com 47,8% e Trump com 47,5% na média das pesquisas, segundo o agregador FiveThirtyEight.

Nos outros seis Estados decisivos, a democrata aparece com leve vantagem em três (Nevada, Michigan e Wisconsin) e o republicano em três (Arizona, Carolina do Norte e Michigan). As margens são mínimas, menores que um ponto percentual em alguns casos.

Isso quer dizer que as pesquisas estão captando melhor a polarização na política americana? Ou Donald Trump pode surpreender mais uma vez? “Essa é a coisa mais importante que nós sabemos desconhecer” responde W. Joseph Campbell, professor emérito de comunicação da American University, em Washington, e autor de “Lost in a Gallup: Polling Failure in U.S. Presidential Elections”.

“Sabemos que isso é um problema, mas não sabemos se foi corrigido. A grande questão é se os pesquisadores realmente encontraram uma maneira de captar o apoio de Donald Trump de forma precisa”, afirma.

Donald Trump enfrenta disputa acirrada contra Kamala Harris, indicam as pesquisas de intenção de voto nos Estados Unidos. Foto: John Bazemore/Associated Press

As metodologias têm sido ajustadas no esforço para detectar esse eleitor trumpista. O problema é que as falhas não costumam se repetir de uma eleição para outra, cada erro de pesquisa tem uma explicação diferente. Por isso, é difícil dizer se as mudanças feitas nos últimos anos, com base nos aprendizados do passado, são garantia de maior precisão no presente.

“Não é como se estivéssemos enfrentando o mesmo problema repetidamente”, observa Campbell, que analisa em seu livro todos os tropeços desde a eleição de 1936. “As pesquisas falham de maneiras diferentes, por razões diferentes. E essa é outra preocupação: os pesquisadores podem tentar corrigir o problema de quatro ou oito anos atrás, mas sempre pode surgir algo novo que dificulta o trabalhos dos institutos.”

Falhas nas últimas eleições

Em 2016, todas as sondagens indicavam que a experiente Hillary Clinton derrotaria o outsider Donald Trump. As previsões, como sabemos agora, estavam erradas.

A democrata, de fato, teve 2,8 milhões de votos a mais que o republicano. Acontece que ser o mais votado não é garantia de vitória na eleição americana, decidida no Colégio Eleitoral. Foi justamente aí que as pesquisas falharam, sem conseguir detectar o avanço de Trump em Estados decisivos, especialmente em Pensilvânia, Michigan e Wisconsin.

“As pesquisas, principalmente as estaduais, não ajustavam as amostras por grau de educação. Existe uma relação direta entre escolaridade e taxa de resposta — pessoas mais escolarizadas tendem a responder mais as pesquisas —, mas isso até então não eram um problema porque esses vieses de escolaridade acabavam se anulando”, explica Raphael Nishimura, diretor de amostragem no Survey Research Center da Universidade de Michigan e membro da American Association for Public Opinion Research (AAPOR).

O que aconteceu em eleições anteriores nesses Estados foi que os democratas tiveram bom desempenho nos dois extremos (entre os eleitores que cursaram no máximo até Ensino Médio e aqueles com nível de pós-graduação). Então, os escolarizados, que respondiam mais as pesquisas, compensavam os menos escolarizados que votavam parecido.

“O que aconteceu em 2016 foi que os menos escolarizados penderam para o Partido Republicano. Os mais escolarizados continuaram democratas e o fato de que esses eleitores estavam mais presentes nas pesquisas criou um viés pró-Partido Democrata, especialmente nesses Estados”, acrescenta Nishimura.

Na eleição seguinte, o baque foi ainda maior: os institutos tiveram o pior desempenho coletivo em quatro décadas, apesar do esforço para corrigir o viés educacional. As pesquisas davam vantagem de até 12 pontos para Joe Biden e o que se viu foi uma disputa mais acirrada, com alguns Estados decisivos disputados voto a voto.

A principal hipótese, dizem analistas ouvidos pelo Estadão, é que os republicanos radicalizados tendem a ser mais refratários às pesquisas e à imprensa de modo geral. É o que os especialistas chamam de problema da não resposta.

“Seria uma característica do eleitor, que está em consonância com o perfil antiestablishment do próprio Trump”, afirma Raphael Nishimura, citando o relatório da American Association for Public Opinion Research sobre o desempenho das pesquisas em 2020.

Isso não quer dizer, contudo, que exista um “voto envergonhado” em Donald Trump. ‘Não há evidências de que existam ou tenham existido eleitores “ocultos” de Trump’, destaca Peter Woolley, professor de Ciências Políticas e pesquisador veterano da Universidade Fairleigh Dickinson, em Nova Jersey. O que acontece muitas vezes, explica, é que alguns subgrupos estão mais representados que outros.

Apoiadores do ex-presidente Donald Trump participam de comício na Georgia.  Foto: Kevin Dietsch/AFP

Mudanças metodológicas

Nos últimos anos, os institutos têm implementado uma série de mudanças metodológicas no esforço para de evitar o viés partidário nas pesquisas, além de adequar as amostras ao nível de escolaridade.

Essas mudanças podem incluir a combinação de diferentes meios (ligação, mensagem de texto e pesquisa online) para alcançar maior variedade de eleitores; ajustes para garantir a representação daqueles que são menos engajados na política (e acabaram escolhendo Trump na reta final de eleições anteriores); além do controvertido recall.

Esse último consiste em perguntar aos entrevistados como eles votaram na última eleição. Assim, os pesquisadores podem comparar as respostas com os resultados para garantir que a representação de democratas e republicanos está equilibrada.

Com base nesses dados, é possível fazer correções na amostra se, por exemplo, o número de pessoas que afirma ter votado em Joe Biden estiver desproporcional aos votos que ele de fato teve.

Os críticos do método apontam que os entrevistados podem não lembrar ou mentir sobre o voto e super-representar quem ganhou o ciclo passado. Ao tentar equilibrar esse “viés do vencedor”, os pesquisadores acabam beneficiando o candidato derrotado.

Esse ano, contudo, é diferente. Biden, o vencedor, abandonou a disputa. Do outro lado, Trump nunca reconheceu a derrota (e uma parte dos seus apoiadores acredita nisso), o que pode distorcer a lembrança dos eleitores e mitigar o viés do recall.

O método, há muito rejeitado, tem se popularizado entre os institutos, ansiosos para corrigir os erros do passado, e abriu dois caminhos divergentes, observou Nate Cohn, analista político e responsável pela metodologia das pesquisas New York Times/Siena College (que não adota o recall) em artigo para o NY Times.

Os institutos que adotam o recall tem, por óbvio, números mais parecidos com os resultados de 2020. Mostram Kamala Harris com liderança mais clara no voto popular e disputas mais acirradas no Colégio Eleitoral. Aqueles que não recorrem ao método tem números mais alinhados com a eleição de meio de mandato, em 2022.

Naquele ano — em que os democratas conseguiram conter a “onda vermelha” no Congresso e garantiram maioria no Senado — as pesquisas tiveram melhor desempenho e até penderam um pouco mais para o lado republicano.

“Se você ajustarmos as pesquisas atuais com base no erro de 2020, provavelmente, Trump está à frente em todos os Estados (decisivos). Se ajustarmos pelo erro de 2022, então Kamala Harris ganha na maioria dos Estados em disputa”, observa Ana Iparraguirre, sócia da empresa de pesquisas de opinião e estratégia política GBAO.

No mundo das pesquisas, já se discute se, no esforço para não subestimá-lo, os institutos poderiam estar super ajustando seus levantamentos e pendendo para Donald Trump.

“As duas coisas podem ser verdadeiras. Podemos estar super ajustando ou subestimando Trump. Em uma eleição tão apertada, isso poderia levar a resultados muito, muito diferentes”, acrescenta Ana.

Afinal, como ler as pesquisas?

As pesquisas, é claro, tem margem de erro o que significa que, nesse cenário de empate técnico, tudo pode acontecer. E o sistema americano tem particularidades que tornam o trabalho dos institutos ainda mais complexo.

O voto antecipado, por exemplo, está em andamento. As notícias e as declarações diárias dos candidatos podem ter impacto direto sobre os eleitores que estão votando neste momento.

Outro desafio é tentar determinar o comparecimento às urnas. Sem voto obrigatório, vence a eleição o candidato que conseguir mobilizar mais pessoas, especialmente as que vivem nos Estados-pêndulo, a sair de casa no dia 5 de novembro. Qualquer variação nesse sentido pode alterar os resultados.

Exemplo disso é a disputa em Michigan, onde a comunidade árabe — cerca de 250 mil pessoas — tem expressado insatisfação com o governo democrata pelo apoio a Israel na guerra no Oriente Médio. Parte desse eleitorado, fundamental para vitória de Joe Biden no Estado, agora afirma que não votará em ninguém.

Além do comportamento dos grupos, é possível observar o desempenho dos candidatos nas pautas prioritárias para o eleitorado. Na economia e na imigração, Trump leva vantagem. No tema do aborto, caro às mulheres, Kamala tem a preferência, apontam as pesquisas.

Outro fator importante, é a capacidade dos candidatos de levantar valiosos recursos para a campanha. Esse é mais um ponto para a democrata, que tem batido recordes de arrecadação.

Kamala Harris cumprimenta apoiadores na Pensilvânia.  Foto: Ruth Fremson/The New York Times

Com tantas variáveis, é preciso levar em consideração que as pesquisas são um retrato do momento. Há algumas semanas, refletiam a empolgação dos democratas com a substituição de Joe Biden por Kamala Harris nas cédulas. Agora, apontam para a resiliência de Trump na disputa.

“É uma eleição acirrada e o instrumento que temos para medi-la não é preciso o suficiente para dar uma resposta definitiva”, lembra Ana Iparraguirre. “Existem alguns fatores que têm explicado por que Donald Trump foi subestimado no passado. Se isso foi resolvido ou não, precisaremos esperar o dia 5 de novembro para descobrir”, conclui.

A menos de um mês da eleição, as pesquisas nos Estados Unidos não apontam caminhos claros para o que deve acontecer em 5 de novembro. Na média, a democrata Kamala Harris aparece com leve vantagem, empatada dentro da margem de erro com Donald Trump, e ainda paira a dúvida se o voto no republicano pode estar sendo subestimado, como aconteceu nas eleições anteriores.

O cenário de empate técnico se repete nos poucos Estados que realmente vão decidir quem será o próximo presidente dos Estados Unidos. Na Pensilvânia, que pode ser fiel da balança, Kamala aparece com 47,8% e Trump com 47,5% na média das pesquisas, segundo o agregador FiveThirtyEight.

Nos outros seis Estados decisivos, a democrata aparece com leve vantagem em três (Nevada, Michigan e Wisconsin) e o republicano em três (Arizona, Carolina do Norte e Michigan). As margens são mínimas, menores que um ponto percentual em alguns casos.

Isso quer dizer que as pesquisas estão captando melhor a polarização na política americana? Ou Donald Trump pode surpreender mais uma vez? “Essa é a coisa mais importante que nós sabemos desconhecer” responde W. Joseph Campbell, professor emérito de comunicação da American University, em Washington, e autor de “Lost in a Gallup: Polling Failure in U.S. Presidential Elections”.

“Sabemos que isso é um problema, mas não sabemos se foi corrigido. A grande questão é se os pesquisadores realmente encontraram uma maneira de captar o apoio de Donald Trump de forma precisa”, afirma.

Donald Trump enfrenta disputa acirrada contra Kamala Harris, indicam as pesquisas de intenção de voto nos Estados Unidos. Foto: John Bazemore/Associated Press

As metodologias têm sido ajustadas no esforço para detectar esse eleitor trumpista. O problema é que as falhas não costumam se repetir de uma eleição para outra, cada erro de pesquisa tem uma explicação diferente. Por isso, é difícil dizer se as mudanças feitas nos últimos anos, com base nos aprendizados do passado, são garantia de maior precisão no presente.

“Não é como se estivéssemos enfrentando o mesmo problema repetidamente”, observa Campbell, que analisa em seu livro todos os tropeços desde a eleição de 1936. “As pesquisas falham de maneiras diferentes, por razões diferentes. E essa é outra preocupação: os pesquisadores podem tentar corrigir o problema de quatro ou oito anos atrás, mas sempre pode surgir algo novo que dificulta o trabalhos dos institutos.”

Falhas nas últimas eleições

Em 2016, todas as sondagens indicavam que a experiente Hillary Clinton derrotaria o outsider Donald Trump. As previsões, como sabemos agora, estavam erradas.

A democrata, de fato, teve 2,8 milhões de votos a mais que o republicano. Acontece que ser o mais votado não é garantia de vitória na eleição americana, decidida no Colégio Eleitoral. Foi justamente aí que as pesquisas falharam, sem conseguir detectar o avanço de Trump em Estados decisivos, especialmente em Pensilvânia, Michigan e Wisconsin.

“As pesquisas, principalmente as estaduais, não ajustavam as amostras por grau de educação. Existe uma relação direta entre escolaridade e taxa de resposta — pessoas mais escolarizadas tendem a responder mais as pesquisas —, mas isso até então não eram um problema porque esses vieses de escolaridade acabavam se anulando”, explica Raphael Nishimura, diretor de amostragem no Survey Research Center da Universidade de Michigan e membro da American Association for Public Opinion Research (AAPOR).

O que aconteceu em eleições anteriores nesses Estados foi que os democratas tiveram bom desempenho nos dois extremos (entre os eleitores que cursaram no máximo até Ensino Médio e aqueles com nível de pós-graduação). Então, os escolarizados, que respondiam mais as pesquisas, compensavam os menos escolarizados que votavam parecido.

“O que aconteceu em 2016 foi que os menos escolarizados penderam para o Partido Republicano. Os mais escolarizados continuaram democratas e o fato de que esses eleitores estavam mais presentes nas pesquisas criou um viés pró-Partido Democrata, especialmente nesses Estados”, acrescenta Nishimura.

Na eleição seguinte, o baque foi ainda maior: os institutos tiveram o pior desempenho coletivo em quatro décadas, apesar do esforço para corrigir o viés educacional. As pesquisas davam vantagem de até 12 pontos para Joe Biden e o que se viu foi uma disputa mais acirrada, com alguns Estados decisivos disputados voto a voto.

A principal hipótese, dizem analistas ouvidos pelo Estadão, é que os republicanos radicalizados tendem a ser mais refratários às pesquisas e à imprensa de modo geral. É o que os especialistas chamam de problema da não resposta.

“Seria uma característica do eleitor, que está em consonância com o perfil antiestablishment do próprio Trump”, afirma Raphael Nishimura, citando o relatório da American Association for Public Opinion Research sobre o desempenho das pesquisas em 2020.

Isso não quer dizer, contudo, que exista um “voto envergonhado” em Donald Trump. ‘Não há evidências de que existam ou tenham existido eleitores “ocultos” de Trump’, destaca Peter Woolley, professor de Ciências Políticas e pesquisador veterano da Universidade Fairleigh Dickinson, em Nova Jersey. O que acontece muitas vezes, explica, é que alguns subgrupos estão mais representados que outros.

Apoiadores do ex-presidente Donald Trump participam de comício na Georgia.  Foto: Kevin Dietsch/AFP

Mudanças metodológicas

Nos últimos anos, os institutos têm implementado uma série de mudanças metodológicas no esforço para de evitar o viés partidário nas pesquisas, além de adequar as amostras ao nível de escolaridade.

Essas mudanças podem incluir a combinação de diferentes meios (ligação, mensagem de texto e pesquisa online) para alcançar maior variedade de eleitores; ajustes para garantir a representação daqueles que são menos engajados na política (e acabaram escolhendo Trump na reta final de eleições anteriores); além do controvertido recall.

Esse último consiste em perguntar aos entrevistados como eles votaram na última eleição. Assim, os pesquisadores podem comparar as respostas com os resultados para garantir que a representação de democratas e republicanos está equilibrada.

Com base nesses dados, é possível fazer correções na amostra se, por exemplo, o número de pessoas que afirma ter votado em Joe Biden estiver desproporcional aos votos que ele de fato teve.

Os críticos do método apontam que os entrevistados podem não lembrar ou mentir sobre o voto e super-representar quem ganhou o ciclo passado. Ao tentar equilibrar esse “viés do vencedor”, os pesquisadores acabam beneficiando o candidato derrotado.

Esse ano, contudo, é diferente. Biden, o vencedor, abandonou a disputa. Do outro lado, Trump nunca reconheceu a derrota (e uma parte dos seus apoiadores acredita nisso), o que pode distorcer a lembrança dos eleitores e mitigar o viés do recall.

O método, há muito rejeitado, tem se popularizado entre os institutos, ansiosos para corrigir os erros do passado, e abriu dois caminhos divergentes, observou Nate Cohn, analista político e responsável pela metodologia das pesquisas New York Times/Siena College (que não adota o recall) em artigo para o NY Times.

Os institutos que adotam o recall tem, por óbvio, números mais parecidos com os resultados de 2020. Mostram Kamala Harris com liderança mais clara no voto popular e disputas mais acirradas no Colégio Eleitoral. Aqueles que não recorrem ao método tem números mais alinhados com a eleição de meio de mandato, em 2022.

Naquele ano — em que os democratas conseguiram conter a “onda vermelha” no Congresso e garantiram maioria no Senado — as pesquisas tiveram melhor desempenho e até penderam um pouco mais para o lado republicano.

“Se você ajustarmos as pesquisas atuais com base no erro de 2020, provavelmente, Trump está à frente em todos os Estados (decisivos). Se ajustarmos pelo erro de 2022, então Kamala Harris ganha na maioria dos Estados em disputa”, observa Ana Iparraguirre, sócia da empresa de pesquisas de opinião e estratégia política GBAO.

No mundo das pesquisas, já se discute se, no esforço para não subestimá-lo, os institutos poderiam estar super ajustando seus levantamentos e pendendo para Donald Trump.

“As duas coisas podem ser verdadeiras. Podemos estar super ajustando ou subestimando Trump. Em uma eleição tão apertada, isso poderia levar a resultados muito, muito diferentes”, acrescenta Ana.

Afinal, como ler as pesquisas?

As pesquisas, é claro, tem margem de erro o que significa que, nesse cenário de empate técnico, tudo pode acontecer. E o sistema americano tem particularidades que tornam o trabalho dos institutos ainda mais complexo.

O voto antecipado, por exemplo, está em andamento. As notícias e as declarações diárias dos candidatos podem ter impacto direto sobre os eleitores que estão votando neste momento.

Outro desafio é tentar determinar o comparecimento às urnas. Sem voto obrigatório, vence a eleição o candidato que conseguir mobilizar mais pessoas, especialmente as que vivem nos Estados-pêndulo, a sair de casa no dia 5 de novembro. Qualquer variação nesse sentido pode alterar os resultados.

Exemplo disso é a disputa em Michigan, onde a comunidade árabe — cerca de 250 mil pessoas — tem expressado insatisfação com o governo democrata pelo apoio a Israel na guerra no Oriente Médio. Parte desse eleitorado, fundamental para vitória de Joe Biden no Estado, agora afirma que não votará em ninguém.

Além do comportamento dos grupos, é possível observar o desempenho dos candidatos nas pautas prioritárias para o eleitorado. Na economia e na imigração, Trump leva vantagem. No tema do aborto, caro às mulheres, Kamala tem a preferência, apontam as pesquisas.

Outro fator importante, é a capacidade dos candidatos de levantar valiosos recursos para a campanha. Esse é mais um ponto para a democrata, que tem batido recordes de arrecadação.

Kamala Harris cumprimenta apoiadores na Pensilvânia.  Foto: Ruth Fremson/The New York Times

Com tantas variáveis, é preciso levar em consideração que as pesquisas são um retrato do momento. Há algumas semanas, refletiam a empolgação dos democratas com a substituição de Joe Biden por Kamala Harris nas cédulas. Agora, apontam para a resiliência de Trump na disputa.

“É uma eleição acirrada e o instrumento que temos para medi-la não é preciso o suficiente para dar uma resposta definitiva”, lembra Ana Iparraguirre. “Existem alguns fatores que têm explicado por que Donald Trump foi subestimado no passado. Se isso foi resolvido ou não, precisaremos esperar o dia 5 de novembro para descobrir”, conclui.

A menos de um mês da eleição, as pesquisas nos Estados Unidos não apontam caminhos claros para o que deve acontecer em 5 de novembro. Na média, a democrata Kamala Harris aparece com leve vantagem, empatada dentro da margem de erro com Donald Trump, e ainda paira a dúvida se o voto no republicano pode estar sendo subestimado, como aconteceu nas eleições anteriores.

O cenário de empate técnico se repete nos poucos Estados que realmente vão decidir quem será o próximo presidente dos Estados Unidos. Na Pensilvânia, que pode ser fiel da balança, Kamala aparece com 47,8% e Trump com 47,5% na média das pesquisas, segundo o agregador FiveThirtyEight.

Nos outros seis Estados decisivos, a democrata aparece com leve vantagem em três (Nevada, Michigan e Wisconsin) e o republicano em três (Arizona, Carolina do Norte e Michigan). As margens são mínimas, menores que um ponto percentual em alguns casos.

Isso quer dizer que as pesquisas estão captando melhor a polarização na política americana? Ou Donald Trump pode surpreender mais uma vez? “Essa é a coisa mais importante que nós sabemos desconhecer” responde W. Joseph Campbell, professor emérito de comunicação da American University, em Washington, e autor de “Lost in a Gallup: Polling Failure in U.S. Presidential Elections”.

“Sabemos que isso é um problema, mas não sabemos se foi corrigido. A grande questão é se os pesquisadores realmente encontraram uma maneira de captar o apoio de Donald Trump de forma precisa”, afirma.

Donald Trump enfrenta disputa acirrada contra Kamala Harris, indicam as pesquisas de intenção de voto nos Estados Unidos. Foto: John Bazemore/Associated Press

As metodologias têm sido ajustadas no esforço para detectar esse eleitor trumpista. O problema é que as falhas não costumam se repetir de uma eleição para outra, cada erro de pesquisa tem uma explicação diferente. Por isso, é difícil dizer se as mudanças feitas nos últimos anos, com base nos aprendizados do passado, são garantia de maior precisão no presente.

“Não é como se estivéssemos enfrentando o mesmo problema repetidamente”, observa Campbell, que analisa em seu livro todos os tropeços desde a eleição de 1936. “As pesquisas falham de maneiras diferentes, por razões diferentes. E essa é outra preocupação: os pesquisadores podem tentar corrigir o problema de quatro ou oito anos atrás, mas sempre pode surgir algo novo que dificulta o trabalhos dos institutos.”

Falhas nas últimas eleições

Em 2016, todas as sondagens indicavam que a experiente Hillary Clinton derrotaria o outsider Donald Trump. As previsões, como sabemos agora, estavam erradas.

A democrata, de fato, teve 2,8 milhões de votos a mais que o republicano. Acontece que ser o mais votado não é garantia de vitória na eleição americana, decidida no Colégio Eleitoral. Foi justamente aí que as pesquisas falharam, sem conseguir detectar o avanço de Trump em Estados decisivos, especialmente em Pensilvânia, Michigan e Wisconsin.

“As pesquisas, principalmente as estaduais, não ajustavam as amostras por grau de educação. Existe uma relação direta entre escolaridade e taxa de resposta — pessoas mais escolarizadas tendem a responder mais as pesquisas —, mas isso até então não eram um problema porque esses vieses de escolaridade acabavam se anulando”, explica Raphael Nishimura, diretor de amostragem no Survey Research Center da Universidade de Michigan e membro da American Association for Public Opinion Research (AAPOR).

O que aconteceu em eleições anteriores nesses Estados foi que os democratas tiveram bom desempenho nos dois extremos (entre os eleitores que cursaram no máximo até Ensino Médio e aqueles com nível de pós-graduação). Então, os escolarizados, que respondiam mais as pesquisas, compensavam os menos escolarizados que votavam parecido.

“O que aconteceu em 2016 foi que os menos escolarizados penderam para o Partido Republicano. Os mais escolarizados continuaram democratas e o fato de que esses eleitores estavam mais presentes nas pesquisas criou um viés pró-Partido Democrata, especialmente nesses Estados”, acrescenta Nishimura.

Na eleição seguinte, o baque foi ainda maior: os institutos tiveram o pior desempenho coletivo em quatro décadas, apesar do esforço para corrigir o viés educacional. As pesquisas davam vantagem de até 12 pontos para Joe Biden e o que se viu foi uma disputa mais acirrada, com alguns Estados decisivos disputados voto a voto.

A principal hipótese, dizem analistas ouvidos pelo Estadão, é que os republicanos radicalizados tendem a ser mais refratários às pesquisas e à imprensa de modo geral. É o que os especialistas chamam de problema da não resposta.

“Seria uma característica do eleitor, que está em consonância com o perfil antiestablishment do próprio Trump”, afirma Raphael Nishimura, citando o relatório da American Association for Public Opinion Research sobre o desempenho das pesquisas em 2020.

Isso não quer dizer, contudo, que exista um “voto envergonhado” em Donald Trump. ‘Não há evidências de que existam ou tenham existido eleitores “ocultos” de Trump’, destaca Peter Woolley, professor de Ciências Políticas e pesquisador veterano da Universidade Fairleigh Dickinson, em Nova Jersey. O que acontece muitas vezes, explica, é que alguns subgrupos estão mais representados que outros.

Apoiadores do ex-presidente Donald Trump participam de comício na Georgia.  Foto: Kevin Dietsch/AFP

Mudanças metodológicas

Nos últimos anos, os institutos têm implementado uma série de mudanças metodológicas no esforço para de evitar o viés partidário nas pesquisas, além de adequar as amostras ao nível de escolaridade.

Essas mudanças podem incluir a combinação de diferentes meios (ligação, mensagem de texto e pesquisa online) para alcançar maior variedade de eleitores; ajustes para garantir a representação daqueles que são menos engajados na política (e acabaram escolhendo Trump na reta final de eleições anteriores); além do controvertido recall.

Esse último consiste em perguntar aos entrevistados como eles votaram na última eleição. Assim, os pesquisadores podem comparar as respostas com os resultados para garantir que a representação de democratas e republicanos está equilibrada.

Com base nesses dados, é possível fazer correções na amostra se, por exemplo, o número de pessoas que afirma ter votado em Joe Biden estiver desproporcional aos votos que ele de fato teve.

Os críticos do método apontam que os entrevistados podem não lembrar ou mentir sobre o voto e super-representar quem ganhou o ciclo passado. Ao tentar equilibrar esse “viés do vencedor”, os pesquisadores acabam beneficiando o candidato derrotado.

Esse ano, contudo, é diferente. Biden, o vencedor, abandonou a disputa. Do outro lado, Trump nunca reconheceu a derrota (e uma parte dos seus apoiadores acredita nisso), o que pode distorcer a lembrança dos eleitores e mitigar o viés do recall.

O método, há muito rejeitado, tem se popularizado entre os institutos, ansiosos para corrigir os erros do passado, e abriu dois caminhos divergentes, observou Nate Cohn, analista político e responsável pela metodologia das pesquisas New York Times/Siena College (que não adota o recall) em artigo para o NY Times.

Os institutos que adotam o recall tem, por óbvio, números mais parecidos com os resultados de 2020. Mostram Kamala Harris com liderança mais clara no voto popular e disputas mais acirradas no Colégio Eleitoral. Aqueles que não recorrem ao método tem números mais alinhados com a eleição de meio de mandato, em 2022.

Naquele ano — em que os democratas conseguiram conter a “onda vermelha” no Congresso e garantiram maioria no Senado — as pesquisas tiveram melhor desempenho e até penderam um pouco mais para o lado republicano.

“Se você ajustarmos as pesquisas atuais com base no erro de 2020, provavelmente, Trump está à frente em todos os Estados (decisivos). Se ajustarmos pelo erro de 2022, então Kamala Harris ganha na maioria dos Estados em disputa”, observa Ana Iparraguirre, sócia da empresa de pesquisas de opinião e estratégia política GBAO.

No mundo das pesquisas, já se discute se, no esforço para não subestimá-lo, os institutos poderiam estar super ajustando seus levantamentos e pendendo para Donald Trump.

“As duas coisas podem ser verdadeiras. Podemos estar super ajustando ou subestimando Trump. Em uma eleição tão apertada, isso poderia levar a resultados muito, muito diferentes”, acrescenta Ana.

Afinal, como ler as pesquisas?

As pesquisas, é claro, tem margem de erro o que significa que, nesse cenário de empate técnico, tudo pode acontecer. E o sistema americano tem particularidades que tornam o trabalho dos institutos ainda mais complexo.

O voto antecipado, por exemplo, está em andamento. As notícias e as declarações diárias dos candidatos podem ter impacto direto sobre os eleitores que estão votando neste momento.

Outro desafio é tentar determinar o comparecimento às urnas. Sem voto obrigatório, vence a eleição o candidato que conseguir mobilizar mais pessoas, especialmente as que vivem nos Estados-pêndulo, a sair de casa no dia 5 de novembro. Qualquer variação nesse sentido pode alterar os resultados.

Exemplo disso é a disputa em Michigan, onde a comunidade árabe — cerca de 250 mil pessoas — tem expressado insatisfação com o governo democrata pelo apoio a Israel na guerra no Oriente Médio. Parte desse eleitorado, fundamental para vitória de Joe Biden no Estado, agora afirma que não votará em ninguém.

Além do comportamento dos grupos, é possível observar o desempenho dos candidatos nas pautas prioritárias para o eleitorado. Na economia e na imigração, Trump leva vantagem. No tema do aborto, caro às mulheres, Kamala tem a preferência, apontam as pesquisas.

Outro fator importante, é a capacidade dos candidatos de levantar valiosos recursos para a campanha. Esse é mais um ponto para a democrata, que tem batido recordes de arrecadação.

Kamala Harris cumprimenta apoiadores na Pensilvânia.  Foto: Ruth Fremson/The New York Times

Com tantas variáveis, é preciso levar em consideração que as pesquisas são um retrato do momento. Há algumas semanas, refletiam a empolgação dos democratas com a substituição de Joe Biden por Kamala Harris nas cédulas. Agora, apontam para a resiliência de Trump na disputa.

“É uma eleição acirrada e o instrumento que temos para medi-la não é preciso o suficiente para dar uma resposta definitiva”, lembra Ana Iparraguirre. “Existem alguns fatores que têm explicado por que Donald Trump foi subestimado no passado. Se isso foi resolvido ou não, precisaremos esperar o dia 5 de novembro para descobrir”, conclui.

A menos de um mês da eleição, as pesquisas nos Estados Unidos não apontam caminhos claros para o que deve acontecer em 5 de novembro. Na média, a democrata Kamala Harris aparece com leve vantagem, empatada dentro da margem de erro com Donald Trump, e ainda paira a dúvida se o voto no republicano pode estar sendo subestimado, como aconteceu nas eleições anteriores.

O cenário de empate técnico se repete nos poucos Estados que realmente vão decidir quem será o próximo presidente dos Estados Unidos. Na Pensilvânia, que pode ser fiel da balança, Kamala aparece com 47,8% e Trump com 47,5% na média das pesquisas, segundo o agregador FiveThirtyEight.

Nos outros seis Estados decisivos, a democrata aparece com leve vantagem em três (Nevada, Michigan e Wisconsin) e o republicano em três (Arizona, Carolina do Norte e Michigan). As margens são mínimas, menores que um ponto percentual em alguns casos.

Isso quer dizer que as pesquisas estão captando melhor a polarização na política americana? Ou Donald Trump pode surpreender mais uma vez? “Essa é a coisa mais importante que nós sabemos desconhecer” responde W. Joseph Campbell, professor emérito de comunicação da American University, em Washington, e autor de “Lost in a Gallup: Polling Failure in U.S. Presidential Elections”.

“Sabemos que isso é um problema, mas não sabemos se foi corrigido. A grande questão é se os pesquisadores realmente encontraram uma maneira de captar o apoio de Donald Trump de forma precisa”, afirma.

Donald Trump enfrenta disputa acirrada contra Kamala Harris, indicam as pesquisas de intenção de voto nos Estados Unidos. Foto: John Bazemore/Associated Press

As metodologias têm sido ajustadas no esforço para detectar esse eleitor trumpista. O problema é que as falhas não costumam se repetir de uma eleição para outra, cada erro de pesquisa tem uma explicação diferente. Por isso, é difícil dizer se as mudanças feitas nos últimos anos, com base nos aprendizados do passado, são garantia de maior precisão no presente.

“Não é como se estivéssemos enfrentando o mesmo problema repetidamente”, observa Campbell, que analisa em seu livro todos os tropeços desde a eleição de 1936. “As pesquisas falham de maneiras diferentes, por razões diferentes. E essa é outra preocupação: os pesquisadores podem tentar corrigir o problema de quatro ou oito anos atrás, mas sempre pode surgir algo novo que dificulta o trabalhos dos institutos.”

Falhas nas últimas eleições

Em 2016, todas as sondagens indicavam que a experiente Hillary Clinton derrotaria o outsider Donald Trump. As previsões, como sabemos agora, estavam erradas.

A democrata, de fato, teve 2,8 milhões de votos a mais que o republicano. Acontece que ser o mais votado não é garantia de vitória na eleição americana, decidida no Colégio Eleitoral. Foi justamente aí que as pesquisas falharam, sem conseguir detectar o avanço de Trump em Estados decisivos, especialmente em Pensilvânia, Michigan e Wisconsin.

“As pesquisas, principalmente as estaduais, não ajustavam as amostras por grau de educação. Existe uma relação direta entre escolaridade e taxa de resposta — pessoas mais escolarizadas tendem a responder mais as pesquisas —, mas isso até então não eram um problema porque esses vieses de escolaridade acabavam se anulando”, explica Raphael Nishimura, diretor de amostragem no Survey Research Center da Universidade de Michigan e membro da American Association for Public Opinion Research (AAPOR).

O que aconteceu em eleições anteriores nesses Estados foi que os democratas tiveram bom desempenho nos dois extremos (entre os eleitores que cursaram no máximo até Ensino Médio e aqueles com nível de pós-graduação). Então, os escolarizados, que respondiam mais as pesquisas, compensavam os menos escolarizados que votavam parecido.

“O que aconteceu em 2016 foi que os menos escolarizados penderam para o Partido Republicano. Os mais escolarizados continuaram democratas e o fato de que esses eleitores estavam mais presentes nas pesquisas criou um viés pró-Partido Democrata, especialmente nesses Estados”, acrescenta Nishimura.

Na eleição seguinte, o baque foi ainda maior: os institutos tiveram o pior desempenho coletivo em quatro décadas, apesar do esforço para corrigir o viés educacional. As pesquisas davam vantagem de até 12 pontos para Joe Biden e o que se viu foi uma disputa mais acirrada, com alguns Estados decisivos disputados voto a voto.

A principal hipótese, dizem analistas ouvidos pelo Estadão, é que os republicanos radicalizados tendem a ser mais refratários às pesquisas e à imprensa de modo geral. É o que os especialistas chamam de problema da não resposta.

“Seria uma característica do eleitor, que está em consonância com o perfil antiestablishment do próprio Trump”, afirma Raphael Nishimura, citando o relatório da American Association for Public Opinion Research sobre o desempenho das pesquisas em 2020.

Isso não quer dizer, contudo, que exista um “voto envergonhado” em Donald Trump. ‘Não há evidências de que existam ou tenham existido eleitores “ocultos” de Trump’, destaca Peter Woolley, professor de Ciências Políticas e pesquisador veterano da Universidade Fairleigh Dickinson, em Nova Jersey. O que acontece muitas vezes, explica, é que alguns subgrupos estão mais representados que outros.

Apoiadores do ex-presidente Donald Trump participam de comício na Georgia.  Foto: Kevin Dietsch/AFP

Mudanças metodológicas

Nos últimos anos, os institutos têm implementado uma série de mudanças metodológicas no esforço para de evitar o viés partidário nas pesquisas, além de adequar as amostras ao nível de escolaridade.

Essas mudanças podem incluir a combinação de diferentes meios (ligação, mensagem de texto e pesquisa online) para alcançar maior variedade de eleitores; ajustes para garantir a representação daqueles que são menos engajados na política (e acabaram escolhendo Trump na reta final de eleições anteriores); além do controvertido recall.

Esse último consiste em perguntar aos entrevistados como eles votaram na última eleição. Assim, os pesquisadores podem comparar as respostas com os resultados para garantir que a representação de democratas e republicanos está equilibrada.

Com base nesses dados, é possível fazer correções na amostra se, por exemplo, o número de pessoas que afirma ter votado em Joe Biden estiver desproporcional aos votos que ele de fato teve.

Os críticos do método apontam que os entrevistados podem não lembrar ou mentir sobre o voto e super-representar quem ganhou o ciclo passado. Ao tentar equilibrar esse “viés do vencedor”, os pesquisadores acabam beneficiando o candidato derrotado.

Esse ano, contudo, é diferente. Biden, o vencedor, abandonou a disputa. Do outro lado, Trump nunca reconheceu a derrota (e uma parte dos seus apoiadores acredita nisso), o que pode distorcer a lembrança dos eleitores e mitigar o viés do recall.

O método, há muito rejeitado, tem se popularizado entre os institutos, ansiosos para corrigir os erros do passado, e abriu dois caminhos divergentes, observou Nate Cohn, analista político e responsável pela metodologia das pesquisas New York Times/Siena College (que não adota o recall) em artigo para o NY Times.

Os institutos que adotam o recall tem, por óbvio, números mais parecidos com os resultados de 2020. Mostram Kamala Harris com liderança mais clara no voto popular e disputas mais acirradas no Colégio Eleitoral. Aqueles que não recorrem ao método tem números mais alinhados com a eleição de meio de mandato, em 2022.

Naquele ano — em que os democratas conseguiram conter a “onda vermelha” no Congresso e garantiram maioria no Senado — as pesquisas tiveram melhor desempenho e até penderam um pouco mais para o lado republicano.

“Se você ajustarmos as pesquisas atuais com base no erro de 2020, provavelmente, Trump está à frente em todos os Estados (decisivos). Se ajustarmos pelo erro de 2022, então Kamala Harris ganha na maioria dos Estados em disputa”, observa Ana Iparraguirre, sócia da empresa de pesquisas de opinião e estratégia política GBAO.

No mundo das pesquisas, já se discute se, no esforço para não subestimá-lo, os institutos poderiam estar super ajustando seus levantamentos e pendendo para Donald Trump.

“As duas coisas podem ser verdadeiras. Podemos estar super ajustando ou subestimando Trump. Em uma eleição tão apertada, isso poderia levar a resultados muito, muito diferentes”, acrescenta Ana.

Afinal, como ler as pesquisas?

As pesquisas, é claro, tem margem de erro o que significa que, nesse cenário de empate técnico, tudo pode acontecer. E o sistema americano tem particularidades que tornam o trabalho dos institutos ainda mais complexo.

O voto antecipado, por exemplo, está em andamento. As notícias e as declarações diárias dos candidatos podem ter impacto direto sobre os eleitores que estão votando neste momento.

Outro desafio é tentar determinar o comparecimento às urnas. Sem voto obrigatório, vence a eleição o candidato que conseguir mobilizar mais pessoas, especialmente as que vivem nos Estados-pêndulo, a sair de casa no dia 5 de novembro. Qualquer variação nesse sentido pode alterar os resultados.

Exemplo disso é a disputa em Michigan, onde a comunidade árabe — cerca de 250 mil pessoas — tem expressado insatisfação com o governo democrata pelo apoio a Israel na guerra no Oriente Médio. Parte desse eleitorado, fundamental para vitória de Joe Biden no Estado, agora afirma que não votará em ninguém.

Além do comportamento dos grupos, é possível observar o desempenho dos candidatos nas pautas prioritárias para o eleitorado. Na economia e na imigração, Trump leva vantagem. No tema do aborto, caro às mulheres, Kamala tem a preferência, apontam as pesquisas.

Outro fator importante, é a capacidade dos candidatos de levantar valiosos recursos para a campanha. Esse é mais um ponto para a democrata, que tem batido recordes de arrecadação.

Kamala Harris cumprimenta apoiadores na Pensilvânia.  Foto: Ruth Fremson/The New York Times

Com tantas variáveis, é preciso levar em consideração que as pesquisas são um retrato do momento. Há algumas semanas, refletiam a empolgação dos democratas com a substituição de Joe Biden por Kamala Harris nas cédulas. Agora, apontam para a resiliência de Trump na disputa.

“É uma eleição acirrada e o instrumento que temos para medi-la não é preciso o suficiente para dar uma resposta definitiva”, lembra Ana Iparraguirre. “Existem alguns fatores que têm explicado por que Donald Trump foi subestimado no passado. Se isso foi resolvido ou não, precisaremos esperar o dia 5 de novembro para descobrir”, conclui.

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