Petro assume como 1º líder de esquerda da Colômbia e defende nova política internacional de drogas


Presidente toma posse com esquerda fortalecida no Congresso e direita uribista em declínio, mas terá desafios frente a uma economia fragilizada e alta da violência

Por Redação
Atualização:

BOGOTÁ - O novo presidente da Colômbia, Gustavo Petro, propôs em seu discurso de posse neste domingo, 7, pôr fim à fracassada “guerra às drogas” no mundo e passar para uma “política forte de prevenção do consumo” nos países desenvolvidos. “É hora de uma nova convenção internacional que aceite que a guerra às drogas fracassou”, disse o líder do país que é o maior produtor mundial de cocaína. Ele também propôs novos acordos de paz com os grupos armados que financiam o narcotráfico.

Sem mencionar os Estados Unidos, principal consumidor da droga processada na Colômbia, Petro questionou as “quatro décadas” de perseguição antidrogas que Washington incentivou. “A guerra às drogas fortaleceu as máfias e enfraqueceu os Estados”, disse ele, acrescentando que nesse período “1 milhão de latino-americanos” foram assassinados e 70 mil americanos morrem “por overdose todos os anos”. “Vamos esperar que mais 1 milhão de latino-americanos sejam assassinados e que as overdoses subam para 200 mil nos EUA a cada ano?”, acrescentou.

Em seu primeiro discurso como chefe de Estado, Petro delineou mudanças para este país de 50 milhões de habitantes, assolado pela desigualdade, pelas defasagens econômicas da pandemia e pela violência cíclica há mais de 60 anos. Petro disse que cumprirá o acordo com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), a guerrilha que assinou a paz em 2016 para se tornar um partido político, e ofereceu aos grupos que permanecem armados benefícios criminais se renunciarem à violência. “Apelamos a todos os armados a deporem as armas nas brumas do passado e a aceitar benefícios legais em troca da paz”, disse.

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Ele não especificou, no entanto, se sua oferta implica em redução de penas ou sanções alternativas à prisão, como as acordadas com as Farc.

Petro tomou posse neste domingo como o primeiro presidente de esquerda da Colômbia, diante de centenas de milhares de pessoas que acompanharam a cerimônia em Bogotá. “Juro a Deus e prometo ao povo cumprir fielmente a Constituição e as leis da Colômbia”, disse o ex-senador e ex-guerrilheiro de 62 anos frente ao chefe do Congresso, na Plaza de Bolívar.

O novo presidente da Colômbia, Gustavo Petro (E), e a vice-presidente Francia Marquez, se cumprimentam durante cerimônia de posse na Praça Bolívar Foto: Juan Barreto/AFP
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O ex-senador, que há três décadas deixou a violência armada, fez o juramento no início da tarde deste domingo, diante de uma extensa delegação de convidados internacionais. Petro substitui o impopular Iván Duque e governará por quatro anos um país de 50 milhões de habitantes, que pela pela primeira vez entrará no giro à esquerda da região.

A posse teve a presença dos presidentes do Chile, Gabriel Boric, do Equador, Guillermo Lasso, e da Argentina, Alberto Fernández. Também estiveram na solenidade o rei Felipe VI, da Espanha, e a diplomata Samantha Power, representando os EUA – o Brasil foi representado pelo chanceler, Carlos França.

A cerimônia foi marcada por simbolismos. Como primeiro ato, Petro ordenou que a espada de Simón Bolívar, símbolo da luta guerrilheira, fosse levada para o local da posse. A faixa foi colocada pela senadora María José Pizarro, filha de Carlos Pizarro, que foi companheiro do presidente na guerrilha Movimento 19 de Abril (M-19) e foi assassinado em 1990, quando liderava a corrida presidencial.

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Nova era

Com a chegada de Petro ao poder, a Colômbia iniciou uma nova era política no país em 200 anos de história republicana. O ex-guerrilheiro, que fez carreira na política como senador e prefeito de Bogotá, promete transformações profundas em um país desigual e sitiado pela violência do narcotráfico.

Com a faixa presidencial, ele herda os desafios de superar a crescente violência que ceifou a vida de mais de 560 defensores de direitos humanos desde 2016, a inflação mais alta das últimas duas décadas e a busca por consenso em um país dividido.

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No entanto, vários setores temem ser afetados pelo novo governo e seu objetivo de realizar reformas na agricultura, na produção de energia, na polícia, na previdência e na arrecadação de impostos. Mas entre seus eleitores há esperança: Petro prometeu a eles uma nação com menos desigualdade, que garantirá os direitos de todos os seus cidadãos - especialmente os mais vulneráveis - e que dará prioridade ao meio ambiente.

“Vai começar o primeiro governo que esperamos que seja da paz. Que possa trazer à Colômbia o que têm faltado durante séculos que é a tranquilidade e a paz. Aqui inicia um governo que luta por justiça ambiental”, disse Petro no sábado, 6, em um ato na capital Bogotá.

O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, participou de uma cerimônia de posse simbólica perante um povo indígena  Foto: Mauricio Dueñas/EFE
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Antes da posse oficial, Petro participou de uma primeira cerimônia simbólica de posse perante o povo indígena Arauhaco, em Serra Nevada de Santa Marta, no norte do país. Um dos mamos - a mais alta hierarquia da comunidade - pediu-lhe que respondesse às exigências da sociedade e deu-lhe uma bengala que representa a sabedoria.

Expectativas

Ele que foi o líder da oposição nas últimas décadas assume com uma bateria de reformas em mente e as expectativas de metade do país que optou por ele na votação de 19 de junho. Com Petro, a ambientalista Francia Márquez, de 40 anos, tornou-se a primeira vice-presidente afro de uma nação que historicamente esteve governada pelas elites de homens brancos.

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A Colômbia entra em um período de mudanças, com um esquerdista no comando, um Congresso a seu favor e uma oposição enfraquecida diante do declínio do ex-presidente Álvaro Uribe, entre 2002 e 2010, o chefe da direita tradicional do país.

Petro parte de uma posição invejável, com a maioria ampla no Congresso e, em relação às ruas, conta com apoio que nenhum governo anterior teve nos últimos anos, comenta o analista Jorge Restrepo, do Centro de Recursos para el Análisis de Conflictos (Cerac).

O presidente reuniu um governo de diversas tendências, com mulheres à frente de vários ministérios e a missão de levar à diante reformas que começarão no período legislativo a partir desta segunda-feira, 8. Entre elas estão o projeto que eleva os impostos aos mais ricos, reduz a arrecadação e tributa bebidas açucaradas, em busca de recursos para os projetos sociais.

“O nível de endividamento e o déficit fiscal que encontramos para o próximo quadriênio são críticos”, assegura Daniel Rojas, um dos coordenadores da comissão de transição do governo de Duque.

Ainda assim, Petro propõe reduzir a distância entre ricos e pobres, uma das mais amplas do continente junto com a do Brasil, com maior acesso ao crédito, subsídios e educação pública.

Desafios

Depois dos estragos da pandemia da covid-19, a economia recupera o crescimento apesar da inflação, que alcançou em julho 10,2% na variação interanual, o desemprego (11,7%) e a pobreza que castiga a 39% da população.

“As pessoas esperam que ocorra logo algumas das mudanças prometidas durante a campanha, que somado à situação econômica, gera um ambiente de tensão”, diz Patrícia Muñoz, cientista política da Universidad Javeriana.

Na frente internacional, Petro reativará as relações diplomáticas e comerciais com o governo de Nicolás Maduro na Venezuela, rompidas desde 2019, e buscará apoio para retomar as conversações de paz com o Exército de Liberación Nacional (ELN), a última guerrilha reconhecida no país. Embora o acordo de paz com as Farc tenha reduzido a violência, a Colômbia ainda não conseguiu extinguir o último conflito armado interno no continente.

A nova vice-presidente Francia Márquez participou de uma cerimônia de posse popular e espiritual com indígenas, em Bogotá  Foto: Mauricio Dueñas/EFE

Segundo a analista política Sandra Borda, o objetivo de melhorar as relações com a Venezuela está ligado à possibilidade desse país facilitar o diálogo com o ELN. Após ser eleito, Petro adotou uma posição mais moderada em algumas questões, disse, e buscou o diálogo com seus adversários políticos.

Além do ELN, poderosos traficantes como o Clã del Golfo, chefiado pelo capo ‘Otoniel’, extraditado este ano para os Estados Unidos, impõem sua lei em várias áreas do país.

O grupou anunciou neste domingo um cessar “unilateral de hostilidades ofensivas”, para buscar os “caminhos da paz”, a partir do início de “uma era distinta” na Colômbia, com a posse de Petro. “Por fim, termina o regime do presidente (Iván) Duque”, aponta no início o comunicado daquele que é considerado o maior grupo criminoso do país sul-americano.

As dissidências que se marginalizaram do pacto de paz também desafiam o estado graças aos recursos do garimpo ilegal e principalmente do narcotráfico.

Petro também recebe um país com a maior produção de cocaína do mundo e, assim como mencionou em seu discurso de posse, propôs em sua campanha repensar a fracassada política de proibição das drogas em conjunto com os Estados Unidos, principal consumidor do derivado da folha de coca.

Também “veremos uma lenta mudança nas forças militares, mas acho que podemos afastar algum tipo de agitação pública, insurreição, greve ou queda na atividade operacional”, diz o analista da Cerac. /AFP e AP

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Pela primeira vez, um presidente de esquerda foi eleito na Colômbia. No último domingo, 19, Gustavo Petro ganhou as eleições presidenciais.

BOGOTÁ - O novo presidente da Colômbia, Gustavo Petro, propôs em seu discurso de posse neste domingo, 7, pôr fim à fracassada “guerra às drogas” no mundo e passar para uma “política forte de prevenção do consumo” nos países desenvolvidos. “É hora de uma nova convenção internacional que aceite que a guerra às drogas fracassou”, disse o líder do país que é o maior produtor mundial de cocaína. Ele também propôs novos acordos de paz com os grupos armados que financiam o narcotráfico.

Sem mencionar os Estados Unidos, principal consumidor da droga processada na Colômbia, Petro questionou as “quatro décadas” de perseguição antidrogas que Washington incentivou. “A guerra às drogas fortaleceu as máfias e enfraqueceu os Estados”, disse ele, acrescentando que nesse período “1 milhão de latino-americanos” foram assassinados e 70 mil americanos morrem “por overdose todos os anos”. “Vamos esperar que mais 1 milhão de latino-americanos sejam assassinados e que as overdoses subam para 200 mil nos EUA a cada ano?”, acrescentou.

Em seu primeiro discurso como chefe de Estado, Petro delineou mudanças para este país de 50 milhões de habitantes, assolado pela desigualdade, pelas defasagens econômicas da pandemia e pela violência cíclica há mais de 60 anos. Petro disse que cumprirá o acordo com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), a guerrilha que assinou a paz em 2016 para se tornar um partido político, e ofereceu aos grupos que permanecem armados benefícios criminais se renunciarem à violência. “Apelamos a todos os armados a deporem as armas nas brumas do passado e a aceitar benefícios legais em troca da paz”, disse.

Ele não especificou, no entanto, se sua oferta implica em redução de penas ou sanções alternativas à prisão, como as acordadas com as Farc.

Petro tomou posse neste domingo como o primeiro presidente de esquerda da Colômbia, diante de centenas de milhares de pessoas que acompanharam a cerimônia em Bogotá. “Juro a Deus e prometo ao povo cumprir fielmente a Constituição e as leis da Colômbia”, disse o ex-senador e ex-guerrilheiro de 62 anos frente ao chefe do Congresso, na Plaza de Bolívar.

O novo presidente da Colômbia, Gustavo Petro (E), e a vice-presidente Francia Marquez, se cumprimentam durante cerimônia de posse na Praça Bolívar Foto: Juan Barreto/AFP

O ex-senador, que há três décadas deixou a violência armada, fez o juramento no início da tarde deste domingo, diante de uma extensa delegação de convidados internacionais. Petro substitui o impopular Iván Duque e governará por quatro anos um país de 50 milhões de habitantes, que pela pela primeira vez entrará no giro à esquerda da região.

A posse teve a presença dos presidentes do Chile, Gabriel Boric, do Equador, Guillermo Lasso, e da Argentina, Alberto Fernández. Também estiveram na solenidade o rei Felipe VI, da Espanha, e a diplomata Samantha Power, representando os EUA – o Brasil foi representado pelo chanceler, Carlos França.

A cerimônia foi marcada por simbolismos. Como primeiro ato, Petro ordenou que a espada de Simón Bolívar, símbolo da luta guerrilheira, fosse levada para o local da posse. A faixa foi colocada pela senadora María José Pizarro, filha de Carlos Pizarro, que foi companheiro do presidente na guerrilha Movimento 19 de Abril (M-19) e foi assassinado em 1990, quando liderava a corrida presidencial.

Nova era

Com a chegada de Petro ao poder, a Colômbia iniciou uma nova era política no país em 200 anos de história republicana. O ex-guerrilheiro, que fez carreira na política como senador e prefeito de Bogotá, promete transformações profundas em um país desigual e sitiado pela violência do narcotráfico.

Com a faixa presidencial, ele herda os desafios de superar a crescente violência que ceifou a vida de mais de 560 defensores de direitos humanos desde 2016, a inflação mais alta das últimas duas décadas e a busca por consenso em um país dividido.

No entanto, vários setores temem ser afetados pelo novo governo e seu objetivo de realizar reformas na agricultura, na produção de energia, na polícia, na previdência e na arrecadação de impostos. Mas entre seus eleitores há esperança: Petro prometeu a eles uma nação com menos desigualdade, que garantirá os direitos de todos os seus cidadãos - especialmente os mais vulneráveis - e que dará prioridade ao meio ambiente.

“Vai começar o primeiro governo que esperamos que seja da paz. Que possa trazer à Colômbia o que têm faltado durante séculos que é a tranquilidade e a paz. Aqui inicia um governo que luta por justiça ambiental”, disse Petro no sábado, 6, em um ato na capital Bogotá.

O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, participou de uma cerimônia de posse simbólica perante um povo indígena  Foto: Mauricio Dueñas/EFE

Antes da posse oficial, Petro participou de uma primeira cerimônia simbólica de posse perante o povo indígena Arauhaco, em Serra Nevada de Santa Marta, no norte do país. Um dos mamos - a mais alta hierarquia da comunidade - pediu-lhe que respondesse às exigências da sociedade e deu-lhe uma bengala que representa a sabedoria.

Expectativas

Ele que foi o líder da oposição nas últimas décadas assume com uma bateria de reformas em mente e as expectativas de metade do país que optou por ele na votação de 19 de junho. Com Petro, a ambientalista Francia Márquez, de 40 anos, tornou-se a primeira vice-presidente afro de uma nação que historicamente esteve governada pelas elites de homens brancos.

A Colômbia entra em um período de mudanças, com um esquerdista no comando, um Congresso a seu favor e uma oposição enfraquecida diante do declínio do ex-presidente Álvaro Uribe, entre 2002 e 2010, o chefe da direita tradicional do país.

Petro parte de uma posição invejável, com a maioria ampla no Congresso e, em relação às ruas, conta com apoio que nenhum governo anterior teve nos últimos anos, comenta o analista Jorge Restrepo, do Centro de Recursos para el Análisis de Conflictos (Cerac).

O presidente reuniu um governo de diversas tendências, com mulheres à frente de vários ministérios e a missão de levar à diante reformas que começarão no período legislativo a partir desta segunda-feira, 8. Entre elas estão o projeto que eleva os impostos aos mais ricos, reduz a arrecadação e tributa bebidas açucaradas, em busca de recursos para os projetos sociais.

“O nível de endividamento e o déficit fiscal que encontramos para o próximo quadriênio são críticos”, assegura Daniel Rojas, um dos coordenadores da comissão de transição do governo de Duque.

Ainda assim, Petro propõe reduzir a distância entre ricos e pobres, uma das mais amplas do continente junto com a do Brasil, com maior acesso ao crédito, subsídios e educação pública.

Desafios

Depois dos estragos da pandemia da covid-19, a economia recupera o crescimento apesar da inflação, que alcançou em julho 10,2% na variação interanual, o desemprego (11,7%) e a pobreza que castiga a 39% da população.

“As pessoas esperam que ocorra logo algumas das mudanças prometidas durante a campanha, que somado à situação econômica, gera um ambiente de tensão”, diz Patrícia Muñoz, cientista política da Universidad Javeriana.

Na frente internacional, Petro reativará as relações diplomáticas e comerciais com o governo de Nicolás Maduro na Venezuela, rompidas desde 2019, e buscará apoio para retomar as conversações de paz com o Exército de Liberación Nacional (ELN), a última guerrilha reconhecida no país. Embora o acordo de paz com as Farc tenha reduzido a violência, a Colômbia ainda não conseguiu extinguir o último conflito armado interno no continente.

A nova vice-presidente Francia Márquez participou de uma cerimônia de posse popular e espiritual com indígenas, em Bogotá  Foto: Mauricio Dueñas/EFE

Segundo a analista política Sandra Borda, o objetivo de melhorar as relações com a Venezuela está ligado à possibilidade desse país facilitar o diálogo com o ELN. Após ser eleito, Petro adotou uma posição mais moderada em algumas questões, disse, e buscou o diálogo com seus adversários políticos.

Além do ELN, poderosos traficantes como o Clã del Golfo, chefiado pelo capo ‘Otoniel’, extraditado este ano para os Estados Unidos, impõem sua lei em várias áreas do país.

O grupou anunciou neste domingo um cessar “unilateral de hostilidades ofensivas”, para buscar os “caminhos da paz”, a partir do início de “uma era distinta” na Colômbia, com a posse de Petro. “Por fim, termina o regime do presidente (Iván) Duque”, aponta no início o comunicado daquele que é considerado o maior grupo criminoso do país sul-americano.

As dissidências que se marginalizaram do pacto de paz também desafiam o estado graças aos recursos do garimpo ilegal e principalmente do narcotráfico.

Petro também recebe um país com a maior produção de cocaína do mundo e, assim como mencionou em seu discurso de posse, propôs em sua campanha repensar a fracassada política de proibição das drogas em conjunto com os Estados Unidos, principal consumidor do derivado da folha de coca.

Também “veremos uma lenta mudança nas forças militares, mas acho que podemos afastar algum tipo de agitação pública, insurreição, greve ou queda na atividade operacional”, diz o analista da Cerac. /AFP e AP

Seu navegador não suporta esse video.

Pela primeira vez, um presidente de esquerda foi eleito na Colômbia. No último domingo, 19, Gustavo Petro ganhou as eleições presidenciais.

BOGOTÁ - O novo presidente da Colômbia, Gustavo Petro, propôs em seu discurso de posse neste domingo, 7, pôr fim à fracassada “guerra às drogas” no mundo e passar para uma “política forte de prevenção do consumo” nos países desenvolvidos. “É hora de uma nova convenção internacional que aceite que a guerra às drogas fracassou”, disse o líder do país que é o maior produtor mundial de cocaína. Ele também propôs novos acordos de paz com os grupos armados que financiam o narcotráfico.

Sem mencionar os Estados Unidos, principal consumidor da droga processada na Colômbia, Petro questionou as “quatro décadas” de perseguição antidrogas que Washington incentivou. “A guerra às drogas fortaleceu as máfias e enfraqueceu os Estados”, disse ele, acrescentando que nesse período “1 milhão de latino-americanos” foram assassinados e 70 mil americanos morrem “por overdose todos os anos”. “Vamos esperar que mais 1 milhão de latino-americanos sejam assassinados e que as overdoses subam para 200 mil nos EUA a cada ano?”, acrescentou.

Em seu primeiro discurso como chefe de Estado, Petro delineou mudanças para este país de 50 milhões de habitantes, assolado pela desigualdade, pelas defasagens econômicas da pandemia e pela violência cíclica há mais de 60 anos. Petro disse que cumprirá o acordo com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), a guerrilha que assinou a paz em 2016 para se tornar um partido político, e ofereceu aos grupos que permanecem armados benefícios criminais se renunciarem à violência. “Apelamos a todos os armados a deporem as armas nas brumas do passado e a aceitar benefícios legais em troca da paz”, disse.

Ele não especificou, no entanto, se sua oferta implica em redução de penas ou sanções alternativas à prisão, como as acordadas com as Farc.

Petro tomou posse neste domingo como o primeiro presidente de esquerda da Colômbia, diante de centenas de milhares de pessoas que acompanharam a cerimônia em Bogotá. “Juro a Deus e prometo ao povo cumprir fielmente a Constituição e as leis da Colômbia”, disse o ex-senador e ex-guerrilheiro de 62 anos frente ao chefe do Congresso, na Plaza de Bolívar.

O novo presidente da Colômbia, Gustavo Petro (E), e a vice-presidente Francia Marquez, se cumprimentam durante cerimônia de posse na Praça Bolívar Foto: Juan Barreto/AFP

O ex-senador, que há três décadas deixou a violência armada, fez o juramento no início da tarde deste domingo, diante de uma extensa delegação de convidados internacionais. Petro substitui o impopular Iván Duque e governará por quatro anos um país de 50 milhões de habitantes, que pela pela primeira vez entrará no giro à esquerda da região.

A posse teve a presença dos presidentes do Chile, Gabriel Boric, do Equador, Guillermo Lasso, e da Argentina, Alberto Fernández. Também estiveram na solenidade o rei Felipe VI, da Espanha, e a diplomata Samantha Power, representando os EUA – o Brasil foi representado pelo chanceler, Carlos França.

A cerimônia foi marcada por simbolismos. Como primeiro ato, Petro ordenou que a espada de Simón Bolívar, símbolo da luta guerrilheira, fosse levada para o local da posse. A faixa foi colocada pela senadora María José Pizarro, filha de Carlos Pizarro, que foi companheiro do presidente na guerrilha Movimento 19 de Abril (M-19) e foi assassinado em 1990, quando liderava a corrida presidencial.

Nova era

Com a chegada de Petro ao poder, a Colômbia iniciou uma nova era política no país em 200 anos de história republicana. O ex-guerrilheiro, que fez carreira na política como senador e prefeito de Bogotá, promete transformações profundas em um país desigual e sitiado pela violência do narcotráfico.

Com a faixa presidencial, ele herda os desafios de superar a crescente violência que ceifou a vida de mais de 560 defensores de direitos humanos desde 2016, a inflação mais alta das últimas duas décadas e a busca por consenso em um país dividido.

No entanto, vários setores temem ser afetados pelo novo governo e seu objetivo de realizar reformas na agricultura, na produção de energia, na polícia, na previdência e na arrecadação de impostos. Mas entre seus eleitores há esperança: Petro prometeu a eles uma nação com menos desigualdade, que garantirá os direitos de todos os seus cidadãos - especialmente os mais vulneráveis - e que dará prioridade ao meio ambiente.

“Vai começar o primeiro governo que esperamos que seja da paz. Que possa trazer à Colômbia o que têm faltado durante séculos que é a tranquilidade e a paz. Aqui inicia um governo que luta por justiça ambiental”, disse Petro no sábado, 6, em um ato na capital Bogotá.

O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, participou de uma cerimônia de posse simbólica perante um povo indígena  Foto: Mauricio Dueñas/EFE

Antes da posse oficial, Petro participou de uma primeira cerimônia simbólica de posse perante o povo indígena Arauhaco, em Serra Nevada de Santa Marta, no norte do país. Um dos mamos - a mais alta hierarquia da comunidade - pediu-lhe que respondesse às exigências da sociedade e deu-lhe uma bengala que representa a sabedoria.

Expectativas

Ele que foi o líder da oposição nas últimas décadas assume com uma bateria de reformas em mente e as expectativas de metade do país que optou por ele na votação de 19 de junho. Com Petro, a ambientalista Francia Márquez, de 40 anos, tornou-se a primeira vice-presidente afro de uma nação que historicamente esteve governada pelas elites de homens brancos.

A Colômbia entra em um período de mudanças, com um esquerdista no comando, um Congresso a seu favor e uma oposição enfraquecida diante do declínio do ex-presidente Álvaro Uribe, entre 2002 e 2010, o chefe da direita tradicional do país.

Petro parte de uma posição invejável, com a maioria ampla no Congresso e, em relação às ruas, conta com apoio que nenhum governo anterior teve nos últimos anos, comenta o analista Jorge Restrepo, do Centro de Recursos para el Análisis de Conflictos (Cerac).

O presidente reuniu um governo de diversas tendências, com mulheres à frente de vários ministérios e a missão de levar à diante reformas que começarão no período legislativo a partir desta segunda-feira, 8. Entre elas estão o projeto que eleva os impostos aos mais ricos, reduz a arrecadação e tributa bebidas açucaradas, em busca de recursos para os projetos sociais.

“O nível de endividamento e o déficit fiscal que encontramos para o próximo quadriênio são críticos”, assegura Daniel Rojas, um dos coordenadores da comissão de transição do governo de Duque.

Ainda assim, Petro propõe reduzir a distância entre ricos e pobres, uma das mais amplas do continente junto com a do Brasil, com maior acesso ao crédito, subsídios e educação pública.

Desafios

Depois dos estragos da pandemia da covid-19, a economia recupera o crescimento apesar da inflação, que alcançou em julho 10,2% na variação interanual, o desemprego (11,7%) e a pobreza que castiga a 39% da população.

“As pessoas esperam que ocorra logo algumas das mudanças prometidas durante a campanha, que somado à situação econômica, gera um ambiente de tensão”, diz Patrícia Muñoz, cientista política da Universidad Javeriana.

Na frente internacional, Petro reativará as relações diplomáticas e comerciais com o governo de Nicolás Maduro na Venezuela, rompidas desde 2019, e buscará apoio para retomar as conversações de paz com o Exército de Liberación Nacional (ELN), a última guerrilha reconhecida no país. Embora o acordo de paz com as Farc tenha reduzido a violência, a Colômbia ainda não conseguiu extinguir o último conflito armado interno no continente.

A nova vice-presidente Francia Márquez participou de uma cerimônia de posse popular e espiritual com indígenas, em Bogotá  Foto: Mauricio Dueñas/EFE

Segundo a analista política Sandra Borda, o objetivo de melhorar as relações com a Venezuela está ligado à possibilidade desse país facilitar o diálogo com o ELN. Após ser eleito, Petro adotou uma posição mais moderada em algumas questões, disse, e buscou o diálogo com seus adversários políticos.

Além do ELN, poderosos traficantes como o Clã del Golfo, chefiado pelo capo ‘Otoniel’, extraditado este ano para os Estados Unidos, impõem sua lei em várias áreas do país.

O grupou anunciou neste domingo um cessar “unilateral de hostilidades ofensivas”, para buscar os “caminhos da paz”, a partir do início de “uma era distinta” na Colômbia, com a posse de Petro. “Por fim, termina o regime do presidente (Iván) Duque”, aponta no início o comunicado daquele que é considerado o maior grupo criminoso do país sul-americano.

As dissidências que se marginalizaram do pacto de paz também desafiam o estado graças aos recursos do garimpo ilegal e principalmente do narcotráfico.

Petro também recebe um país com a maior produção de cocaína do mundo e, assim como mencionou em seu discurso de posse, propôs em sua campanha repensar a fracassada política de proibição das drogas em conjunto com os Estados Unidos, principal consumidor do derivado da folha de coca.

Também “veremos uma lenta mudança nas forças militares, mas acho que podemos afastar algum tipo de agitação pública, insurreição, greve ou queda na atividade operacional”, diz o analista da Cerac. /AFP e AP

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