Plano para despejar água de Fukushima complica relação entre Japão e Coreia do Sul


Premiê japonês, Fumio Kishida, anunciou nesta segunda-feira que país pretende liberar resíduo na quinta-feira, 24

Por Choe Sang-Hun

THE NEW YORK TIMES, SEUL — Em um cruzamento movimentado em Seul neste verão, uma faixa do principal partido de oposição, o Partido Democrático, gritava “Não!” ao plano do Japão de despejar água radioativa tratada de sua usina nuclear de Fukushima destruída à beira do Oceano Pacífico.

Do outro lado da rua, um cartaz da legenda no governo, o Partido do Poder Popular, dizia que a verdadeira ameaça era a oposição espalhando teorias conspiratórias que assustariam as pessoas em relação aos frutos do mar: “O Partido Democrático está matando o sustento de nossos pescadores!”

O decisão do Japão de despejar mais de 1,3 milhão de toneladas de água tratada em Fukushima Daiichi, a usina de energia nuclear que foi destruída por um terremoto seguido de tsunami em 2011, tem causado alarme em todo o Pacífico. O primeiro-ministro, Fumio Kishida, anunciou nesta segunda-feira (21, manhã de terça-feira no Japão), que a liberação do resíduo ocorrerá na próxima quinta-feira, 24.

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A usina nuclear de Fukushima, danificada por um grande terremoto e tsunami em 11 de março de 2011, é vista do porto pesqueiro próximo de Ukedo, na cidade de Namie, no nordeste do Japão Foto: Eugene Hoshiko/AP Photo

Na Coreia do Sul, mesmo antes do anúncio da data, a decisão desencadeou um debate político especialmente acalorado, com o governo do presidente Yoon Suk-yeol e seus inimigos se enfrentando por meio de faixas, vídeos do YouTube, entrevistas coletivas e protestos.

O que diferencia a Coreia do Sul de outros críticos da região é que seu governo endossou o plano do Japão, apesar de dúvidas na opinião pública, apenas pedindo a Tóquio transparência para garantir que a água seja descarregada de modo adequado. As autoridades têm veiculado anúncios online e realizado entrevistas coletivas diárias para dissipar o que chamam de alarmismo da oposição e convencer as pessoas de que a água não causará danos.

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Mas a contínua agitação na Coreia do Sul em relação ao assunto tem ameaçado complicar o progresso que Estados Unidos, Japão e Coreia do Sul fizeram nos últimos meses para construir uma parceria trilateral mais forte.

Críticos do governo acusam o presidente sul-coreano de concordar com o plano de despejo da água de Fukushima com o objetivo de melhorar as relações com o Japão, inimigo histórico da Coreia do Sul, e a pedido dos Estados Unidos, um forte aliado de ambas as nações.

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As recentes tentativas de Yoon de melhorar os laços com o Japão, enterrando antigas disputas históricas, têm agradado a Washington, que pressiona para alinhar Seul e Tóquio em um esforço mais amplo para enfrentar a China, a Coreia do Norte e a Rússia.

“Precisamos melhorar os laços com o Japão, mas também é importante proteger a saúde de nosso povo”, disse Park Kwangon, líder da maioria da Assembleia Nacional e membro do Partido Democrático, em uma entrevista. “Não consigo deixar de suspeitar que o presidente Yoon fez um compromisso com isso para melhorar as relações com Tóquio.”

Na Coreia do Sul, questões relacionadas ao Japão costumam gerar uma resposta intensa. No centro de Seul, manifestantes se envolvem em discussões acaloradas sobre se seu país deve considerar o Japão um inimigo ou um amigo. Acometido por desastres recorrentes e escândalos de corrupção, o governo também tem tido dificuldades em conquistar confiança.

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Pessoas protestam em uma praia perto da usina nuclear de Fukushima; a usina começou a liberar seu primeiro lote de água radioativa tratada no Oceano Pacífico  Foto: Eugene Hoshiko/AP Photo

Em 2008, quando o governo suspendeu uma proibição de cinco anos às importações de carne bovina americana, imposta pela primeira vez após o surto da doença da vaca louca nos Estados Unidos, protestos massivos paralisaram o centro da capital por semanas. Para as multidões nos protestos, a questão não era apenas sobre preocupações com a saúde; eles acusaram o presidente Lee Myung-bak de estar muito ansioso para fazer a vontade de Washington.

Em 2017, quando a Coreia do Sul concordou com a instalação de um sistema de bateria antimísseis americano conhecido como THAAD, muitos não confiaram na explicação do governo de que ele foi implantado apenas para proteger contra a Coreia do Norte, não como uma ferramenta para o Exército americano monitorar também a atividade de mísseis chineses. Muitos sul-coreanos prefeririam ficar de fora da competição de poder entre os EUA e a China.

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Segundo pesquisas recentes, a maioria dos sul-coreanos estava cética quando o governo de Yoon disse que era hora de melhorar os laços com o Japão. Quando seu governo afirmou para não se preocuparem com o plano de Fukushima, eles se opuseram à capacidade do Japão de filtrar com sucesso a água contaminada e ser transparente sobre sua segurança.

O Japão possui 1.000 tanques grandes para armazenar a água que foi usada para resfriar os núcleos dos reatores destruídos na usina de Fukushima. À medida que a capacidade dos tanques se esgota, Tóquio deseja liberar gradualmente a água no oceano ao longo dos próximos 30 anos, após filtrá-la e diluí-la para atender aos padrões regulatórios do país.

Quando o plano foi anunciado pela primeira vez em 2021, a FDA (agência dos EUA que regula alimentos e medicamentos) afirmou que não via “nenhum impacto na saúde humana e animal” se as águas residuais tratadas fossem descarregadas conforme proposto. No entanto, especialistas independentes nomeados pelo Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas alertaram para “riscos consideráveis” a milhões de vidas e meios de subsistência na região do Pacífico.

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Em julho, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), órgão de fiscalização nuclear das Nações Unidas, endossou o plano do Japão, chamando o impacto radiológico da água de “negligenciável”. Semanas depois, reguladores ambientais em Massachusetts negaram um pedido semelhante de liberar água radioativa tratada de uma usina nuclear desativada na baía de Cape Cod, na costa leste dos Estados Unidos.

Turistas na cidade de Namie, no nordeste do Japão, tiram fotos da usina nuclear de Fukushima, danificada por um grande terremoto e tsunami em 11 de março de 2011 Foto: Eugene Hoshiko/AP

“Do ponto de vista científico, a questão em jogo é simples: se materiais radioativos suficientes chegariam ao nosso país para nos afetar”, disse Chung Bum-Jin, presidente eleito da Sociedade Nuclear Coreana. “Mas quando a política se envolve, a pergunta se torna complicada, com mais de uma resposta.”

O despejo marinho é a maneira “mais segura” de descartar a água, disse Jeong Yong Hoon, professor de engenharia nuclear no Instituto Avançado de Ciência e Tecnologia da Coreia. Outras opções de descarte apenas tornam o caminho eventual da água para o mar —e o processo de avaliação do impacto ambiental— mais complicado, afirmou.

Para adicionar garantias, a Coreia do Sul prometeu intensificar os esforços para monitorar a água do mar e a pesca em busca de qualquer aumento de substâncias radioativas após o despejo da água. Também afirmou que a proibição de frutos do mar da região de Fukushima, imposta pela primeira vez após o desastre de 2011, permanecerá até que as pessoas se sintam confiantes de que a água está segura.

“O que o Japão está tentando fazer é sem precedentes: não é água de resfriamento comum de uma usina nuclear normal que eles querem despejar no mar; está contaminada com todos os tipos de isótopos perigosos dos núcleos dos reatores derretidos”, disse Seo Kyun-ryul, professor emérito de engenharia nuclear da Universidade Nacional de Seul.

Tóquio rejeitou outras opções de disposição a longo prazo, como manter a água em terra adicionando mais tanques, escavando um lago artificial ou misturando-a com argamassa, irritando críticos na Coreia do Sul, China e países insulares do Pacífico.

Jornalistas filmam a usina nuclear de Fukushima no porto pesqueiro próximo de Ukedo, na cidade de Namie, nordeste do Japão Foto: Eugene Hoshiko/AP

“O Japão fez a escolha mais barata —simplesmente despejá-la no oceano”, disse Park, o legislador em Seul. “Pode obter benefícios econômicos com isso, mas perde a confiança das pessoas nos países vizinhos.”

Nas recentes manifestações de protesto no centro de Seul, ativistas compararam o despejo da água de Fukushima a um ato de “terrorismo nuclear lento e silencioso” e descreveram a revisão de segurança da AIEA como sendo “adaptada” para o Japão. Em um ambiente tão acalorado, cientistas de ambos os lados do debate temem uma reação negativa.

Chung, presidente eleito da Sociedade Nuclear Coreana, disse que aqueles que apoiavam o plano japonês estavam sendo difamados como porta-vozes da indústria de energia nuclear ou como traidores “pró-japoneses”.

Aqueles do outro lado também sofreram consequências no ambiente político altamente polarizado da Coreia do Sul. Seo, da Universidade Nacional de Seul, foi processado por um grupo de pescadores locais depois de alertar para os perigos potenciais da água de Fukushima. “Pessoas como eu, que vão contra a linha de política do governo, são perseguidas por gerar ansiedade e medo entre as pessoas”, afirmou.

THE NEW YORK TIMES, SEUL — Em um cruzamento movimentado em Seul neste verão, uma faixa do principal partido de oposição, o Partido Democrático, gritava “Não!” ao plano do Japão de despejar água radioativa tratada de sua usina nuclear de Fukushima destruída à beira do Oceano Pacífico.

Do outro lado da rua, um cartaz da legenda no governo, o Partido do Poder Popular, dizia que a verdadeira ameaça era a oposição espalhando teorias conspiratórias que assustariam as pessoas em relação aos frutos do mar: “O Partido Democrático está matando o sustento de nossos pescadores!”

O decisão do Japão de despejar mais de 1,3 milhão de toneladas de água tratada em Fukushima Daiichi, a usina de energia nuclear que foi destruída por um terremoto seguido de tsunami em 2011, tem causado alarme em todo o Pacífico. O primeiro-ministro, Fumio Kishida, anunciou nesta segunda-feira (21, manhã de terça-feira no Japão), que a liberação do resíduo ocorrerá na próxima quinta-feira, 24.

A usina nuclear de Fukushima, danificada por um grande terremoto e tsunami em 11 de março de 2011, é vista do porto pesqueiro próximo de Ukedo, na cidade de Namie, no nordeste do Japão Foto: Eugene Hoshiko/AP Photo

Na Coreia do Sul, mesmo antes do anúncio da data, a decisão desencadeou um debate político especialmente acalorado, com o governo do presidente Yoon Suk-yeol e seus inimigos se enfrentando por meio de faixas, vídeos do YouTube, entrevistas coletivas e protestos.

O que diferencia a Coreia do Sul de outros críticos da região é que seu governo endossou o plano do Japão, apesar de dúvidas na opinião pública, apenas pedindo a Tóquio transparência para garantir que a água seja descarregada de modo adequado. As autoridades têm veiculado anúncios online e realizado entrevistas coletivas diárias para dissipar o que chamam de alarmismo da oposição e convencer as pessoas de que a água não causará danos.

Mas a contínua agitação na Coreia do Sul em relação ao assunto tem ameaçado complicar o progresso que Estados Unidos, Japão e Coreia do Sul fizeram nos últimos meses para construir uma parceria trilateral mais forte.

Críticos do governo acusam o presidente sul-coreano de concordar com o plano de despejo da água de Fukushima com o objetivo de melhorar as relações com o Japão, inimigo histórico da Coreia do Sul, e a pedido dos Estados Unidos, um forte aliado de ambas as nações.

As recentes tentativas de Yoon de melhorar os laços com o Japão, enterrando antigas disputas históricas, têm agradado a Washington, que pressiona para alinhar Seul e Tóquio em um esforço mais amplo para enfrentar a China, a Coreia do Norte e a Rússia.

“Precisamos melhorar os laços com o Japão, mas também é importante proteger a saúde de nosso povo”, disse Park Kwangon, líder da maioria da Assembleia Nacional e membro do Partido Democrático, em uma entrevista. “Não consigo deixar de suspeitar que o presidente Yoon fez um compromisso com isso para melhorar as relações com Tóquio.”

Na Coreia do Sul, questões relacionadas ao Japão costumam gerar uma resposta intensa. No centro de Seul, manifestantes se envolvem em discussões acaloradas sobre se seu país deve considerar o Japão um inimigo ou um amigo. Acometido por desastres recorrentes e escândalos de corrupção, o governo também tem tido dificuldades em conquistar confiança.

Pessoas protestam em uma praia perto da usina nuclear de Fukushima; a usina começou a liberar seu primeiro lote de água radioativa tratada no Oceano Pacífico  Foto: Eugene Hoshiko/AP Photo

Em 2008, quando o governo suspendeu uma proibição de cinco anos às importações de carne bovina americana, imposta pela primeira vez após o surto da doença da vaca louca nos Estados Unidos, protestos massivos paralisaram o centro da capital por semanas. Para as multidões nos protestos, a questão não era apenas sobre preocupações com a saúde; eles acusaram o presidente Lee Myung-bak de estar muito ansioso para fazer a vontade de Washington.

Em 2017, quando a Coreia do Sul concordou com a instalação de um sistema de bateria antimísseis americano conhecido como THAAD, muitos não confiaram na explicação do governo de que ele foi implantado apenas para proteger contra a Coreia do Norte, não como uma ferramenta para o Exército americano monitorar também a atividade de mísseis chineses. Muitos sul-coreanos prefeririam ficar de fora da competição de poder entre os EUA e a China.

Segundo pesquisas recentes, a maioria dos sul-coreanos estava cética quando o governo de Yoon disse que era hora de melhorar os laços com o Japão. Quando seu governo afirmou para não se preocuparem com o plano de Fukushima, eles se opuseram à capacidade do Japão de filtrar com sucesso a água contaminada e ser transparente sobre sua segurança.

O Japão possui 1.000 tanques grandes para armazenar a água que foi usada para resfriar os núcleos dos reatores destruídos na usina de Fukushima. À medida que a capacidade dos tanques se esgota, Tóquio deseja liberar gradualmente a água no oceano ao longo dos próximos 30 anos, após filtrá-la e diluí-la para atender aos padrões regulatórios do país.

Quando o plano foi anunciado pela primeira vez em 2021, a FDA (agência dos EUA que regula alimentos e medicamentos) afirmou que não via “nenhum impacto na saúde humana e animal” se as águas residuais tratadas fossem descarregadas conforme proposto. No entanto, especialistas independentes nomeados pelo Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas alertaram para “riscos consideráveis” a milhões de vidas e meios de subsistência na região do Pacífico.

Em julho, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), órgão de fiscalização nuclear das Nações Unidas, endossou o plano do Japão, chamando o impacto radiológico da água de “negligenciável”. Semanas depois, reguladores ambientais em Massachusetts negaram um pedido semelhante de liberar água radioativa tratada de uma usina nuclear desativada na baía de Cape Cod, na costa leste dos Estados Unidos.

Turistas na cidade de Namie, no nordeste do Japão, tiram fotos da usina nuclear de Fukushima, danificada por um grande terremoto e tsunami em 11 de março de 2011 Foto: Eugene Hoshiko/AP

“Do ponto de vista científico, a questão em jogo é simples: se materiais radioativos suficientes chegariam ao nosso país para nos afetar”, disse Chung Bum-Jin, presidente eleito da Sociedade Nuclear Coreana. “Mas quando a política se envolve, a pergunta se torna complicada, com mais de uma resposta.”

O despejo marinho é a maneira “mais segura” de descartar a água, disse Jeong Yong Hoon, professor de engenharia nuclear no Instituto Avançado de Ciência e Tecnologia da Coreia. Outras opções de descarte apenas tornam o caminho eventual da água para o mar —e o processo de avaliação do impacto ambiental— mais complicado, afirmou.

Para adicionar garantias, a Coreia do Sul prometeu intensificar os esforços para monitorar a água do mar e a pesca em busca de qualquer aumento de substâncias radioativas após o despejo da água. Também afirmou que a proibição de frutos do mar da região de Fukushima, imposta pela primeira vez após o desastre de 2011, permanecerá até que as pessoas se sintam confiantes de que a água está segura.

“O que o Japão está tentando fazer é sem precedentes: não é água de resfriamento comum de uma usina nuclear normal que eles querem despejar no mar; está contaminada com todos os tipos de isótopos perigosos dos núcleos dos reatores derretidos”, disse Seo Kyun-ryul, professor emérito de engenharia nuclear da Universidade Nacional de Seul.

Tóquio rejeitou outras opções de disposição a longo prazo, como manter a água em terra adicionando mais tanques, escavando um lago artificial ou misturando-a com argamassa, irritando críticos na Coreia do Sul, China e países insulares do Pacífico.

Jornalistas filmam a usina nuclear de Fukushima no porto pesqueiro próximo de Ukedo, na cidade de Namie, nordeste do Japão Foto: Eugene Hoshiko/AP

“O Japão fez a escolha mais barata —simplesmente despejá-la no oceano”, disse Park, o legislador em Seul. “Pode obter benefícios econômicos com isso, mas perde a confiança das pessoas nos países vizinhos.”

Nas recentes manifestações de protesto no centro de Seul, ativistas compararam o despejo da água de Fukushima a um ato de “terrorismo nuclear lento e silencioso” e descreveram a revisão de segurança da AIEA como sendo “adaptada” para o Japão. Em um ambiente tão acalorado, cientistas de ambos os lados do debate temem uma reação negativa.

Chung, presidente eleito da Sociedade Nuclear Coreana, disse que aqueles que apoiavam o plano japonês estavam sendo difamados como porta-vozes da indústria de energia nuclear ou como traidores “pró-japoneses”.

Aqueles do outro lado também sofreram consequências no ambiente político altamente polarizado da Coreia do Sul. Seo, da Universidade Nacional de Seul, foi processado por um grupo de pescadores locais depois de alertar para os perigos potenciais da água de Fukushima. “Pessoas como eu, que vão contra a linha de política do governo, são perseguidas por gerar ansiedade e medo entre as pessoas”, afirmou.

THE NEW YORK TIMES, SEUL — Em um cruzamento movimentado em Seul neste verão, uma faixa do principal partido de oposição, o Partido Democrático, gritava “Não!” ao plano do Japão de despejar água radioativa tratada de sua usina nuclear de Fukushima destruída à beira do Oceano Pacífico.

Do outro lado da rua, um cartaz da legenda no governo, o Partido do Poder Popular, dizia que a verdadeira ameaça era a oposição espalhando teorias conspiratórias que assustariam as pessoas em relação aos frutos do mar: “O Partido Democrático está matando o sustento de nossos pescadores!”

O decisão do Japão de despejar mais de 1,3 milhão de toneladas de água tratada em Fukushima Daiichi, a usina de energia nuclear que foi destruída por um terremoto seguido de tsunami em 2011, tem causado alarme em todo o Pacífico. O primeiro-ministro, Fumio Kishida, anunciou nesta segunda-feira (21, manhã de terça-feira no Japão), que a liberação do resíduo ocorrerá na próxima quinta-feira, 24.

A usina nuclear de Fukushima, danificada por um grande terremoto e tsunami em 11 de março de 2011, é vista do porto pesqueiro próximo de Ukedo, na cidade de Namie, no nordeste do Japão Foto: Eugene Hoshiko/AP Photo

Na Coreia do Sul, mesmo antes do anúncio da data, a decisão desencadeou um debate político especialmente acalorado, com o governo do presidente Yoon Suk-yeol e seus inimigos se enfrentando por meio de faixas, vídeos do YouTube, entrevistas coletivas e protestos.

O que diferencia a Coreia do Sul de outros críticos da região é que seu governo endossou o plano do Japão, apesar de dúvidas na opinião pública, apenas pedindo a Tóquio transparência para garantir que a água seja descarregada de modo adequado. As autoridades têm veiculado anúncios online e realizado entrevistas coletivas diárias para dissipar o que chamam de alarmismo da oposição e convencer as pessoas de que a água não causará danos.

Mas a contínua agitação na Coreia do Sul em relação ao assunto tem ameaçado complicar o progresso que Estados Unidos, Japão e Coreia do Sul fizeram nos últimos meses para construir uma parceria trilateral mais forte.

Críticos do governo acusam o presidente sul-coreano de concordar com o plano de despejo da água de Fukushima com o objetivo de melhorar as relações com o Japão, inimigo histórico da Coreia do Sul, e a pedido dos Estados Unidos, um forte aliado de ambas as nações.

As recentes tentativas de Yoon de melhorar os laços com o Japão, enterrando antigas disputas históricas, têm agradado a Washington, que pressiona para alinhar Seul e Tóquio em um esforço mais amplo para enfrentar a China, a Coreia do Norte e a Rússia.

“Precisamos melhorar os laços com o Japão, mas também é importante proteger a saúde de nosso povo”, disse Park Kwangon, líder da maioria da Assembleia Nacional e membro do Partido Democrático, em uma entrevista. “Não consigo deixar de suspeitar que o presidente Yoon fez um compromisso com isso para melhorar as relações com Tóquio.”

Na Coreia do Sul, questões relacionadas ao Japão costumam gerar uma resposta intensa. No centro de Seul, manifestantes se envolvem em discussões acaloradas sobre se seu país deve considerar o Japão um inimigo ou um amigo. Acometido por desastres recorrentes e escândalos de corrupção, o governo também tem tido dificuldades em conquistar confiança.

Pessoas protestam em uma praia perto da usina nuclear de Fukushima; a usina começou a liberar seu primeiro lote de água radioativa tratada no Oceano Pacífico  Foto: Eugene Hoshiko/AP Photo

Em 2008, quando o governo suspendeu uma proibição de cinco anos às importações de carne bovina americana, imposta pela primeira vez após o surto da doença da vaca louca nos Estados Unidos, protestos massivos paralisaram o centro da capital por semanas. Para as multidões nos protestos, a questão não era apenas sobre preocupações com a saúde; eles acusaram o presidente Lee Myung-bak de estar muito ansioso para fazer a vontade de Washington.

Em 2017, quando a Coreia do Sul concordou com a instalação de um sistema de bateria antimísseis americano conhecido como THAAD, muitos não confiaram na explicação do governo de que ele foi implantado apenas para proteger contra a Coreia do Norte, não como uma ferramenta para o Exército americano monitorar também a atividade de mísseis chineses. Muitos sul-coreanos prefeririam ficar de fora da competição de poder entre os EUA e a China.

Segundo pesquisas recentes, a maioria dos sul-coreanos estava cética quando o governo de Yoon disse que era hora de melhorar os laços com o Japão. Quando seu governo afirmou para não se preocuparem com o plano de Fukushima, eles se opuseram à capacidade do Japão de filtrar com sucesso a água contaminada e ser transparente sobre sua segurança.

O Japão possui 1.000 tanques grandes para armazenar a água que foi usada para resfriar os núcleos dos reatores destruídos na usina de Fukushima. À medida que a capacidade dos tanques se esgota, Tóquio deseja liberar gradualmente a água no oceano ao longo dos próximos 30 anos, após filtrá-la e diluí-la para atender aos padrões regulatórios do país.

Quando o plano foi anunciado pela primeira vez em 2021, a FDA (agência dos EUA que regula alimentos e medicamentos) afirmou que não via “nenhum impacto na saúde humana e animal” se as águas residuais tratadas fossem descarregadas conforme proposto. No entanto, especialistas independentes nomeados pelo Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas alertaram para “riscos consideráveis” a milhões de vidas e meios de subsistência na região do Pacífico.

Em julho, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), órgão de fiscalização nuclear das Nações Unidas, endossou o plano do Japão, chamando o impacto radiológico da água de “negligenciável”. Semanas depois, reguladores ambientais em Massachusetts negaram um pedido semelhante de liberar água radioativa tratada de uma usina nuclear desativada na baía de Cape Cod, na costa leste dos Estados Unidos.

Turistas na cidade de Namie, no nordeste do Japão, tiram fotos da usina nuclear de Fukushima, danificada por um grande terremoto e tsunami em 11 de março de 2011 Foto: Eugene Hoshiko/AP

“Do ponto de vista científico, a questão em jogo é simples: se materiais radioativos suficientes chegariam ao nosso país para nos afetar”, disse Chung Bum-Jin, presidente eleito da Sociedade Nuclear Coreana. “Mas quando a política se envolve, a pergunta se torna complicada, com mais de uma resposta.”

O despejo marinho é a maneira “mais segura” de descartar a água, disse Jeong Yong Hoon, professor de engenharia nuclear no Instituto Avançado de Ciência e Tecnologia da Coreia. Outras opções de descarte apenas tornam o caminho eventual da água para o mar —e o processo de avaliação do impacto ambiental— mais complicado, afirmou.

Para adicionar garantias, a Coreia do Sul prometeu intensificar os esforços para monitorar a água do mar e a pesca em busca de qualquer aumento de substâncias radioativas após o despejo da água. Também afirmou que a proibição de frutos do mar da região de Fukushima, imposta pela primeira vez após o desastre de 2011, permanecerá até que as pessoas se sintam confiantes de que a água está segura.

“O que o Japão está tentando fazer é sem precedentes: não é água de resfriamento comum de uma usina nuclear normal que eles querem despejar no mar; está contaminada com todos os tipos de isótopos perigosos dos núcleos dos reatores derretidos”, disse Seo Kyun-ryul, professor emérito de engenharia nuclear da Universidade Nacional de Seul.

Tóquio rejeitou outras opções de disposição a longo prazo, como manter a água em terra adicionando mais tanques, escavando um lago artificial ou misturando-a com argamassa, irritando críticos na Coreia do Sul, China e países insulares do Pacífico.

Jornalistas filmam a usina nuclear de Fukushima no porto pesqueiro próximo de Ukedo, na cidade de Namie, nordeste do Japão Foto: Eugene Hoshiko/AP

“O Japão fez a escolha mais barata —simplesmente despejá-la no oceano”, disse Park, o legislador em Seul. “Pode obter benefícios econômicos com isso, mas perde a confiança das pessoas nos países vizinhos.”

Nas recentes manifestações de protesto no centro de Seul, ativistas compararam o despejo da água de Fukushima a um ato de “terrorismo nuclear lento e silencioso” e descreveram a revisão de segurança da AIEA como sendo “adaptada” para o Japão. Em um ambiente tão acalorado, cientistas de ambos os lados do debate temem uma reação negativa.

Chung, presidente eleito da Sociedade Nuclear Coreana, disse que aqueles que apoiavam o plano japonês estavam sendo difamados como porta-vozes da indústria de energia nuclear ou como traidores “pró-japoneses”.

Aqueles do outro lado também sofreram consequências no ambiente político altamente polarizado da Coreia do Sul. Seo, da Universidade Nacional de Seul, foi processado por um grupo de pescadores locais depois de alertar para os perigos potenciais da água de Fukushima. “Pessoas como eu, que vão contra a linha de política do governo, são perseguidas por gerar ansiedade e medo entre as pessoas”, afirmou.

THE NEW YORK TIMES, SEUL — Em um cruzamento movimentado em Seul neste verão, uma faixa do principal partido de oposição, o Partido Democrático, gritava “Não!” ao plano do Japão de despejar água radioativa tratada de sua usina nuclear de Fukushima destruída à beira do Oceano Pacífico.

Do outro lado da rua, um cartaz da legenda no governo, o Partido do Poder Popular, dizia que a verdadeira ameaça era a oposição espalhando teorias conspiratórias que assustariam as pessoas em relação aos frutos do mar: “O Partido Democrático está matando o sustento de nossos pescadores!”

O decisão do Japão de despejar mais de 1,3 milhão de toneladas de água tratada em Fukushima Daiichi, a usina de energia nuclear que foi destruída por um terremoto seguido de tsunami em 2011, tem causado alarme em todo o Pacífico. O primeiro-ministro, Fumio Kishida, anunciou nesta segunda-feira (21, manhã de terça-feira no Japão), que a liberação do resíduo ocorrerá na próxima quinta-feira, 24.

A usina nuclear de Fukushima, danificada por um grande terremoto e tsunami em 11 de março de 2011, é vista do porto pesqueiro próximo de Ukedo, na cidade de Namie, no nordeste do Japão Foto: Eugene Hoshiko/AP Photo

Na Coreia do Sul, mesmo antes do anúncio da data, a decisão desencadeou um debate político especialmente acalorado, com o governo do presidente Yoon Suk-yeol e seus inimigos se enfrentando por meio de faixas, vídeos do YouTube, entrevistas coletivas e protestos.

O que diferencia a Coreia do Sul de outros críticos da região é que seu governo endossou o plano do Japão, apesar de dúvidas na opinião pública, apenas pedindo a Tóquio transparência para garantir que a água seja descarregada de modo adequado. As autoridades têm veiculado anúncios online e realizado entrevistas coletivas diárias para dissipar o que chamam de alarmismo da oposição e convencer as pessoas de que a água não causará danos.

Mas a contínua agitação na Coreia do Sul em relação ao assunto tem ameaçado complicar o progresso que Estados Unidos, Japão e Coreia do Sul fizeram nos últimos meses para construir uma parceria trilateral mais forte.

Críticos do governo acusam o presidente sul-coreano de concordar com o plano de despejo da água de Fukushima com o objetivo de melhorar as relações com o Japão, inimigo histórico da Coreia do Sul, e a pedido dos Estados Unidos, um forte aliado de ambas as nações.

As recentes tentativas de Yoon de melhorar os laços com o Japão, enterrando antigas disputas históricas, têm agradado a Washington, que pressiona para alinhar Seul e Tóquio em um esforço mais amplo para enfrentar a China, a Coreia do Norte e a Rússia.

“Precisamos melhorar os laços com o Japão, mas também é importante proteger a saúde de nosso povo”, disse Park Kwangon, líder da maioria da Assembleia Nacional e membro do Partido Democrático, em uma entrevista. “Não consigo deixar de suspeitar que o presidente Yoon fez um compromisso com isso para melhorar as relações com Tóquio.”

Na Coreia do Sul, questões relacionadas ao Japão costumam gerar uma resposta intensa. No centro de Seul, manifestantes se envolvem em discussões acaloradas sobre se seu país deve considerar o Japão um inimigo ou um amigo. Acometido por desastres recorrentes e escândalos de corrupção, o governo também tem tido dificuldades em conquistar confiança.

Pessoas protestam em uma praia perto da usina nuclear de Fukushima; a usina começou a liberar seu primeiro lote de água radioativa tratada no Oceano Pacífico  Foto: Eugene Hoshiko/AP Photo

Em 2008, quando o governo suspendeu uma proibição de cinco anos às importações de carne bovina americana, imposta pela primeira vez após o surto da doença da vaca louca nos Estados Unidos, protestos massivos paralisaram o centro da capital por semanas. Para as multidões nos protestos, a questão não era apenas sobre preocupações com a saúde; eles acusaram o presidente Lee Myung-bak de estar muito ansioso para fazer a vontade de Washington.

Em 2017, quando a Coreia do Sul concordou com a instalação de um sistema de bateria antimísseis americano conhecido como THAAD, muitos não confiaram na explicação do governo de que ele foi implantado apenas para proteger contra a Coreia do Norte, não como uma ferramenta para o Exército americano monitorar também a atividade de mísseis chineses. Muitos sul-coreanos prefeririam ficar de fora da competição de poder entre os EUA e a China.

Segundo pesquisas recentes, a maioria dos sul-coreanos estava cética quando o governo de Yoon disse que era hora de melhorar os laços com o Japão. Quando seu governo afirmou para não se preocuparem com o plano de Fukushima, eles se opuseram à capacidade do Japão de filtrar com sucesso a água contaminada e ser transparente sobre sua segurança.

O Japão possui 1.000 tanques grandes para armazenar a água que foi usada para resfriar os núcleos dos reatores destruídos na usina de Fukushima. À medida que a capacidade dos tanques se esgota, Tóquio deseja liberar gradualmente a água no oceano ao longo dos próximos 30 anos, após filtrá-la e diluí-la para atender aos padrões regulatórios do país.

Quando o plano foi anunciado pela primeira vez em 2021, a FDA (agência dos EUA que regula alimentos e medicamentos) afirmou que não via “nenhum impacto na saúde humana e animal” se as águas residuais tratadas fossem descarregadas conforme proposto. No entanto, especialistas independentes nomeados pelo Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas alertaram para “riscos consideráveis” a milhões de vidas e meios de subsistência na região do Pacífico.

Em julho, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), órgão de fiscalização nuclear das Nações Unidas, endossou o plano do Japão, chamando o impacto radiológico da água de “negligenciável”. Semanas depois, reguladores ambientais em Massachusetts negaram um pedido semelhante de liberar água radioativa tratada de uma usina nuclear desativada na baía de Cape Cod, na costa leste dos Estados Unidos.

Turistas na cidade de Namie, no nordeste do Japão, tiram fotos da usina nuclear de Fukushima, danificada por um grande terremoto e tsunami em 11 de março de 2011 Foto: Eugene Hoshiko/AP

“Do ponto de vista científico, a questão em jogo é simples: se materiais radioativos suficientes chegariam ao nosso país para nos afetar”, disse Chung Bum-Jin, presidente eleito da Sociedade Nuclear Coreana. “Mas quando a política se envolve, a pergunta se torna complicada, com mais de uma resposta.”

O despejo marinho é a maneira “mais segura” de descartar a água, disse Jeong Yong Hoon, professor de engenharia nuclear no Instituto Avançado de Ciência e Tecnologia da Coreia. Outras opções de descarte apenas tornam o caminho eventual da água para o mar —e o processo de avaliação do impacto ambiental— mais complicado, afirmou.

Para adicionar garantias, a Coreia do Sul prometeu intensificar os esforços para monitorar a água do mar e a pesca em busca de qualquer aumento de substâncias radioativas após o despejo da água. Também afirmou que a proibição de frutos do mar da região de Fukushima, imposta pela primeira vez após o desastre de 2011, permanecerá até que as pessoas se sintam confiantes de que a água está segura.

“O que o Japão está tentando fazer é sem precedentes: não é água de resfriamento comum de uma usina nuclear normal que eles querem despejar no mar; está contaminada com todos os tipos de isótopos perigosos dos núcleos dos reatores derretidos”, disse Seo Kyun-ryul, professor emérito de engenharia nuclear da Universidade Nacional de Seul.

Tóquio rejeitou outras opções de disposição a longo prazo, como manter a água em terra adicionando mais tanques, escavando um lago artificial ou misturando-a com argamassa, irritando críticos na Coreia do Sul, China e países insulares do Pacífico.

Jornalistas filmam a usina nuclear de Fukushima no porto pesqueiro próximo de Ukedo, na cidade de Namie, nordeste do Japão Foto: Eugene Hoshiko/AP

“O Japão fez a escolha mais barata —simplesmente despejá-la no oceano”, disse Park, o legislador em Seul. “Pode obter benefícios econômicos com isso, mas perde a confiança das pessoas nos países vizinhos.”

Nas recentes manifestações de protesto no centro de Seul, ativistas compararam o despejo da água de Fukushima a um ato de “terrorismo nuclear lento e silencioso” e descreveram a revisão de segurança da AIEA como sendo “adaptada” para o Japão. Em um ambiente tão acalorado, cientistas de ambos os lados do debate temem uma reação negativa.

Chung, presidente eleito da Sociedade Nuclear Coreana, disse que aqueles que apoiavam o plano japonês estavam sendo difamados como porta-vozes da indústria de energia nuclear ou como traidores “pró-japoneses”.

Aqueles do outro lado também sofreram consequências no ambiente político altamente polarizado da Coreia do Sul. Seo, da Universidade Nacional de Seul, foi processado por um grupo de pescadores locais depois de alertar para os perigos potenciais da água de Fukushima. “Pessoas como eu, que vão contra a linha de política do governo, são perseguidas por gerar ansiedade e medo entre as pessoas”, afirmou.

THE NEW YORK TIMES, SEUL — Em um cruzamento movimentado em Seul neste verão, uma faixa do principal partido de oposição, o Partido Democrático, gritava “Não!” ao plano do Japão de despejar água radioativa tratada de sua usina nuclear de Fukushima destruída à beira do Oceano Pacífico.

Do outro lado da rua, um cartaz da legenda no governo, o Partido do Poder Popular, dizia que a verdadeira ameaça era a oposição espalhando teorias conspiratórias que assustariam as pessoas em relação aos frutos do mar: “O Partido Democrático está matando o sustento de nossos pescadores!”

O decisão do Japão de despejar mais de 1,3 milhão de toneladas de água tratada em Fukushima Daiichi, a usina de energia nuclear que foi destruída por um terremoto seguido de tsunami em 2011, tem causado alarme em todo o Pacífico. O primeiro-ministro, Fumio Kishida, anunciou nesta segunda-feira (21, manhã de terça-feira no Japão), que a liberação do resíduo ocorrerá na próxima quinta-feira, 24.

A usina nuclear de Fukushima, danificada por um grande terremoto e tsunami em 11 de março de 2011, é vista do porto pesqueiro próximo de Ukedo, na cidade de Namie, no nordeste do Japão Foto: Eugene Hoshiko/AP Photo

Na Coreia do Sul, mesmo antes do anúncio da data, a decisão desencadeou um debate político especialmente acalorado, com o governo do presidente Yoon Suk-yeol e seus inimigos se enfrentando por meio de faixas, vídeos do YouTube, entrevistas coletivas e protestos.

O que diferencia a Coreia do Sul de outros críticos da região é que seu governo endossou o plano do Japão, apesar de dúvidas na opinião pública, apenas pedindo a Tóquio transparência para garantir que a água seja descarregada de modo adequado. As autoridades têm veiculado anúncios online e realizado entrevistas coletivas diárias para dissipar o que chamam de alarmismo da oposição e convencer as pessoas de que a água não causará danos.

Mas a contínua agitação na Coreia do Sul em relação ao assunto tem ameaçado complicar o progresso que Estados Unidos, Japão e Coreia do Sul fizeram nos últimos meses para construir uma parceria trilateral mais forte.

Críticos do governo acusam o presidente sul-coreano de concordar com o plano de despejo da água de Fukushima com o objetivo de melhorar as relações com o Japão, inimigo histórico da Coreia do Sul, e a pedido dos Estados Unidos, um forte aliado de ambas as nações.

As recentes tentativas de Yoon de melhorar os laços com o Japão, enterrando antigas disputas históricas, têm agradado a Washington, que pressiona para alinhar Seul e Tóquio em um esforço mais amplo para enfrentar a China, a Coreia do Norte e a Rússia.

“Precisamos melhorar os laços com o Japão, mas também é importante proteger a saúde de nosso povo”, disse Park Kwangon, líder da maioria da Assembleia Nacional e membro do Partido Democrático, em uma entrevista. “Não consigo deixar de suspeitar que o presidente Yoon fez um compromisso com isso para melhorar as relações com Tóquio.”

Na Coreia do Sul, questões relacionadas ao Japão costumam gerar uma resposta intensa. No centro de Seul, manifestantes se envolvem em discussões acaloradas sobre se seu país deve considerar o Japão um inimigo ou um amigo. Acometido por desastres recorrentes e escândalos de corrupção, o governo também tem tido dificuldades em conquistar confiança.

Pessoas protestam em uma praia perto da usina nuclear de Fukushima; a usina começou a liberar seu primeiro lote de água radioativa tratada no Oceano Pacífico  Foto: Eugene Hoshiko/AP Photo

Em 2008, quando o governo suspendeu uma proibição de cinco anos às importações de carne bovina americana, imposta pela primeira vez após o surto da doença da vaca louca nos Estados Unidos, protestos massivos paralisaram o centro da capital por semanas. Para as multidões nos protestos, a questão não era apenas sobre preocupações com a saúde; eles acusaram o presidente Lee Myung-bak de estar muito ansioso para fazer a vontade de Washington.

Em 2017, quando a Coreia do Sul concordou com a instalação de um sistema de bateria antimísseis americano conhecido como THAAD, muitos não confiaram na explicação do governo de que ele foi implantado apenas para proteger contra a Coreia do Norte, não como uma ferramenta para o Exército americano monitorar também a atividade de mísseis chineses. Muitos sul-coreanos prefeririam ficar de fora da competição de poder entre os EUA e a China.

Segundo pesquisas recentes, a maioria dos sul-coreanos estava cética quando o governo de Yoon disse que era hora de melhorar os laços com o Japão. Quando seu governo afirmou para não se preocuparem com o plano de Fukushima, eles se opuseram à capacidade do Japão de filtrar com sucesso a água contaminada e ser transparente sobre sua segurança.

O Japão possui 1.000 tanques grandes para armazenar a água que foi usada para resfriar os núcleos dos reatores destruídos na usina de Fukushima. À medida que a capacidade dos tanques se esgota, Tóquio deseja liberar gradualmente a água no oceano ao longo dos próximos 30 anos, após filtrá-la e diluí-la para atender aos padrões regulatórios do país.

Quando o plano foi anunciado pela primeira vez em 2021, a FDA (agência dos EUA que regula alimentos e medicamentos) afirmou que não via “nenhum impacto na saúde humana e animal” se as águas residuais tratadas fossem descarregadas conforme proposto. No entanto, especialistas independentes nomeados pelo Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas alertaram para “riscos consideráveis” a milhões de vidas e meios de subsistência na região do Pacífico.

Em julho, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), órgão de fiscalização nuclear das Nações Unidas, endossou o plano do Japão, chamando o impacto radiológico da água de “negligenciável”. Semanas depois, reguladores ambientais em Massachusetts negaram um pedido semelhante de liberar água radioativa tratada de uma usina nuclear desativada na baía de Cape Cod, na costa leste dos Estados Unidos.

Turistas na cidade de Namie, no nordeste do Japão, tiram fotos da usina nuclear de Fukushima, danificada por um grande terremoto e tsunami em 11 de março de 2011 Foto: Eugene Hoshiko/AP

“Do ponto de vista científico, a questão em jogo é simples: se materiais radioativos suficientes chegariam ao nosso país para nos afetar”, disse Chung Bum-Jin, presidente eleito da Sociedade Nuclear Coreana. “Mas quando a política se envolve, a pergunta se torna complicada, com mais de uma resposta.”

O despejo marinho é a maneira “mais segura” de descartar a água, disse Jeong Yong Hoon, professor de engenharia nuclear no Instituto Avançado de Ciência e Tecnologia da Coreia. Outras opções de descarte apenas tornam o caminho eventual da água para o mar —e o processo de avaliação do impacto ambiental— mais complicado, afirmou.

Para adicionar garantias, a Coreia do Sul prometeu intensificar os esforços para monitorar a água do mar e a pesca em busca de qualquer aumento de substâncias radioativas após o despejo da água. Também afirmou que a proibição de frutos do mar da região de Fukushima, imposta pela primeira vez após o desastre de 2011, permanecerá até que as pessoas se sintam confiantes de que a água está segura.

“O que o Japão está tentando fazer é sem precedentes: não é água de resfriamento comum de uma usina nuclear normal que eles querem despejar no mar; está contaminada com todos os tipos de isótopos perigosos dos núcleos dos reatores derretidos”, disse Seo Kyun-ryul, professor emérito de engenharia nuclear da Universidade Nacional de Seul.

Tóquio rejeitou outras opções de disposição a longo prazo, como manter a água em terra adicionando mais tanques, escavando um lago artificial ou misturando-a com argamassa, irritando críticos na Coreia do Sul, China e países insulares do Pacífico.

Jornalistas filmam a usina nuclear de Fukushima no porto pesqueiro próximo de Ukedo, na cidade de Namie, nordeste do Japão Foto: Eugene Hoshiko/AP

“O Japão fez a escolha mais barata —simplesmente despejá-la no oceano”, disse Park, o legislador em Seul. “Pode obter benefícios econômicos com isso, mas perde a confiança das pessoas nos países vizinhos.”

Nas recentes manifestações de protesto no centro de Seul, ativistas compararam o despejo da água de Fukushima a um ato de “terrorismo nuclear lento e silencioso” e descreveram a revisão de segurança da AIEA como sendo “adaptada” para o Japão. Em um ambiente tão acalorado, cientistas de ambos os lados do debate temem uma reação negativa.

Chung, presidente eleito da Sociedade Nuclear Coreana, disse que aqueles que apoiavam o plano japonês estavam sendo difamados como porta-vozes da indústria de energia nuclear ou como traidores “pró-japoneses”.

Aqueles do outro lado também sofreram consequências no ambiente político altamente polarizado da Coreia do Sul. Seo, da Universidade Nacional de Seul, foi processado por um grupo de pescadores locais depois de alertar para os perigos potenciais da água de Fukushima. “Pessoas como eu, que vão contra a linha de política do governo, são perseguidas por gerar ansiedade e medo entre as pessoas”, afirmou.

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