Por que Biden deve desistir de tentar a reeleição contra Donald Trump


O presidente e seu partido retratam a si mesmos como salvadores da democracia. Suas ações dizem o contrário

Por The Economist
Atualização:

O debate presidencial foi terrível para Joe Biden, mas a operação de acobertamento é pior. Foi uma agonia assistir a um velho confuso com dificuldades para lembrar palavras e fatos. Sua incapacidade de argumentar contra um oponente fraco foi desalentadora. Mas o esforço de sua campanha em negar o que dezenas de milhões de americanos viram com seus próprios olhos é ainda mais tóxico, porque essa desonestidade provoca repulsa.

O efeito foi deixar a Casa Branca ao alcance de Donald Trump. Novas pesquisas constataram que os eleitores nos Estados em que Biden tem de vencer penderam contra ele. Sua liderança pode estar em risco mesmo em Estados assegurados no passado, como Virgínia, Minnesota e Novo México.

Biden merece ser lembrado por suas realizações e sua decência, não pelo seu declínio. Portanto é correto que os primeiros democratas veteranos tenham começado a pedir abertamente que ele deixe de concorrer à reeleição. Contudo, suas expressões públicas não são nada em comparação à crescente onda privada de consternação. Mais democratas têm de despertar urgentemente para o fato de que, se não tomarem uma atitude agora, Trump vencerá. Para ocasionar a renovação política que os Estados Unidos precisam tanto e tão claramente, eles têm de pedir mudança. Não é tarde demais.

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Imagem mostra Joe Biden durante discurso em Wisconsin, no dia 8 de maio. Dúvidas sobre a capacidade de Biden governar, geradas após debate contra Trump, provocam crise na campanha democrata Foto: Morry Gash/AP

Os democratas argumentam, corretamente, que Trump é inapto para ocupar a presidência. Mas o debate e seu desdobramento imediato provaram que Biden também é. Primeiramente em razão de seu declínio mental. Biden ainda consegue transmitir dinamismo em aparições curtas e roteirizadas. Mas é impossível governar uma superpotência lendo o texto no teleprompter. E é impossível pausar uma crise internacional porque o presidente está tendo uma noite ruim. Alguém que não consegue nem terminar uma frase sobre o Medicare deveria guardar os códigos de lançamento de armas nucleares?

Biden não tem culpa de suas capacidades em declínio, mas sim de um segundo elemento desqualificador, que é sua insistência, incentivada por sua família, seu alto escalão e elites democratas, de que ainda é capaz de exercer o trabalho mais difícil do mundo. A alegação de Biden de que esta eleição é uma escolha entre o certo e o errado é arruinada pelo fato da existência de sua campanha ter passado a depender de uma mentira.

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Os democratas escarnecem do Partido Republicano por seu comportamento subserviente a Trump. Novamente, os democratas estão corretos. Republicanos demais têm repetido mentiras e não têm tido coragem moral para criticar os abusos de Trump. Convencidos de que durarão mais que ele — ou que outros pagarão o preço por ejetá-lo — senadores e deputados republicanos colocaram sua ambição acima de seu país.

O Partido Democrata deveria se olhar no espelho, começando pelo próprio Biden. Ele diz que foi mal no debate porque estava cansado em razão de ter viajado de um lado para o outro pelo mundo inteiro, como se sua fraqueza fosse evidência de sua vitalidade. Seus apoiadores argumentam que aqueles terríveis 90 minutos não deveriam obscurecer os três anos e meio recentes. Mas o importante foi eles prenunciarem os quatro seguintes. Democratas veteranos que repetem esses argumentos desesperados ou aguardam em silêncio para alguém falar primeiro podem achar que estão sendo leais. Ao seu país ou às suas carreiras?

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Os democratas podem dizer que suas táticas são apenas política. Seus fins louváveis de salvar a democracia americana da predação de Trump justificam seus meios torpes. Essa defesa não ajuda em nada os EUA. A tática de acobertar suas próprias falhas demonizando seu oponente prejudica faz tempo a política americana, mas usar a ameaça de um Trump “ditador” para compensar a evidente fragilidade de Biden é uma forma de chantagem. Enquanto chefe de Estado, o presidente americano encarna as virtudes da república. Quanto mais ele for visto como um velho teimoso, que deixa o trabalho de verdade ser feito pelos assessores, mais ele minará a fé dos americanos em seu sistema de governo. Ao representar os EUA no exterior, Biden projetará decrepitude — para deleite da China e da Rússia e desgosto dos aliados de Washington.

Há uma outra opção. Biden deveria retirar sua candidatura. Dessa maneira, a eleição poderá renovar o corpo político. A virtude da democracia é os eleitores poderem escolher seus governantes, mas Biden e Trump oferecem uma escolha entre o incapaz e o indizível. Os americanos merecem coisa melhor.

Um novo candidato teria pouco mais de dez semanas após a convenção para apresentar suas propostas. Esse candidato poderia perder, obviamente, mas até mesmo a catarse do autossacrifício de Biden ajudaria a política americana a se recuperar

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Conforme explica o nosso novo podcast, “Boom!”, a política presidencial dos EUA está presa a uma rotina. Exceto por Barack Obama, todos os presidentes americanos desde Bill Clinton, eleito em 1992, nasceram nos anos 40. Biden (1942) postulou-se pela primeira vez à presidência 37 anos atrás, ainda que de forma estabanada. Naquela época, Trump (1946) também pensou em concorrer. Sua geração amadureceu durante a Guerra do Vietnã e carrega consigo a bagagem dos protestos universitários, da era “a ganância é boa” em Wall Street e de lutas antigas sobre raça e feminismo. Essas lutas são muito diferentes hoje — e não apenas por serem travadas com mais frequência no TikTok.

Estagnação é uma falha do sistema partidário. Os partidos deveriam ser veículos que unem facções e interesses para alcançar o poder. Eles têm sido sequestrados. Primeiro Clintons e Bushes tomaram a direção. Quando os eleitores ficaram fartos, Obama e posteriormente Trump protagonizaram rebeliões em suas bases. No atual Partido Democrata, o banco do motorista é monopolizado por Biden e seu time. A renovação só poderá começar quando os democratas reassumirem o controle e persuadirem o presidente a retirar sua candidatura à reeleição.

The Economist afirmou pela primeira vez em 2022 que Biden não deveria buscar se reeleger em razão da sua idade. Imediatamente após o debate nosso argumento se fortalece. Um novo candidato teria pouco mais de dez semanas após a convenção para apresentar suas propostas. Esse candidato poderia perder, obviamente, mas até mesmo a catarse do autossacrifício de Biden ajudaria a política americana a se recuperar.

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Nós acreditamos, porém, que esse democrata teria boa chance de vencer — melhor que a de Biden, mesmo que seja Kamala Harris a se candidatar, a relativamente impopular vice-presidente. Esse democrata seria apto para governar; e privaria, à exceção de Harris, Trump de seus argumentos mais fortes contra Biden: responsabilidade pela inflação, pela imigração e pela suposta “caça às bruxas” que teria ocasionado seus processos na Justiça. A renovação dos EUA tem de começar agora. Para tanto, não poderia haver maneira melhor que escolher um novo candidato para derrotar Trump. /TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

O debate presidencial foi terrível para Joe Biden, mas a operação de acobertamento é pior. Foi uma agonia assistir a um velho confuso com dificuldades para lembrar palavras e fatos. Sua incapacidade de argumentar contra um oponente fraco foi desalentadora. Mas o esforço de sua campanha em negar o que dezenas de milhões de americanos viram com seus próprios olhos é ainda mais tóxico, porque essa desonestidade provoca repulsa.

O efeito foi deixar a Casa Branca ao alcance de Donald Trump. Novas pesquisas constataram que os eleitores nos Estados em que Biden tem de vencer penderam contra ele. Sua liderança pode estar em risco mesmo em Estados assegurados no passado, como Virgínia, Minnesota e Novo México.

Biden merece ser lembrado por suas realizações e sua decência, não pelo seu declínio. Portanto é correto que os primeiros democratas veteranos tenham começado a pedir abertamente que ele deixe de concorrer à reeleição. Contudo, suas expressões públicas não são nada em comparação à crescente onda privada de consternação. Mais democratas têm de despertar urgentemente para o fato de que, se não tomarem uma atitude agora, Trump vencerá. Para ocasionar a renovação política que os Estados Unidos precisam tanto e tão claramente, eles têm de pedir mudança. Não é tarde demais.

Imagem mostra Joe Biden durante discurso em Wisconsin, no dia 8 de maio. Dúvidas sobre a capacidade de Biden governar, geradas após debate contra Trump, provocam crise na campanha democrata Foto: Morry Gash/AP

Os democratas argumentam, corretamente, que Trump é inapto para ocupar a presidência. Mas o debate e seu desdobramento imediato provaram que Biden também é. Primeiramente em razão de seu declínio mental. Biden ainda consegue transmitir dinamismo em aparições curtas e roteirizadas. Mas é impossível governar uma superpotência lendo o texto no teleprompter. E é impossível pausar uma crise internacional porque o presidente está tendo uma noite ruim. Alguém que não consegue nem terminar uma frase sobre o Medicare deveria guardar os códigos de lançamento de armas nucleares?

Biden não tem culpa de suas capacidades em declínio, mas sim de um segundo elemento desqualificador, que é sua insistência, incentivada por sua família, seu alto escalão e elites democratas, de que ainda é capaz de exercer o trabalho mais difícil do mundo. A alegação de Biden de que esta eleição é uma escolha entre o certo e o errado é arruinada pelo fato da existência de sua campanha ter passado a depender de uma mentira.

Os democratas escarnecem do Partido Republicano por seu comportamento subserviente a Trump. Novamente, os democratas estão corretos. Republicanos demais têm repetido mentiras e não têm tido coragem moral para criticar os abusos de Trump. Convencidos de que durarão mais que ele — ou que outros pagarão o preço por ejetá-lo — senadores e deputados republicanos colocaram sua ambição acima de seu país.

O Partido Democrata deveria se olhar no espelho, começando pelo próprio Biden. Ele diz que foi mal no debate porque estava cansado em razão de ter viajado de um lado para o outro pelo mundo inteiro, como se sua fraqueza fosse evidência de sua vitalidade. Seus apoiadores argumentam que aqueles terríveis 90 minutos não deveriam obscurecer os três anos e meio recentes. Mas o importante foi eles prenunciarem os quatro seguintes. Democratas veteranos que repetem esses argumentos desesperados ou aguardam em silêncio para alguém falar primeiro podem achar que estão sendo leais. Ao seu país ou às suas carreiras?

Os democratas podem dizer que suas táticas são apenas política. Seus fins louváveis de salvar a democracia americana da predação de Trump justificam seus meios torpes. Essa defesa não ajuda em nada os EUA. A tática de acobertar suas próprias falhas demonizando seu oponente prejudica faz tempo a política americana, mas usar a ameaça de um Trump “ditador” para compensar a evidente fragilidade de Biden é uma forma de chantagem. Enquanto chefe de Estado, o presidente americano encarna as virtudes da república. Quanto mais ele for visto como um velho teimoso, que deixa o trabalho de verdade ser feito pelos assessores, mais ele minará a fé dos americanos em seu sistema de governo. Ao representar os EUA no exterior, Biden projetará decrepitude — para deleite da China e da Rússia e desgosto dos aliados de Washington.

Há uma outra opção. Biden deveria retirar sua candidatura. Dessa maneira, a eleição poderá renovar o corpo político. A virtude da democracia é os eleitores poderem escolher seus governantes, mas Biden e Trump oferecem uma escolha entre o incapaz e o indizível. Os americanos merecem coisa melhor.

Um novo candidato teria pouco mais de dez semanas após a convenção para apresentar suas propostas. Esse candidato poderia perder, obviamente, mas até mesmo a catarse do autossacrifício de Biden ajudaria a política americana a se recuperar

Conforme explica o nosso novo podcast, “Boom!”, a política presidencial dos EUA está presa a uma rotina. Exceto por Barack Obama, todos os presidentes americanos desde Bill Clinton, eleito em 1992, nasceram nos anos 40. Biden (1942) postulou-se pela primeira vez à presidência 37 anos atrás, ainda que de forma estabanada. Naquela época, Trump (1946) também pensou em concorrer. Sua geração amadureceu durante a Guerra do Vietnã e carrega consigo a bagagem dos protestos universitários, da era “a ganância é boa” em Wall Street e de lutas antigas sobre raça e feminismo. Essas lutas são muito diferentes hoje — e não apenas por serem travadas com mais frequência no TikTok.

Estagnação é uma falha do sistema partidário. Os partidos deveriam ser veículos que unem facções e interesses para alcançar o poder. Eles têm sido sequestrados. Primeiro Clintons e Bushes tomaram a direção. Quando os eleitores ficaram fartos, Obama e posteriormente Trump protagonizaram rebeliões em suas bases. No atual Partido Democrata, o banco do motorista é monopolizado por Biden e seu time. A renovação só poderá começar quando os democratas reassumirem o controle e persuadirem o presidente a retirar sua candidatura à reeleição.

The Economist afirmou pela primeira vez em 2022 que Biden não deveria buscar se reeleger em razão da sua idade. Imediatamente após o debate nosso argumento se fortalece. Um novo candidato teria pouco mais de dez semanas após a convenção para apresentar suas propostas. Esse candidato poderia perder, obviamente, mas até mesmo a catarse do autossacrifício de Biden ajudaria a política americana a se recuperar.

Nós acreditamos, porém, que esse democrata teria boa chance de vencer — melhor que a de Biden, mesmo que seja Kamala Harris a se candidatar, a relativamente impopular vice-presidente. Esse democrata seria apto para governar; e privaria, à exceção de Harris, Trump de seus argumentos mais fortes contra Biden: responsabilidade pela inflação, pela imigração e pela suposta “caça às bruxas” que teria ocasionado seus processos na Justiça. A renovação dos EUA tem de começar agora. Para tanto, não poderia haver maneira melhor que escolher um novo candidato para derrotar Trump. /TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

O debate presidencial foi terrível para Joe Biden, mas a operação de acobertamento é pior. Foi uma agonia assistir a um velho confuso com dificuldades para lembrar palavras e fatos. Sua incapacidade de argumentar contra um oponente fraco foi desalentadora. Mas o esforço de sua campanha em negar o que dezenas de milhões de americanos viram com seus próprios olhos é ainda mais tóxico, porque essa desonestidade provoca repulsa.

O efeito foi deixar a Casa Branca ao alcance de Donald Trump. Novas pesquisas constataram que os eleitores nos Estados em que Biden tem de vencer penderam contra ele. Sua liderança pode estar em risco mesmo em Estados assegurados no passado, como Virgínia, Minnesota e Novo México.

Biden merece ser lembrado por suas realizações e sua decência, não pelo seu declínio. Portanto é correto que os primeiros democratas veteranos tenham começado a pedir abertamente que ele deixe de concorrer à reeleição. Contudo, suas expressões públicas não são nada em comparação à crescente onda privada de consternação. Mais democratas têm de despertar urgentemente para o fato de que, se não tomarem uma atitude agora, Trump vencerá. Para ocasionar a renovação política que os Estados Unidos precisam tanto e tão claramente, eles têm de pedir mudança. Não é tarde demais.

Imagem mostra Joe Biden durante discurso em Wisconsin, no dia 8 de maio. Dúvidas sobre a capacidade de Biden governar, geradas após debate contra Trump, provocam crise na campanha democrata Foto: Morry Gash/AP

Os democratas argumentam, corretamente, que Trump é inapto para ocupar a presidência. Mas o debate e seu desdobramento imediato provaram que Biden também é. Primeiramente em razão de seu declínio mental. Biden ainda consegue transmitir dinamismo em aparições curtas e roteirizadas. Mas é impossível governar uma superpotência lendo o texto no teleprompter. E é impossível pausar uma crise internacional porque o presidente está tendo uma noite ruim. Alguém que não consegue nem terminar uma frase sobre o Medicare deveria guardar os códigos de lançamento de armas nucleares?

Biden não tem culpa de suas capacidades em declínio, mas sim de um segundo elemento desqualificador, que é sua insistência, incentivada por sua família, seu alto escalão e elites democratas, de que ainda é capaz de exercer o trabalho mais difícil do mundo. A alegação de Biden de que esta eleição é uma escolha entre o certo e o errado é arruinada pelo fato da existência de sua campanha ter passado a depender de uma mentira.

Os democratas escarnecem do Partido Republicano por seu comportamento subserviente a Trump. Novamente, os democratas estão corretos. Republicanos demais têm repetido mentiras e não têm tido coragem moral para criticar os abusos de Trump. Convencidos de que durarão mais que ele — ou que outros pagarão o preço por ejetá-lo — senadores e deputados republicanos colocaram sua ambição acima de seu país.

O Partido Democrata deveria se olhar no espelho, começando pelo próprio Biden. Ele diz que foi mal no debate porque estava cansado em razão de ter viajado de um lado para o outro pelo mundo inteiro, como se sua fraqueza fosse evidência de sua vitalidade. Seus apoiadores argumentam que aqueles terríveis 90 minutos não deveriam obscurecer os três anos e meio recentes. Mas o importante foi eles prenunciarem os quatro seguintes. Democratas veteranos que repetem esses argumentos desesperados ou aguardam em silêncio para alguém falar primeiro podem achar que estão sendo leais. Ao seu país ou às suas carreiras?

Os democratas podem dizer que suas táticas são apenas política. Seus fins louváveis de salvar a democracia americana da predação de Trump justificam seus meios torpes. Essa defesa não ajuda em nada os EUA. A tática de acobertar suas próprias falhas demonizando seu oponente prejudica faz tempo a política americana, mas usar a ameaça de um Trump “ditador” para compensar a evidente fragilidade de Biden é uma forma de chantagem. Enquanto chefe de Estado, o presidente americano encarna as virtudes da república. Quanto mais ele for visto como um velho teimoso, que deixa o trabalho de verdade ser feito pelos assessores, mais ele minará a fé dos americanos em seu sistema de governo. Ao representar os EUA no exterior, Biden projetará decrepitude — para deleite da China e da Rússia e desgosto dos aliados de Washington.

Há uma outra opção. Biden deveria retirar sua candidatura. Dessa maneira, a eleição poderá renovar o corpo político. A virtude da democracia é os eleitores poderem escolher seus governantes, mas Biden e Trump oferecem uma escolha entre o incapaz e o indizível. Os americanos merecem coisa melhor.

Um novo candidato teria pouco mais de dez semanas após a convenção para apresentar suas propostas. Esse candidato poderia perder, obviamente, mas até mesmo a catarse do autossacrifício de Biden ajudaria a política americana a se recuperar

Conforme explica o nosso novo podcast, “Boom!”, a política presidencial dos EUA está presa a uma rotina. Exceto por Barack Obama, todos os presidentes americanos desde Bill Clinton, eleito em 1992, nasceram nos anos 40. Biden (1942) postulou-se pela primeira vez à presidência 37 anos atrás, ainda que de forma estabanada. Naquela época, Trump (1946) também pensou em concorrer. Sua geração amadureceu durante a Guerra do Vietnã e carrega consigo a bagagem dos protestos universitários, da era “a ganância é boa” em Wall Street e de lutas antigas sobre raça e feminismo. Essas lutas são muito diferentes hoje — e não apenas por serem travadas com mais frequência no TikTok.

Estagnação é uma falha do sistema partidário. Os partidos deveriam ser veículos que unem facções e interesses para alcançar o poder. Eles têm sido sequestrados. Primeiro Clintons e Bushes tomaram a direção. Quando os eleitores ficaram fartos, Obama e posteriormente Trump protagonizaram rebeliões em suas bases. No atual Partido Democrata, o banco do motorista é monopolizado por Biden e seu time. A renovação só poderá começar quando os democratas reassumirem o controle e persuadirem o presidente a retirar sua candidatura à reeleição.

The Economist afirmou pela primeira vez em 2022 que Biden não deveria buscar se reeleger em razão da sua idade. Imediatamente após o debate nosso argumento se fortalece. Um novo candidato teria pouco mais de dez semanas após a convenção para apresentar suas propostas. Esse candidato poderia perder, obviamente, mas até mesmo a catarse do autossacrifício de Biden ajudaria a política americana a se recuperar.

Nós acreditamos, porém, que esse democrata teria boa chance de vencer — melhor que a de Biden, mesmo que seja Kamala Harris a se candidatar, a relativamente impopular vice-presidente. Esse democrata seria apto para governar; e privaria, à exceção de Harris, Trump de seus argumentos mais fortes contra Biden: responsabilidade pela inflação, pela imigração e pela suposta “caça às bruxas” que teria ocasionado seus processos na Justiça. A renovação dos EUA tem de começar agora. Para tanto, não poderia haver maneira melhor que escolher um novo candidato para derrotar Trump. /TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

O debate presidencial foi terrível para Joe Biden, mas a operação de acobertamento é pior. Foi uma agonia assistir a um velho confuso com dificuldades para lembrar palavras e fatos. Sua incapacidade de argumentar contra um oponente fraco foi desalentadora. Mas o esforço de sua campanha em negar o que dezenas de milhões de americanos viram com seus próprios olhos é ainda mais tóxico, porque essa desonestidade provoca repulsa.

O efeito foi deixar a Casa Branca ao alcance de Donald Trump. Novas pesquisas constataram que os eleitores nos Estados em que Biden tem de vencer penderam contra ele. Sua liderança pode estar em risco mesmo em Estados assegurados no passado, como Virgínia, Minnesota e Novo México.

Biden merece ser lembrado por suas realizações e sua decência, não pelo seu declínio. Portanto é correto que os primeiros democratas veteranos tenham começado a pedir abertamente que ele deixe de concorrer à reeleição. Contudo, suas expressões públicas não são nada em comparação à crescente onda privada de consternação. Mais democratas têm de despertar urgentemente para o fato de que, se não tomarem uma atitude agora, Trump vencerá. Para ocasionar a renovação política que os Estados Unidos precisam tanto e tão claramente, eles têm de pedir mudança. Não é tarde demais.

Imagem mostra Joe Biden durante discurso em Wisconsin, no dia 8 de maio. Dúvidas sobre a capacidade de Biden governar, geradas após debate contra Trump, provocam crise na campanha democrata Foto: Morry Gash/AP

Os democratas argumentam, corretamente, que Trump é inapto para ocupar a presidência. Mas o debate e seu desdobramento imediato provaram que Biden também é. Primeiramente em razão de seu declínio mental. Biden ainda consegue transmitir dinamismo em aparições curtas e roteirizadas. Mas é impossível governar uma superpotência lendo o texto no teleprompter. E é impossível pausar uma crise internacional porque o presidente está tendo uma noite ruim. Alguém que não consegue nem terminar uma frase sobre o Medicare deveria guardar os códigos de lançamento de armas nucleares?

Biden não tem culpa de suas capacidades em declínio, mas sim de um segundo elemento desqualificador, que é sua insistência, incentivada por sua família, seu alto escalão e elites democratas, de que ainda é capaz de exercer o trabalho mais difícil do mundo. A alegação de Biden de que esta eleição é uma escolha entre o certo e o errado é arruinada pelo fato da existência de sua campanha ter passado a depender de uma mentira.

Os democratas escarnecem do Partido Republicano por seu comportamento subserviente a Trump. Novamente, os democratas estão corretos. Republicanos demais têm repetido mentiras e não têm tido coragem moral para criticar os abusos de Trump. Convencidos de que durarão mais que ele — ou que outros pagarão o preço por ejetá-lo — senadores e deputados republicanos colocaram sua ambição acima de seu país.

O Partido Democrata deveria se olhar no espelho, começando pelo próprio Biden. Ele diz que foi mal no debate porque estava cansado em razão de ter viajado de um lado para o outro pelo mundo inteiro, como se sua fraqueza fosse evidência de sua vitalidade. Seus apoiadores argumentam que aqueles terríveis 90 minutos não deveriam obscurecer os três anos e meio recentes. Mas o importante foi eles prenunciarem os quatro seguintes. Democratas veteranos que repetem esses argumentos desesperados ou aguardam em silêncio para alguém falar primeiro podem achar que estão sendo leais. Ao seu país ou às suas carreiras?

Os democratas podem dizer que suas táticas são apenas política. Seus fins louváveis de salvar a democracia americana da predação de Trump justificam seus meios torpes. Essa defesa não ajuda em nada os EUA. A tática de acobertar suas próprias falhas demonizando seu oponente prejudica faz tempo a política americana, mas usar a ameaça de um Trump “ditador” para compensar a evidente fragilidade de Biden é uma forma de chantagem. Enquanto chefe de Estado, o presidente americano encarna as virtudes da república. Quanto mais ele for visto como um velho teimoso, que deixa o trabalho de verdade ser feito pelos assessores, mais ele minará a fé dos americanos em seu sistema de governo. Ao representar os EUA no exterior, Biden projetará decrepitude — para deleite da China e da Rússia e desgosto dos aliados de Washington.

Há uma outra opção. Biden deveria retirar sua candidatura. Dessa maneira, a eleição poderá renovar o corpo político. A virtude da democracia é os eleitores poderem escolher seus governantes, mas Biden e Trump oferecem uma escolha entre o incapaz e o indizível. Os americanos merecem coisa melhor.

Um novo candidato teria pouco mais de dez semanas após a convenção para apresentar suas propostas. Esse candidato poderia perder, obviamente, mas até mesmo a catarse do autossacrifício de Biden ajudaria a política americana a se recuperar

Conforme explica o nosso novo podcast, “Boom!”, a política presidencial dos EUA está presa a uma rotina. Exceto por Barack Obama, todos os presidentes americanos desde Bill Clinton, eleito em 1992, nasceram nos anos 40. Biden (1942) postulou-se pela primeira vez à presidência 37 anos atrás, ainda que de forma estabanada. Naquela época, Trump (1946) também pensou em concorrer. Sua geração amadureceu durante a Guerra do Vietnã e carrega consigo a bagagem dos protestos universitários, da era “a ganância é boa” em Wall Street e de lutas antigas sobre raça e feminismo. Essas lutas são muito diferentes hoje — e não apenas por serem travadas com mais frequência no TikTok.

Estagnação é uma falha do sistema partidário. Os partidos deveriam ser veículos que unem facções e interesses para alcançar o poder. Eles têm sido sequestrados. Primeiro Clintons e Bushes tomaram a direção. Quando os eleitores ficaram fartos, Obama e posteriormente Trump protagonizaram rebeliões em suas bases. No atual Partido Democrata, o banco do motorista é monopolizado por Biden e seu time. A renovação só poderá começar quando os democratas reassumirem o controle e persuadirem o presidente a retirar sua candidatura à reeleição.

The Economist afirmou pela primeira vez em 2022 que Biden não deveria buscar se reeleger em razão da sua idade. Imediatamente após o debate nosso argumento se fortalece. Um novo candidato teria pouco mais de dez semanas após a convenção para apresentar suas propostas. Esse candidato poderia perder, obviamente, mas até mesmo a catarse do autossacrifício de Biden ajudaria a política americana a se recuperar.

Nós acreditamos, porém, que esse democrata teria boa chance de vencer — melhor que a de Biden, mesmo que seja Kamala Harris a se candidatar, a relativamente impopular vice-presidente. Esse democrata seria apto para governar; e privaria, à exceção de Harris, Trump de seus argumentos mais fortes contra Biden: responsabilidade pela inflação, pela imigração e pela suposta “caça às bruxas” que teria ocasionado seus processos na Justiça. A renovação dos EUA tem de começar agora. Para tanto, não poderia haver maneira melhor que escolher um novo candidato para derrotar Trump. /TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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