Em 1990, o Congresso americano aprovou uma emenda à Lei do Ar Limpo, de 1970, entre outras medidas contra chuva ácida, poluição atmosférica em áreas urbanas e ações relativas à camada de ozônio.
A legislação foi altamente bem-sucedida, reduzindo em grande medida a poluição a um custo muito menor do que grupos de interesses empresariais haviam previsto. Às vezes vejo pessoas tentando usar a chuva ácida como exemplo do alarmismo ambiental — ei, esse assunto era sério em 1980, mas agora quase ninguém mais fala disso. Mas a razão pela qual não falamos disso é que as políticas resolveram quase totalmente o problema.
O que é realmente chocante a partir da perspectiva atual, contudo, é o fato de a legislação de 1990 ter sido aprovada no Congresso com apoio de esmagadoras maiorias bipartidárias. Entre os que votaram Sim estava um senador de Kentucky então no primeiro mandato chamado Mitch McConnell.
Isso é passado. O presente é assim: A Lei de Redução da Inflação — que, apesar de seu nome, é principalmente uma legislação ambiental com um aspecto que favorece uma reforma na saúde — não recebeu nenhum voto republicano. E a LRI não é um plano esquerdista para inserir o Grande Governo nas vidas de todas as pessoas: a lei não coage os americanos a tornar-se verdes; ela tem como base subsídios para promover tecnologias baixas em emissões, provavelmente criando muitos novos empregos. Então, qual o motivo da aguerrida oposição do Partido Republicano?
A resposta imediata é que o Partido Republicano se tornou fortemente antiambientalista com o passar do tempo. Mas por quê?
Pesquisas do Pew Research Center mostram uma discordância partidária cada vez mais profunda em relação a política ambiental. Nos anos 90, autoproclamados republicanos e democratas não tinham visões tão diferentes a respeito do meio ambiente: a probabilidade de republicanos afirmarem que deveríamos fazer tudo o que for necessário para proteger o meio ambiente era menor do que ver democratas afirmando isso; mais provável era ver republicanos afirmando que leis ambientais prejudicam a economia; mas as diferenças entre os campos eram relativamente modestas.
Desde então, porém, esses lapsos se transformaram em abismos; e de maneira assimétrica: os democratas ficaram pouco mais favoráveis à ação ambiental, e os republicanos se tornaram muito menos favoráveis.
A maior parte da divergência é bastante recente, ocorre aproximadamente a partir de 2008. Não posso deixar de apontar que a crença entre os republicanos de que proteção ambiental castiga a economia foi às alturas precisamente no período em que um progresso tecnológico revolucionário no setor da energia renovável tornava reduzir emissões mais barato do que jamais havia sido.
Eleitores republicanos parecem estar atentos às deixas dos políticos e das personalidades dos meios de comunicação. Então, por que motivo os formadores de opinião conservadores viraram antiambientalistas?
Legislação ambiental nos EUA
Não se trata da crença nos mercados livres ou de oposição à intervenção do governo. Um dos aspectos mais marcantes das recentes disputas sobre energia é a medida com que os republicanos têm tentado usar o poder do Estado para promover fontes poluidoras de energia mesmo enquanto o setor privado prefere alternativas. O governo de Donald Trump tentou, sem sucesso, forçar empresas de fornecimento de eletricidade a continuar queimando carvão mesmo quando outras fontes de energia eram mais baratas. Atualmente, conforme noticiou o Times, muitos tesoureiros estaduais republicanos estão tentando punir bancos e outras empresas que buscam reduzir emissões de gases-estufa.
E o que dizer da visão cínica de que o Partido Republicano está simplesmente no bolso dos interesses da indústria de combustíveis fósseis? Obviamente, faz-se de tudo por dinheiro, e as contribuições do carvão e, em menor medida, do petróleo e do gás fluem principalmente para os republicanos. Mas a Lei de Redução da Inflação — que abrirá muitas oportunidades de trabalho — contou com apoio de várias grandes corporações, incluindo empresas de energia como BP e Shell. Os republicanos permaneceram inabaláveis.
O que ocorreu, eu argumentaria, foi que a política ambiental acabou pega pela guerra cultural — que, por sua vez, é orientada em grande medida por temas como raça e etnia. É por esse motivo, eu suspeito, que a discordância partidária a respeito do meio ambiente se ampliou tanto depois que os Estados Unidos elegeram seu primeiro presidente negro.
Um aspecto especialmente notável da reportagem investigativa do Times a respeito dos tesoureiros estaduais estarem punindo empresas que buscam limitar emissões de gases-estufa é a maneira com que essas autoridades condenam as corporações, qualificando-as como “lacradoras”.
Falar de lacração normalmente significa falar de justiça racial e social. Na direita — que se define cada vez mais por tentativas de limitar direitos de americanos que não sejam heterossexuais, brancos e cristãos — o termo passou a significar abuso. Ensinar a estudantes a respeito do papel do racismo na história americana é ruim porque é lacrador. Assim como, aparentemente, tantas outras coisas, como a rede de restaurantes Cracker Barrel oferecendo aos clientes salsichas sem carne ou preocupar-se com as mudanças climáticas.
Isso pode não fazer muito sentido intelectualmente, mas é evidente que funciona no nível emocional. Quem tende a se preocupar com o meio ambiente? Com frequência pessoas também preocupadas com justiça social — ou as elites globais. (Ciência ambiental é em grande parte um empreendimento global.)
Mesmo republicanos que deveriam entender melhor as coisas não rompem com a posição anticiência de seu partido. Ainda que, como governador de Massachusetts, Mitt Romney tenha tido um registro decente em relação ao meio ambiente, no Congresso ele se uniu a todos os republicanos votando contra a LRI.
Isso significa que as pessoas com esperança de esforços bipartidários em relação ao meio ambiente provavelmente iludem a si mesmas. Proteção ambiental passou agora a ser parte da guerra cultural, detalhes de políticas e argumentos racionais não importam. /TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO