Opinião|Por que subitamente tudo parece estar desmoronando para Israel


O estado judeu de Israel está em perigo gravíssimo hoje e o perigo vem tanto do Irã quanto da atual coalizão governante israelense

Por Thomas Friedman

O que você faria?

Não há pergunta que o governo de Israel tenha feito ao mundo com mais frequência desde que o Hamas invadiu Israel em 7 de outubro e o Hezbollah atacou Israel em 8 de outubro.

O que seu país faria se terroristas cruzassem sua fronteira ocidental e matassem, mutilassem, sequestrassem ou abusassem sexualmente de centenas de israelenses que encontrassem e, no dia seguinte, seus aliados do Hezbollah enviassem foguetes sobre sua fronteira norte, afastando milhares de civis — tudo isso aplaudido pelo Irã?

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Soldado israelense aguarda instruções em cima de um tanque no norte de Israel  Foto: Baz Ratner/AP

O que você faria?

É uma pergunta poderosa e relevante, e uma pergunta que os críticos de Israel frequentemente evitam.

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Mas eles não são os únicos a evitá-la.

Este governo israelense, liderado por Binyamin Netanyahu, quer que você, eu e todos os israelenses e todos os amigos de Israel — e até mesmo inimigos — acreditemos que sempre houve apenas uma resposta certa para essa pergunta: invadir Gaza, caçar todos os líderes e combatentes do Hamas, matar até o último deles e não ser dissuadido pelas baixas civis, então massacrar o Hezbollah no Líbano — e fazer as duas coisas sem gastar tempo planejando uma estratégia de saída para nenhuma delas.

Eu argumentei desde o primeiro dia que era uma armadilha. Uma armadilha em que, lamento dizer, o governo Biden não foi firme o suficiente para impedir que Israel caísse, e não foi firme o suficiente para insistir em um caminho melhor, um caminho não trilhado.

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Este não é o momento para contenção. O estado judeu de Israel está em perigo gravíssimo hoje. E o perigo vem tanto do Irã quanto da atual coalizão governante israelense.

Israelenses protestam pela volta dos reféns que estão na Faixa de Gaza  Foto: Gil Cohen-magen/AFP

Vejam, eu nunca tive ilusões quanto às razões mais amplas pelas quais essa guerra aconteceu. É o desdobramento de uma estratégia maior iraniana para destruir lentamente o estado judeu, enfraquecer os aliados árabes dos Estados Unidos e minar a influência americana na região — ao mesmo tempo em que dissuade Israel de atacar as instalações nucleares do Irã — usando representantes iranianos para sangrar Israel até a morte. Essa é a história mais ampla.

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O gatilho e objetivo imediato da guerra foi um interesse iraniano e do Hamas em sabotar a iniciativa diplomática da equipe de Biden para reunir Israel, a Autoridade Palestina e a Arábia Saudita em um anel de paz.

A contraestratégia iraniana e do Hamas era acender um anel de fogo ao redor de Israel, usando o Hamas, o Hezbollah, os Houthis, milícias xiitas pró-iranianas no Iraque e militantes da Cisjordânia armados pelo Irã com armas contrabandeadas por meio da Jordânia. A estratégia iraniana é requintada do ponto de vista de Teerã: destruir Israel sacrificando tantos palestinos e libaneses quanto necessário, mas nunca arriscar uma única vida iraniana. Os iranianos estão prontos para morrer até o último libanês, o último palestino, o último sírio e o último iemenita para eliminar Israel (e distrair o mundo dos abusos do regime iraniano contra seu próprio povo e do controle imperialista sobre o Líbano, Iêmen, Iraque e Síria).

O presidente do Irã, Masoud Pezeshkian, discursa na Assembleia-Geral da ONU, em Nova York, Estados Unidos  Foto: Pamela Smith/AP
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O problema para os israelenses e o povo judeu é que, embora o governo Netanyahu estivesse certo em seu diagnóstico de que esta era uma guerra de aniquilação, ele se recusou a conduzi-la da única maneira que poderia trazer uma esperança de sucesso — porque essa estratégia ia contra os interesses políticos do primeiro-ministro e os interesses ideológicos messiânicos de sua coalizão.

Israel enfrenta uma ameaça existencial de fora, e seu primeiro-ministro e seus aliados têm priorizado seus próprios interesses políticos e ideológicos em detrimento disso. Eles até ressuscitaram recentemente sua tentativa de golpe judicial para esmagar a Suprema Corte israelense — em meio a uma guerra de sobrevivência nacional enquanto reféns apodrecem em Gaza. É um dos episódios mais vergonhosos da história judaica, e é uma vergonha o lobby pró-Israel do AIPAC em Washington não se manifestar contra isso.

Para combater essa rede de ameaças iranianas, Israel precisava de quatro coisas: muito tempo, porque esse anel de fogo não poderia ser extinto da noite para o dia; muitos recursos, principalmente dos Estados Unidos e outros aliados ocidentais; muitos aliados árabes e europeus, porque Israel não pode lutar uma guerra de atrito sozinho; e, talvez o mais crucial de tudo, muita legitimidade.

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O presidente Biden e sua equipe ofereceram a Israel um roteiro para essa contraestratégia, mas, infelizmente, eles nunca tiveram coragem de impô-la a Netanyahu com uma combinação de pressão, diplomacia e ultimatos. Esse roteiro envolveria persuadir os aliados árabes dos EUA a reformar fundamentalmente a Autoridade Palestina na Cisjordânia com uma liderança nova e confiável e, então, fazer com que Israel concordasse em abrir negociações com a liderança da Autoridade Palestina em um caminho de longo prazo para uma solução de dois estados.

Israelenses pedem que o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, faça um acordo para a soltura dos reféns que estão na Faixa de Gaza  Foto: Maya Alleruzzo/AP

Isso teria feito o seguinte: 1) Abriria caminho para isolar e pressionar o Hamas a concordar com um cessar-fogo no qual Israel sairia de Gaza em troca de todos os reféns, encerrando a guerra lá e eliminando o pretexto do Hezbollah para atacar Israel pelo norte. 2) Abriria caminho para a Arábia Saudita normalizar as relações com Israel, um golpe devastador para o Hamas e o Irã. 3) Abriria caminho para os Emirados Árabes Unidos fazerem parceria com uma Autoridade Palestina reformada para enviar tropas para Gaza e fazer o que o Hamas mais odiaria: substituí-lo como autoridade governante, apoiado por centenas de milhões de dólares para reconstruir Gaza, o que provavelmente faria dela a força palestina mais popular em Gaza da noite para o dia.

Até agora, porém, Bibi recusou a proposta de Biden (enquanto flerta abertamente com Donald Trump) porque o primeiro-ministro teria que romper com os malucos de direita que o levaram ao poder e formar uma coalizão governamental diferente com partidos mais moderados. Bibi priorizou sua segurança política pessoal em detrimento da segurança nacional de Israel. E, por meses, ele tem enrolado o mundo todo e seu próprio povo para disfarçar isso.

Netanyahu pensou que poderia simplesmente dizer ao mundo que Israel estava defendendo a fronteira da liberdade contra o Hamas, o Hezbollah, os Houthis e o Irã, e todos se alinhariam com Israel. O que você faria? Mas o único lugar no mundo onde isso lhe rende aplausos de pé é no Congresso dos EUA.

Serviços de emergência buscam sobreviventes e corpos após um bombardeio israelense no subúrbio de Beirute, Líbano  Foto: Bilal Hussein/AP

O resto do mundo, particularmente os estados árabes moderados e os europeus, disseram a ele: Bibi, a sua história não cola. Você não pode dizer ao mundo que está defendendo a fronteira da liberdade contra o Hamas e o Hezbollah enquanto expande — cada vez mais violentamente — a ocupação de colonos de Israel diante dos palestinos na Cisjordânia. A sua história não cola.

Então, o primeiro-ministro israelense optou pela doutrina Netanyahu: combater sozinho em três frentes — Gaza, Líbano e Cisjordânia — sem nenhum plano para o dia seguinte em lugar nenhum. Ao fazer isso, ele rejeitou a estratégia de Biden: incorporar Israel em uma coalizão EUA-Israel-árabes-moderados que isolaria o Irã e seus representantes, daria alguma esperança de que talvez um dia veríamos dois estados para dois povos nativos entre o Rio Jordão e o Mediterrâneo, e deixaria claro para o mundo que a fonte de problemas na região não é o Partido de Deus em Israel, mas os Partidos de Deus no Líbano, Iêmen e Irã.

A estratégia de Netanyahu é um desastre. Como um comandante militar veterano dos EUA que observou de perto a estratégia de guerra de Israel em Gaza me disse em particular, qualquer um com dois olhos na cabeça sabe que a única maneira de derrotar o Hamas é uma estratégia de “limpar, manter e construir”: destruir o inimigo, manter o território e então construir uma autoridade governamental palestina local alternativa e legítima. A estratégia de Israel em Gaza, ele disse, tem sido: “limpar, sair, voltar, limpar novamente o mesmo lugar, sair novamente, voltar e limpar novamente”.

Apoiadores da causa palestina protestam contra o discurso do primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, na Assembleia-Geral da ONU, em Nova York, Estados Unidos  Foto: Julia Demaree Nikhinson/AP

É um exemplo clássico de como transformar o Hamas “de uma insurgência quase militar para uma insurgência clássica”, acrescentou ele. Alguém leu o artigo principal no Haaretz online no dia do notável ataque israelense usando os pagers do Hezbollah? Quem leu, encontrou quatro jovens soldados israelenses mortos naquele dia lutando contra o Hamas em Gaza olhando para você — quase um ano após o início da guerra lá. Quase diariamente lemos também sobre um grande número de civis de Gaza mortos em uma operação israelense contra alguns combatentes do Hamas que vivem entre eles. Enquanto isso, ninguém está governando Gaza.

Sim, sim, eu já ouvi as críticas: estou delirando. Algum líder israelense ou palestino aceitaria tal plano? Bem, dois amigos meus fizeram exatamente isso: o ex-primeiro-ministro israelense, Ehud Olmert e o ex-ministro das Relações Exteriores da Autoridade Palestina, Nasser al-Qudwa. Podem conferir o plano deles para uma solução de dois estados aqui. Biden deve convidá-los para o Salão Oval na quinta-feira para incorporar o projeto deles, que está totalmente alinhado com os interesses dos EUA.

Repito: Israel está em terrível perigo. Está lutando a guerra mais justa de sua história — respondendo ao sequestro e assassinato brutal e não provocado de mulheres, crianças e avós pelo Hamas — e, no entanto, hoje Israel é mais um estado pária do que nunca.

Por quê? Quando se luta uma guerra como essa sem horizonte político por tanto tempo — uma guerra que nega qualquer possibilidade de palestinos mais moderados governarem Gaza — a operação militar israelense lá começa a parecer uma matança sem fim, matar por matar. É exatamente isso que o Hamas, o Hezbollah e o Irã querem.

Sempre houve um caminho não trilhado. Se tenho certeza de que daria certo? Claro que não. A única coisa que tenho certeza é que o caminho em que Netanyahu jogou Israel agora é um caminho para a ruína, cercado por um anel de fogo. Se continuar nesse caminho, e as pessoas mais talentosas de Israel começarão a ir embora, e o Israel que conhecemos desaparecerá para sempre.

O que você faria?

Não há pergunta que o governo de Israel tenha feito ao mundo com mais frequência desde que o Hamas invadiu Israel em 7 de outubro e o Hezbollah atacou Israel em 8 de outubro.

O que seu país faria se terroristas cruzassem sua fronteira ocidental e matassem, mutilassem, sequestrassem ou abusassem sexualmente de centenas de israelenses que encontrassem e, no dia seguinte, seus aliados do Hezbollah enviassem foguetes sobre sua fronteira norte, afastando milhares de civis — tudo isso aplaudido pelo Irã?

Soldado israelense aguarda instruções em cima de um tanque no norte de Israel  Foto: Baz Ratner/AP

O que você faria?

É uma pergunta poderosa e relevante, e uma pergunta que os críticos de Israel frequentemente evitam.

Mas eles não são os únicos a evitá-la.

Este governo israelense, liderado por Binyamin Netanyahu, quer que você, eu e todos os israelenses e todos os amigos de Israel — e até mesmo inimigos — acreditemos que sempre houve apenas uma resposta certa para essa pergunta: invadir Gaza, caçar todos os líderes e combatentes do Hamas, matar até o último deles e não ser dissuadido pelas baixas civis, então massacrar o Hezbollah no Líbano — e fazer as duas coisas sem gastar tempo planejando uma estratégia de saída para nenhuma delas.

Eu argumentei desde o primeiro dia que era uma armadilha. Uma armadilha em que, lamento dizer, o governo Biden não foi firme o suficiente para impedir que Israel caísse, e não foi firme o suficiente para insistir em um caminho melhor, um caminho não trilhado.

Este não é o momento para contenção. O estado judeu de Israel está em perigo gravíssimo hoje. E o perigo vem tanto do Irã quanto da atual coalizão governante israelense.

Israelenses protestam pela volta dos reféns que estão na Faixa de Gaza  Foto: Gil Cohen-magen/AFP

Vejam, eu nunca tive ilusões quanto às razões mais amplas pelas quais essa guerra aconteceu. É o desdobramento de uma estratégia maior iraniana para destruir lentamente o estado judeu, enfraquecer os aliados árabes dos Estados Unidos e minar a influência americana na região — ao mesmo tempo em que dissuade Israel de atacar as instalações nucleares do Irã — usando representantes iranianos para sangrar Israel até a morte. Essa é a história mais ampla.

O gatilho e objetivo imediato da guerra foi um interesse iraniano e do Hamas em sabotar a iniciativa diplomática da equipe de Biden para reunir Israel, a Autoridade Palestina e a Arábia Saudita em um anel de paz.

A contraestratégia iraniana e do Hamas era acender um anel de fogo ao redor de Israel, usando o Hamas, o Hezbollah, os Houthis, milícias xiitas pró-iranianas no Iraque e militantes da Cisjordânia armados pelo Irã com armas contrabandeadas por meio da Jordânia. A estratégia iraniana é requintada do ponto de vista de Teerã: destruir Israel sacrificando tantos palestinos e libaneses quanto necessário, mas nunca arriscar uma única vida iraniana. Os iranianos estão prontos para morrer até o último libanês, o último palestino, o último sírio e o último iemenita para eliminar Israel (e distrair o mundo dos abusos do regime iraniano contra seu próprio povo e do controle imperialista sobre o Líbano, Iêmen, Iraque e Síria).

O presidente do Irã, Masoud Pezeshkian, discursa na Assembleia-Geral da ONU, em Nova York, Estados Unidos  Foto: Pamela Smith/AP

O problema para os israelenses e o povo judeu é que, embora o governo Netanyahu estivesse certo em seu diagnóstico de que esta era uma guerra de aniquilação, ele se recusou a conduzi-la da única maneira que poderia trazer uma esperança de sucesso — porque essa estratégia ia contra os interesses políticos do primeiro-ministro e os interesses ideológicos messiânicos de sua coalizão.

Israel enfrenta uma ameaça existencial de fora, e seu primeiro-ministro e seus aliados têm priorizado seus próprios interesses políticos e ideológicos em detrimento disso. Eles até ressuscitaram recentemente sua tentativa de golpe judicial para esmagar a Suprema Corte israelense — em meio a uma guerra de sobrevivência nacional enquanto reféns apodrecem em Gaza. É um dos episódios mais vergonhosos da história judaica, e é uma vergonha o lobby pró-Israel do AIPAC em Washington não se manifestar contra isso.

Para combater essa rede de ameaças iranianas, Israel precisava de quatro coisas: muito tempo, porque esse anel de fogo não poderia ser extinto da noite para o dia; muitos recursos, principalmente dos Estados Unidos e outros aliados ocidentais; muitos aliados árabes e europeus, porque Israel não pode lutar uma guerra de atrito sozinho; e, talvez o mais crucial de tudo, muita legitimidade.

O presidente Biden e sua equipe ofereceram a Israel um roteiro para essa contraestratégia, mas, infelizmente, eles nunca tiveram coragem de impô-la a Netanyahu com uma combinação de pressão, diplomacia e ultimatos. Esse roteiro envolveria persuadir os aliados árabes dos EUA a reformar fundamentalmente a Autoridade Palestina na Cisjordânia com uma liderança nova e confiável e, então, fazer com que Israel concordasse em abrir negociações com a liderança da Autoridade Palestina em um caminho de longo prazo para uma solução de dois estados.

Israelenses pedem que o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, faça um acordo para a soltura dos reféns que estão na Faixa de Gaza  Foto: Maya Alleruzzo/AP

Isso teria feito o seguinte: 1) Abriria caminho para isolar e pressionar o Hamas a concordar com um cessar-fogo no qual Israel sairia de Gaza em troca de todos os reféns, encerrando a guerra lá e eliminando o pretexto do Hezbollah para atacar Israel pelo norte. 2) Abriria caminho para a Arábia Saudita normalizar as relações com Israel, um golpe devastador para o Hamas e o Irã. 3) Abriria caminho para os Emirados Árabes Unidos fazerem parceria com uma Autoridade Palestina reformada para enviar tropas para Gaza e fazer o que o Hamas mais odiaria: substituí-lo como autoridade governante, apoiado por centenas de milhões de dólares para reconstruir Gaza, o que provavelmente faria dela a força palestina mais popular em Gaza da noite para o dia.

Até agora, porém, Bibi recusou a proposta de Biden (enquanto flerta abertamente com Donald Trump) porque o primeiro-ministro teria que romper com os malucos de direita que o levaram ao poder e formar uma coalizão governamental diferente com partidos mais moderados. Bibi priorizou sua segurança política pessoal em detrimento da segurança nacional de Israel. E, por meses, ele tem enrolado o mundo todo e seu próprio povo para disfarçar isso.

Netanyahu pensou que poderia simplesmente dizer ao mundo que Israel estava defendendo a fronteira da liberdade contra o Hamas, o Hezbollah, os Houthis e o Irã, e todos se alinhariam com Israel. O que você faria? Mas o único lugar no mundo onde isso lhe rende aplausos de pé é no Congresso dos EUA.

Serviços de emergência buscam sobreviventes e corpos após um bombardeio israelense no subúrbio de Beirute, Líbano  Foto: Bilal Hussein/AP

O resto do mundo, particularmente os estados árabes moderados e os europeus, disseram a ele: Bibi, a sua história não cola. Você não pode dizer ao mundo que está defendendo a fronteira da liberdade contra o Hamas e o Hezbollah enquanto expande — cada vez mais violentamente — a ocupação de colonos de Israel diante dos palestinos na Cisjordânia. A sua história não cola.

Então, o primeiro-ministro israelense optou pela doutrina Netanyahu: combater sozinho em três frentes — Gaza, Líbano e Cisjordânia — sem nenhum plano para o dia seguinte em lugar nenhum. Ao fazer isso, ele rejeitou a estratégia de Biden: incorporar Israel em uma coalizão EUA-Israel-árabes-moderados que isolaria o Irã e seus representantes, daria alguma esperança de que talvez um dia veríamos dois estados para dois povos nativos entre o Rio Jordão e o Mediterrâneo, e deixaria claro para o mundo que a fonte de problemas na região não é o Partido de Deus em Israel, mas os Partidos de Deus no Líbano, Iêmen e Irã.

A estratégia de Netanyahu é um desastre. Como um comandante militar veterano dos EUA que observou de perto a estratégia de guerra de Israel em Gaza me disse em particular, qualquer um com dois olhos na cabeça sabe que a única maneira de derrotar o Hamas é uma estratégia de “limpar, manter e construir”: destruir o inimigo, manter o território e então construir uma autoridade governamental palestina local alternativa e legítima. A estratégia de Israel em Gaza, ele disse, tem sido: “limpar, sair, voltar, limpar novamente o mesmo lugar, sair novamente, voltar e limpar novamente”.

Apoiadores da causa palestina protestam contra o discurso do primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, na Assembleia-Geral da ONU, em Nova York, Estados Unidos  Foto: Julia Demaree Nikhinson/AP

É um exemplo clássico de como transformar o Hamas “de uma insurgência quase militar para uma insurgência clássica”, acrescentou ele. Alguém leu o artigo principal no Haaretz online no dia do notável ataque israelense usando os pagers do Hezbollah? Quem leu, encontrou quatro jovens soldados israelenses mortos naquele dia lutando contra o Hamas em Gaza olhando para você — quase um ano após o início da guerra lá. Quase diariamente lemos também sobre um grande número de civis de Gaza mortos em uma operação israelense contra alguns combatentes do Hamas que vivem entre eles. Enquanto isso, ninguém está governando Gaza.

Sim, sim, eu já ouvi as críticas: estou delirando. Algum líder israelense ou palestino aceitaria tal plano? Bem, dois amigos meus fizeram exatamente isso: o ex-primeiro-ministro israelense, Ehud Olmert e o ex-ministro das Relações Exteriores da Autoridade Palestina, Nasser al-Qudwa. Podem conferir o plano deles para uma solução de dois estados aqui. Biden deve convidá-los para o Salão Oval na quinta-feira para incorporar o projeto deles, que está totalmente alinhado com os interesses dos EUA.

Repito: Israel está em terrível perigo. Está lutando a guerra mais justa de sua história — respondendo ao sequestro e assassinato brutal e não provocado de mulheres, crianças e avós pelo Hamas — e, no entanto, hoje Israel é mais um estado pária do que nunca.

Por quê? Quando se luta uma guerra como essa sem horizonte político por tanto tempo — uma guerra que nega qualquer possibilidade de palestinos mais moderados governarem Gaza — a operação militar israelense lá começa a parecer uma matança sem fim, matar por matar. É exatamente isso que o Hamas, o Hezbollah e o Irã querem.

Sempre houve um caminho não trilhado. Se tenho certeza de que daria certo? Claro que não. A única coisa que tenho certeza é que o caminho em que Netanyahu jogou Israel agora é um caminho para a ruína, cercado por um anel de fogo. Se continuar nesse caminho, e as pessoas mais talentosas de Israel começarão a ir embora, e o Israel que conhecemos desaparecerá para sempre.

O que você faria?

Não há pergunta que o governo de Israel tenha feito ao mundo com mais frequência desde que o Hamas invadiu Israel em 7 de outubro e o Hezbollah atacou Israel em 8 de outubro.

O que seu país faria se terroristas cruzassem sua fronteira ocidental e matassem, mutilassem, sequestrassem ou abusassem sexualmente de centenas de israelenses que encontrassem e, no dia seguinte, seus aliados do Hezbollah enviassem foguetes sobre sua fronteira norte, afastando milhares de civis — tudo isso aplaudido pelo Irã?

Soldado israelense aguarda instruções em cima de um tanque no norte de Israel  Foto: Baz Ratner/AP

O que você faria?

É uma pergunta poderosa e relevante, e uma pergunta que os críticos de Israel frequentemente evitam.

Mas eles não são os únicos a evitá-la.

Este governo israelense, liderado por Binyamin Netanyahu, quer que você, eu e todos os israelenses e todos os amigos de Israel — e até mesmo inimigos — acreditemos que sempre houve apenas uma resposta certa para essa pergunta: invadir Gaza, caçar todos os líderes e combatentes do Hamas, matar até o último deles e não ser dissuadido pelas baixas civis, então massacrar o Hezbollah no Líbano — e fazer as duas coisas sem gastar tempo planejando uma estratégia de saída para nenhuma delas.

Eu argumentei desde o primeiro dia que era uma armadilha. Uma armadilha em que, lamento dizer, o governo Biden não foi firme o suficiente para impedir que Israel caísse, e não foi firme o suficiente para insistir em um caminho melhor, um caminho não trilhado.

Este não é o momento para contenção. O estado judeu de Israel está em perigo gravíssimo hoje. E o perigo vem tanto do Irã quanto da atual coalizão governante israelense.

Israelenses protestam pela volta dos reféns que estão na Faixa de Gaza  Foto: Gil Cohen-magen/AFP

Vejam, eu nunca tive ilusões quanto às razões mais amplas pelas quais essa guerra aconteceu. É o desdobramento de uma estratégia maior iraniana para destruir lentamente o estado judeu, enfraquecer os aliados árabes dos Estados Unidos e minar a influência americana na região — ao mesmo tempo em que dissuade Israel de atacar as instalações nucleares do Irã — usando representantes iranianos para sangrar Israel até a morte. Essa é a história mais ampla.

O gatilho e objetivo imediato da guerra foi um interesse iraniano e do Hamas em sabotar a iniciativa diplomática da equipe de Biden para reunir Israel, a Autoridade Palestina e a Arábia Saudita em um anel de paz.

A contraestratégia iraniana e do Hamas era acender um anel de fogo ao redor de Israel, usando o Hamas, o Hezbollah, os Houthis, milícias xiitas pró-iranianas no Iraque e militantes da Cisjordânia armados pelo Irã com armas contrabandeadas por meio da Jordânia. A estratégia iraniana é requintada do ponto de vista de Teerã: destruir Israel sacrificando tantos palestinos e libaneses quanto necessário, mas nunca arriscar uma única vida iraniana. Os iranianos estão prontos para morrer até o último libanês, o último palestino, o último sírio e o último iemenita para eliminar Israel (e distrair o mundo dos abusos do regime iraniano contra seu próprio povo e do controle imperialista sobre o Líbano, Iêmen, Iraque e Síria).

O presidente do Irã, Masoud Pezeshkian, discursa na Assembleia-Geral da ONU, em Nova York, Estados Unidos  Foto: Pamela Smith/AP

O problema para os israelenses e o povo judeu é que, embora o governo Netanyahu estivesse certo em seu diagnóstico de que esta era uma guerra de aniquilação, ele se recusou a conduzi-la da única maneira que poderia trazer uma esperança de sucesso — porque essa estratégia ia contra os interesses políticos do primeiro-ministro e os interesses ideológicos messiânicos de sua coalizão.

Israel enfrenta uma ameaça existencial de fora, e seu primeiro-ministro e seus aliados têm priorizado seus próprios interesses políticos e ideológicos em detrimento disso. Eles até ressuscitaram recentemente sua tentativa de golpe judicial para esmagar a Suprema Corte israelense — em meio a uma guerra de sobrevivência nacional enquanto reféns apodrecem em Gaza. É um dos episódios mais vergonhosos da história judaica, e é uma vergonha o lobby pró-Israel do AIPAC em Washington não se manifestar contra isso.

Para combater essa rede de ameaças iranianas, Israel precisava de quatro coisas: muito tempo, porque esse anel de fogo não poderia ser extinto da noite para o dia; muitos recursos, principalmente dos Estados Unidos e outros aliados ocidentais; muitos aliados árabes e europeus, porque Israel não pode lutar uma guerra de atrito sozinho; e, talvez o mais crucial de tudo, muita legitimidade.

O presidente Biden e sua equipe ofereceram a Israel um roteiro para essa contraestratégia, mas, infelizmente, eles nunca tiveram coragem de impô-la a Netanyahu com uma combinação de pressão, diplomacia e ultimatos. Esse roteiro envolveria persuadir os aliados árabes dos EUA a reformar fundamentalmente a Autoridade Palestina na Cisjordânia com uma liderança nova e confiável e, então, fazer com que Israel concordasse em abrir negociações com a liderança da Autoridade Palestina em um caminho de longo prazo para uma solução de dois estados.

Israelenses pedem que o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, faça um acordo para a soltura dos reféns que estão na Faixa de Gaza  Foto: Maya Alleruzzo/AP

Isso teria feito o seguinte: 1) Abriria caminho para isolar e pressionar o Hamas a concordar com um cessar-fogo no qual Israel sairia de Gaza em troca de todos os reféns, encerrando a guerra lá e eliminando o pretexto do Hezbollah para atacar Israel pelo norte. 2) Abriria caminho para a Arábia Saudita normalizar as relações com Israel, um golpe devastador para o Hamas e o Irã. 3) Abriria caminho para os Emirados Árabes Unidos fazerem parceria com uma Autoridade Palestina reformada para enviar tropas para Gaza e fazer o que o Hamas mais odiaria: substituí-lo como autoridade governante, apoiado por centenas de milhões de dólares para reconstruir Gaza, o que provavelmente faria dela a força palestina mais popular em Gaza da noite para o dia.

Até agora, porém, Bibi recusou a proposta de Biden (enquanto flerta abertamente com Donald Trump) porque o primeiro-ministro teria que romper com os malucos de direita que o levaram ao poder e formar uma coalizão governamental diferente com partidos mais moderados. Bibi priorizou sua segurança política pessoal em detrimento da segurança nacional de Israel. E, por meses, ele tem enrolado o mundo todo e seu próprio povo para disfarçar isso.

Netanyahu pensou que poderia simplesmente dizer ao mundo que Israel estava defendendo a fronteira da liberdade contra o Hamas, o Hezbollah, os Houthis e o Irã, e todos se alinhariam com Israel. O que você faria? Mas o único lugar no mundo onde isso lhe rende aplausos de pé é no Congresso dos EUA.

Serviços de emergência buscam sobreviventes e corpos após um bombardeio israelense no subúrbio de Beirute, Líbano  Foto: Bilal Hussein/AP

O resto do mundo, particularmente os estados árabes moderados e os europeus, disseram a ele: Bibi, a sua história não cola. Você não pode dizer ao mundo que está defendendo a fronteira da liberdade contra o Hamas e o Hezbollah enquanto expande — cada vez mais violentamente — a ocupação de colonos de Israel diante dos palestinos na Cisjordânia. A sua história não cola.

Então, o primeiro-ministro israelense optou pela doutrina Netanyahu: combater sozinho em três frentes — Gaza, Líbano e Cisjordânia — sem nenhum plano para o dia seguinte em lugar nenhum. Ao fazer isso, ele rejeitou a estratégia de Biden: incorporar Israel em uma coalizão EUA-Israel-árabes-moderados que isolaria o Irã e seus representantes, daria alguma esperança de que talvez um dia veríamos dois estados para dois povos nativos entre o Rio Jordão e o Mediterrâneo, e deixaria claro para o mundo que a fonte de problemas na região não é o Partido de Deus em Israel, mas os Partidos de Deus no Líbano, Iêmen e Irã.

A estratégia de Netanyahu é um desastre. Como um comandante militar veterano dos EUA que observou de perto a estratégia de guerra de Israel em Gaza me disse em particular, qualquer um com dois olhos na cabeça sabe que a única maneira de derrotar o Hamas é uma estratégia de “limpar, manter e construir”: destruir o inimigo, manter o território e então construir uma autoridade governamental palestina local alternativa e legítima. A estratégia de Israel em Gaza, ele disse, tem sido: “limpar, sair, voltar, limpar novamente o mesmo lugar, sair novamente, voltar e limpar novamente”.

Apoiadores da causa palestina protestam contra o discurso do primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, na Assembleia-Geral da ONU, em Nova York, Estados Unidos  Foto: Julia Demaree Nikhinson/AP

É um exemplo clássico de como transformar o Hamas “de uma insurgência quase militar para uma insurgência clássica”, acrescentou ele. Alguém leu o artigo principal no Haaretz online no dia do notável ataque israelense usando os pagers do Hezbollah? Quem leu, encontrou quatro jovens soldados israelenses mortos naquele dia lutando contra o Hamas em Gaza olhando para você — quase um ano após o início da guerra lá. Quase diariamente lemos também sobre um grande número de civis de Gaza mortos em uma operação israelense contra alguns combatentes do Hamas que vivem entre eles. Enquanto isso, ninguém está governando Gaza.

Sim, sim, eu já ouvi as críticas: estou delirando. Algum líder israelense ou palestino aceitaria tal plano? Bem, dois amigos meus fizeram exatamente isso: o ex-primeiro-ministro israelense, Ehud Olmert e o ex-ministro das Relações Exteriores da Autoridade Palestina, Nasser al-Qudwa. Podem conferir o plano deles para uma solução de dois estados aqui. Biden deve convidá-los para o Salão Oval na quinta-feira para incorporar o projeto deles, que está totalmente alinhado com os interesses dos EUA.

Repito: Israel está em terrível perigo. Está lutando a guerra mais justa de sua história — respondendo ao sequestro e assassinato brutal e não provocado de mulheres, crianças e avós pelo Hamas — e, no entanto, hoje Israel é mais um estado pária do que nunca.

Por quê? Quando se luta uma guerra como essa sem horizonte político por tanto tempo — uma guerra que nega qualquer possibilidade de palestinos mais moderados governarem Gaza — a operação militar israelense lá começa a parecer uma matança sem fim, matar por matar. É exatamente isso que o Hamas, o Hezbollah e o Irã querem.

Sempre houve um caminho não trilhado. Se tenho certeza de que daria certo? Claro que não. A única coisa que tenho certeza é que o caminho em que Netanyahu jogou Israel agora é um caminho para a ruína, cercado por um anel de fogo. Se continuar nesse caminho, e as pessoas mais talentosas de Israel começarão a ir embora, e o Israel que conhecemos desaparecerá para sempre.

O que você faria?

Não há pergunta que o governo de Israel tenha feito ao mundo com mais frequência desde que o Hamas invadiu Israel em 7 de outubro e o Hezbollah atacou Israel em 8 de outubro.

O que seu país faria se terroristas cruzassem sua fronteira ocidental e matassem, mutilassem, sequestrassem ou abusassem sexualmente de centenas de israelenses que encontrassem e, no dia seguinte, seus aliados do Hezbollah enviassem foguetes sobre sua fronteira norte, afastando milhares de civis — tudo isso aplaudido pelo Irã?

Soldado israelense aguarda instruções em cima de um tanque no norte de Israel  Foto: Baz Ratner/AP

O que você faria?

É uma pergunta poderosa e relevante, e uma pergunta que os críticos de Israel frequentemente evitam.

Mas eles não são os únicos a evitá-la.

Este governo israelense, liderado por Binyamin Netanyahu, quer que você, eu e todos os israelenses e todos os amigos de Israel — e até mesmo inimigos — acreditemos que sempre houve apenas uma resposta certa para essa pergunta: invadir Gaza, caçar todos os líderes e combatentes do Hamas, matar até o último deles e não ser dissuadido pelas baixas civis, então massacrar o Hezbollah no Líbano — e fazer as duas coisas sem gastar tempo planejando uma estratégia de saída para nenhuma delas.

Eu argumentei desde o primeiro dia que era uma armadilha. Uma armadilha em que, lamento dizer, o governo Biden não foi firme o suficiente para impedir que Israel caísse, e não foi firme o suficiente para insistir em um caminho melhor, um caminho não trilhado.

Este não é o momento para contenção. O estado judeu de Israel está em perigo gravíssimo hoje. E o perigo vem tanto do Irã quanto da atual coalizão governante israelense.

Israelenses protestam pela volta dos reféns que estão na Faixa de Gaza  Foto: Gil Cohen-magen/AFP

Vejam, eu nunca tive ilusões quanto às razões mais amplas pelas quais essa guerra aconteceu. É o desdobramento de uma estratégia maior iraniana para destruir lentamente o estado judeu, enfraquecer os aliados árabes dos Estados Unidos e minar a influência americana na região — ao mesmo tempo em que dissuade Israel de atacar as instalações nucleares do Irã — usando representantes iranianos para sangrar Israel até a morte. Essa é a história mais ampla.

O gatilho e objetivo imediato da guerra foi um interesse iraniano e do Hamas em sabotar a iniciativa diplomática da equipe de Biden para reunir Israel, a Autoridade Palestina e a Arábia Saudita em um anel de paz.

A contraestratégia iraniana e do Hamas era acender um anel de fogo ao redor de Israel, usando o Hamas, o Hezbollah, os Houthis, milícias xiitas pró-iranianas no Iraque e militantes da Cisjordânia armados pelo Irã com armas contrabandeadas por meio da Jordânia. A estratégia iraniana é requintada do ponto de vista de Teerã: destruir Israel sacrificando tantos palestinos e libaneses quanto necessário, mas nunca arriscar uma única vida iraniana. Os iranianos estão prontos para morrer até o último libanês, o último palestino, o último sírio e o último iemenita para eliminar Israel (e distrair o mundo dos abusos do regime iraniano contra seu próprio povo e do controle imperialista sobre o Líbano, Iêmen, Iraque e Síria).

O presidente do Irã, Masoud Pezeshkian, discursa na Assembleia-Geral da ONU, em Nova York, Estados Unidos  Foto: Pamela Smith/AP

O problema para os israelenses e o povo judeu é que, embora o governo Netanyahu estivesse certo em seu diagnóstico de que esta era uma guerra de aniquilação, ele se recusou a conduzi-la da única maneira que poderia trazer uma esperança de sucesso — porque essa estratégia ia contra os interesses políticos do primeiro-ministro e os interesses ideológicos messiânicos de sua coalizão.

Israel enfrenta uma ameaça existencial de fora, e seu primeiro-ministro e seus aliados têm priorizado seus próprios interesses políticos e ideológicos em detrimento disso. Eles até ressuscitaram recentemente sua tentativa de golpe judicial para esmagar a Suprema Corte israelense — em meio a uma guerra de sobrevivência nacional enquanto reféns apodrecem em Gaza. É um dos episódios mais vergonhosos da história judaica, e é uma vergonha o lobby pró-Israel do AIPAC em Washington não se manifestar contra isso.

Para combater essa rede de ameaças iranianas, Israel precisava de quatro coisas: muito tempo, porque esse anel de fogo não poderia ser extinto da noite para o dia; muitos recursos, principalmente dos Estados Unidos e outros aliados ocidentais; muitos aliados árabes e europeus, porque Israel não pode lutar uma guerra de atrito sozinho; e, talvez o mais crucial de tudo, muita legitimidade.

O presidente Biden e sua equipe ofereceram a Israel um roteiro para essa contraestratégia, mas, infelizmente, eles nunca tiveram coragem de impô-la a Netanyahu com uma combinação de pressão, diplomacia e ultimatos. Esse roteiro envolveria persuadir os aliados árabes dos EUA a reformar fundamentalmente a Autoridade Palestina na Cisjordânia com uma liderança nova e confiável e, então, fazer com que Israel concordasse em abrir negociações com a liderança da Autoridade Palestina em um caminho de longo prazo para uma solução de dois estados.

Israelenses pedem que o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, faça um acordo para a soltura dos reféns que estão na Faixa de Gaza  Foto: Maya Alleruzzo/AP

Isso teria feito o seguinte: 1) Abriria caminho para isolar e pressionar o Hamas a concordar com um cessar-fogo no qual Israel sairia de Gaza em troca de todos os reféns, encerrando a guerra lá e eliminando o pretexto do Hezbollah para atacar Israel pelo norte. 2) Abriria caminho para a Arábia Saudita normalizar as relações com Israel, um golpe devastador para o Hamas e o Irã. 3) Abriria caminho para os Emirados Árabes Unidos fazerem parceria com uma Autoridade Palestina reformada para enviar tropas para Gaza e fazer o que o Hamas mais odiaria: substituí-lo como autoridade governante, apoiado por centenas de milhões de dólares para reconstruir Gaza, o que provavelmente faria dela a força palestina mais popular em Gaza da noite para o dia.

Até agora, porém, Bibi recusou a proposta de Biden (enquanto flerta abertamente com Donald Trump) porque o primeiro-ministro teria que romper com os malucos de direita que o levaram ao poder e formar uma coalizão governamental diferente com partidos mais moderados. Bibi priorizou sua segurança política pessoal em detrimento da segurança nacional de Israel. E, por meses, ele tem enrolado o mundo todo e seu próprio povo para disfarçar isso.

Netanyahu pensou que poderia simplesmente dizer ao mundo que Israel estava defendendo a fronteira da liberdade contra o Hamas, o Hezbollah, os Houthis e o Irã, e todos se alinhariam com Israel. O que você faria? Mas o único lugar no mundo onde isso lhe rende aplausos de pé é no Congresso dos EUA.

Serviços de emergência buscam sobreviventes e corpos após um bombardeio israelense no subúrbio de Beirute, Líbano  Foto: Bilal Hussein/AP

O resto do mundo, particularmente os estados árabes moderados e os europeus, disseram a ele: Bibi, a sua história não cola. Você não pode dizer ao mundo que está defendendo a fronteira da liberdade contra o Hamas e o Hezbollah enquanto expande — cada vez mais violentamente — a ocupação de colonos de Israel diante dos palestinos na Cisjordânia. A sua história não cola.

Então, o primeiro-ministro israelense optou pela doutrina Netanyahu: combater sozinho em três frentes — Gaza, Líbano e Cisjordânia — sem nenhum plano para o dia seguinte em lugar nenhum. Ao fazer isso, ele rejeitou a estratégia de Biden: incorporar Israel em uma coalizão EUA-Israel-árabes-moderados que isolaria o Irã e seus representantes, daria alguma esperança de que talvez um dia veríamos dois estados para dois povos nativos entre o Rio Jordão e o Mediterrâneo, e deixaria claro para o mundo que a fonte de problemas na região não é o Partido de Deus em Israel, mas os Partidos de Deus no Líbano, Iêmen e Irã.

A estratégia de Netanyahu é um desastre. Como um comandante militar veterano dos EUA que observou de perto a estratégia de guerra de Israel em Gaza me disse em particular, qualquer um com dois olhos na cabeça sabe que a única maneira de derrotar o Hamas é uma estratégia de “limpar, manter e construir”: destruir o inimigo, manter o território e então construir uma autoridade governamental palestina local alternativa e legítima. A estratégia de Israel em Gaza, ele disse, tem sido: “limpar, sair, voltar, limpar novamente o mesmo lugar, sair novamente, voltar e limpar novamente”.

Apoiadores da causa palestina protestam contra o discurso do primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, na Assembleia-Geral da ONU, em Nova York, Estados Unidos  Foto: Julia Demaree Nikhinson/AP

É um exemplo clássico de como transformar o Hamas “de uma insurgência quase militar para uma insurgência clássica”, acrescentou ele. Alguém leu o artigo principal no Haaretz online no dia do notável ataque israelense usando os pagers do Hezbollah? Quem leu, encontrou quatro jovens soldados israelenses mortos naquele dia lutando contra o Hamas em Gaza olhando para você — quase um ano após o início da guerra lá. Quase diariamente lemos também sobre um grande número de civis de Gaza mortos em uma operação israelense contra alguns combatentes do Hamas que vivem entre eles. Enquanto isso, ninguém está governando Gaza.

Sim, sim, eu já ouvi as críticas: estou delirando. Algum líder israelense ou palestino aceitaria tal plano? Bem, dois amigos meus fizeram exatamente isso: o ex-primeiro-ministro israelense, Ehud Olmert e o ex-ministro das Relações Exteriores da Autoridade Palestina, Nasser al-Qudwa. Podem conferir o plano deles para uma solução de dois estados aqui. Biden deve convidá-los para o Salão Oval na quinta-feira para incorporar o projeto deles, que está totalmente alinhado com os interesses dos EUA.

Repito: Israel está em terrível perigo. Está lutando a guerra mais justa de sua história — respondendo ao sequestro e assassinato brutal e não provocado de mulheres, crianças e avós pelo Hamas — e, no entanto, hoje Israel é mais um estado pária do que nunca.

Por quê? Quando se luta uma guerra como essa sem horizonte político por tanto tempo — uma guerra que nega qualquer possibilidade de palestinos mais moderados governarem Gaza — a operação militar israelense lá começa a parecer uma matança sem fim, matar por matar. É exatamente isso que o Hamas, o Hezbollah e o Irã querem.

Sempre houve um caminho não trilhado. Se tenho certeza de que daria certo? Claro que não. A única coisa que tenho certeza é que o caminho em que Netanyahu jogou Israel agora é um caminho para a ruína, cercado por um anel de fogo. Se continuar nesse caminho, e as pessoas mais talentosas de Israel começarão a ir embora, e o Israel que conhecemos desaparecerá para sempre.

Opinião por Thomas Friedman

É ganhador do Pullitzer e colunista do NYT. Especialista em relações internacionais, escreveu 'De Beirute a Jerusalém'

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