SAINT PAUL (ESTADOS UNIDOS) - A garçonete Laney Thunder Bull trabalha em um restaurante em Grand Marais, no interior de Minnesota. Ela conta que a alta dos preços que afetou os Estados Unidos no pós-pandemia foi um dos motivos que a fizeram deixar a reserva onde ela vivia na Dakota do Sul para tentar uma vida melhor em Minnesota.
Ela foi atraída por um programa que conecta empregadores com jovens que estão procurando uma vaga de trabalho e exige que as empresas ofereçam moradia para os empregados. “Essa é a terceira temporada que venho para cá e agora estou pensando em ficar definitivamente. Na Dakota do Sul, é difícil conseguir um lugar para morar. E aqui, o programa providencia casa”, diz.
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A sensação de Laney, de que a vida está difícil e os preços estão altos, mesmo com a estabilização da inflação no último ano, se reflete na confiança do consumidor na economia americana. Esse índice mostra que a impressão do americano é a de que as coisas não vão bem.
Segundo uma pesquisa da Universidade de Michigan, mesmo com o avanço do PIB e a recuperação da atividade econômica a partir de 2021, a confiança do consumidor está em 67,9 pontos, ou 33,1 pontos a menos do registrado antes da pandemia.
O PIB americano deverá encerrar o governo Biden com um crescimento anual médio de 3,2%. O desempenho é o melhor para um presidente desde o segundo mandato de Bill Clinton, quando a média da alta do PIB foi de 4,45%.
Ainda assim, de acordo com a professora Joanne Hsu, responsável pelo levantamento, a insatisfação do americano decorre sobretudo do fato de os preços estarem em patamar elevado, ainda que a inflação esteja desacelerando. O índice deve ficar em 2,9% neste ano, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI). Em 2021, no entanto, ela chegou a 7% – patamar que não se via no país desde 1981, quando atingiu 8,9%.
Colunista de economia do jornal Star Tribune (o principal do estado de Minnesota), Christopher Farrell também aponta a inflação como uma das grandes responsáveis pelo descontentamento do americano. “Esse aumento da inflação não foi o maior da história, mas foi significativo e pegou as pessoas de surpresa. Apesar de os salários estarem subindo acima da inflação, os preços das coisas que realmente importam para as pessoas, como os do supermercado, estão altos. Mesmo que a inflação esteja caindo e a economia não esteja em recessão, quando as pessoas vão ao supermercado, elas ainda veem preços elevados e continuam preocupadas.”
Veronica Clark, economista do Citi para Estados Unidos, afirma que, além dos preços altos, o problema de os consumidores não conseguirem comprar uma casa tem feito a confiança permanecer em patamar baixo. “A pesquisa da Universidade de Michigan mostra que uma parte muito pequena dos consumidores acha que agora é um bom momento para se comprar um imóvel.”
Clarck destaca que o mercado de trabalho tem perdido força nos últimos meses, o que contribui para espalhar um sentimento de pessimismo pelo país. A taxa de desemprego começou a subir em fevereiro deste ano, passando de 3,9% para 4,2% em agosto.
A polarização política é outro fator que afeta o modo como os americanos veem a economia. “A confiança do consumidor é muito mais baixa entre os republicanos do que entre os democratas e também está abaixo dos níveis pré-pandemia entre os independentes”, diz Clarck.
A pesquisa da Universidade de Michigan mostra que a confiança do consumidor democrata, em setembro, estava em 92,6 pontos. Do republicado, em 47 pontos. A diferença, portanto, era de 45,6 pontos. Em setembro de 2020, último ano do governo Donald Trump e primeiro da pandemia, a confiança entre democratas era de 67,7 pontos e entre republicanos, de 98,9 pontos, uma diferença de 31,2 pontos – menor que a atual.
O que prometem os candidatos
A democrata Kamala Harris tem atacado grandes redes de supermercados, colocando-as como responsáveis pelo aumento de preços. Ela defende a adoção de políticas para garantir a concorrência no setor. Economistas, apontam, entretanto, que problemas na cadeia de abastecimento decorrentes da pandemia e aumento nos custos de trabalho têm pressionado os preços nos mercados.
Para facilitar a compra do primeiro imóvel por parte dos americanos, a democrata propôs a concessão de créditos fiscais de até US$ 25 mil e incentivos para construtoras. Há uma preocupação, entretanto, que esse crédito ao consumidor provoque um aumento de demanda de modo que o mercado não conseguirá atender, elevando ainda mais os preços dos imóveis.
O republicano Donald Trump não tem apresentado propostas para reduzir a inflação. Por outro lado, promete elevar as tarifas sobre importação de produtos chineses – o que pode pressionar ainda mais os preços no país. Em relação aos imóveis, Trump afirma que deverá permitir construções em terras federais e promete reduzir regulamentações (sem detalhar quais).
Para Clarck, do Citi, é difícil prever quais políticas econômicas o futuro presidente dos EUA conseguirá implementar. “Parece haver uma alta probabilidade de um Congresso dividido, caso em que muitas políticas provavelmente não serão aprovadas como lei. Mas, de maneira geral, vemos déficits fiscais mais amplos nos dois cenários. Poderia haver algumas políticas, como tarifas, que aumentariam o nível dos preços.”
A repórter viajou como bolsista do World Press Institute (WPI)