Milhares de manifestantes indígenas do Equador encerraram os protestos em Quito na noite de quinta-feira, 30, após um acordo com o governo de Guillermo Lasso para reduzir os preços dos combustíveis. O acordo encerra mais de duas semanas de protestos, que deixaram seis mortos.
O pacto prevê redução de cinco centavos por galão no preço do diesel e da gasolina, além dos 10 centavos já concedidos pelo Executivo no início da semana. Os indígenas exigiam um corte de 40 centavos. O governo deve ainda acabar com o estado de exceção, que possibilitou o uso das forças militares nacionais devido a “atos violentos” e desabastecimentos, causados pelos protestos.
Além disso, o acordo também prevê a revogação de um decreto de concessão de novos campos de petróleo e a reforma de outro, a fim de limitar a mineração em territórios indígenas e zonas de proteção hídrica.
O presidente direitista Guillermo Lasso comemorou o pacto no Twitter. “Conseguimos o valor supremo a que todos aspiramos: a paz em nosso país”, disse. “A greve acabou. Agora começamos juntos a tarefa de transformar essa paz em progresso, bem-estar e oportunidades para todos”, acrescentou.
“Certamente estamos cansados (...) Então é hora de voltar para a casinha”, disse o líder da Confederação de Nacionalidades Indígenas do Equador (Conaie), Leônidas Iza, diante de cerca de 4 mil indígenas que tomaram a Casa da Cultura, local simbólico para eles em Quito.
Os indígenas retornaram pacificamente ao interior do país em ônibus e caminhões, agitando bandeiras equatorianas e wiphala dos povos originários.
O acordo com mediado pela Igreja Católica e assinado por Leônidas Iza e pelo ministro do governo, Francisco Jiménez. Uma mesa de diálogo permanente também foi estabelecida para futuras demandas.
No evento, realizado na sede da Conferência Episcopal Equatoriana (CEE), as lideranças indígenas deram as mãos em uma corrente e as ergueram em triunfo.
A partir de agora, os novos preços dos combustíveis entrarão em vigor assim que o presidente emitir um decreto.
Entenda os protestos no Equador
Impeachment não avança
Guillermo Lasso, que assumiu o poder há 13 meses, conseguiu escapar na terça-feira de um impeachment tentado pelo Congresso, onde uma oposição majoritária, mas dividida, o culpou pela crise política. Os opositores não tiveram 12 votos para reunir os 92 necessários.
Uma tentativa anterior de negociação entre o governo e os indígenas havia sido suspensa por Lasso no mesmo dia, após um ataque a um comboio militar e policial na região da Amazônia equatoriana, atribuído aos manifestantes. O incidente resultou em um policial morto e 12 outros feridos.
As manifestações, que provocaram confrontos com as forças de segurança e marchas de cerca de 10 mil indígenas em Quito, deixaram pelo menos seis mortos e 600 feridos, entre agentes e manifestantes, e 150 detidos, segundo diversas fontes.
Cerca de 4 mil pessoas também se mobilizaram fora da capital, parando estradas em 19 das 24 províncias.
Para abrir caminho ao diálogo, Lasso decidiu no domingo baixar os preços do galão de diesel (para US$ 1,80) e da gasolina comum (para US$ 2,45) em 10 centavos de dólar, o que representa para o Estado cerca de 230 milhões de dólares por ano, segundo anunciou.
Antes, já havia aumentado um bônus econômico para os mais pobres de US$ 50 para US$ 55 e perdoado dívidas camponesas de até US$ 3 mil com bancos públicos.
“Prepare dias de luta”
A Conaie mantém o pedido de direcionar mais subsídios aos combustíveis para os camponeses, que antes dos protestos já representavam 3 bilhões de dólares anuais. “O direcionamento dos subsídios deve atender aqueles de que mais precisamos”, disse Leônidas Iza em seu comício no centro cultural, onde os indígenas se reuniram.
A Conaie, que participou de revoltas que derrubaram três presidentes entre 1997 e 2005, disse no Twitter que em noventa dias avaliará o cumprimento dos acordos. A entidade também liderou protestos em 2019 contra a eliminação dos subsídios aos combustíveis, que resultou em 11 mortes em conflitos com forças militares do país.
Antes de se despedir dos apoiadores, Iza os chamou à unidade para “preparar os próximos dias de luta”, com vistas a “alcançar sociedades mais justas e inclusivas”.
Lasso, por sua vez, reuniu-se com seu gabinete ministerial para “continuar a coordenação das melhores ações em benefício dos equatorianos”, como ele mesmo apontou no Twitter.
O Equador estimou perdas de 50 milhões de dólares para cada dia de manifestações, o que reduziu a produção de petróleo em menos da metade (de 520 mil barris por dia em 12 de junho) e ameaçou interromper toda a atividade de hidrocarbonetos. /AFP