Netanyahu adia reforma do Judiciário em Israel, em meio a greve geral e risco de colapso da coalizão


Primeiro-ministro precisou negociar com aliados de extrema direita da coalizão para adiar votação, enquanto israelenses fazem a maior greve na história do país e pedem a suspensão da reforma

Por Carolina Marins
Atualização:

JERUSALÉM - Pressionado por uma greve geral e sinais de dissidência nas Forças Armadas e em sua própria coalizão, o primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, adiou nesta segunda-feira, 27, a última votação da reforma do Judiciário, que amplia os poderes do Executivo na nomeação de juízes e é apontada por especialistas como uma ameaça à democracia do país.

A concessão ocorre depois de milhares de israelenses saírem às ruas espontaneamente entre ontem e hoje, depois que o premiê demitiu seu ministro da Defesa que criticou o projeto de lei. Em pronunciamento, Netanyahu disse que vai congelar a reforma até maio para um “diálogo real”.

O maior grupo sindical de Israel, Histadrut, que representa quase 800 mil trabalhadores em saúde, trânsito e bancos, liderou uma greve geral ao longo do dia de hoje, o que aumentou a pressão sobre Netanyahu para suspender a reforma. Após um dia inteiro de negociação com sua coalizão, com ameaça de rompimento de alguns partidos, Netanyahu concordou em adiar a votação. O movimento, dizem analistas, pode amenizar, mas não deve conter a crescente onda de protestos.

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Milhares de manifestantes ocupam as ruas de Israel nesta segunda Foto: Stringer/Reuters

Israel em chamas

A resistência ao plano de Netanyahu ganhou força ainda no domingo, 26, depois que dezenas de milhares de pessoas saíram às ruas em uma demonstração espontânea de raiva pela decisão do primeiro-ministro de demitir seu ministro da Defesa, Yoav Gallant. No sábado, Gallant, um dos moderados do gabinete, tinha pedido a suspensão da reforma.

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Cantando “o país está pegando fogo”, os manifestantes acenderam fogueiras na principal rodovia de Tel-Aviv, ainda na madrugada, paralisando a rodovia por horas. Pela manhã, em meio à paralisação, que afetou de lojas do McDonalds a hospitais e o principal aeroporto do país, milhares de manifestantes se reuniram em frente ao Parlamento de Israel para manter a pressão sobre o premiê.

A onda de protestos, no entanto, ampliou divisões dentro da própria coalizão de Netanyahu. Enquanto desde ontem ao menos dois ministros mais moderados sinalizavam seguir o caminho de Gallant e romper com o governo, caso ele mantivesse a reforma, o ministro de Segurança Nacional, Itamar Ben-Gvir, de extrema direita, seguiu no caminho oposto: prometeu renunciar se o premiê desistisse do projeto.

Uma renúncia de Ben-Gvir poderia levar à dissolução da coalizão e uma nova eleição teria de ser convocada se Netanyahu não conseguisse negociar com outros partidos para ter a maioria de 61 assentos no Parlamento. Com isso, o premiê ofereceu concessões ao ministro para suspender o projeto pelo menos até maio e tentar acalmar a crise. A principal concessão é a criação de uma guarda nacional sob o comando de Ben-Gvir.

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Bibi ganha tempo

“Netanyahu quer manter sua coalizão o tanto que ele conseguir, por isso ele decidiu demitir Gallant, que tomou o partido dos mais liberais nas Forças de Defesa e Segurança de Israel”, avalia Ido Zelkovitz, pesquisador e professor no Departamento de História do Oriente Médio na Universidade de Haifa. “Ao invés de ficar ao lado dos mais liberais, Netanyahu decidiu manter a sua coalizão viva. Nesse momento ele preferiu escolher Ben-Gvir em vez de Gallant.”

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A intenção ao adiar a votação é, além de buscar conversar com a própria coalizão e a oposição, é ver se os protestos diminuem conforme os feriados do Ramadã e da Páscoa Judaica começam. No entanto, segundo especialistas ouvidos pelo Estadão, a tendência é que os protestos continuem, já que a demanda é para que a reforma seja cancelada e não apenas congelada.

“Netanyahu está ganhando tempo”, pontua Karina Calandri, coordenadora de programas e projetos do Instituto Brasil-Israel (IBI) e doutora em Relações Internacionais. “Ele vai ter pelo menos mais duas semanas [após o feriado de Pessach] para talvez negociar com outro partido político para manter a coalizão. Mas também os opositores querem tirar o Netanyahu do poder, então ele tá numa situação em que ele está apostando em tudo o que ele tem.”

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EUA elogiam passo atrás

A decisão de Netanyahu foi celebrada dentro e fora de Israel. Opositores comemoraram, embora vejam com desconfiança a decisão ter vindo somente agora. “Antes tarde do que nunca”, afirmou o líder do partido Unidade Nacional, Benny Gantz. Já Yair Lapid disse estar aberto a negociações, desde que “não haja truques, apenas se a legislação for realmente interrompida”.

Os Estados Unidos, que foram os aliados que fizeram a crítica mais contundente em cima de Netanyahu, celebraram a decisão “Recebemos este anúncio como uma oportunidade para criar mais tempo e espaço para um compromisso”, disse a secretária de imprensa da Casa Branca Karine Jean-Pierre. “Um compromisso é precisamente o que temos pedido”. O Reino Unido, para onde Netanyahu viajou recentemente e foi pressionado por Rishi Sunak, também parabenizou a decisão.

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Manifestantes fizeram fogueiras e bloquearam uma rodovia depois do anúncio da demissão de Yoav Gallant  Foto: Ohad Zwigenberg / AP Photo

Uma concessão tardia

O cientista político e primeiro sargento da unidade dos Paraquedistas do Exército de Israel na reserva, Eitan Gottfried, tem ido aos protestos desde que começaram há trezes semanas, e observa que a decisão de Netanyahu já poderia ter sido tomada há muito tempo, mas ao menos agora abre espaço ao diálogo. “Felizmente [temos esse congelamento], depois de cinco eleições em 3 anos, uma tensão política e uma falta de confiança no sistema político.”

“Agora resta ver o que vai acontecer. Agora eles vão esperar um pouco, mas e quando chegar julho (fim do próximo período legislativo que vai de maio a julho) e não tiver um acordo geral? Vamos voltar a esse jogo de reforma e manifestações?”, questiona Gottfried, que nasceu no Brasil e se mudou para Israel há oito anos. “Mas eu acho que o que foi bonito pelo menos nessas últimas semanas foi ver pessoas que não concordavam, que não votaram em partidos distintos, se juntando e falando que se tem uma coisa que a gente concorda é em defender a democracia.”

Manifestantes se reúnem com bandeiras nacionais do lado de fora do Parlamento de Israel em Jerusalém nesta segunda-feira, 27  Foto: AHMAD GHARABLI / AFP

Os pontos da reforma

O projeto do governo de Netanyahu, um dos Executivos mais à direita na história de Israel, pretende aumentar o poder dos políticos sobre os juízes e diminuir o papel da Suprema Corte. Os críticos afirmam que a reforma ameaça a separação dos poderes e, portanto, o caráter democrático do Estado de Israel. A rejeição ao projeto provocou nos últimos meses um dos maiores movimentos populares de protestos da história do país.

Netanyahu havia prometido que a reforma seria votada esta semana. São necessárias três votações no Parlamento para que ela passe a valer, sendo que o texto já foi aprovado em duas votação com poucas modificações. A próxima votação, adiada para maio, será a última.

Ainda assim, o governo de Netanyahu avançou com uma peça central da reforma – uma lei que daria à coalizão governista a palavra final sobre todas as nomeações judiciais. Uma comissão parlamentar aprovou a legislação na segunda-feira para uma votação final, que pode ocorrer esta semana.

O governo também busca aprovar leis que dariam ao Knesset autoridade para anular as decisões da Suprema Corte e limitar a revisão judicial das leis.

Uma lei separada que contornaria uma decisão da Suprema Corte para permitir que um importante aliado da coalizão servisse como ministro foi adiada após um pedido do líder desse partido. /COM AP E NYT

Polícia de Israel entra em conflito com israelenses durante protesto em frente ao Parlamento Foto: Ariel Schalit / AP Photo

JERUSALÉM - Pressionado por uma greve geral e sinais de dissidência nas Forças Armadas e em sua própria coalizão, o primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, adiou nesta segunda-feira, 27, a última votação da reforma do Judiciário, que amplia os poderes do Executivo na nomeação de juízes e é apontada por especialistas como uma ameaça à democracia do país.

A concessão ocorre depois de milhares de israelenses saírem às ruas espontaneamente entre ontem e hoje, depois que o premiê demitiu seu ministro da Defesa que criticou o projeto de lei. Em pronunciamento, Netanyahu disse que vai congelar a reforma até maio para um “diálogo real”.

O maior grupo sindical de Israel, Histadrut, que representa quase 800 mil trabalhadores em saúde, trânsito e bancos, liderou uma greve geral ao longo do dia de hoje, o que aumentou a pressão sobre Netanyahu para suspender a reforma. Após um dia inteiro de negociação com sua coalizão, com ameaça de rompimento de alguns partidos, Netanyahu concordou em adiar a votação. O movimento, dizem analistas, pode amenizar, mas não deve conter a crescente onda de protestos.

Milhares de manifestantes ocupam as ruas de Israel nesta segunda Foto: Stringer/Reuters

Israel em chamas

A resistência ao plano de Netanyahu ganhou força ainda no domingo, 26, depois que dezenas de milhares de pessoas saíram às ruas em uma demonstração espontânea de raiva pela decisão do primeiro-ministro de demitir seu ministro da Defesa, Yoav Gallant. No sábado, Gallant, um dos moderados do gabinete, tinha pedido a suspensão da reforma.

Cantando “o país está pegando fogo”, os manifestantes acenderam fogueiras na principal rodovia de Tel-Aviv, ainda na madrugada, paralisando a rodovia por horas. Pela manhã, em meio à paralisação, que afetou de lojas do McDonalds a hospitais e o principal aeroporto do país, milhares de manifestantes se reuniram em frente ao Parlamento de Israel para manter a pressão sobre o premiê.

A onda de protestos, no entanto, ampliou divisões dentro da própria coalizão de Netanyahu. Enquanto desde ontem ao menos dois ministros mais moderados sinalizavam seguir o caminho de Gallant e romper com o governo, caso ele mantivesse a reforma, o ministro de Segurança Nacional, Itamar Ben-Gvir, de extrema direita, seguiu no caminho oposto: prometeu renunciar se o premiê desistisse do projeto.

Uma renúncia de Ben-Gvir poderia levar à dissolução da coalizão e uma nova eleição teria de ser convocada se Netanyahu não conseguisse negociar com outros partidos para ter a maioria de 61 assentos no Parlamento. Com isso, o premiê ofereceu concessões ao ministro para suspender o projeto pelo menos até maio e tentar acalmar a crise. A principal concessão é a criação de uma guarda nacional sob o comando de Ben-Gvir.

Bibi ganha tempo

“Netanyahu quer manter sua coalizão o tanto que ele conseguir, por isso ele decidiu demitir Gallant, que tomou o partido dos mais liberais nas Forças de Defesa e Segurança de Israel”, avalia Ido Zelkovitz, pesquisador e professor no Departamento de História do Oriente Médio na Universidade de Haifa. “Ao invés de ficar ao lado dos mais liberais, Netanyahu decidiu manter a sua coalizão viva. Nesse momento ele preferiu escolher Ben-Gvir em vez de Gallant.”

A intenção ao adiar a votação é, além de buscar conversar com a própria coalizão e a oposição, é ver se os protestos diminuem conforme os feriados do Ramadã e da Páscoa Judaica começam. No entanto, segundo especialistas ouvidos pelo Estadão, a tendência é que os protestos continuem, já que a demanda é para que a reforma seja cancelada e não apenas congelada.

“Netanyahu está ganhando tempo”, pontua Karina Calandri, coordenadora de programas e projetos do Instituto Brasil-Israel (IBI) e doutora em Relações Internacionais. “Ele vai ter pelo menos mais duas semanas [após o feriado de Pessach] para talvez negociar com outro partido político para manter a coalizão. Mas também os opositores querem tirar o Netanyahu do poder, então ele tá numa situação em que ele está apostando em tudo o que ele tem.”

EUA elogiam passo atrás

A decisão de Netanyahu foi celebrada dentro e fora de Israel. Opositores comemoraram, embora vejam com desconfiança a decisão ter vindo somente agora. “Antes tarde do que nunca”, afirmou o líder do partido Unidade Nacional, Benny Gantz. Já Yair Lapid disse estar aberto a negociações, desde que “não haja truques, apenas se a legislação for realmente interrompida”.

Os Estados Unidos, que foram os aliados que fizeram a crítica mais contundente em cima de Netanyahu, celebraram a decisão “Recebemos este anúncio como uma oportunidade para criar mais tempo e espaço para um compromisso”, disse a secretária de imprensa da Casa Branca Karine Jean-Pierre. “Um compromisso é precisamente o que temos pedido”. O Reino Unido, para onde Netanyahu viajou recentemente e foi pressionado por Rishi Sunak, também parabenizou a decisão.

Manifestantes fizeram fogueiras e bloquearam uma rodovia depois do anúncio da demissão de Yoav Gallant  Foto: Ohad Zwigenberg / AP Photo

Uma concessão tardia

O cientista político e primeiro sargento da unidade dos Paraquedistas do Exército de Israel na reserva, Eitan Gottfried, tem ido aos protestos desde que começaram há trezes semanas, e observa que a decisão de Netanyahu já poderia ter sido tomada há muito tempo, mas ao menos agora abre espaço ao diálogo. “Felizmente [temos esse congelamento], depois de cinco eleições em 3 anos, uma tensão política e uma falta de confiança no sistema político.”

“Agora resta ver o que vai acontecer. Agora eles vão esperar um pouco, mas e quando chegar julho (fim do próximo período legislativo que vai de maio a julho) e não tiver um acordo geral? Vamos voltar a esse jogo de reforma e manifestações?”, questiona Gottfried, que nasceu no Brasil e se mudou para Israel há oito anos. “Mas eu acho que o que foi bonito pelo menos nessas últimas semanas foi ver pessoas que não concordavam, que não votaram em partidos distintos, se juntando e falando que se tem uma coisa que a gente concorda é em defender a democracia.”

Manifestantes se reúnem com bandeiras nacionais do lado de fora do Parlamento de Israel em Jerusalém nesta segunda-feira, 27  Foto: AHMAD GHARABLI / AFP

Os pontos da reforma

O projeto do governo de Netanyahu, um dos Executivos mais à direita na história de Israel, pretende aumentar o poder dos políticos sobre os juízes e diminuir o papel da Suprema Corte. Os críticos afirmam que a reforma ameaça a separação dos poderes e, portanto, o caráter democrático do Estado de Israel. A rejeição ao projeto provocou nos últimos meses um dos maiores movimentos populares de protestos da história do país.

Netanyahu havia prometido que a reforma seria votada esta semana. São necessárias três votações no Parlamento para que ela passe a valer, sendo que o texto já foi aprovado em duas votação com poucas modificações. A próxima votação, adiada para maio, será a última.

Ainda assim, o governo de Netanyahu avançou com uma peça central da reforma – uma lei que daria à coalizão governista a palavra final sobre todas as nomeações judiciais. Uma comissão parlamentar aprovou a legislação na segunda-feira para uma votação final, que pode ocorrer esta semana.

O governo também busca aprovar leis que dariam ao Knesset autoridade para anular as decisões da Suprema Corte e limitar a revisão judicial das leis.

Uma lei separada que contornaria uma decisão da Suprema Corte para permitir que um importante aliado da coalizão servisse como ministro foi adiada após um pedido do líder desse partido. /COM AP E NYT

Polícia de Israel entra em conflito com israelenses durante protesto em frente ao Parlamento Foto: Ariel Schalit / AP Photo

JERUSALÉM - Pressionado por uma greve geral e sinais de dissidência nas Forças Armadas e em sua própria coalizão, o primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, adiou nesta segunda-feira, 27, a última votação da reforma do Judiciário, que amplia os poderes do Executivo na nomeação de juízes e é apontada por especialistas como uma ameaça à democracia do país.

A concessão ocorre depois de milhares de israelenses saírem às ruas espontaneamente entre ontem e hoje, depois que o premiê demitiu seu ministro da Defesa que criticou o projeto de lei. Em pronunciamento, Netanyahu disse que vai congelar a reforma até maio para um “diálogo real”.

O maior grupo sindical de Israel, Histadrut, que representa quase 800 mil trabalhadores em saúde, trânsito e bancos, liderou uma greve geral ao longo do dia de hoje, o que aumentou a pressão sobre Netanyahu para suspender a reforma. Após um dia inteiro de negociação com sua coalizão, com ameaça de rompimento de alguns partidos, Netanyahu concordou em adiar a votação. O movimento, dizem analistas, pode amenizar, mas não deve conter a crescente onda de protestos.

Milhares de manifestantes ocupam as ruas de Israel nesta segunda Foto: Stringer/Reuters

Israel em chamas

A resistência ao plano de Netanyahu ganhou força ainda no domingo, 26, depois que dezenas de milhares de pessoas saíram às ruas em uma demonstração espontânea de raiva pela decisão do primeiro-ministro de demitir seu ministro da Defesa, Yoav Gallant. No sábado, Gallant, um dos moderados do gabinete, tinha pedido a suspensão da reforma.

Cantando “o país está pegando fogo”, os manifestantes acenderam fogueiras na principal rodovia de Tel-Aviv, ainda na madrugada, paralisando a rodovia por horas. Pela manhã, em meio à paralisação, que afetou de lojas do McDonalds a hospitais e o principal aeroporto do país, milhares de manifestantes se reuniram em frente ao Parlamento de Israel para manter a pressão sobre o premiê.

A onda de protestos, no entanto, ampliou divisões dentro da própria coalizão de Netanyahu. Enquanto desde ontem ao menos dois ministros mais moderados sinalizavam seguir o caminho de Gallant e romper com o governo, caso ele mantivesse a reforma, o ministro de Segurança Nacional, Itamar Ben-Gvir, de extrema direita, seguiu no caminho oposto: prometeu renunciar se o premiê desistisse do projeto.

Uma renúncia de Ben-Gvir poderia levar à dissolução da coalizão e uma nova eleição teria de ser convocada se Netanyahu não conseguisse negociar com outros partidos para ter a maioria de 61 assentos no Parlamento. Com isso, o premiê ofereceu concessões ao ministro para suspender o projeto pelo menos até maio e tentar acalmar a crise. A principal concessão é a criação de uma guarda nacional sob o comando de Ben-Gvir.

Bibi ganha tempo

“Netanyahu quer manter sua coalizão o tanto que ele conseguir, por isso ele decidiu demitir Gallant, que tomou o partido dos mais liberais nas Forças de Defesa e Segurança de Israel”, avalia Ido Zelkovitz, pesquisador e professor no Departamento de História do Oriente Médio na Universidade de Haifa. “Ao invés de ficar ao lado dos mais liberais, Netanyahu decidiu manter a sua coalizão viva. Nesse momento ele preferiu escolher Ben-Gvir em vez de Gallant.”

A intenção ao adiar a votação é, além de buscar conversar com a própria coalizão e a oposição, é ver se os protestos diminuem conforme os feriados do Ramadã e da Páscoa Judaica começam. No entanto, segundo especialistas ouvidos pelo Estadão, a tendência é que os protestos continuem, já que a demanda é para que a reforma seja cancelada e não apenas congelada.

“Netanyahu está ganhando tempo”, pontua Karina Calandri, coordenadora de programas e projetos do Instituto Brasil-Israel (IBI) e doutora em Relações Internacionais. “Ele vai ter pelo menos mais duas semanas [após o feriado de Pessach] para talvez negociar com outro partido político para manter a coalizão. Mas também os opositores querem tirar o Netanyahu do poder, então ele tá numa situação em que ele está apostando em tudo o que ele tem.”

EUA elogiam passo atrás

A decisão de Netanyahu foi celebrada dentro e fora de Israel. Opositores comemoraram, embora vejam com desconfiança a decisão ter vindo somente agora. “Antes tarde do que nunca”, afirmou o líder do partido Unidade Nacional, Benny Gantz. Já Yair Lapid disse estar aberto a negociações, desde que “não haja truques, apenas se a legislação for realmente interrompida”.

Os Estados Unidos, que foram os aliados que fizeram a crítica mais contundente em cima de Netanyahu, celebraram a decisão “Recebemos este anúncio como uma oportunidade para criar mais tempo e espaço para um compromisso”, disse a secretária de imprensa da Casa Branca Karine Jean-Pierre. “Um compromisso é precisamente o que temos pedido”. O Reino Unido, para onde Netanyahu viajou recentemente e foi pressionado por Rishi Sunak, também parabenizou a decisão.

Manifestantes fizeram fogueiras e bloquearam uma rodovia depois do anúncio da demissão de Yoav Gallant  Foto: Ohad Zwigenberg / AP Photo

Uma concessão tardia

O cientista político e primeiro sargento da unidade dos Paraquedistas do Exército de Israel na reserva, Eitan Gottfried, tem ido aos protestos desde que começaram há trezes semanas, e observa que a decisão de Netanyahu já poderia ter sido tomada há muito tempo, mas ao menos agora abre espaço ao diálogo. “Felizmente [temos esse congelamento], depois de cinco eleições em 3 anos, uma tensão política e uma falta de confiança no sistema político.”

“Agora resta ver o que vai acontecer. Agora eles vão esperar um pouco, mas e quando chegar julho (fim do próximo período legislativo que vai de maio a julho) e não tiver um acordo geral? Vamos voltar a esse jogo de reforma e manifestações?”, questiona Gottfried, que nasceu no Brasil e se mudou para Israel há oito anos. “Mas eu acho que o que foi bonito pelo menos nessas últimas semanas foi ver pessoas que não concordavam, que não votaram em partidos distintos, se juntando e falando que se tem uma coisa que a gente concorda é em defender a democracia.”

Manifestantes se reúnem com bandeiras nacionais do lado de fora do Parlamento de Israel em Jerusalém nesta segunda-feira, 27  Foto: AHMAD GHARABLI / AFP

Os pontos da reforma

O projeto do governo de Netanyahu, um dos Executivos mais à direita na história de Israel, pretende aumentar o poder dos políticos sobre os juízes e diminuir o papel da Suprema Corte. Os críticos afirmam que a reforma ameaça a separação dos poderes e, portanto, o caráter democrático do Estado de Israel. A rejeição ao projeto provocou nos últimos meses um dos maiores movimentos populares de protestos da história do país.

Netanyahu havia prometido que a reforma seria votada esta semana. São necessárias três votações no Parlamento para que ela passe a valer, sendo que o texto já foi aprovado em duas votação com poucas modificações. A próxima votação, adiada para maio, será a última.

Ainda assim, o governo de Netanyahu avançou com uma peça central da reforma – uma lei que daria à coalizão governista a palavra final sobre todas as nomeações judiciais. Uma comissão parlamentar aprovou a legislação na segunda-feira para uma votação final, que pode ocorrer esta semana.

O governo também busca aprovar leis que dariam ao Knesset autoridade para anular as decisões da Suprema Corte e limitar a revisão judicial das leis.

Uma lei separada que contornaria uma decisão da Suprema Corte para permitir que um importante aliado da coalizão servisse como ministro foi adiada após um pedido do líder desse partido. /COM AP E NYT

Polícia de Israel entra em conflito com israelenses durante protesto em frente ao Parlamento Foto: Ariel Schalit / AP Photo

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