Após a Ucrânia empreender uma contraofensiva nas regiões leste e sul do país, territórios então dominados pela Rússia e alvos de anexação, o presidente russo, Vladimir Putin, reconheceu a necessidade de estabilizar o front de batalha nos próximos dias. As forças russas têm sofrido uma série de derrotas e foram obrigadas a recuar em pontos estratégicos, como na cidade de Liman, e Moscou tenta finalizar o processo de anexação para ter o pretexto de se defender com todas as armas.
Desde o dia 30 de setembro, a Ucrânia tem avançado em uma contraofensiva simultânea sobre dois dos quatro territórios que a Rússia realizou referendos para incorporá-los ao país. Em uma chamada de vídeo nesta quarta-feira, 5, Putin afirmou que parte do princípio que “a situação nos novos territórios se estabilizará”.
A declaração de Putin ocorre no momento em que correspondentes de guerra russos e blogueiros militares falam sobre a gravidade e das perdas russas nesses fronts, na região de Kherson, no sul, e no leste, em áreas de Luhansk e Donetsk. Os relatos são de uma retirada das forças russas em larga escala. “A retirada no leste é um desastre”, escreveu um repórter de guerra da televisão estatal russa, Roman Saponkov.
Para se ter dimensão das baixas, uma reportagem da BBC na Rússia disse recentemente que uma unidade de elite da inteligência militar russa pode ter perdido até 75% dos militares que estavam na Ucrânia. Nesta quarta-feira, as autoridades do sul da Ucrânia afirmaram que expandiu a área de controle na região de Kherson. O presidente ucraniano, Volodmir Zelenski, confirmou a recaptura de uma série de cidades.
Apesar de Putin ter assinado os últimos documentos para a conclusão da anexação dos territórios nesta sexta-feira, a Rússia ainda não determinou as fronteiras precisas que consideram, agora, parte do território russo. Putin prometeu, no entanto, que vai defender esses territórios com todos os meios à sua disposição, incluindo armas nucleares.
Pouco depois de Putin assinar os documentos, o chefe do gabinete de Zelenski, Andrii Iermak, afirmou que “as decisões inúteis do país terrorista não valem o papel em que são assinadas”, em um sinal de que as forças ucranianas não irão reconhecer os territórios como parte da Rússia. A comunidade internacional também não reconhece os referendos como legítimos.
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Controle da usina nuclear de Zaporizhzhia
Em meio ao processo de anexação, Putin também tenta fazer com que o Kremlin tenha o controle legítimo da usina nuclear de Zaporizhzhia, a maior da Europa. O líder do Kremlin assinou um decreto nesta quarta-feira que formaliza o controle, mas o diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), Rafael Grossi, informou que está a caminho de Kiev para assumir o controle e estabelecer uma zona de proteção ao redor da usina. Grossi pediu que os trabalhadores do local não assinem nenhum documento.
A Rússia conseguiu o controle militar de Zaporizhzhia durante a guerra, mas a operação da usina continua sob comando ucraniano. A usina fica localizada em uma das regiões que a Rússia pretende anexar – a de Zaporizhzhia. As outras três são as regiões de Luhansk e Donetsk, no leste, e Kherson, no sul.
Momento mais frágil da Rússia
Especialistas militares ouvidos pelo jornal britânico The Guardian avaliam que a Rússia vive o seu momento mais frágil na guerra. Segundo o Guardian, cerca de 15 mil das tropas mais bem treinadas da Rússia lutam para combater os ucranianos na região oeste de Kherson, o que reduziu as forças russas em outros lugares.
Na avaliação de Jack Watling, analista sênior do Royal United Services Institute, as tropas russas ao redor de Kherson recuaram para a segunda linha de defesa para encurtar o front. Ele afirma que não há sinais de rendição dos russos, como aconteceu na região de Kharkiv, mas se a Ucrânia conseguir romper a segunda linha de defesa as linhas de abastecimento da Rússia podem ser cortadas, isolando-os. “No momento, as pontes estão sendo atingidas por foguetes Himars, que são escassos e muito caros”, declarou Watling. “(Se avançarem mais) podem se dar ao luxo de abrir fogo contra alvos secundários”.
Apesar das perdas, o porta-voz da presidência russa, Dmitri Peskov, prometeu que Moscou recuperaria os territórios perdidos. “Esses territórios estarão com a Rússia para sempre, serão recuperados”, declarou.
Em paralelo, autoridades russas das áreas ocupadas garantem que as retiradas russas são “táticas e temporárias”. “O reagrupamento diante das condições atuais permite reunir forças e dar um golpe”, declarou Kirill Stremooussov à agência russa Ria Novosti. /AFP e AP