Quais são os próximos passos da guerra com a Rússia após Ucrânia admitir impasse? Leia análise


A contraofensiva ucraniana no sul, lançada em meados de junho, não alcançou o grande avanço que os líderes ucranianos e seus apoiadores no Ocidente esperavam

Por Max Boot

Na arte da guerra, atacar sempre foi mais difícil que defender. A guerra na Ucrânia demonstra que atacar ficou ainda mais difícil na era digital. O predomínio dos drones torna quase impossível avançar sem ser detectado, e a onipresença das munições guiadas de precisão — incluindo drones de ataque — facilita às tropas alvejar soldados e tanques inimigos em movimento.

Os russos descobriram por si mesmos as dificuldades da guerra ofensiva durante sua invasão inicial à Ucrânia — e novamente durante ofensivas mais recentes em Bakhmut e agora em Avdiivka. Soldados russos foram destroçados em ataques “moedores de carne” durante avanços modestos.

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Os ucranianos tiveram mais sucesso com suas contraofensivas no ano passado: conseguiram retomar aproximadamente metade do território que a Rússia ocupou inicialmente em 2022, com ganhos especialmente impressionantes em Kherson, no sul, e Kharkiv, no oeste, antes dos russos conseguirem fortificar suas posições. Mas a contraofensiva ucraniana no sul lançada em meados de junho não alcançou o grande avanço que os líderes ucranianos e seus apoiadores no Ocidente esperavam.

Soldados ucranianos se preparam para disparar foguetes na linha de frente em Zaporizhzhia, Ucrânia, em novembro de 2023 Foto: Kateryna Klochko / EFE

Após quase cinco meses de combates intensos, os ucranianos avançaram meros 16 quilômetros. Não estão próximos de chegar o Mar de Azov e assim romper a “ponte terrestre” entre a Crimeia e a Rússia, o que, segundo me disse em janeiro o secretário da Defesa dos Estados Unidos, Lloyd Austin, era um “objetivo realista para este ano”.

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Na semana passada, o mais graduado general ucraniano, Valeri Zaluzhni, admitiu para a revista The Economist que a guerra estava “estagnada” e que “muito provavelmente não haverá nenhum belo avanço mais profundo”, a não ser que a Ucrânia consiga de alguma maneira obter uma vantagem tecnológica sobre os russos.

Por que a Ucrânia não obteve mais sucesso? Nos bastidores, autoridades de Kiev e Washington apontam os dedos umas para as outras. Os americanos resmungam privadamente que os ucranianos não desempenharam bem na execução de uma ofensiva de armas combinadas no estilo da Otan e regrediram para o tipo de guerra de atrito que caracterizava a estratégia militar soviética, ao mesmo tempo que desviaram soldados necessários para esforços complementares em torno de Bakhmut.

Os ucranianos, por sua vez, reclamam que o Ocidente não lhes deu armas suficientes para romper as fortificações russas e que muitos armamentos que eles receberam não estão em boas condições de funcionamento. A Ucrânia não possui equipamentos de desminagem e blindados o suficiente — e, mais importante, não possui força aérea suficiente para evitar que as aeronaves russas convencionais e não tripuladas ataquem os soldados ucranianos enquanto eles tentam atravessar campos minados.

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Soldados americanos jamais atacariam posições entrincheiradas sem superioridade aérea, mas era exatamente isso que o Pentágono esperava dos soldados ucranianos. E o governo Biden só enviou tanques M1 Abrams e sistemas de mísseis táticos do Exército (ATACMS) neste outono (Hemisfério Norte) — tarde demais para influenciar a contraofensiva do verão.

“A Ucrânia tem pedido armas o tempo todo, e a resposta tem sido, ‘Sim, elas estão chegando, logo elas chegam’; mas o envio demorou, e a Europa disse, ‘Desculpem, mas não temos armas o suficiente’”, disse-me o ex-ministro ucraniano da Defesa Andrii Zagorodniuk, na semana passada, de Kiev. “De muitas maneiras, a Ucrânia foi posicionada para fracassar em relação a expectativas excessivas sobre um ganho territorial massivo”, confirmou Alina Polyakova, presidente do Centro de Análise de Política Europeia, em Washington.

Exército da Ucrânia em um veículo de combate durante combates com a Rússia em Zaporizhzhia, Ucrânia, em novembro de 2023 Foto: Stringer via REUTERS
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Então o que os ucranianos — e seus apoiadores no Ocidente — deveriam fazer agora? Muitos argumentarão que, com o fracasso desta contraofensiva, é hora de se costurar um acordo com o Kremlin. Mas não há indicações consistentes de que o ditador russo, Vladimir Putin, esteja disposto a abrir qualquer concessão ou desistir de seu objetivo de engolir a Ucrânia.

Os reveses militares da Ucrânia — e a diminuição do apoio à causa de Kiev entre os republicanos no Congresso — apenas o encorajam a manter a expectativa de que ele prevalecerá sobre seus inimigos. “A única razão que fará Putin parar com a guerra é ele ser impedido fisicamente e não ter outra escolha”, disse-me Zagorodniuk. “Ele não vai parar a guerra enquanto conseguir continuar; ele parará apenas quando não puder mais seguir com o conflito.”

Portanto, os ucranianos cansados com guerra não têm escolha a não ser continuar lutando se quiserem evitar que seu país seja ocupado por criminosos de guerra que cometem atrocidades abomináveis contra civis inocentes. E nós não temos outra escolha a não ser continuar apoiando os ucranianos.

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Os EUA têm um imperativo estratégico em jogo: os ucranianos estão infligindo baixas massivas às Forças Armadas russas, que diminuirão o nível da ameaça representada pela Rússia à Otan e seus vizinhos por anos. Há também um imperativo humanitário: armando a Ucrânia, nós estamos salvando vidas inocentes.

O Ocidente deve, particularmente, continuar a fornecer munição de defesa antiaérea para impedir os ataques aéreos que Putin deverá lançar proximamente contra cidades ucranianas para torná-las inabitáveis. “Os russos tentarão destruir a Ucrânia no inverno”, disse-me uma autoridade de governo. “Nós precisamos impedir que isso aconteça.”

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Mais amplamente, o Ocidente deveria dar a Zaluzhni o que ele precisa. Num artigo que a Economist publicou juntamente com sua entrevista, ele pediu mais drones para atacar as tropas russas, sistemas de guerra eletrônica para defender-se contra os drones russos, radares melhores de contrabateria, tecnologia avançada de neutralização de minas e mais ajuda para treinar e mobilizar reservistas.

Militares ucranianos disparam foguetes Partyzan contra tropas russas perto da linha de frente de Zaporizhzhia, Ucrânia, em novembro de 2023 Foto: Stringer/Reuters

O tenente-general aposentado Frederick “Ben” Hodges, ex-comandante das forças dos EUA na Europa, enfatizou para mim que a Ucrânia ainda precisa de muito mais capacidade de ataque de longo alcance na forma de mísseis de cruzeiro, caças de combate F-16 e ATACMS para atingir aeroportos e centros de logística russos na Crimeia ocupada.

Mesmo se as forças terrestres ucranianas mudarem para uma estratégia mais defensiva durante o inverno, a Ucrânia pode continuar a destruir linhas de suprimento e postos de comando da Rússia. Hodges aponta que todas as posições russas no sul da Ucrânia são abastecidas a partir da Crimeia, “então, se você consegue fazer a Marinha, a Força Aérea e a logística russa se realocar, você muda o cálculo inteiro do lado russo”.

A Ucrânia já demonstrou que é capaz de vencer com táticas assimétricas. Sua maior vitória nos meses recentes não foi em terra, foi no mar, apesar dos ucranianos não terem uma Marinha propriamente dita. A Ucrânia alcançou um grande sucesso usando drones e mísseis de cruzeiro para atacar navios da Frota Russa no Mar Negro, portos e bases.

No início de outubro, a frota russa foi forçada a deixar seu ancoradouro histórico em Sevastopol, na Crimeia, e realocou-se no Porto de Novorossiisk, na Rússia. Como resultado, a Ucrânia pôde voltar a exportar grãos pelo Mar Negro.

Navio com grãos ucranianos passa por Istambul, Turquia  Foto: Yoruk Isik/Reuters

Ninguém esperava que a Ucrânia conseguiria continuar a exportar grãos depois que a Rússia se retirou, neste verão, do acordo que garantia o fluxo. Mas a Ucrânia deu um jeito. Portanto, nós também precisamos manter a fé e acreditar que os ucranianos encontrarão uma maneira de continuar a defender seu país e expulsar gradualmente a ocupação russa.

Se o Congresso continuar financiando a Ucrânia e se o presidente Joe Biden derrotar seu provável oponente, o ex-presidente Donald Trump, em 2024 (duas incertezas neste momento), Putin se confrontará com a realidade de que não conseguirá vencer esta guerra. Mas se o nosso apoio à Ucrânia se abalar, Putin poderá emergir como vencedor de sua guerra de agressão — com consequências assustadoras para o mundo inteiro.

Muitos americanos afirmam que estão se cansando dessa guerra. Mas nós estamos arriscando apenas 0,65% do orçamento federal para apoiar a Ucrânia. Os ucranianos estão arriscando suas vidas. Eles também estão cansados, mas sabem que não podem desistir da luta. Nós também não. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

Na arte da guerra, atacar sempre foi mais difícil que defender. A guerra na Ucrânia demonstra que atacar ficou ainda mais difícil na era digital. O predomínio dos drones torna quase impossível avançar sem ser detectado, e a onipresença das munições guiadas de precisão — incluindo drones de ataque — facilita às tropas alvejar soldados e tanques inimigos em movimento.

Os russos descobriram por si mesmos as dificuldades da guerra ofensiva durante sua invasão inicial à Ucrânia — e novamente durante ofensivas mais recentes em Bakhmut e agora em Avdiivka. Soldados russos foram destroçados em ataques “moedores de carne” durante avanços modestos.

Os ucranianos tiveram mais sucesso com suas contraofensivas no ano passado: conseguiram retomar aproximadamente metade do território que a Rússia ocupou inicialmente em 2022, com ganhos especialmente impressionantes em Kherson, no sul, e Kharkiv, no oeste, antes dos russos conseguirem fortificar suas posições. Mas a contraofensiva ucraniana no sul lançada em meados de junho não alcançou o grande avanço que os líderes ucranianos e seus apoiadores no Ocidente esperavam.

Soldados ucranianos se preparam para disparar foguetes na linha de frente em Zaporizhzhia, Ucrânia, em novembro de 2023 Foto: Kateryna Klochko / EFE

Após quase cinco meses de combates intensos, os ucranianos avançaram meros 16 quilômetros. Não estão próximos de chegar o Mar de Azov e assim romper a “ponte terrestre” entre a Crimeia e a Rússia, o que, segundo me disse em janeiro o secretário da Defesa dos Estados Unidos, Lloyd Austin, era um “objetivo realista para este ano”.

Na semana passada, o mais graduado general ucraniano, Valeri Zaluzhni, admitiu para a revista The Economist que a guerra estava “estagnada” e que “muito provavelmente não haverá nenhum belo avanço mais profundo”, a não ser que a Ucrânia consiga de alguma maneira obter uma vantagem tecnológica sobre os russos.

Por que a Ucrânia não obteve mais sucesso? Nos bastidores, autoridades de Kiev e Washington apontam os dedos umas para as outras. Os americanos resmungam privadamente que os ucranianos não desempenharam bem na execução de uma ofensiva de armas combinadas no estilo da Otan e regrediram para o tipo de guerra de atrito que caracterizava a estratégia militar soviética, ao mesmo tempo que desviaram soldados necessários para esforços complementares em torno de Bakhmut.

Os ucranianos, por sua vez, reclamam que o Ocidente não lhes deu armas suficientes para romper as fortificações russas e que muitos armamentos que eles receberam não estão em boas condições de funcionamento. A Ucrânia não possui equipamentos de desminagem e blindados o suficiente — e, mais importante, não possui força aérea suficiente para evitar que as aeronaves russas convencionais e não tripuladas ataquem os soldados ucranianos enquanto eles tentam atravessar campos minados.

Soldados americanos jamais atacariam posições entrincheiradas sem superioridade aérea, mas era exatamente isso que o Pentágono esperava dos soldados ucranianos. E o governo Biden só enviou tanques M1 Abrams e sistemas de mísseis táticos do Exército (ATACMS) neste outono (Hemisfério Norte) — tarde demais para influenciar a contraofensiva do verão.

“A Ucrânia tem pedido armas o tempo todo, e a resposta tem sido, ‘Sim, elas estão chegando, logo elas chegam’; mas o envio demorou, e a Europa disse, ‘Desculpem, mas não temos armas o suficiente’”, disse-me o ex-ministro ucraniano da Defesa Andrii Zagorodniuk, na semana passada, de Kiev. “De muitas maneiras, a Ucrânia foi posicionada para fracassar em relação a expectativas excessivas sobre um ganho territorial massivo”, confirmou Alina Polyakova, presidente do Centro de Análise de Política Europeia, em Washington.

Exército da Ucrânia em um veículo de combate durante combates com a Rússia em Zaporizhzhia, Ucrânia, em novembro de 2023 Foto: Stringer via REUTERS

Então o que os ucranianos — e seus apoiadores no Ocidente — deveriam fazer agora? Muitos argumentarão que, com o fracasso desta contraofensiva, é hora de se costurar um acordo com o Kremlin. Mas não há indicações consistentes de que o ditador russo, Vladimir Putin, esteja disposto a abrir qualquer concessão ou desistir de seu objetivo de engolir a Ucrânia.

Os reveses militares da Ucrânia — e a diminuição do apoio à causa de Kiev entre os republicanos no Congresso — apenas o encorajam a manter a expectativa de que ele prevalecerá sobre seus inimigos. “A única razão que fará Putin parar com a guerra é ele ser impedido fisicamente e não ter outra escolha”, disse-me Zagorodniuk. “Ele não vai parar a guerra enquanto conseguir continuar; ele parará apenas quando não puder mais seguir com o conflito.”

Portanto, os ucranianos cansados com guerra não têm escolha a não ser continuar lutando se quiserem evitar que seu país seja ocupado por criminosos de guerra que cometem atrocidades abomináveis contra civis inocentes. E nós não temos outra escolha a não ser continuar apoiando os ucranianos.

Os EUA têm um imperativo estratégico em jogo: os ucranianos estão infligindo baixas massivas às Forças Armadas russas, que diminuirão o nível da ameaça representada pela Rússia à Otan e seus vizinhos por anos. Há também um imperativo humanitário: armando a Ucrânia, nós estamos salvando vidas inocentes.

O Ocidente deve, particularmente, continuar a fornecer munição de defesa antiaérea para impedir os ataques aéreos que Putin deverá lançar proximamente contra cidades ucranianas para torná-las inabitáveis. “Os russos tentarão destruir a Ucrânia no inverno”, disse-me uma autoridade de governo. “Nós precisamos impedir que isso aconteça.”

Mais amplamente, o Ocidente deveria dar a Zaluzhni o que ele precisa. Num artigo que a Economist publicou juntamente com sua entrevista, ele pediu mais drones para atacar as tropas russas, sistemas de guerra eletrônica para defender-se contra os drones russos, radares melhores de contrabateria, tecnologia avançada de neutralização de minas e mais ajuda para treinar e mobilizar reservistas.

Militares ucranianos disparam foguetes Partyzan contra tropas russas perto da linha de frente de Zaporizhzhia, Ucrânia, em novembro de 2023 Foto: Stringer/Reuters

O tenente-general aposentado Frederick “Ben” Hodges, ex-comandante das forças dos EUA na Europa, enfatizou para mim que a Ucrânia ainda precisa de muito mais capacidade de ataque de longo alcance na forma de mísseis de cruzeiro, caças de combate F-16 e ATACMS para atingir aeroportos e centros de logística russos na Crimeia ocupada.

Mesmo se as forças terrestres ucranianas mudarem para uma estratégia mais defensiva durante o inverno, a Ucrânia pode continuar a destruir linhas de suprimento e postos de comando da Rússia. Hodges aponta que todas as posições russas no sul da Ucrânia são abastecidas a partir da Crimeia, “então, se você consegue fazer a Marinha, a Força Aérea e a logística russa se realocar, você muda o cálculo inteiro do lado russo”.

A Ucrânia já demonstrou que é capaz de vencer com táticas assimétricas. Sua maior vitória nos meses recentes não foi em terra, foi no mar, apesar dos ucranianos não terem uma Marinha propriamente dita. A Ucrânia alcançou um grande sucesso usando drones e mísseis de cruzeiro para atacar navios da Frota Russa no Mar Negro, portos e bases.

No início de outubro, a frota russa foi forçada a deixar seu ancoradouro histórico em Sevastopol, na Crimeia, e realocou-se no Porto de Novorossiisk, na Rússia. Como resultado, a Ucrânia pôde voltar a exportar grãos pelo Mar Negro.

Navio com grãos ucranianos passa por Istambul, Turquia  Foto: Yoruk Isik/Reuters

Ninguém esperava que a Ucrânia conseguiria continuar a exportar grãos depois que a Rússia se retirou, neste verão, do acordo que garantia o fluxo. Mas a Ucrânia deu um jeito. Portanto, nós também precisamos manter a fé e acreditar que os ucranianos encontrarão uma maneira de continuar a defender seu país e expulsar gradualmente a ocupação russa.

Se o Congresso continuar financiando a Ucrânia e se o presidente Joe Biden derrotar seu provável oponente, o ex-presidente Donald Trump, em 2024 (duas incertezas neste momento), Putin se confrontará com a realidade de que não conseguirá vencer esta guerra. Mas se o nosso apoio à Ucrânia se abalar, Putin poderá emergir como vencedor de sua guerra de agressão — com consequências assustadoras para o mundo inteiro.

Muitos americanos afirmam que estão se cansando dessa guerra. Mas nós estamos arriscando apenas 0,65% do orçamento federal para apoiar a Ucrânia. Os ucranianos estão arriscando suas vidas. Eles também estão cansados, mas sabem que não podem desistir da luta. Nós também não. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

Na arte da guerra, atacar sempre foi mais difícil que defender. A guerra na Ucrânia demonstra que atacar ficou ainda mais difícil na era digital. O predomínio dos drones torna quase impossível avançar sem ser detectado, e a onipresença das munições guiadas de precisão — incluindo drones de ataque — facilita às tropas alvejar soldados e tanques inimigos em movimento.

Os russos descobriram por si mesmos as dificuldades da guerra ofensiva durante sua invasão inicial à Ucrânia — e novamente durante ofensivas mais recentes em Bakhmut e agora em Avdiivka. Soldados russos foram destroçados em ataques “moedores de carne” durante avanços modestos.

Os ucranianos tiveram mais sucesso com suas contraofensivas no ano passado: conseguiram retomar aproximadamente metade do território que a Rússia ocupou inicialmente em 2022, com ganhos especialmente impressionantes em Kherson, no sul, e Kharkiv, no oeste, antes dos russos conseguirem fortificar suas posições. Mas a contraofensiva ucraniana no sul lançada em meados de junho não alcançou o grande avanço que os líderes ucranianos e seus apoiadores no Ocidente esperavam.

Soldados ucranianos se preparam para disparar foguetes na linha de frente em Zaporizhzhia, Ucrânia, em novembro de 2023 Foto: Kateryna Klochko / EFE

Após quase cinco meses de combates intensos, os ucranianos avançaram meros 16 quilômetros. Não estão próximos de chegar o Mar de Azov e assim romper a “ponte terrestre” entre a Crimeia e a Rússia, o que, segundo me disse em janeiro o secretário da Defesa dos Estados Unidos, Lloyd Austin, era um “objetivo realista para este ano”.

Na semana passada, o mais graduado general ucraniano, Valeri Zaluzhni, admitiu para a revista The Economist que a guerra estava “estagnada” e que “muito provavelmente não haverá nenhum belo avanço mais profundo”, a não ser que a Ucrânia consiga de alguma maneira obter uma vantagem tecnológica sobre os russos.

Por que a Ucrânia não obteve mais sucesso? Nos bastidores, autoridades de Kiev e Washington apontam os dedos umas para as outras. Os americanos resmungam privadamente que os ucranianos não desempenharam bem na execução de uma ofensiva de armas combinadas no estilo da Otan e regrediram para o tipo de guerra de atrito que caracterizava a estratégia militar soviética, ao mesmo tempo que desviaram soldados necessários para esforços complementares em torno de Bakhmut.

Os ucranianos, por sua vez, reclamam que o Ocidente não lhes deu armas suficientes para romper as fortificações russas e que muitos armamentos que eles receberam não estão em boas condições de funcionamento. A Ucrânia não possui equipamentos de desminagem e blindados o suficiente — e, mais importante, não possui força aérea suficiente para evitar que as aeronaves russas convencionais e não tripuladas ataquem os soldados ucranianos enquanto eles tentam atravessar campos minados.

Soldados americanos jamais atacariam posições entrincheiradas sem superioridade aérea, mas era exatamente isso que o Pentágono esperava dos soldados ucranianos. E o governo Biden só enviou tanques M1 Abrams e sistemas de mísseis táticos do Exército (ATACMS) neste outono (Hemisfério Norte) — tarde demais para influenciar a contraofensiva do verão.

“A Ucrânia tem pedido armas o tempo todo, e a resposta tem sido, ‘Sim, elas estão chegando, logo elas chegam’; mas o envio demorou, e a Europa disse, ‘Desculpem, mas não temos armas o suficiente’”, disse-me o ex-ministro ucraniano da Defesa Andrii Zagorodniuk, na semana passada, de Kiev. “De muitas maneiras, a Ucrânia foi posicionada para fracassar em relação a expectativas excessivas sobre um ganho territorial massivo”, confirmou Alina Polyakova, presidente do Centro de Análise de Política Europeia, em Washington.

Exército da Ucrânia em um veículo de combate durante combates com a Rússia em Zaporizhzhia, Ucrânia, em novembro de 2023 Foto: Stringer via REUTERS

Então o que os ucranianos — e seus apoiadores no Ocidente — deveriam fazer agora? Muitos argumentarão que, com o fracasso desta contraofensiva, é hora de se costurar um acordo com o Kremlin. Mas não há indicações consistentes de que o ditador russo, Vladimir Putin, esteja disposto a abrir qualquer concessão ou desistir de seu objetivo de engolir a Ucrânia.

Os reveses militares da Ucrânia — e a diminuição do apoio à causa de Kiev entre os republicanos no Congresso — apenas o encorajam a manter a expectativa de que ele prevalecerá sobre seus inimigos. “A única razão que fará Putin parar com a guerra é ele ser impedido fisicamente e não ter outra escolha”, disse-me Zagorodniuk. “Ele não vai parar a guerra enquanto conseguir continuar; ele parará apenas quando não puder mais seguir com o conflito.”

Portanto, os ucranianos cansados com guerra não têm escolha a não ser continuar lutando se quiserem evitar que seu país seja ocupado por criminosos de guerra que cometem atrocidades abomináveis contra civis inocentes. E nós não temos outra escolha a não ser continuar apoiando os ucranianos.

Os EUA têm um imperativo estratégico em jogo: os ucranianos estão infligindo baixas massivas às Forças Armadas russas, que diminuirão o nível da ameaça representada pela Rússia à Otan e seus vizinhos por anos. Há também um imperativo humanitário: armando a Ucrânia, nós estamos salvando vidas inocentes.

O Ocidente deve, particularmente, continuar a fornecer munição de defesa antiaérea para impedir os ataques aéreos que Putin deverá lançar proximamente contra cidades ucranianas para torná-las inabitáveis. “Os russos tentarão destruir a Ucrânia no inverno”, disse-me uma autoridade de governo. “Nós precisamos impedir que isso aconteça.”

Mais amplamente, o Ocidente deveria dar a Zaluzhni o que ele precisa. Num artigo que a Economist publicou juntamente com sua entrevista, ele pediu mais drones para atacar as tropas russas, sistemas de guerra eletrônica para defender-se contra os drones russos, radares melhores de contrabateria, tecnologia avançada de neutralização de minas e mais ajuda para treinar e mobilizar reservistas.

Militares ucranianos disparam foguetes Partyzan contra tropas russas perto da linha de frente de Zaporizhzhia, Ucrânia, em novembro de 2023 Foto: Stringer/Reuters

O tenente-general aposentado Frederick “Ben” Hodges, ex-comandante das forças dos EUA na Europa, enfatizou para mim que a Ucrânia ainda precisa de muito mais capacidade de ataque de longo alcance na forma de mísseis de cruzeiro, caças de combate F-16 e ATACMS para atingir aeroportos e centros de logística russos na Crimeia ocupada.

Mesmo se as forças terrestres ucranianas mudarem para uma estratégia mais defensiva durante o inverno, a Ucrânia pode continuar a destruir linhas de suprimento e postos de comando da Rússia. Hodges aponta que todas as posições russas no sul da Ucrânia são abastecidas a partir da Crimeia, “então, se você consegue fazer a Marinha, a Força Aérea e a logística russa se realocar, você muda o cálculo inteiro do lado russo”.

A Ucrânia já demonstrou que é capaz de vencer com táticas assimétricas. Sua maior vitória nos meses recentes não foi em terra, foi no mar, apesar dos ucranianos não terem uma Marinha propriamente dita. A Ucrânia alcançou um grande sucesso usando drones e mísseis de cruzeiro para atacar navios da Frota Russa no Mar Negro, portos e bases.

No início de outubro, a frota russa foi forçada a deixar seu ancoradouro histórico em Sevastopol, na Crimeia, e realocou-se no Porto de Novorossiisk, na Rússia. Como resultado, a Ucrânia pôde voltar a exportar grãos pelo Mar Negro.

Navio com grãos ucranianos passa por Istambul, Turquia  Foto: Yoruk Isik/Reuters

Ninguém esperava que a Ucrânia conseguiria continuar a exportar grãos depois que a Rússia se retirou, neste verão, do acordo que garantia o fluxo. Mas a Ucrânia deu um jeito. Portanto, nós também precisamos manter a fé e acreditar que os ucranianos encontrarão uma maneira de continuar a defender seu país e expulsar gradualmente a ocupação russa.

Se o Congresso continuar financiando a Ucrânia e se o presidente Joe Biden derrotar seu provável oponente, o ex-presidente Donald Trump, em 2024 (duas incertezas neste momento), Putin se confrontará com a realidade de que não conseguirá vencer esta guerra. Mas se o nosso apoio à Ucrânia se abalar, Putin poderá emergir como vencedor de sua guerra de agressão — com consequências assustadoras para o mundo inteiro.

Muitos americanos afirmam que estão se cansando dessa guerra. Mas nós estamos arriscando apenas 0,65% do orçamento federal para apoiar a Ucrânia. Os ucranianos estão arriscando suas vidas. Eles também estão cansados, mas sabem que não podem desistir da luta. Nós também não. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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