Qual Javier Milei vai governar a Argentina? Três analistas comentam na Americas Quarterly


Candidato libertário teve 11 pontos percentuais a mais que o ministro da economia, Sergio Massa. Especialistas analisam o ocorrido e o que virá a seguir para o país

Por Redação

No domingo, 19 de novembro, Javier Milei venceu o segundo turno da eleição presidencial da Argentina, recebendo 55,7% dos votos contra os 44,3% de Sergio Massa. A diferença de 11 pontos foi maior do que a prevista por algumas pesquisas, com o eleitorado escolhendo a mensagem de mudança radical de Milei enquanto o país enfrenta inflação acima de 140% e um índice de pobreza de 40%. Massa, atual ministro da economia, reconheceu a derrota no começo da noite.

Pedimos a alguns observadores que compartilhassem suas reações ao resultado:

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Javier Milei em Buenos Aires, Argentina, domingo, 13 de agosto de 2023. Foto: Natacha Pisarenko / AP

Juan Cruz Díaz, diretor administrativo do Grupo Cefeidas

Parte da vitória de Javier Milei pode ser atribuída à sua capacidade de capitalizar em cima da ampla insatisfação da população em relação à coalizão governante. A profunda deterioração econômica vivenciada pela Argentina nos quatro anos mais recentes (incluindo alta na inflação e na pobreza), somada a um aspecto de insatisfação generalizada com o establishment político, particularmente o kirchnerismo, permitiu que o inexperiente Milei rapidamente penetrasse e se aproveitasse de propostas mais tradicionais da oposição, principalmente as da coalizão Juntos por el Cambio (JxC).

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Se a forte narrativa anti-establishment de Milei foi chave para sua ascensão meteórica rumo à presidência, levando ao segundo turno, o líder libertário baixou a intensidade do seu discurso após os resultados do primeiro turno, apostando em vez disso em uma abordagem mais conciliatória. Isso se refletiu na sua reconciliação com a candidata presidencial da JxC, Patricia Bullrich. O apoio dela, bem como o do ex-presidente Mauricio Macri, desempenharam um papel fundamental na reta final da campanha, mobilizando recursos e garantindo muitos votos da JxC para Milei, que foram chave para a vitória de ontem.

Enquanto isso, Sergio Massa foi incapaz de superar o atual contexto econômico desfavorável. Sua estratégia de campanha, concentrada em apresentá-lo como candidato moderado e retratando ao mesmo tempo as incertezas em torno de uma possível presidência de Milei, não teve o resultado esperado e produziu uma derrota mais pronunciada do que o esperado.

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De agora em diante, Milei enfrentará um instável processo de transição do governo, marcado pela renúncia de Massa como ministro da economia. Em 10 de dezembro, o novo presidente enfrentará um contexto complexo, sem contar com nenhum governador nem a maioria no congresso, o que o obrigará a buscar um consenso, aproveitando-se do embalo produzido pelo voto popular nas eleições.

Brian Winter, editor-chefe da Americas Quarterly

A eleição acabou, mas ainda não sabemos quem governará a Argentina: será o volátil Javier Milei que vimos durante a maior parte da campanha? Ou a versão mais calma, comparativamente moderada, que se apresentou como líder de coalizão nas semanas finais da disputa?

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Se for a segunda versão, a Argentina pode ter uma chance.

O desafio pela frente é formidável. Mas, se Milei formar uma parceria com a coalizão de centro-direita do ex-presidente Mauricio Macri para produzir uma política econômica minimamente coerente, então a Argentina terá outros ventos soprando a seu favor, incluindo o lucro da exploração do gás natural, do lítio e outros projetos de mineração, e uma safra que deve ser muito melhor que a deste ano, fruto da pior seca em 60 anos.

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Este panorama otimista pode nunca se materializar. Quando Donald Trump e Jair Bolsonaro foram eleitos, parte do eleitorado também esperou por uma “guinada” que jamais ocorreu. É possível que Milei simplesmente não tenha o temperamento ou o apoio político no congresso para governar e fazer aprovar as dolorosas reformas que serão necessárias para reerguer a Argentina.

O discurso de vitória de Milei, com sua promessa de “mudanças drásticas, sem gradualismo”, indicou um líder corajoso que decidiu pisar fundo no acelerador para implementar sua pauta, incluindo uma possível dolarização da economia. Poderíamos pensar se essa diferença de 11 pontos não foi “grande demais”, possivelmente levando Milei a descartar a abordagem um pouco mais convencional vista no segundo turno. Veremos.

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Muito se falou a respeito do futuro da democracia na Argentina. De fato, teremos que acompanhar esse novo governo atentamente. Mas, igualmente, teremos que ver se o peronismo e seus aliados entenderão o mandato fortemente popular que Miei acaba de receber, ou se tentarão obstruir violentamente ou derrubar Milei desde o primeiro dia de governo, com greves e instabilidade civil. Respeitar o vencedor de uma eleição legítima, e o apelo subjacente por mudanças dramáticas, também é parte da democracia.

Javier Milei fala com apoiadores do lado de fora de sua sede de campanha após vencer o segundo turno das eleições em Buenos Aires, Argentina, domingo, 19 de novembro de 2023.  Foto: Mario De Fina / AP

María Esperanza Casullo, professora da Universidade Nacional de Río Negro e CONICET

Milei venceu graças a uma transferência perfeita dos votos do primeiro turno destinados a Patricia Bullrich, terceira colocada, e seu desafiante Horacio Rodríguez Larreta, e também do quarto colocado, Juan Schiaretti.

Isso significa que ele tem um amplo mandato para implementar as políticas de sua pauta: dolarização da economia, privatização da YPF e outras estatais, cortes brutais nas estruturas do estado. Também significa que ele é agora, na prática, sócio do ex-presidente Mauricio Macri. A promessa de Macri de controlar ou moderar os ímpetos de Milei foi chave para que seus ex-eleitores votassem em Milei, e resta saber como será o envolvimento de Macri no futuro governo de Milei.

Sem nenhuma necessidade iminente de moderar o discurso, Milei pode optar por não fazê-lo: seu discurso de vitória mostrou um posicionamento irredutível, e outros governos populistas descobriram que sua melhor estratégia é começar no ataque.

Finalmente, não acredito que veremos uma ampla resistência peronista nas ruas. Os peronistas foram duramente derrotados e não devem se mobilizar contra um governo eleito com um mandato popular tão amplo. A atitude deles deve ser mais passiva: “vocês arrumaram esta cama, agora durmam nela”. E Milei prometeu especificamente responder com dureza a eventuais protestos. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

No domingo, 19 de novembro, Javier Milei venceu o segundo turno da eleição presidencial da Argentina, recebendo 55,7% dos votos contra os 44,3% de Sergio Massa. A diferença de 11 pontos foi maior do que a prevista por algumas pesquisas, com o eleitorado escolhendo a mensagem de mudança radical de Milei enquanto o país enfrenta inflação acima de 140% e um índice de pobreza de 40%. Massa, atual ministro da economia, reconheceu a derrota no começo da noite.

Pedimos a alguns observadores que compartilhassem suas reações ao resultado:

Javier Milei em Buenos Aires, Argentina, domingo, 13 de agosto de 2023. Foto: Natacha Pisarenko / AP

Juan Cruz Díaz, diretor administrativo do Grupo Cefeidas

Parte da vitória de Javier Milei pode ser atribuída à sua capacidade de capitalizar em cima da ampla insatisfação da população em relação à coalizão governante. A profunda deterioração econômica vivenciada pela Argentina nos quatro anos mais recentes (incluindo alta na inflação e na pobreza), somada a um aspecto de insatisfação generalizada com o establishment político, particularmente o kirchnerismo, permitiu que o inexperiente Milei rapidamente penetrasse e se aproveitasse de propostas mais tradicionais da oposição, principalmente as da coalizão Juntos por el Cambio (JxC).

Se a forte narrativa anti-establishment de Milei foi chave para sua ascensão meteórica rumo à presidência, levando ao segundo turno, o líder libertário baixou a intensidade do seu discurso após os resultados do primeiro turno, apostando em vez disso em uma abordagem mais conciliatória. Isso se refletiu na sua reconciliação com a candidata presidencial da JxC, Patricia Bullrich. O apoio dela, bem como o do ex-presidente Mauricio Macri, desempenharam um papel fundamental na reta final da campanha, mobilizando recursos e garantindo muitos votos da JxC para Milei, que foram chave para a vitória de ontem.

Enquanto isso, Sergio Massa foi incapaz de superar o atual contexto econômico desfavorável. Sua estratégia de campanha, concentrada em apresentá-lo como candidato moderado e retratando ao mesmo tempo as incertezas em torno de uma possível presidência de Milei, não teve o resultado esperado e produziu uma derrota mais pronunciada do que o esperado.

De agora em diante, Milei enfrentará um instável processo de transição do governo, marcado pela renúncia de Massa como ministro da economia. Em 10 de dezembro, o novo presidente enfrentará um contexto complexo, sem contar com nenhum governador nem a maioria no congresso, o que o obrigará a buscar um consenso, aproveitando-se do embalo produzido pelo voto popular nas eleições.

Brian Winter, editor-chefe da Americas Quarterly

A eleição acabou, mas ainda não sabemos quem governará a Argentina: será o volátil Javier Milei que vimos durante a maior parte da campanha? Ou a versão mais calma, comparativamente moderada, que se apresentou como líder de coalizão nas semanas finais da disputa?

Se for a segunda versão, a Argentina pode ter uma chance.

O desafio pela frente é formidável. Mas, se Milei formar uma parceria com a coalizão de centro-direita do ex-presidente Mauricio Macri para produzir uma política econômica minimamente coerente, então a Argentina terá outros ventos soprando a seu favor, incluindo o lucro da exploração do gás natural, do lítio e outros projetos de mineração, e uma safra que deve ser muito melhor que a deste ano, fruto da pior seca em 60 anos.

Este panorama otimista pode nunca se materializar. Quando Donald Trump e Jair Bolsonaro foram eleitos, parte do eleitorado também esperou por uma “guinada” que jamais ocorreu. É possível que Milei simplesmente não tenha o temperamento ou o apoio político no congresso para governar e fazer aprovar as dolorosas reformas que serão necessárias para reerguer a Argentina.

O discurso de vitória de Milei, com sua promessa de “mudanças drásticas, sem gradualismo”, indicou um líder corajoso que decidiu pisar fundo no acelerador para implementar sua pauta, incluindo uma possível dolarização da economia. Poderíamos pensar se essa diferença de 11 pontos não foi “grande demais”, possivelmente levando Milei a descartar a abordagem um pouco mais convencional vista no segundo turno. Veremos.

Muito se falou a respeito do futuro da democracia na Argentina. De fato, teremos que acompanhar esse novo governo atentamente. Mas, igualmente, teremos que ver se o peronismo e seus aliados entenderão o mandato fortemente popular que Miei acaba de receber, ou se tentarão obstruir violentamente ou derrubar Milei desde o primeiro dia de governo, com greves e instabilidade civil. Respeitar o vencedor de uma eleição legítima, e o apelo subjacente por mudanças dramáticas, também é parte da democracia.

Javier Milei fala com apoiadores do lado de fora de sua sede de campanha após vencer o segundo turno das eleições em Buenos Aires, Argentina, domingo, 19 de novembro de 2023.  Foto: Mario De Fina / AP

María Esperanza Casullo, professora da Universidade Nacional de Río Negro e CONICET

Milei venceu graças a uma transferência perfeita dos votos do primeiro turno destinados a Patricia Bullrich, terceira colocada, e seu desafiante Horacio Rodríguez Larreta, e também do quarto colocado, Juan Schiaretti.

Isso significa que ele tem um amplo mandato para implementar as políticas de sua pauta: dolarização da economia, privatização da YPF e outras estatais, cortes brutais nas estruturas do estado. Também significa que ele é agora, na prática, sócio do ex-presidente Mauricio Macri. A promessa de Macri de controlar ou moderar os ímpetos de Milei foi chave para que seus ex-eleitores votassem em Milei, e resta saber como será o envolvimento de Macri no futuro governo de Milei.

Sem nenhuma necessidade iminente de moderar o discurso, Milei pode optar por não fazê-lo: seu discurso de vitória mostrou um posicionamento irredutível, e outros governos populistas descobriram que sua melhor estratégia é começar no ataque.

Finalmente, não acredito que veremos uma ampla resistência peronista nas ruas. Os peronistas foram duramente derrotados e não devem se mobilizar contra um governo eleito com um mandato popular tão amplo. A atitude deles deve ser mais passiva: “vocês arrumaram esta cama, agora durmam nela”. E Milei prometeu especificamente responder com dureza a eventuais protestos. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

No domingo, 19 de novembro, Javier Milei venceu o segundo turno da eleição presidencial da Argentina, recebendo 55,7% dos votos contra os 44,3% de Sergio Massa. A diferença de 11 pontos foi maior do que a prevista por algumas pesquisas, com o eleitorado escolhendo a mensagem de mudança radical de Milei enquanto o país enfrenta inflação acima de 140% e um índice de pobreza de 40%. Massa, atual ministro da economia, reconheceu a derrota no começo da noite.

Pedimos a alguns observadores que compartilhassem suas reações ao resultado:

Javier Milei em Buenos Aires, Argentina, domingo, 13 de agosto de 2023. Foto: Natacha Pisarenko / AP

Juan Cruz Díaz, diretor administrativo do Grupo Cefeidas

Parte da vitória de Javier Milei pode ser atribuída à sua capacidade de capitalizar em cima da ampla insatisfação da população em relação à coalizão governante. A profunda deterioração econômica vivenciada pela Argentina nos quatro anos mais recentes (incluindo alta na inflação e na pobreza), somada a um aspecto de insatisfação generalizada com o establishment político, particularmente o kirchnerismo, permitiu que o inexperiente Milei rapidamente penetrasse e se aproveitasse de propostas mais tradicionais da oposição, principalmente as da coalizão Juntos por el Cambio (JxC).

Se a forte narrativa anti-establishment de Milei foi chave para sua ascensão meteórica rumo à presidência, levando ao segundo turno, o líder libertário baixou a intensidade do seu discurso após os resultados do primeiro turno, apostando em vez disso em uma abordagem mais conciliatória. Isso se refletiu na sua reconciliação com a candidata presidencial da JxC, Patricia Bullrich. O apoio dela, bem como o do ex-presidente Mauricio Macri, desempenharam um papel fundamental na reta final da campanha, mobilizando recursos e garantindo muitos votos da JxC para Milei, que foram chave para a vitória de ontem.

Enquanto isso, Sergio Massa foi incapaz de superar o atual contexto econômico desfavorável. Sua estratégia de campanha, concentrada em apresentá-lo como candidato moderado e retratando ao mesmo tempo as incertezas em torno de uma possível presidência de Milei, não teve o resultado esperado e produziu uma derrota mais pronunciada do que o esperado.

De agora em diante, Milei enfrentará um instável processo de transição do governo, marcado pela renúncia de Massa como ministro da economia. Em 10 de dezembro, o novo presidente enfrentará um contexto complexo, sem contar com nenhum governador nem a maioria no congresso, o que o obrigará a buscar um consenso, aproveitando-se do embalo produzido pelo voto popular nas eleições.

Brian Winter, editor-chefe da Americas Quarterly

A eleição acabou, mas ainda não sabemos quem governará a Argentina: será o volátil Javier Milei que vimos durante a maior parte da campanha? Ou a versão mais calma, comparativamente moderada, que se apresentou como líder de coalizão nas semanas finais da disputa?

Se for a segunda versão, a Argentina pode ter uma chance.

O desafio pela frente é formidável. Mas, se Milei formar uma parceria com a coalizão de centro-direita do ex-presidente Mauricio Macri para produzir uma política econômica minimamente coerente, então a Argentina terá outros ventos soprando a seu favor, incluindo o lucro da exploração do gás natural, do lítio e outros projetos de mineração, e uma safra que deve ser muito melhor que a deste ano, fruto da pior seca em 60 anos.

Este panorama otimista pode nunca se materializar. Quando Donald Trump e Jair Bolsonaro foram eleitos, parte do eleitorado também esperou por uma “guinada” que jamais ocorreu. É possível que Milei simplesmente não tenha o temperamento ou o apoio político no congresso para governar e fazer aprovar as dolorosas reformas que serão necessárias para reerguer a Argentina.

O discurso de vitória de Milei, com sua promessa de “mudanças drásticas, sem gradualismo”, indicou um líder corajoso que decidiu pisar fundo no acelerador para implementar sua pauta, incluindo uma possível dolarização da economia. Poderíamos pensar se essa diferença de 11 pontos não foi “grande demais”, possivelmente levando Milei a descartar a abordagem um pouco mais convencional vista no segundo turno. Veremos.

Muito se falou a respeito do futuro da democracia na Argentina. De fato, teremos que acompanhar esse novo governo atentamente. Mas, igualmente, teremos que ver se o peronismo e seus aliados entenderão o mandato fortemente popular que Miei acaba de receber, ou se tentarão obstruir violentamente ou derrubar Milei desde o primeiro dia de governo, com greves e instabilidade civil. Respeitar o vencedor de uma eleição legítima, e o apelo subjacente por mudanças dramáticas, também é parte da democracia.

Javier Milei fala com apoiadores do lado de fora de sua sede de campanha após vencer o segundo turno das eleições em Buenos Aires, Argentina, domingo, 19 de novembro de 2023.  Foto: Mario De Fina / AP

María Esperanza Casullo, professora da Universidade Nacional de Río Negro e CONICET

Milei venceu graças a uma transferência perfeita dos votos do primeiro turno destinados a Patricia Bullrich, terceira colocada, e seu desafiante Horacio Rodríguez Larreta, e também do quarto colocado, Juan Schiaretti.

Isso significa que ele tem um amplo mandato para implementar as políticas de sua pauta: dolarização da economia, privatização da YPF e outras estatais, cortes brutais nas estruturas do estado. Também significa que ele é agora, na prática, sócio do ex-presidente Mauricio Macri. A promessa de Macri de controlar ou moderar os ímpetos de Milei foi chave para que seus ex-eleitores votassem em Milei, e resta saber como será o envolvimento de Macri no futuro governo de Milei.

Sem nenhuma necessidade iminente de moderar o discurso, Milei pode optar por não fazê-lo: seu discurso de vitória mostrou um posicionamento irredutível, e outros governos populistas descobriram que sua melhor estratégia é começar no ataque.

Finalmente, não acredito que veremos uma ampla resistência peronista nas ruas. Os peronistas foram duramente derrotados e não devem se mobilizar contra um governo eleito com um mandato popular tão amplo. A atitude deles deve ser mais passiva: “vocês arrumaram esta cama, agora durmam nela”. E Milei prometeu especificamente responder com dureza a eventuais protestos. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

No domingo, 19 de novembro, Javier Milei venceu o segundo turno da eleição presidencial da Argentina, recebendo 55,7% dos votos contra os 44,3% de Sergio Massa. A diferença de 11 pontos foi maior do que a prevista por algumas pesquisas, com o eleitorado escolhendo a mensagem de mudança radical de Milei enquanto o país enfrenta inflação acima de 140% e um índice de pobreza de 40%. Massa, atual ministro da economia, reconheceu a derrota no começo da noite.

Pedimos a alguns observadores que compartilhassem suas reações ao resultado:

Javier Milei em Buenos Aires, Argentina, domingo, 13 de agosto de 2023. Foto: Natacha Pisarenko / AP

Juan Cruz Díaz, diretor administrativo do Grupo Cefeidas

Parte da vitória de Javier Milei pode ser atribuída à sua capacidade de capitalizar em cima da ampla insatisfação da população em relação à coalizão governante. A profunda deterioração econômica vivenciada pela Argentina nos quatro anos mais recentes (incluindo alta na inflação e na pobreza), somada a um aspecto de insatisfação generalizada com o establishment político, particularmente o kirchnerismo, permitiu que o inexperiente Milei rapidamente penetrasse e se aproveitasse de propostas mais tradicionais da oposição, principalmente as da coalizão Juntos por el Cambio (JxC).

Se a forte narrativa anti-establishment de Milei foi chave para sua ascensão meteórica rumo à presidência, levando ao segundo turno, o líder libertário baixou a intensidade do seu discurso após os resultados do primeiro turno, apostando em vez disso em uma abordagem mais conciliatória. Isso se refletiu na sua reconciliação com a candidata presidencial da JxC, Patricia Bullrich. O apoio dela, bem como o do ex-presidente Mauricio Macri, desempenharam um papel fundamental na reta final da campanha, mobilizando recursos e garantindo muitos votos da JxC para Milei, que foram chave para a vitória de ontem.

Enquanto isso, Sergio Massa foi incapaz de superar o atual contexto econômico desfavorável. Sua estratégia de campanha, concentrada em apresentá-lo como candidato moderado e retratando ao mesmo tempo as incertezas em torno de uma possível presidência de Milei, não teve o resultado esperado e produziu uma derrota mais pronunciada do que o esperado.

De agora em diante, Milei enfrentará um instável processo de transição do governo, marcado pela renúncia de Massa como ministro da economia. Em 10 de dezembro, o novo presidente enfrentará um contexto complexo, sem contar com nenhum governador nem a maioria no congresso, o que o obrigará a buscar um consenso, aproveitando-se do embalo produzido pelo voto popular nas eleições.

Brian Winter, editor-chefe da Americas Quarterly

A eleição acabou, mas ainda não sabemos quem governará a Argentina: será o volátil Javier Milei que vimos durante a maior parte da campanha? Ou a versão mais calma, comparativamente moderada, que se apresentou como líder de coalizão nas semanas finais da disputa?

Se for a segunda versão, a Argentina pode ter uma chance.

O desafio pela frente é formidável. Mas, se Milei formar uma parceria com a coalizão de centro-direita do ex-presidente Mauricio Macri para produzir uma política econômica minimamente coerente, então a Argentina terá outros ventos soprando a seu favor, incluindo o lucro da exploração do gás natural, do lítio e outros projetos de mineração, e uma safra que deve ser muito melhor que a deste ano, fruto da pior seca em 60 anos.

Este panorama otimista pode nunca se materializar. Quando Donald Trump e Jair Bolsonaro foram eleitos, parte do eleitorado também esperou por uma “guinada” que jamais ocorreu. É possível que Milei simplesmente não tenha o temperamento ou o apoio político no congresso para governar e fazer aprovar as dolorosas reformas que serão necessárias para reerguer a Argentina.

O discurso de vitória de Milei, com sua promessa de “mudanças drásticas, sem gradualismo”, indicou um líder corajoso que decidiu pisar fundo no acelerador para implementar sua pauta, incluindo uma possível dolarização da economia. Poderíamos pensar se essa diferença de 11 pontos não foi “grande demais”, possivelmente levando Milei a descartar a abordagem um pouco mais convencional vista no segundo turno. Veremos.

Muito se falou a respeito do futuro da democracia na Argentina. De fato, teremos que acompanhar esse novo governo atentamente. Mas, igualmente, teremos que ver se o peronismo e seus aliados entenderão o mandato fortemente popular que Miei acaba de receber, ou se tentarão obstruir violentamente ou derrubar Milei desde o primeiro dia de governo, com greves e instabilidade civil. Respeitar o vencedor de uma eleição legítima, e o apelo subjacente por mudanças dramáticas, também é parte da democracia.

Javier Milei fala com apoiadores do lado de fora de sua sede de campanha após vencer o segundo turno das eleições em Buenos Aires, Argentina, domingo, 19 de novembro de 2023.  Foto: Mario De Fina / AP

María Esperanza Casullo, professora da Universidade Nacional de Río Negro e CONICET

Milei venceu graças a uma transferência perfeita dos votos do primeiro turno destinados a Patricia Bullrich, terceira colocada, e seu desafiante Horacio Rodríguez Larreta, e também do quarto colocado, Juan Schiaretti.

Isso significa que ele tem um amplo mandato para implementar as políticas de sua pauta: dolarização da economia, privatização da YPF e outras estatais, cortes brutais nas estruturas do estado. Também significa que ele é agora, na prática, sócio do ex-presidente Mauricio Macri. A promessa de Macri de controlar ou moderar os ímpetos de Milei foi chave para que seus ex-eleitores votassem em Milei, e resta saber como será o envolvimento de Macri no futuro governo de Milei.

Sem nenhuma necessidade iminente de moderar o discurso, Milei pode optar por não fazê-lo: seu discurso de vitória mostrou um posicionamento irredutível, e outros governos populistas descobriram que sua melhor estratégia é começar no ataque.

Finalmente, não acredito que veremos uma ampla resistência peronista nas ruas. Os peronistas foram duramente derrotados e não devem se mobilizar contra um governo eleito com um mandato popular tão amplo. A atitude deles deve ser mais passiva: “vocês arrumaram esta cama, agora durmam nela”. E Milei prometeu especificamente responder com dureza a eventuais protestos. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

No domingo, 19 de novembro, Javier Milei venceu o segundo turno da eleição presidencial da Argentina, recebendo 55,7% dos votos contra os 44,3% de Sergio Massa. A diferença de 11 pontos foi maior do que a prevista por algumas pesquisas, com o eleitorado escolhendo a mensagem de mudança radical de Milei enquanto o país enfrenta inflação acima de 140% e um índice de pobreza de 40%. Massa, atual ministro da economia, reconheceu a derrota no começo da noite.

Pedimos a alguns observadores que compartilhassem suas reações ao resultado:

Javier Milei em Buenos Aires, Argentina, domingo, 13 de agosto de 2023. Foto: Natacha Pisarenko / AP

Juan Cruz Díaz, diretor administrativo do Grupo Cefeidas

Parte da vitória de Javier Milei pode ser atribuída à sua capacidade de capitalizar em cima da ampla insatisfação da população em relação à coalizão governante. A profunda deterioração econômica vivenciada pela Argentina nos quatro anos mais recentes (incluindo alta na inflação e na pobreza), somada a um aspecto de insatisfação generalizada com o establishment político, particularmente o kirchnerismo, permitiu que o inexperiente Milei rapidamente penetrasse e se aproveitasse de propostas mais tradicionais da oposição, principalmente as da coalizão Juntos por el Cambio (JxC).

Se a forte narrativa anti-establishment de Milei foi chave para sua ascensão meteórica rumo à presidência, levando ao segundo turno, o líder libertário baixou a intensidade do seu discurso após os resultados do primeiro turno, apostando em vez disso em uma abordagem mais conciliatória. Isso se refletiu na sua reconciliação com a candidata presidencial da JxC, Patricia Bullrich. O apoio dela, bem como o do ex-presidente Mauricio Macri, desempenharam um papel fundamental na reta final da campanha, mobilizando recursos e garantindo muitos votos da JxC para Milei, que foram chave para a vitória de ontem.

Enquanto isso, Sergio Massa foi incapaz de superar o atual contexto econômico desfavorável. Sua estratégia de campanha, concentrada em apresentá-lo como candidato moderado e retratando ao mesmo tempo as incertezas em torno de uma possível presidência de Milei, não teve o resultado esperado e produziu uma derrota mais pronunciada do que o esperado.

De agora em diante, Milei enfrentará um instável processo de transição do governo, marcado pela renúncia de Massa como ministro da economia. Em 10 de dezembro, o novo presidente enfrentará um contexto complexo, sem contar com nenhum governador nem a maioria no congresso, o que o obrigará a buscar um consenso, aproveitando-se do embalo produzido pelo voto popular nas eleições.

Brian Winter, editor-chefe da Americas Quarterly

A eleição acabou, mas ainda não sabemos quem governará a Argentina: será o volátil Javier Milei que vimos durante a maior parte da campanha? Ou a versão mais calma, comparativamente moderada, que se apresentou como líder de coalizão nas semanas finais da disputa?

Se for a segunda versão, a Argentina pode ter uma chance.

O desafio pela frente é formidável. Mas, se Milei formar uma parceria com a coalizão de centro-direita do ex-presidente Mauricio Macri para produzir uma política econômica minimamente coerente, então a Argentina terá outros ventos soprando a seu favor, incluindo o lucro da exploração do gás natural, do lítio e outros projetos de mineração, e uma safra que deve ser muito melhor que a deste ano, fruto da pior seca em 60 anos.

Este panorama otimista pode nunca se materializar. Quando Donald Trump e Jair Bolsonaro foram eleitos, parte do eleitorado também esperou por uma “guinada” que jamais ocorreu. É possível que Milei simplesmente não tenha o temperamento ou o apoio político no congresso para governar e fazer aprovar as dolorosas reformas que serão necessárias para reerguer a Argentina.

O discurso de vitória de Milei, com sua promessa de “mudanças drásticas, sem gradualismo”, indicou um líder corajoso que decidiu pisar fundo no acelerador para implementar sua pauta, incluindo uma possível dolarização da economia. Poderíamos pensar se essa diferença de 11 pontos não foi “grande demais”, possivelmente levando Milei a descartar a abordagem um pouco mais convencional vista no segundo turno. Veremos.

Muito se falou a respeito do futuro da democracia na Argentina. De fato, teremos que acompanhar esse novo governo atentamente. Mas, igualmente, teremos que ver se o peronismo e seus aliados entenderão o mandato fortemente popular que Miei acaba de receber, ou se tentarão obstruir violentamente ou derrubar Milei desde o primeiro dia de governo, com greves e instabilidade civil. Respeitar o vencedor de uma eleição legítima, e o apelo subjacente por mudanças dramáticas, também é parte da democracia.

Javier Milei fala com apoiadores do lado de fora de sua sede de campanha após vencer o segundo turno das eleições em Buenos Aires, Argentina, domingo, 19 de novembro de 2023.  Foto: Mario De Fina / AP

María Esperanza Casullo, professora da Universidade Nacional de Río Negro e CONICET

Milei venceu graças a uma transferência perfeita dos votos do primeiro turno destinados a Patricia Bullrich, terceira colocada, e seu desafiante Horacio Rodríguez Larreta, e também do quarto colocado, Juan Schiaretti.

Isso significa que ele tem um amplo mandato para implementar as políticas de sua pauta: dolarização da economia, privatização da YPF e outras estatais, cortes brutais nas estruturas do estado. Também significa que ele é agora, na prática, sócio do ex-presidente Mauricio Macri. A promessa de Macri de controlar ou moderar os ímpetos de Milei foi chave para que seus ex-eleitores votassem em Milei, e resta saber como será o envolvimento de Macri no futuro governo de Milei.

Sem nenhuma necessidade iminente de moderar o discurso, Milei pode optar por não fazê-lo: seu discurso de vitória mostrou um posicionamento irredutível, e outros governos populistas descobriram que sua melhor estratégia é começar no ataque.

Finalmente, não acredito que veremos uma ampla resistência peronista nas ruas. Os peronistas foram duramente derrotados e não devem se mobilizar contra um governo eleito com um mandato popular tão amplo. A atitude deles deve ser mais passiva: “vocês arrumaram esta cama, agora durmam nela”. E Milei prometeu especificamente responder com dureza a eventuais protestos. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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