THE WASHINGTON POST - Vladimir Putin aprendeu seu brutal código de guerra quando ainda era um garoto pobre que brincava nas ruas de Leningrado, talvez aos 7 anos de idade, e brigou pela primeira vez com uma gangue do bairro.
“Percebi que eu precisava ser forte em qualquer situação, estando certo ou errado”, afirmou Putin ao biógrafo Oleg Blotski. “Simplesmente entendi que, se você quiser vencer, terá de lutar cada luta até o final, como se fosse sua batalha decisiva e definitiva.”
O Exército russo deixou um rastro horripilante nas ruas de Bucha, Ucrânia, evidenciando a maneira como o código de sujeito durão de Putin se aplica em combate. O soldado profissional se torna um valentão do bairro com a mesma mentalidade de lutar até o final que Putin aprendeu quando menino.
O Massacre de Bucha
A vida inteira de Putin convergiu para a catastrófica guerra na Ucrânia. Suas ideias alucinadas e messiânicas a respeito da história russa fundiram-se ao desprezo pelas leis da guerra, que ele já demonstrou em sua sangrenta campanha na Chechênia cerca de duas décadas atrás.
O líder russo fabricou sua motivação para entrar em guerra contra a Ucrânia e mentiu a respeito de seus planos. E quando fracassou em alcançar a vitória fácil que esperava, seu Exército parece ter se vingado atacando civis com selvageria.
Teria Putin finalmente encontrado um limite na Ucrânia? Graças a corajosos ucranianos e repórteres estrngeiros, estamos percebendo a carnificina que seu estilo de guerra tem produzido em Bucha, Mariupol, Kharkiv e Trostianets — lugares que a maioria de nós jamais havia escutado falar algumas semanas atrás, agora gravados com mesma infâmia de Guernica e Srebrenica. O presidente francês, Emmanuel Macron, descreveu as imagens mais recentes das cidades ucranianas como “inadmissíveis”. “Um soco no estômago”, conforme definiu o secretário de Estado americano, Antony Blinken. Putin “é um criminoso de guerra”, afirmou o presidente Joe Biden.
Processo no TPI
O processo judicial responsabilizando Putin e seu Exército já começou. O Tribunal Penal Internacional lançou sua investigação no início de março; a Polônia convocou uma comissão internacional de investigação; promotores de Justiça franceses abriram três investigações de crimes de guerra contra cidadãos franceses; e a Procuradoria Geral da Ucrânia mobilizou cerca de 50 mil investigadores para reunir provas das atrocidades. Algumas dessas investigações prosseguirão independentemente do resultado da guerra.
A resposta da Rússia às horripilantes imagens seguiu a linha do regime de Putin para caracterizar esse tipo de informação: tudo não passa de uma campanha de mentiras deslavadas. Os desmentidos em relação às matanças brutais são tão arrogantes e reveladores que evocam um vazio moral que deveria envergonhar todos os russos honestos.
“Todos os que morreram em Bucha eram delinquentes de alguma forma”, garantiu o parlamentar russo Oleg Matveichev. Bucha foi uma “provocação flagrante e brutal dos nazistas ucranianos”, afirmou a comentarista da TV estatal russa Olga Skabeieva. O Ocidente escolheu Bucha por sua “acusação odiosa contra a Rússia”, porque o nome da cidade soa parecido com a palavra “butcher” (açougueiro) em inglês, afirmou a apresentadora de talk-show Olesia Loseva.
Feitiço contra o feiticeiro
Mas a verdade por trás desses horrores está sendo confirmada pixel a pixel. As redes sociais ocidentais, que Putin se esforçou tanto para manipular, produzem agora um doce sabor de justiça, ao desmembrar as narrativas da Rússia que negam sua responsabilidade a respeito de Bucha e outras atrocidades.
Uma refutação sistemática começou na segunda-feira com um post de Eliot Higgins, fundador do site britânico de jornalismo investigativo Bellingcat. Ele analisou as afirmações russas de que imagens de Bucha tinham “sinais de falsificação em vídeo e outras alterações”. Higgins mostrou que uma suposta imagem da “mão de um cadáver que se movia”, filmada de dentro de um carro, foi produto de uma gota de água que escorria pelo para-brisa. Similarmente, ele esclareceu que a alegação russa a respeito de um cadáver que aparentemente se mexeu, filmado no reflexo do retrovisor de um carro, explicava-se pela distorção do espelho.
E o mais devastador para Moscou: fotos de satélites comerciais tiradas em meados de março por equipamentos da Maxar Technologies mostram corpos espalhados pelas ruas de Bucha num momento em que as tropas russas a ocupavam; e os cadáveres estavam no mesmo lugar quando jornalistas entraram na cidade no fim de semana passado, quando as tropas russas saíram.
O que esta guerra significou para soldados russos que seguiram as ordens de Putin de invadir seu vizinho? Um assombroso retrato de uma unidade de elite, o 331.º Regimento de Paraquedistas, foi publicado recentemente por Mark Urban, da BBC. Essa unidade — “a melhor das melhores”, segundo gabou-se um general na internet, em maio — foi acionada para Kiev a partir de sua base central, em Kostroma, a nordeste de Moscou, em fevereiro.
O comandante da unidade foi morto em combate na Ucrânia em 13 de março. Muitos outros oficiais e conscritos graduados morreram antes da unidade ser retirada de combate na semana passada, para Belarus. A BBC identificou 39 mortos, e moradores de Kostroma disseram à emissora britânica que até 100 membros da unidade de elite morreram. A BBC noticiou que o número de mortos, feridos, desaparecidos ou prisioneiros da unidade pode ter chegado a um terço de seu contingente de 1,5 mil homens.
Num perfil em rede social em memória ao sargento Sergei Duganov, uma mulher russa escreveu: “O 331.º regimento está desaparecendo. Quase todos os dias, fotos dos nossos meninos de Kostroma são publicadas e me causam arrepios. O que está acontecendo? Onde isso vai parar? Quando as pessoas vão parar de morrer?”.
Quando a carnificina brutal de Putin vai acabar? Esta demanda cresce cada vez mais na Rússia, na Ucrânia e em todo o mundo. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL
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