"Em tempos normais, algo assim provavelmente não aconteceria. Mas estes não são tempos normais." Foi desta forma que o ex-governador de Ohio John Kasich justificou sua presença na convenção democrata na noite desta segunda-feira, 17. Republicano desde a juventude, Kasich foi crítico à escolha de Donald Trump como candidato em 2016, mas se recusou a votar em Hillary Clinton. Neste ano, ele será um dos quatro republicanos a pedir voto por Joe Biden na noite de hoje.
A presença de republicanos de longa data em campanha pela oposição foi apresentada como um troféu dos democratas na primeira noite da convenção. Ao serem apresentados no mesmo dia em que Bernie Sanders discursa, o partido pretende mostrar que a coalizão de apoio a Biden une esquerda e direita.
John Kasich é uma das principais atrações da Convenção Nacional Democrata, que tem ainda presença de outros três nomes republicanos: a ex-governadora de New Jersey Christine Whitman; a executiva e ex-candidata ao governo da Califórnia Meg Whitman; e a ex-deputada por Nova York Susan Molinari.
Os republicanos argumentaram "compromisso com o país" para fazer a campanha contra Trump. Conforme trechos antecipados de seu discurso na noite de hoje, Kasich deve reconhecer as diferenças, mas ressaltar quão importante é superá-las nesse momento. "Sim, há áreas em que eu e Joe discordamos absolutamente", deve dizer Kasich. "Nós podemos fazer melhor do que o que estamos vendo hoje, com certeza. Eu sei que Joe Biden, com sua experiência, conhecimento e decência, pode nos nos unir para nos ajudar a encontrar um caminho melhor."
O ex-governador de Ohio passou décadas na vida pública, sempre pelo partido republicano. Em uma entrevista, pouco antes de seu discurso, ele disse que não conseguiria repetir o que fez em 2016, quando não votou em Hillary e nem em Trump. Desta vez, disse ele, "a alma do país está sendo danificada".
Biden tem a preferência entre eleitores independentes, segundo pesquisas eleitorais, e busca conquistar o eleitorado moderado que chegou a votar em Barack Obama em 2008, mas escolheu Trump em 2016. A participação dos republicanos fortalece seu discurso junto a esse eleitorado. A presença dos republicanos na convenção se soma aos grupos de conservadores anti-Trump - o Lincoln Project e o Republican Voters Against Trump - e ao movimento de senadores do partido que tentam se descolar da imagem do presidente.
"Há republicanos que querem votar por Biden e é importante mostrar que eles não estão sozinhos, que está tudo bem em ter líderes republicanos que votarão em Biden", afirmou Cedric Richmond, deputado do Partido Democrata, ao justificar a presença de nomes ligados à oposição. "O tema da primeira noite da convenção é 'Nós, o povo', e não 'Nós, os democratas'", disse Richmond.
A apresentação de republicanos, no entanto, criou atritos com a ala progressista do partido. Pouco antes da convenção, Kasich criticou "políticos extremistas" e mencionou o nome da deputada Alexandria Ocasio-Cortez, uma estrela do partido democrata."Pessoas extremistas, de esquerda ou de direita, recebem publicidade exagerada que tende a definir seu partido. Eu ouço as pessoas o tempo todo fazendo essas declarações, e só porque a AOC recebe publicidade exagerada não significa que ela representa o Partido Democrata. Ela é apenas um membro do partido", disse o republicano.
A deputada respondeu, pelo Twitter. “É ótimo que Kasich tenha acordado e percebido a importância de apoiar a chapa Biden-Harris. Espero que ele chegue aos eleitores do Partido Republicano. Ainda assim, algo me diz que um republicano que luta contra os direitos das mulheres não pode dizer quem é ou não representante do partido Democrata", escreveu a deputada, citando o fato de o republicano ser contrário ao aborto, autorizado nos EUA.