‘Rivalidade com os EUA vai definir apetite da China em avançar sobre Taiwan’, diz analista


Eleição taiwanesa deste sábado ocorrem em meio à tensão crescente com Pequim e ameaça chinesa de ‘esmagar’ qualquer tentativa de independência

Por Jéssica Petrovna
Entrevista comSimona Grano Pesquisadora sênior em Taiwan no Centro de Análise da China do Asia Society e diretora do Projeto de Estudos de Taiwan na Universidade de Zurique

Taiwan dá a largada a maratona eleitoral que marca o ano de 2024. A votação deste sábado, 13, é observada atentamente pelo mundo inteiro em meio à tensão com a China, que reivindica Taipé como parte do seu território e transformou os exercícios militares de intimidação em rotina na faixa marítima que separa a ilha do continente.

Na véspera do pleito, Pequim deu mais um recado ao prometer “esmagar” qualquer tentativa de independência de Taiwan. E, na prática, o que está em jogo nas urnas é a estratégia para lidar com essa tensão. A disputa é entre a continuidade do governo que se aproximou dos EUA em busca de segurança e a oposição que vê na boa relação com a China a maior garantia.

Apesar do tom beligerante que Pequim adota com Taipé, no entanto, é justamente o nível da competição com o Washington que deve ditar o “apetite” chinês para o confronto no curto prazo, afirma a pesquisadora sênior em Taiwan no Centro de Análise da China do Asia Society.

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“Eu não acredito que devamos nos preocupar com uma invasão militar no momento”, afirma. “O que devemos observar realmente é como a competição Estados Unidos-China se desenvolve. E como a situação econômica interna da China vai evoluir, já que não estão indo bem. É isso que vai dizer se Pequim terá ou não apetite para iniciar uma confrontação militar”, conclui.

Pilotos da Força Aérea de Taiwan treinam em meio à tensão com a China.  Foto: EFE/EPA/RITCHIE B. TONGO

Leia abaixo os principais trechos da entrevista

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O número de pessoas na ilha que se identifica como chineses e taiwaneses tem caído enquanto cresce o percentual daqueles que se veem só como taiwaneses. O que isso reflete?

A China sempre pensou que poderia recuperar Taiwan por meio da integração econômica. Mas isso mudou especialmente quando Tsai Ing-wen foi eleita presidente em 2016. Mais tarde, o que aconteceu em Hong Kong, com a China implementando a lei de segurança nacional, realmente influenciou as pessoas a votarem nela (para o segundo mandato).

E essa tendência de consolidar o voto para o partido que deseja mais distância de Pequim está conectada ao fato de que as gerações mais jovens se veem apenas como taiwaneses em uma porcentagem cada vez maior. 62% das pessoas da ilha se identificam apenas como taiwaneses mas, se olharmos para as pessoas que tem entre 20 e 40 anos, esse número gira em torno de 80%.

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Esta é uma tendência que, não importa em quem votem, revela muito sobre questões sociais, e não apenas de identidade. Tem muito a ver com princípios democráticos e o fato de que os taiwaneses, especialmente os jovens, só sabem o que significa viver em um país democrático. Para eles, a questão da identidade está muito ligada ao sistema de governo e isso é um sistema de governo democrático. Essa é uma tendência que a China não pode deter, não importa em quem votem.

Apoiadores do Partido Progressista Democrático (DPP) em comício de William Lai. Foto: EFE/EPA/RITCHIE B. TONGO

E a China ameaçou ‘esmagar’ qualquer tentativa de independência de Taiwan. Qual é a maior preocupação no que diz respeito à relação com Pequim;

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Eu não acredito que devamos nos preocupar com uma invasão militar no momento. O que devemos observar realmente é como a competição Estados Unidos-China se desenvolve, se estabiliza ou não. E como a situação econômica interna da China vai evoluir, já que não estão indo bem no momento. É isso que vai dizer se Pequim terá ou não apetite para iniciar uma confrontação militar ou um bloqueio. Além disso, acredito que os chineses vão querer ver primeiro o que acontece nas eleições dos Estados Unidos, em novembro.

Alguns relatórios afirmam que Xi Jinping estaria preparando uma eventual invasão em 2027 ou 2030. Você acredita que essas datas são mais retóricas do que uma real ameaça?

A data marca os 100 anos da fundação do Exército de Libertação Popular da China, portanto, tudo isso é simbólico. Eu acredito que o plano de longo prazo é certamente recuperar Taiwan, seja por meios militares ou por meios pacíficos, mas não acho que essas datas sejam particularmente importantes. Não acredito que haja um plano concreto para fazer isso até 2027.

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Informações vazadas recentemente pelo serviço secreto dos Estados Unidos mostram problemas com foguetes e o estado de deterioração do exército chinês. Todos os sinais indicam no momento que o exército chinês não está pronto. Ou seja, o plano de longo prazo é realmente recuperar Taiwan, mas não acredito que haja um plano urgente no momento, dada a situação de recessão econômica e o estado do Exército de Libertação do Povo.

E no que diz respeito a economia? Qual a situação de Taiwan?

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Até agora, a China tentou sabotar a economia de Taiwan, mas eles só atingiram produtos agrícolas e pesqueiros, o que mostra que Pequim também não tem interesse em sabotar, por exemplo, o setor de tecnologia, porque dependente da indústria de semicondutores em Taiwan.

Outros problemas que os taiwaneses enfrentam estão realmente ligados à desaceleração econômica. Os preços estão muito altos e é realmente difícil para uma família jovem se estabelecer, comprar uma casa, por exemplo. Há também a questão demográfica (a ilha tem uma das menores taxas de natalidade da Ásia), a sociedade está envelhecendo mais do que em outras.

Nesta eleição, os partidos de oposição cogitaram se unir, mas chegaram divididos. Como funciona essa interação entre as forças políticas de Taiwan?

É complicado no sentido de que os dois principais partidos, o Partido Democrático Progressista (DPP da sigla em inglês) e o Kuomintang (KMT) têm uma relação muito tensa. Isso remonta do passado, do período em que o KMT impôs uma lei marcial e governou com um regime autoritário brutal por 40 anos. O DPP foi o partido que surgiu dessa oposição ao regime, então o legado histórico pesa muito nessa relação.

O terceiro, o Partido do Povo de Taiwan (TPP da sigla em inglês), é mais difícil de determinar, é um partido mais errático e também um pouco oportunista. Parece se alinhar a um lado ou outro de acordo com o que é mais conveniente no momento. Ko Wen-je (o líder do partido), foi eleito pela primeira vez como prefeito de Taipé em 2014 com a ajuda do DPP. Agora tentou, ainda que sem sucesso, formar uma chapa eleitoral junto com o KMT. Nesse caso, acredito que realmente será preciso esperar para ver, mas acredito que será pragmático.

Taiwan dá a largada a maratona eleitoral que marca o ano de 2024. A votação deste sábado, 13, é observada atentamente pelo mundo inteiro em meio à tensão com a China, que reivindica Taipé como parte do seu território e transformou os exercícios militares de intimidação em rotina na faixa marítima que separa a ilha do continente.

Na véspera do pleito, Pequim deu mais um recado ao prometer “esmagar” qualquer tentativa de independência de Taiwan. E, na prática, o que está em jogo nas urnas é a estratégia para lidar com essa tensão. A disputa é entre a continuidade do governo que se aproximou dos EUA em busca de segurança e a oposição que vê na boa relação com a China a maior garantia.

Apesar do tom beligerante que Pequim adota com Taipé, no entanto, é justamente o nível da competição com o Washington que deve ditar o “apetite” chinês para o confronto no curto prazo, afirma a pesquisadora sênior em Taiwan no Centro de Análise da China do Asia Society.

“Eu não acredito que devamos nos preocupar com uma invasão militar no momento”, afirma. “O que devemos observar realmente é como a competição Estados Unidos-China se desenvolve. E como a situação econômica interna da China vai evoluir, já que não estão indo bem. É isso que vai dizer se Pequim terá ou não apetite para iniciar uma confrontação militar”, conclui.

Pilotos da Força Aérea de Taiwan treinam em meio à tensão com a China.  Foto: EFE/EPA/RITCHIE B. TONGO

Leia abaixo os principais trechos da entrevista

O número de pessoas na ilha que se identifica como chineses e taiwaneses tem caído enquanto cresce o percentual daqueles que se veem só como taiwaneses. O que isso reflete?

A China sempre pensou que poderia recuperar Taiwan por meio da integração econômica. Mas isso mudou especialmente quando Tsai Ing-wen foi eleita presidente em 2016. Mais tarde, o que aconteceu em Hong Kong, com a China implementando a lei de segurança nacional, realmente influenciou as pessoas a votarem nela (para o segundo mandato).

E essa tendência de consolidar o voto para o partido que deseja mais distância de Pequim está conectada ao fato de que as gerações mais jovens se veem apenas como taiwaneses em uma porcentagem cada vez maior. 62% das pessoas da ilha se identificam apenas como taiwaneses mas, se olharmos para as pessoas que tem entre 20 e 40 anos, esse número gira em torno de 80%.

Esta é uma tendência que, não importa em quem votem, revela muito sobre questões sociais, e não apenas de identidade. Tem muito a ver com princípios democráticos e o fato de que os taiwaneses, especialmente os jovens, só sabem o que significa viver em um país democrático. Para eles, a questão da identidade está muito ligada ao sistema de governo e isso é um sistema de governo democrático. Essa é uma tendência que a China não pode deter, não importa em quem votem.

Apoiadores do Partido Progressista Democrático (DPP) em comício de William Lai. Foto: EFE/EPA/RITCHIE B. TONGO

E a China ameaçou ‘esmagar’ qualquer tentativa de independência de Taiwan. Qual é a maior preocupação no que diz respeito à relação com Pequim;

Eu não acredito que devamos nos preocupar com uma invasão militar no momento. O que devemos observar realmente é como a competição Estados Unidos-China se desenvolve, se estabiliza ou não. E como a situação econômica interna da China vai evoluir, já que não estão indo bem no momento. É isso que vai dizer se Pequim terá ou não apetite para iniciar uma confrontação militar ou um bloqueio. Além disso, acredito que os chineses vão querer ver primeiro o que acontece nas eleições dos Estados Unidos, em novembro.

Alguns relatórios afirmam que Xi Jinping estaria preparando uma eventual invasão em 2027 ou 2030. Você acredita que essas datas são mais retóricas do que uma real ameaça?

A data marca os 100 anos da fundação do Exército de Libertação Popular da China, portanto, tudo isso é simbólico. Eu acredito que o plano de longo prazo é certamente recuperar Taiwan, seja por meios militares ou por meios pacíficos, mas não acho que essas datas sejam particularmente importantes. Não acredito que haja um plano concreto para fazer isso até 2027.

Informações vazadas recentemente pelo serviço secreto dos Estados Unidos mostram problemas com foguetes e o estado de deterioração do exército chinês. Todos os sinais indicam no momento que o exército chinês não está pronto. Ou seja, o plano de longo prazo é realmente recuperar Taiwan, mas não acredito que haja um plano urgente no momento, dada a situação de recessão econômica e o estado do Exército de Libertação do Povo.

E no que diz respeito a economia? Qual a situação de Taiwan?

Até agora, a China tentou sabotar a economia de Taiwan, mas eles só atingiram produtos agrícolas e pesqueiros, o que mostra que Pequim também não tem interesse em sabotar, por exemplo, o setor de tecnologia, porque dependente da indústria de semicondutores em Taiwan.

Outros problemas que os taiwaneses enfrentam estão realmente ligados à desaceleração econômica. Os preços estão muito altos e é realmente difícil para uma família jovem se estabelecer, comprar uma casa, por exemplo. Há também a questão demográfica (a ilha tem uma das menores taxas de natalidade da Ásia), a sociedade está envelhecendo mais do que em outras.

Nesta eleição, os partidos de oposição cogitaram se unir, mas chegaram divididos. Como funciona essa interação entre as forças políticas de Taiwan?

É complicado no sentido de que os dois principais partidos, o Partido Democrático Progressista (DPP da sigla em inglês) e o Kuomintang (KMT) têm uma relação muito tensa. Isso remonta do passado, do período em que o KMT impôs uma lei marcial e governou com um regime autoritário brutal por 40 anos. O DPP foi o partido que surgiu dessa oposição ao regime, então o legado histórico pesa muito nessa relação.

O terceiro, o Partido do Povo de Taiwan (TPP da sigla em inglês), é mais difícil de determinar, é um partido mais errático e também um pouco oportunista. Parece se alinhar a um lado ou outro de acordo com o que é mais conveniente no momento. Ko Wen-je (o líder do partido), foi eleito pela primeira vez como prefeito de Taipé em 2014 com a ajuda do DPP. Agora tentou, ainda que sem sucesso, formar uma chapa eleitoral junto com o KMT. Nesse caso, acredito que realmente será preciso esperar para ver, mas acredito que será pragmático.

Taiwan dá a largada a maratona eleitoral que marca o ano de 2024. A votação deste sábado, 13, é observada atentamente pelo mundo inteiro em meio à tensão com a China, que reivindica Taipé como parte do seu território e transformou os exercícios militares de intimidação em rotina na faixa marítima que separa a ilha do continente.

Na véspera do pleito, Pequim deu mais um recado ao prometer “esmagar” qualquer tentativa de independência de Taiwan. E, na prática, o que está em jogo nas urnas é a estratégia para lidar com essa tensão. A disputa é entre a continuidade do governo que se aproximou dos EUA em busca de segurança e a oposição que vê na boa relação com a China a maior garantia.

Apesar do tom beligerante que Pequim adota com Taipé, no entanto, é justamente o nível da competição com o Washington que deve ditar o “apetite” chinês para o confronto no curto prazo, afirma a pesquisadora sênior em Taiwan no Centro de Análise da China do Asia Society.

“Eu não acredito que devamos nos preocupar com uma invasão militar no momento”, afirma. “O que devemos observar realmente é como a competição Estados Unidos-China se desenvolve. E como a situação econômica interna da China vai evoluir, já que não estão indo bem. É isso que vai dizer se Pequim terá ou não apetite para iniciar uma confrontação militar”, conclui.

Pilotos da Força Aérea de Taiwan treinam em meio à tensão com a China.  Foto: EFE/EPA/RITCHIE B. TONGO

Leia abaixo os principais trechos da entrevista

O número de pessoas na ilha que se identifica como chineses e taiwaneses tem caído enquanto cresce o percentual daqueles que se veem só como taiwaneses. O que isso reflete?

A China sempre pensou que poderia recuperar Taiwan por meio da integração econômica. Mas isso mudou especialmente quando Tsai Ing-wen foi eleita presidente em 2016. Mais tarde, o que aconteceu em Hong Kong, com a China implementando a lei de segurança nacional, realmente influenciou as pessoas a votarem nela (para o segundo mandato).

E essa tendência de consolidar o voto para o partido que deseja mais distância de Pequim está conectada ao fato de que as gerações mais jovens se veem apenas como taiwaneses em uma porcentagem cada vez maior. 62% das pessoas da ilha se identificam apenas como taiwaneses mas, se olharmos para as pessoas que tem entre 20 e 40 anos, esse número gira em torno de 80%.

Esta é uma tendência que, não importa em quem votem, revela muito sobre questões sociais, e não apenas de identidade. Tem muito a ver com princípios democráticos e o fato de que os taiwaneses, especialmente os jovens, só sabem o que significa viver em um país democrático. Para eles, a questão da identidade está muito ligada ao sistema de governo e isso é um sistema de governo democrático. Essa é uma tendência que a China não pode deter, não importa em quem votem.

Apoiadores do Partido Progressista Democrático (DPP) em comício de William Lai. Foto: EFE/EPA/RITCHIE B. TONGO

E a China ameaçou ‘esmagar’ qualquer tentativa de independência de Taiwan. Qual é a maior preocupação no que diz respeito à relação com Pequim;

Eu não acredito que devamos nos preocupar com uma invasão militar no momento. O que devemos observar realmente é como a competição Estados Unidos-China se desenvolve, se estabiliza ou não. E como a situação econômica interna da China vai evoluir, já que não estão indo bem no momento. É isso que vai dizer se Pequim terá ou não apetite para iniciar uma confrontação militar ou um bloqueio. Além disso, acredito que os chineses vão querer ver primeiro o que acontece nas eleições dos Estados Unidos, em novembro.

Alguns relatórios afirmam que Xi Jinping estaria preparando uma eventual invasão em 2027 ou 2030. Você acredita que essas datas são mais retóricas do que uma real ameaça?

A data marca os 100 anos da fundação do Exército de Libertação Popular da China, portanto, tudo isso é simbólico. Eu acredito que o plano de longo prazo é certamente recuperar Taiwan, seja por meios militares ou por meios pacíficos, mas não acho que essas datas sejam particularmente importantes. Não acredito que haja um plano concreto para fazer isso até 2027.

Informações vazadas recentemente pelo serviço secreto dos Estados Unidos mostram problemas com foguetes e o estado de deterioração do exército chinês. Todos os sinais indicam no momento que o exército chinês não está pronto. Ou seja, o plano de longo prazo é realmente recuperar Taiwan, mas não acredito que haja um plano urgente no momento, dada a situação de recessão econômica e o estado do Exército de Libertação do Povo.

E no que diz respeito a economia? Qual a situação de Taiwan?

Até agora, a China tentou sabotar a economia de Taiwan, mas eles só atingiram produtos agrícolas e pesqueiros, o que mostra que Pequim também não tem interesse em sabotar, por exemplo, o setor de tecnologia, porque dependente da indústria de semicondutores em Taiwan.

Outros problemas que os taiwaneses enfrentam estão realmente ligados à desaceleração econômica. Os preços estão muito altos e é realmente difícil para uma família jovem se estabelecer, comprar uma casa, por exemplo. Há também a questão demográfica (a ilha tem uma das menores taxas de natalidade da Ásia), a sociedade está envelhecendo mais do que em outras.

Nesta eleição, os partidos de oposição cogitaram se unir, mas chegaram divididos. Como funciona essa interação entre as forças políticas de Taiwan?

É complicado no sentido de que os dois principais partidos, o Partido Democrático Progressista (DPP da sigla em inglês) e o Kuomintang (KMT) têm uma relação muito tensa. Isso remonta do passado, do período em que o KMT impôs uma lei marcial e governou com um regime autoritário brutal por 40 anos. O DPP foi o partido que surgiu dessa oposição ao regime, então o legado histórico pesa muito nessa relação.

O terceiro, o Partido do Povo de Taiwan (TPP da sigla em inglês), é mais difícil de determinar, é um partido mais errático e também um pouco oportunista. Parece se alinhar a um lado ou outro de acordo com o que é mais conveniente no momento. Ko Wen-je (o líder do partido), foi eleito pela primeira vez como prefeito de Taipé em 2014 com a ajuda do DPP. Agora tentou, ainda que sem sucesso, formar uma chapa eleitoral junto com o KMT. Nesse caso, acredito que realmente será preciso esperar para ver, mas acredito que será pragmático.

Taiwan dá a largada a maratona eleitoral que marca o ano de 2024. A votação deste sábado, 13, é observada atentamente pelo mundo inteiro em meio à tensão com a China, que reivindica Taipé como parte do seu território e transformou os exercícios militares de intimidação em rotina na faixa marítima que separa a ilha do continente.

Na véspera do pleito, Pequim deu mais um recado ao prometer “esmagar” qualquer tentativa de independência de Taiwan. E, na prática, o que está em jogo nas urnas é a estratégia para lidar com essa tensão. A disputa é entre a continuidade do governo que se aproximou dos EUA em busca de segurança e a oposição que vê na boa relação com a China a maior garantia.

Apesar do tom beligerante que Pequim adota com Taipé, no entanto, é justamente o nível da competição com o Washington que deve ditar o “apetite” chinês para o confronto no curto prazo, afirma a pesquisadora sênior em Taiwan no Centro de Análise da China do Asia Society.

“Eu não acredito que devamos nos preocupar com uma invasão militar no momento”, afirma. “O que devemos observar realmente é como a competição Estados Unidos-China se desenvolve. E como a situação econômica interna da China vai evoluir, já que não estão indo bem. É isso que vai dizer se Pequim terá ou não apetite para iniciar uma confrontação militar”, conclui.

Pilotos da Força Aérea de Taiwan treinam em meio à tensão com a China.  Foto: EFE/EPA/RITCHIE B. TONGO

Leia abaixo os principais trechos da entrevista

O número de pessoas na ilha que se identifica como chineses e taiwaneses tem caído enquanto cresce o percentual daqueles que se veem só como taiwaneses. O que isso reflete?

A China sempre pensou que poderia recuperar Taiwan por meio da integração econômica. Mas isso mudou especialmente quando Tsai Ing-wen foi eleita presidente em 2016. Mais tarde, o que aconteceu em Hong Kong, com a China implementando a lei de segurança nacional, realmente influenciou as pessoas a votarem nela (para o segundo mandato).

E essa tendência de consolidar o voto para o partido que deseja mais distância de Pequim está conectada ao fato de que as gerações mais jovens se veem apenas como taiwaneses em uma porcentagem cada vez maior. 62% das pessoas da ilha se identificam apenas como taiwaneses mas, se olharmos para as pessoas que tem entre 20 e 40 anos, esse número gira em torno de 80%.

Esta é uma tendência que, não importa em quem votem, revela muito sobre questões sociais, e não apenas de identidade. Tem muito a ver com princípios democráticos e o fato de que os taiwaneses, especialmente os jovens, só sabem o que significa viver em um país democrático. Para eles, a questão da identidade está muito ligada ao sistema de governo e isso é um sistema de governo democrático. Essa é uma tendência que a China não pode deter, não importa em quem votem.

Apoiadores do Partido Progressista Democrático (DPP) em comício de William Lai. Foto: EFE/EPA/RITCHIE B. TONGO

E a China ameaçou ‘esmagar’ qualquer tentativa de independência de Taiwan. Qual é a maior preocupação no que diz respeito à relação com Pequim;

Eu não acredito que devamos nos preocupar com uma invasão militar no momento. O que devemos observar realmente é como a competição Estados Unidos-China se desenvolve, se estabiliza ou não. E como a situação econômica interna da China vai evoluir, já que não estão indo bem no momento. É isso que vai dizer se Pequim terá ou não apetite para iniciar uma confrontação militar ou um bloqueio. Além disso, acredito que os chineses vão querer ver primeiro o que acontece nas eleições dos Estados Unidos, em novembro.

Alguns relatórios afirmam que Xi Jinping estaria preparando uma eventual invasão em 2027 ou 2030. Você acredita que essas datas são mais retóricas do que uma real ameaça?

A data marca os 100 anos da fundação do Exército de Libertação Popular da China, portanto, tudo isso é simbólico. Eu acredito que o plano de longo prazo é certamente recuperar Taiwan, seja por meios militares ou por meios pacíficos, mas não acho que essas datas sejam particularmente importantes. Não acredito que haja um plano concreto para fazer isso até 2027.

Informações vazadas recentemente pelo serviço secreto dos Estados Unidos mostram problemas com foguetes e o estado de deterioração do exército chinês. Todos os sinais indicam no momento que o exército chinês não está pronto. Ou seja, o plano de longo prazo é realmente recuperar Taiwan, mas não acredito que haja um plano urgente no momento, dada a situação de recessão econômica e o estado do Exército de Libertação do Povo.

E no que diz respeito a economia? Qual a situação de Taiwan?

Até agora, a China tentou sabotar a economia de Taiwan, mas eles só atingiram produtos agrícolas e pesqueiros, o que mostra que Pequim também não tem interesse em sabotar, por exemplo, o setor de tecnologia, porque dependente da indústria de semicondutores em Taiwan.

Outros problemas que os taiwaneses enfrentam estão realmente ligados à desaceleração econômica. Os preços estão muito altos e é realmente difícil para uma família jovem se estabelecer, comprar uma casa, por exemplo. Há também a questão demográfica (a ilha tem uma das menores taxas de natalidade da Ásia), a sociedade está envelhecendo mais do que em outras.

Nesta eleição, os partidos de oposição cogitaram se unir, mas chegaram divididos. Como funciona essa interação entre as forças políticas de Taiwan?

É complicado no sentido de que os dois principais partidos, o Partido Democrático Progressista (DPP da sigla em inglês) e o Kuomintang (KMT) têm uma relação muito tensa. Isso remonta do passado, do período em que o KMT impôs uma lei marcial e governou com um regime autoritário brutal por 40 anos. O DPP foi o partido que surgiu dessa oposição ao regime, então o legado histórico pesa muito nessa relação.

O terceiro, o Partido do Povo de Taiwan (TPP da sigla em inglês), é mais difícil de determinar, é um partido mais errático e também um pouco oportunista. Parece se alinhar a um lado ou outro de acordo com o que é mais conveniente no momento. Ko Wen-je (o líder do partido), foi eleito pela primeira vez como prefeito de Taipé em 2014 com a ajuda do DPP. Agora tentou, ainda que sem sucesso, formar uma chapa eleitoral junto com o KMT. Nesse caso, acredito que realmente será preciso esperar para ver, mas acredito que será pragmático.

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Entrevista por Jéssica Petrovna

Repórter da editoria de Internacional.

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