Enfrentando acusações do Ocidente de “chantagem” por represar toneladas de grãos na Ucrânia, a Rússia sinalizou que está pronta para criar um “corredor humanitário” no Mar Negro para escoamento da produção agrícola ucraniana em troca do alívio de algumas sanções contra Moscou, evitando um cenário de escassez alimentar no mercado internacional.
O Kremlin estaria de acordo em conceder um “salvo conduto” para que embarcações de transporte de alimento deixam a Ucrânia, desde que o Ocidente concorde em levantar algumas das sanções impostas desde o começo da guerra, afirmou o vice-ministro das Relações Exteriores russo, Andrei Rudenko, citado pela agência de notícias Interfax na quarta-feira, 25.
“Temos repetidamente insistido sobre este ponto, que uma solução para o problema alimentar requer uma abordagem abrangente, incluindo o levantamento das sanções que foram impostas às exportações e transações financeiras russas”, disse Rudenko.
Durante a semana, líderes ocidentais acusaram a Rússia de uma ação deliberada na Ucrânia para pressionar o sistema internacional com uma redução da oferta de trigo e óleo de girassol A Ucrânia é um importante fornecedor dos gêneros alimentícios no mercado internacional.
Na terça-feira, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, afirmou que Moscou está acumulando suas próprias exportações de alimentos retendo suprimentos produzidos pela Ucrânia, para aumentar os preços globais ou negociando trigo em troca de apoio político. Um relatório da inteligência dos EUA recentemente revelado ao público afirmou que um bloqueio naval russo interrompe o comércio marítimo nos portos ucranianos.
Apesar das afirmações de Rudenko sobre o corredor humanitário, Moscou não admite que sua atuação tenha bloqueado a retirada de grãos. O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, culpou o Ocidente pela crise. “Nós categoricamente não aceitamos essas acusações. Pelo contrário, nós culpamos os países ocidentais por ações que levaram a isso”, disse nesta quinta-feira, 26.
Ainda de acordo com a Interfax, Rudenko também afirmou que a Moscou exige a retirada de minas colocadas pelo lado ucraniano nos portos onde os navios estão ancorados, acrescentando que a Rússia mantém um diálogo aberto com as Nações Unidas.
Um funcionário da diplomacia turca revelou que Ancara e Moscou estão em negociações sobre a abertura do corredor humanitário. A Turquia regula o trânsito de navios de guerra em tempos de guerra através do Estreito Turco, que conecta os mares Negro e Egeu, e acionou a Convenção de Montreux quatro dias depois que a Rússia invadiu a Ucrânia, impedindo a Rússia de trazer mais navios de guerra para o Mar Negro.
Moscou, no entanto, contornou o acordo usando navios mercantes - que não são proibidos nas vias navegáveis - para abastecer as operações militares na Ucrânia, segundo o The Middle East Institute, um think tank apartidário em Washington.
“A Turquia está negociando com a Rússia e a Ucrânia a exportação de grãos da Ucrânia”, disse o funcionário, pedindo anonimato. “Com um corredor a ser aberto a partir da Turquia, há uma demanda para que esses grãos cheguem aos mercados-alvo. As negociações ainda estão em andamento”, acrescentou.
Respondendo a uma pergunta sobre a condição imposta pela Rússia para a criação do corredor humanitário, a ministra das Relações Exteriores do Reino Unido, Liz Truss, acusou o presidente Vladimir Putin de pedir “um resgate ao mundo por comida”.
“É completamente espantoso que Putin esteja tentando manter o mundo como refém, e ele está essencialmente armando a fome e a falta de comida entre as pessoas mais pobres do mundo”, disse Truss durante uma visita à Bósnia na quinta-feira, 26.
“Nós simplesmente não podemos permitir que isso aconteça. Putin precisa remover o bloqueio aos grãos ucranianos. (...) O que não podemos ter é qualquer suspensão de sanções, qualquer apaziguamento, que simplesmente tornará Putin mais forte a longo prazo”, acrescentou Truss./ REUTERS e WPOST