O governo da Sérvia colocou suas tropas em alerta máximo nesta terça, 27, devido às recentes tensões no Kosovo. O país vizinho tem sofrido com tiroteios, explosões e bloqueios de estradas.
O presidente sérvio, Aleksandar Vucic, “ordenou que o Exército esteja no mais alto nível de prontidão de combate, ou seja, no nível de uso da força armada”, disse o ministro da Defesa, Milos Vucevic, em um comunicado.
Na véspera, Vucic havia enviado o chefe do Exército, general Milan Mojsilovic, à fronteira com o Kosovo, onde a comunidade sérvia ergueu barricadas num novo agravamento das tensões neste jovem país dos Bálcãs.
“A situação lá é complicada e complexa”, disse o chefe militar à emissora Pink, na noite de domingo, a caminho de Raska, a 10 km da fronteira com Kosovo. Posteriormente, o Ministério do Interior havia declarado que “todas as unidades” dependentes de seu departamento passariam “imediatamente para o comando do chefe do Estado-Maior”.
A Sérvia não reconhece a independência de sua antiga província do Sul - habitada principalmente por albaneses étnicos - proclamada em 2008.
Belgrado incentiva os 120 mil sérvios de Kosovo a desafiar as autoridades locais, enquanto Pristina busca consolidar sua soberania sobre todo o território.
Bloqueios
Centenas de sérvios mantêm bloqueios de estradas no Norte de Kosovo desde 10 de dezembro, para protestar contra a prisão de um ex-policial sérvio, paralisando a circulação de veículos na direção de dois postos de fronteira com a Sérvia.
Na segunda-feira, os meios de comunicação sérvios divulgaram um vídeo compartilhado nas redes sociais, em que se ouvem disparos de arma de fogo, alegando tratar-se de “combates” que ocorreram quando as forças kosovar tentaram desmantelar uma barricada.
O ministro do Interior do Kosovo, Xhelal Svecla, disse que o ataque ocorreu contra uma patrulha da Força Internacional de Segurança de Kosovo (KFOR).
A KFOR anunciou uma investigação sobre os tiros “em 25 de dezembro, perto de uma patrulha da missão da Otan no Kosovo”. O incidente, no entanto, não causou “ferimentos ou danos materiais”.
Entenda a crise no Kosovo e relembre a guerra
Os Bálcãs, ou península balcânica, são uma região no sudeste da Europa que engloba a Albânia, Bósnia e Herzegovina, Bulgária, Grécia, Macedônia do Norte, Montenegro, Sérvia, o autoproclamado Estado independente do Kosovo, uma porção da Turquia no continente europeu e partes da Croácia, da Romênia e da Eslovênia. O termo deriva da palavra turca para montanha e faz referência à cordilheira dos Bálcãs, que se estende do leste da Sérvia até o mar Negro.
A animosidade entre albaneses e sérvios do Kosovo permanece 20 anos após a guerra.
As tensões crescentes na região fazem reviver as memórias da pior guerra na Europa desde o fim da 2.ª Guerra. O conflito no Kosovo deixou 13 mil mortos e milhares de feridos. A Guerra de Kosovo começou em março de 1999 e ainda provoca enorme comoção na população de maioria albanesa do território nos Balcãs.
No início do século 20, países da região lutaram pelo controle dos territórios remanescentes do Império Otomano. O reino independente da Sérvia entrou em uma série de guerras para formar a “Grande Sérvia”, um Estado envolvendo toda a região balcânica. Como resultado das guerras balcânicas (1912-1913), a Sérvia incorporou a Macedônia e o Kosovo, considerado berço original da nacionalidade sérvia.
Na 2.ª Guerra, boa parte do território kosovar passou a fazer parte da Albânia e, ao fim do conflito, foi incorporado à Iugoslávia, de maioria sérvia. Kosovo teve sua autonomia reconhecida constitucionalmente em 1974 e passou a ter um governo próprio, mas essa autonomia foi revogada e o governo, dissolvido, em 1989 e 1990.
No início da década seguinte, a república socialista da Iugoslávia foi dissolvida com a independência de Bósnia, Croácia, Macedônia e Eslovênia, com diferentes graus de violência.
Com 90% da população de origem albanesa, a região autônoma de Kosovo fazia parte da Iugoslávia. Mas os albaneses eram perseguidos pela minoria sérvia. A tensão étnica levou a um movimento separatista, que em 1996 fundou o Exército da Libertação do Kosovo para se opor ao governo central da Iugoslávia, liderado pelo nacionalista Slobodan Milosevic.
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O conflito chegou ao ápice em 1998 e, após denúncias de que Milosevic estava promovendo massacre de albaneses, e depois do fracasso da diplomacia, a Otan decidiu intervir com ataques aéreos contra alvos iugoslavos em Belgrado e Pristina. Foram 79 dias de bombardeios, ao fim dos quais os sérvios saíram do Kosovo, deixando a região sob supervisão das Nações Unidas.
A Otan optou pela ação militar de 1999 com a justificativa de conter o banho de sangue promovido por Milosevic contra a população albanesa no Kosovo. Mas a ação foi criticada por ter sido realizada sem a aprovação do Conselho de Segurança da ONU. Os bombardeios não deram os resultados esperados, e Milosevic respondeu à intervenção com um banho de sangue.
Militares e grupos paramilitares sérvios invadiram casas no Kosovo e mataram civis às centenas, deixando destruição em cidades inteiras. Quase um milhão de pessoas abandonou o Kosovo. A crise humanitária foi a pior registrada na Europa desde a 2.ª Guerra. O conflito se estenderia até 10 de junho daquele ano.
A ONU instituiu uma força de paz internacional na província e os bombardeios ocidentais cessaram, apesar da permanência de Milosevic no poder. A administração do Kosovo coube a um mandato da Otan. O país declarou independência da Sérvia em 2008, quase uma década depois que os ataques aéreos da Otan acabaram com o controle de Belgrado sobre o território.
Dos 193 países que formam a ONU, 82 ainda não veem Kosovo como uma república independente. Entre eles, o Brasil. Mas a constituição Sérvia ainda vê o Kosovo como território sérvio, e vem impedindo o Kosovo de ingressar em instituições internacionais como a Interpol e a Unesco. / AP, NYT e W. POST