Sérvia exige retorno de suas tropas ao Kosovo e aumenta tensão nos Balcãs


Ocidente fez advertências e afirmou que exigência não será tolerada; presidente pede o retorno de 1 mil militares

Por Redação

BELGRADO, SÉRVIA - A Sérvia exigiu formalmente nesta sexta-feira, 16, que suas forças de segurança retornassem à ex-província sérvia separatista do Kosovo, apesar das advertências do Ocidente de que tais apelos não serão aceitos e aumentarão as tensões naquela parte dos Bálcãs.

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O presidente sérvio, Aleksandar Vucic, disse à televisão estatal RTS que o governo pediu ao comandante das forças de paz lideradas pela Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) estacionadas em Kosovo desde 1999, quando a aliança ocidental expulsou as tropas sérvias da região, para permitir o retorno de até 1 mil militares e policiais sérvios ao norte do país, povoado por sérvios.

“O pedido diz que um certo número de tropas sérvias, de cem a 1.000, retornará ao Kosovo”, disse Vucic. Ele disse que apesar de ser “quase certo que isso não vai ser concedido”, o pedido vai ficar registrado.

Mulher sérvia passa por bandeira do Kosovo na cidade de Mitrovica Foto: REUTERS/Marko Djurica
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Funcionários sérvios afirmam que uma resolução das Nações Unidas que encerrou formalmente a guerra do Kosovo permite que as tropas sérvias retornem ao local. A Otan bombardeou a Sérvia para impedir a guerra, acabar com sua sangrenta repressão contra separatistas e civis de etnia albanesa e ordenar que suas tropas saíssem de Kosovo.

Funcionários sérvios afirmam que as missões de paz lideradas pela Otan e pela União Européia são incapazes de proteger a minoria sérvia em Kosovo do assédio da maioria albanesa e que suas forças de segurança podem fazer o trabalho.

É improvável que o retorno das tropas sérvias seja concedido porque significaria entregar a segurança das regiões do norte às forças sérvias – uma medida que aumentaria as tensões nos Bálcãs.

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As autoridades alemãs e americanas rejeitaram veementemente qualquer ideia do retorno das forças de segurança sérvias à região.

Aumento das tensões

As tensões entre a Sérvia e o Kosovo aumentaram na semana passada, depois que os sérvios ergueram barricadas nas principais estradas do norte da província para protestar contra a prisão de um ex-policial sérvio do Kosovo. Tiros foram disparados das barricadas.

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A Sérvia elevou a prontidão de combate de suas tropas na fronteira com o Kosovo e alertou que não ficaria paralisada se os sérvios kosovares, que representam menos de 10% da população, fossem atacados.

Milhares de albaneses fogem do Kosovo durante o conflito com a Sérvia Foto: REUTERS

Os EUA aceitaram a condição de Estado do Kosovo, assim como grande parte do Ocidente. A Sérvia e seus aliados Rússia e China rejeitaram e impediram o Kosovo de ingressar na ONU e em outras instituições internacionais.

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Há temores de que a Rússia possa levar a Sérvia a outra intervenção militar em Kosovo para tentar desviar pelo menos parte da atenção mundial de sua invasão na Ucrânia. Sob a liderança populista de Vucic, a Sérvia tem se afastado constantemente de sua proclamada meta de adesão à UE e em direção a uma estreita aliança política e militar com Moscou.

A porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Maria Zakharova, disse na quinta-feira que “o embaixador russo na Sérvia, que está em contato próximo com a liderança sérvia, recebeu instruções de Moscou para tomar medidas concretas de apoio à Sérvia, que incluem normalizar ou propor formas de normalizar a situação” no Kosovo.

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Enquanto isso, o primeiro-ministro do Kosovo apresentou formalmente na quinta-feira o pedido de seu país para receber o status de candidato à adesão à União Europeia, um primeiro passo no que parece ser um caminho muito longo para uma eventual adesão.

O primeiro-ministro Albin Kurti apresentou o pedido ao ministro checo de Assuntos Europeus, Mikulas Bek, cujo país atualmente ocupa a presidência rotativa da UE.

Entenda a crise no Kosovo e relembre a guerra

Os Bálcãs, ou península balcânica, são uma região no sudeste da Europa que engloba a Albânia, Bósnia e Herzegovina, Bulgária, Grécia, Macedônia do Norte, Montenegro, Sérvia, o autoproclamado Estado independente do Kosovo, uma porção da Turquia no continente europeu e partes da Croácia, da Romênia e da Eslovênia. O termo deriva da palavra turca para montanha e faz referência à cordilheira dos Bálcãs, que se estende do leste da Sérvia até o mar Negro.

A animosidade entre albaneses e sérvios do Kosovo permanece 20 anos após a guerra. Foto: Andrew Testa para The New York Times

As tensões crescentes na região fazem reviver as memórias da pior guerra na Europa desde o fim da 2.ª Guerra. O conflito no Kosovo deixou 13 mil mortos e milhares de feridos. A Guerra de Kosovo começou em março de 1999 e ainda provoca enorme comoção na população de maioria albanesa do território nos Balcãs.

No início do século 20, países da região lutaram pelo controle dos territórios remanescentes do Império Otomano. O reino independente da Sérvia entrou em uma série de guerras para formar a “Grande Sérvia”, um Estado envolvendo toda a região balcânica. Como resultado das guerras balcânicas (1912-1913), a Sérvia incorporou a Macedônia e o Kosovo, considerado berço original da nacionalidade sérvia.

Na 2.ª Guerra, boa parte do território kosovar passou a fazer parte da Albânia e, ao fim do conflito, foi incorporado à Iugoslávia, de maioria sérvia. Kosovo teve sua autonomia reconhecida constitucionalmente em 1974 e passou a ter um governo próprio, mas essa autonomia foi revogada e o governo, dissolvido, em 1989 e 1990.

No início da década seguinte, a república socialista da Iugoslávia foi dissolvida com a independência de Bósnia, Croácia, Macedônia e Eslovênia, com diferentes graus de violência.

Com 90% da população de origem albanesa, a região autônoma de Kosovo fazia parte da Iugoslávia. Mas os albaneses eram perseguidos pela minoria sérvia. A tensão étnica levou a um movimento separatista, que em 1996 fundou o Exército da Libertação do Kosovo para se opor ao governo central da Iugoslávia, liderado pelo nacionalista Slobodan Milosevic.

O conflito chegou ao ápice em 1998 e, após denúncias de que Milosevic estava promovendo massacre de albaneses, e depois do fracasso da diplomacia, a Otan decidiu intervir com ataques áereos contra alvos iugoslavos em Belgrado e Pristina. Foram 79 dias de bombardeios, ao fim dos quais os sérvios saíram do Kosovo, deixando a região sob supervisão das Nações Unidas.

A Otan optou pela ação militar de 1999 com a justificativa de conter o banho de sangue promovido por Milosevic contra a população albanesa no Kosovo. Mas a ação foi criticada por ter sido realizada sem a aprovação do Conselho de Segurança da ONU. Os bombardeios não deram os resultados esperados, e Milosevic respondeu à intervenção com um banho de sangue.

Militares e grupos paramilitares sérvios invadiram casas no Kosovo e mataram civis às centenas, deixando destruição em cidades inteiras. Quase um milhão de pessoas abandonou o Kosovo. A crise humanitária foi a pior registrada na Europa desde a 2.ª Guerra. O conflito se estenderia até 10 de junho daquele ano.

Sérvio retira pertences de um dos mortos do Exército de Libertação do Kosovo, em 1999, durante a guerra Foto: REUTERS/Yannis Behrakis

A ONU instituiu uma força de paz internacional na província e os bombardeios ocidentais cessaram, apesar da permanência de Milosevic no poder. A administração do Kosovo coube a um mandato da Otan. O país declarou independência da Sérvia em 2008, quase uma década depois que os ataques aéreos da Otan acabaram com o controle de Belgrado sobre o território.

Dos 193 países que formam a ONU, 82 ainda não veem Kosovo como uma república independente. Entre eles, o Brasil. Mas a constituição Sérvia ainda vê o Kosovo como território sérvio, e vem impedindo o Kosovo de ingressar em instituições internacionais como a Interpol e a Unesco. / AP, NYT e W.POST

BELGRADO, SÉRVIA - A Sérvia exigiu formalmente nesta sexta-feira, 16, que suas forças de segurança retornassem à ex-província sérvia separatista do Kosovo, apesar das advertências do Ocidente de que tais apelos não serão aceitos e aumentarão as tensões naquela parte dos Bálcãs.

O presidente sérvio, Aleksandar Vucic, disse à televisão estatal RTS que o governo pediu ao comandante das forças de paz lideradas pela Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) estacionadas em Kosovo desde 1999, quando a aliança ocidental expulsou as tropas sérvias da região, para permitir o retorno de até 1 mil militares e policiais sérvios ao norte do país, povoado por sérvios.

“O pedido diz que um certo número de tropas sérvias, de cem a 1.000, retornará ao Kosovo”, disse Vucic. Ele disse que apesar de ser “quase certo que isso não vai ser concedido”, o pedido vai ficar registrado.

Mulher sérvia passa por bandeira do Kosovo na cidade de Mitrovica Foto: REUTERS/Marko Djurica

Funcionários sérvios afirmam que uma resolução das Nações Unidas que encerrou formalmente a guerra do Kosovo permite que as tropas sérvias retornem ao local. A Otan bombardeou a Sérvia para impedir a guerra, acabar com sua sangrenta repressão contra separatistas e civis de etnia albanesa e ordenar que suas tropas saíssem de Kosovo.

Funcionários sérvios afirmam que as missões de paz lideradas pela Otan e pela União Européia são incapazes de proteger a minoria sérvia em Kosovo do assédio da maioria albanesa e que suas forças de segurança podem fazer o trabalho.

É improvável que o retorno das tropas sérvias seja concedido porque significaria entregar a segurança das regiões do norte às forças sérvias – uma medida que aumentaria as tensões nos Bálcãs.

As autoridades alemãs e americanas rejeitaram veementemente qualquer ideia do retorno das forças de segurança sérvias à região.

Aumento das tensões

As tensões entre a Sérvia e o Kosovo aumentaram na semana passada, depois que os sérvios ergueram barricadas nas principais estradas do norte da província para protestar contra a prisão de um ex-policial sérvio do Kosovo. Tiros foram disparados das barricadas.

A Sérvia elevou a prontidão de combate de suas tropas na fronteira com o Kosovo e alertou que não ficaria paralisada se os sérvios kosovares, que representam menos de 10% da população, fossem atacados.

Milhares de albaneses fogem do Kosovo durante o conflito com a Sérvia Foto: REUTERS

Os EUA aceitaram a condição de Estado do Kosovo, assim como grande parte do Ocidente. A Sérvia e seus aliados Rússia e China rejeitaram e impediram o Kosovo de ingressar na ONU e em outras instituições internacionais.

Há temores de que a Rússia possa levar a Sérvia a outra intervenção militar em Kosovo para tentar desviar pelo menos parte da atenção mundial de sua invasão na Ucrânia. Sob a liderança populista de Vucic, a Sérvia tem se afastado constantemente de sua proclamada meta de adesão à UE e em direção a uma estreita aliança política e militar com Moscou.

A porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Maria Zakharova, disse na quinta-feira que “o embaixador russo na Sérvia, que está em contato próximo com a liderança sérvia, recebeu instruções de Moscou para tomar medidas concretas de apoio à Sérvia, que incluem normalizar ou propor formas de normalizar a situação” no Kosovo.

Enquanto isso, o primeiro-ministro do Kosovo apresentou formalmente na quinta-feira o pedido de seu país para receber o status de candidato à adesão à União Europeia, um primeiro passo no que parece ser um caminho muito longo para uma eventual adesão.

O primeiro-ministro Albin Kurti apresentou o pedido ao ministro checo de Assuntos Europeus, Mikulas Bek, cujo país atualmente ocupa a presidência rotativa da UE.

Entenda a crise no Kosovo e relembre a guerra

Os Bálcãs, ou península balcânica, são uma região no sudeste da Europa que engloba a Albânia, Bósnia e Herzegovina, Bulgária, Grécia, Macedônia do Norte, Montenegro, Sérvia, o autoproclamado Estado independente do Kosovo, uma porção da Turquia no continente europeu e partes da Croácia, da Romênia e da Eslovênia. O termo deriva da palavra turca para montanha e faz referência à cordilheira dos Bálcãs, que se estende do leste da Sérvia até o mar Negro.

A animosidade entre albaneses e sérvios do Kosovo permanece 20 anos após a guerra. Foto: Andrew Testa para The New York Times

As tensões crescentes na região fazem reviver as memórias da pior guerra na Europa desde o fim da 2.ª Guerra. O conflito no Kosovo deixou 13 mil mortos e milhares de feridos. A Guerra de Kosovo começou em março de 1999 e ainda provoca enorme comoção na população de maioria albanesa do território nos Balcãs.

No início do século 20, países da região lutaram pelo controle dos territórios remanescentes do Império Otomano. O reino independente da Sérvia entrou em uma série de guerras para formar a “Grande Sérvia”, um Estado envolvendo toda a região balcânica. Como resultado das guerras balcânicas (1912-1913), a Sérvia incorporou a Macedônia e o Kosovo, considerado berço original da nacionalidade sérvia.

Na 2.ª Guerra, boa parte do território kosovar passou a fazer parte da Albânia e, ao fim do conflito, foi incorporado à Iugoslávia, de maioria sérvia. Kosovo teve sua autonomia reconhecida constitucionalmente em 1974 e passou a ter um governo próprio, mas essa autonomia foi revogada e o governo, dissolvido, em 1989 e 1990.

No início da década seguinte, a república socialista da Iugoslávia foi dissolvida com a independência de Bósnia, Croácia, Macedônia e Eslovênia, com diferentes graus de violência.

Com 90% da população de origem albanesa, a região autônoma de Kosovo fazia parte da Iugoslávia. Mas os albaneses eram perseguidos pela minoria sérvia. A tensão étnica levou a um movimento separatista, que em 1996 fundou o Exército da Libertação do Kosovo para se opor ao governo central da Iugoslávia, liderado pelo nacionalista Slobodan Milosevic.

O conflito chegou ao ápice em 1998 e, após denúncias de que Milosevic estava promovendo massacre de albaneses, e depois do fracasso da diplomacia, a Otan decidiu intervir com ataques áereos contra alvos iugoslavos em Belgrado e Pristina. Foram 79 dias de bombardeios, ao fim dos quais os sérvios saíram do Kosovo, deixando a região sob supervisão das Nações Unidas.

A Otan optou pela ação militar de 1999 com a justificativa de conter o banho de sangue promovido por Milosevic contra a população albanesa no Kosovo. Mas a ação foi criticada por ter sido realizada sem a aprovação do Conselho de Segurança da ONU. Os bombardeios não deram os resultados esperados, e Milosevic respondeu à intervenção com um banho de sangue.

Militares e grupos paramilitares sérvios invadiram casas no Kosovo e mataram civis às centenas, deixando destruição em cidades inteiras. Quase um milhão de pessoas abandonou o Kosovo. A crise humanitária foi a pior registrada na Europa desde a 2.ª Guerra. O conflito se estenderia até 10 de junho daquele ano.

Sérvio retira pertences de um dos mortos do Exército de Libertação do Kosovo, em 1999, durante a guerra Foto: REUTERS/Yannis Behrakis

A ONU instituiu uma força de paz internacional na província e os bombardeios ocidentais cessaram, apesar da permanência de Milosevic no poder. A administração do Kosovo coube a um mandato da Otan. O país declarou independência da Sérvia em 2008, quase uma década depois que os ataques aéreos da Otan acabaram com o controle de Belgrado sobre o território.

Dos 193 países que formam a ONU, 82 ainda não veem Kosovo como uma república independente. Entre eles, o Brasil. Mas a constituição Sérvia ainda vê o Kosovo como território sérvio, e vem impedindo o Kosovo de ingressar em instituições internacionais como a Interpol e a Unesco. / AP, NYT e W.POST

BELGRADO, SÉRVIA - A Sérvia exigiu formalmente nesta sexta-feira, 16, que suas forças de segurança retornassem à ex-província sérvia separatista do Kosovo, apesar das advertências do Ocidente de que tais apelos não serão aceitos e aumentarão as tensões naquela parte dos Bálcãs.

O presidente sérvio, Aleksandar Vucic, disse à televisão estatal RTS que o governo pediu ao comandante das forças de paz lideradas pela Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) estacionadas em Kosovo desde 1999, quando a aliança ocidental expulsou as tropas sérvias da região, para permitir o retorno de até 1 mil militares e policiais sérvios ao norte do país, povoado por sérvios.

“O pedido diz que um certo número de tropas sérvias, de cem a 1.000, retornará ao Kosovo”, disse Vucic. Ele disse que apesar de ser “quase certo que isso não vai ser concedido”, o pedido vai ficar registrado.

Mulher sérvia passa por bandeira do Kosovo na cidade de Mitrovica Foto: REUTERS/Marko Djurica

Funcionários sérvios afirmam que uma resolução das Nações Unidas que encerrou formalmente a guerra do Kosovo permite que as tropas sérvias retornem ao local. A Otan bombardeou a Sérvia para impedir a guerra, acabar com sua sangrenta repressão contra separatistas e civis de etnia albanesa e ordenar que suas tropas saíssem de Kosovo.

Funcionários sérvios afirmam que as missões de paz lideradas pela Otan e pela União Européia são incapazes de proteger a minoria sérvia em Kosovo do assédio da maioria albanesa e que suas forças de segurança podem fazer o trabalho.

É improvável que o retorno das tropas sérvias seja concedido porque significaria entregar a segurança das regiões do norte às forças sérvias – uma medida que aumentaria as tensões nos Bálcãs.

As autoridades alemãs e americanas rejeitaram veementemente qualquer ideia do retorno das forças de segurança sérvias à região.

Aumento das tensões

As tensões entre a Sérvia e o Kosovo aumentaram na semana passada, depois que os sérvios ergueram barricadas nas principais estradas do norte da província para protestar contra a prisão de um ex-policial sérvio do Kosovo. Tiros foram disparados das barricadas.

A Sérvia elevou a prontidão de combate de suas tropas na fronteira com o Kosovo e alertou que não ficaria paralisada se os sérvios kosovares, que representam menos de 10% da população, fossem atacados.

Milhares de albaneses fogem do Kosovo durante o conflito com a Sérvia Foto: REUTERS

Os EUA aceitaram a condição de Estado do Kosovo, assim como grande parte do Ocidente. A Sérvia e seus aliados Rússia e China rejeitaram e impediram o Kosovo de ingressar na ONU e em outras instituições internacionais.

Há temores de que a Rússia possa levar a Sérvia a outra intervenção militar em Kosovo para tentar desviar pelo menos parte da atenção mundial de sua invasão na Ucrânia. Sob a liderança populista de Vucic, a Sérvia tem se afastado constantemente de sua proclamada meta de adesão à UE e em direção a uma estreita aliança política e militar com Moscou.

A porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Maria Zakharova, disse na quinta-feira que “o embaixador russo na Sérvia, que está em contato próximo com a liderança sérvia, recebeu instruções de Moscou para tomar medidas concretas de apoio à Sérvia, que incluem normalizar ou propor formas de normalizar a situação” no Kosovo.

Enquanto isso, o primeiro-ministro do Kosovo apresentou formalmente na quinta-feira o pedido de seu país para receber o status de candidato à adesão à União Europeia, um primeiro passo no que parece ser um caminho muito longo para uma eventual adesão.

O primeiro-ministro Albin Kurti apresentou o pedido ao ministro checo de Assuntos Europeus, Mikulas Bek, cujo país atualmente ocupa a presidência rotativa da UE.

Entenda a crise no Kosovo e relembre a guerra

Os Bálcãs, ou península balcânica, são uma região no sudeste da Europa que engloba a Albânia, Bósnia e Herzegovina, Bulgária, Grécia, Macedônia do Norte, Montenegro, Sérvia, o autoproclamado Estado independente do Kosovo, uma porção da Turquia no continente europeu e partes da Croácia, da Romênia e da Eslovênia. O termo deriva da palavra turca para montanha e faz referência à cordilheira dos Bálcãs, que se estende do leste da Sérvia até o mar Negro.

A animosidade entre albaneses e sérvios do Kosovo permanece 20 anos após a guerra. Foto: Andrew Testa para The New York Times

As tensões crescentes na região fazem reviver as memórias da pior guerra na Europa desde o fim da 2.ª Guerra. O conflito no Kosovo deixou 13 mil mortos e milhares de feridos. A Guerra de Kosovo começou em março de 1999 e ainda provoca enorme comoção na população de maioria albanesa do território nos Balcãs.

No início do século 20, países da região lutaram pelo controle dos territórios remanescentes do Império Otomano. O reino independente da Sérvia entrou em uma série de guerras para formar a “Grande Sérvia”, um Estado envolvendo toda a região balcânica. Como resultado das guerras balcânicas (1912-1913), a Sérvia incorporou a Macedônia e o Kosovo, considerado berço original da nacionalidade sérvia.

Na 2.ª Guerra, boa parte do território kosovar passou a fazer parte da Albânia e, ao fim do conflito, foi incorporado à Iugoslávia, de maioria sérvia. Kosovo teve sua autonomia reconhecida constitucionalmente em 1974 e passou a ter um governo próprio, mas essa autonomia foi revogada e o governo, dissolvido, em 1989 e 1990.

No início da década seguinte, a república socialista da Iugoslávia foi dissolvida com a independência de Bósnia, Croácia, Macedônia e Eslovênia, com diferentes graus de violência.

Com 90% da população de origem albanesa, a região autônoma de Kosovo fazia parte da Iugoslávia. Mas os albaneses eram perseguidos pela minoria sérvia. A tensão étnica levou a um movimento separatista, que em 1996 fundou o Exército da Libertação do Kosovo para se opor ao governo central da Iugoslávia, liderado pelo nacionalista Slobodan Milosevic.

O conflito chegou ao ápice em 1998 e, após denúncias de que Milosevic estava promovendo massacre de albaneses, e depois do fracasso da diplomacia, a Otan decidiu intervir com ataques áereos contra alvos iugoslavos em Belgrado e Pristina. Foram 79 dias de bombardeios, ao fim dos quais os sérvios saíram do Kosovo, deixando a região sob supervisão das Nações Unidas.

A Otan optou pela ação militar de 1999 com a justificativa de conter o banho de sangue promovido por Milosevic contra a população albanesa no Kosovo. Mas a ação foi criticada por ter sido realizada sem a aprovação do Conselho de Segurança da ONU. Os bombardeios não deram os resultados esperados, e Milosevic respondeu à intervenção com um banho de sangue.

Militares e grupos paramilitares sérvios invadiram casas no Kosovo e mataram civis às centenas, deixando destruição em cidades inteiras. Quase um milhão de pessoas abandonou o Kosovo. A crise humanitária foi a pior registrada na Europa desde a 2.ª Guerra. O conflito se estenderia até 10 de junho daquele ano.

Sérvio retira pertences de um dos mortos do Exército de Libertação do Kosovo, em 1999, durante a guerra Foto: REUTERS/Yannis Behrakis

A ONU instituiu uma força de paz internacional na província e os bombardeios ocidentais cessaram, apesar da permanência de Milosevic no poder. A administração do Kosovo coube a um mandato da Otan. O país declarou independência da Sérvia em 2008, quase uma década depois que os ataques aéreos da Otan acabaram com o controle de Belgrado sobre o território.

Dos 193 países que formam a ONU, 82 ainda não veem Kosovo como uma república independente. Entre eles, o Brasil. Mas a constituição Sérvia ainda vê o Kosovo como território sérvio, e vem impedindo o Kosovo de ingressar em instituições internacionais como a Interpol e a Unesco. / AP, NYT e W.POST

BELGRADO, SÉRVIA - A Sérvia exigiu formalmente nesta sexta-feira, 16, que suas forças de segurança retornassem à ex-província sérvia separatista do Kosovo, apesar das advertências do Ocidente de que tais apelos não serão aceitos e aumentarão as tensões naquela parte dos Bálcãs.

O presidente sérvio, Aleksandar Vucic, disse à televisão estatal RTS que o governo pediu ao comandante das forças de paz lideradas pela Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) estacionadas em Kosovo desde 1999, quando a aliança ocidental expulsou as tropas sérvias da região, para permitir o retorno de até 1 mil militares e policiais sérvios ao norte do país, povoado por sérvios.

“O pedido diz que um certo número de tropas sérvias, de cem a 1.000, retornará ao Kosovo”, disse Vucic. Ele disse que apesar de ser “quase certo que isso não vai ser concedido”, o pedido vai ficar registrado.

Mulher sérvia passa por bandeira do Kosovo na cidade de Mitrovica Foto: REUTERS/Marko Djurica

Funcionários sérvios afirmam que uma resolução das Nações Unidas que encerrou formalmente a guerra do Kosovo permite que as tropas sérvias retornem ao local. A Otan bombardeou a Sérvia para impedir a guerra, acabar com sua sangrenta repressão contra separatistas e civis de etnia albanesa e ordenar que suas tropas saíssem de Kosovo.

Funcionários sérvios afirmam que as missões de paz lideradas pela Otan e pela União Européia são incapazes de proteger a minoria sérvia em Kosovo do assédio da maioria albanesa e que suas forças de segurança podem fazer o trabalho.

É improvável que o retorno das tropas sérvias seja concedido porque significaria entregar a segurança das regiões do norte às forças sérvias – uma medida que aumentaria as tensões nos Bálcãs.

As autoridades alemãs e americanas rejeitaram veementemente qualquer ideia do retorno das forças de segurança sérvias à região.

Aumento das tensões

As tensões entre a Sérvia e o Kosovo aumentaram na semana passada, depois que os sérvios ergueram barricadas nas principais estradas do norte da província para protestar contra a prisão de um ex-policial sérvio do Kosovo. Tiros foram disparados das barricadas.

A Sérvia elevou a prontidão de combate de suas tropas na fronteira com o Kosovo e alertou que não ficaria paralisada se os sérvios kosovares, que representam menos de 10% da população, fossem atacados.

Milhares de albaneses fogem do Kosovo durante o conflito com a Sérvia Foto: REUTERS

Os EUA aceitaram a condição de Estado do Kosovo, assim como grande parte do Ocidente. A Sérvia e seus aliados Rússia e China rejeitaram e impediram o Kosovo de ingressar na ONU e em outras instituições internacionais.

Há temores de que a Rússia possa levar a Sérvia a outra intervenção militar em Kosovo para tentar desviar pelo menos parte da atenção mundial de sua invasão na Ucrânia. Sob a liderança populista de Vucic, a Sérvia tem se afastado constantemente de sua proclamada meta de adesão à UE e em direção a uma estreita aliança política e militar com Moscou.

A porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Maria Zakharova, disse na quinta-feira que “o embaixador russo na Sérvia, que está em contato próximo com a liderança sérvia, recebeu instruções de Moscou para tomar medidas concretas de apoio à Sérvia, que incluem normalizar ou propor formas de normalizar a situação” no Kosovo.

Enquanto isso, o primeiro-ministro do Kosovo apresentou formalmente na quinta-feira o pedido de seu país para receber o status de candidato à adesão à União Europeia, um primeiro passo no que parece ser um caminho muito longo para uma eventual adesão.

O primeiro-ministro Albin Kurti apresentou o pedido ao ministro checo de Assuntos Europeus, Mikulas Bek, cujo país atualmente ocupa a presidência rotativa da UE.

Entenda a crise no Kosovo e relembre a guerra

Os Bálcãs, ou península balcânica, são uma região no sudeste da Europa que engloba a Albânia, Bósnia e Herzegovina, Bulgária, Grécia, Macedônia do Norte, Montenegro, Sérvia, o autoproclamado Estado independente do Kosovo, uma porção da Turquia no continente europeu e partes da Croácia, da Romênia e da Eslovênia. O termo deriva da palavra turca para montanha e faz referência à cordilheira dos Bálcãs, que se estende do leste da Sérvia até o mar Negro.

A animosidade entre albaneses e sérvios do Kosovo permanece 20 anos após a guerra. Foto: Andrew Testa para The New York Times

As tensões crescentes na região fazem reviver as memórias da pior guerra na Europa desde o fim da 2.ª Guerra. O conflito no Kosovo deixou 13 mil mortos e milhares de feridos. A Guerra de Kosovo começou em março de 1999 e ainda provoca enorme comoção na população de maioria albanesa do território nos Balcãs.

No início do século 20, países da região lutaram pelo controle dos territórios remanescentes do Império Otomano. O reino independente da Sérvia entrou em uma série de guerras para formar a “Grande Sérvia”, um Estado envolvendo toda a região balcânica. Como resultado das guerras balcânicas (1912-1913), a Sérvia incorporou a Macedônia e o Kosovo, considerado berço original da nacionalidade sérvia.

Na 2.ª Guerra, boa parte do território kosovar passou a fazer parte da Albânia e, ao fim do conflito, foi incorporado à Iugoslávia, de maioria sérvia. Kosovo teve sua autonomia reconhecida constitucionalmente em 1974 e passou a ter um governo próprio, mas essa autonomia foi revogada e o governo, dissolvido, em 1989 e 1990.

No início da década seguinte, a república socialista da Iugoslávia foi dissolvida com a independência de Bósnia, Croácia, Macedônia e Eslovênia, com diferentes graus de violência.

Com 90% da população de origem albanesa, a região autônoma de Kosovo fazia parte da Iugoslávia. Mas os albaneses eram perseguidos pela minoria sérvia. A tensão étnica levou a um movimento separatista, que em 1996 fundou o Exército da Libertação do Kosovo para se opor ao governo central da Iugoslávia, liderado pelo nacionalista Slobodan Milosevic.

O conflito chegou ao ápice em 1998 e, após denúncias de que Milosevic estava promovendo massacre de albaneses, e depois do fracasso da diplomacia, a Otan decidiu intervir com ataques áereos contra alvos iugoslavos em Belgrado e Pristina. Foram 79 dias de bombardeios, ao fim dos quais os sérvios saíram do Kosovo, deixando a região sob supervisão das Nações Unidas.

A Otan optou pela ação militar de 1999 com a justificativa de conter o banho de sangue promovido por Milosevic contra a população albanesa no Kosovo. Mas a ação foi criticada por ter sido realizada sem a aprovação do Conselho de Segurança da ONU. Os bombardeios não deram os resultados esperados, e Milosevic respondeu à intervenção com um banho de sangue.

Militares e grupos paramilitares sérvios invadiram casas no Kosovo e mataram civis às centenas, deixando destruição em cidades inteiras. Quase um milhão de pessoas abandonou o Kosovo. A crise humanitária foi a pior registrada na Europa desde a 2.ª Guerra. O conflito se estenderia até 10 de junho daquele ano.

Sérvio retira pertences de um dos mortos do Exército de Libertação do Kosovo, em 1999, durante a guerra Foto: REUTERS/Yannis Behrakis

A ONU instituiu uma força de paz internacional na província e os bombardeios ocidentais cessaram, apesar da permanência de Milosevic no poder. A administração do Kosovo coube a um mandato da Otan. O país declarou independência da Sérvia em 2008, quase uma década depois que os ataques aéreos da Otan acabaram com o controle de Belgrado sobre o território.

Dos 193 países que formam a ONU, 82 ainda não veem Kosovo como uma república independente. Entre eles, o Brasil. Mas a constituição Sérvia ainda vê o Kosovo como território sérvio, e vem impedindo o Kosovo de ingressar em instituições internacionais como a Interpol e a Unesco. / AP, NYT e W.POST

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