Os seguidores do pastor evangélico Paul Nthenge Mackenzie compareceram ao Tribunal de Justiça de Shanzu, na cidade portuária de Mombaça, nesta quinta-feira, 15, carregando seus poucos pertences e bolsas, para enfrentar acusações de tentativa de suicídio. Sobreviventes do culto no qual os fiéis jejuavam até a morte para ‘encontrar jesus’, eles se negam a comer mesmo após a prisão do pastor.
Os 65 membros do culto se recusaram a comer suas refeições em um centro de resgate onde foram atendidos, levando as autoridades a acusá-los de tentativa de suicídio, considerado contravenção pelo código penal do Quênia, punível com multa ou pena de prisão de até dois anos.
Especulava-se que os sobreviventes seriam enviados para a prisão para aguardar julgamento, mas o juiz, Joe Omido, seguiu as recomendações do órgão nacional de defesa dos direitos humanos do Quênia para devolvê-los ao centro de resgate.
Atendimento humanitário
O caso, que chamou a atenção do público pela primeira vez em abril, abalou o Quênia, com grupos de direitos humanos e observadores se perguntando como a polícia e os serviços de inteligência falharam em evitar as mortes por tanto tempo.
Em sua decisão, Omido disse que as vítimas devem ser devolvidas ao centro de resgate, receber aconselhamento e avaliação psicológica e ser acompanhadas de perto.
Ele ordenou outra audiência no tribunal em 29 de junho. Uma pessoa, que se recusou a cumprir uma avaliação mental ou receber cuidados médicos, foi enviada para a prisão após a audiência.
Morte na Floresta Shakahola
Até esta semana, 318 corpos foram exumados da Floresta Shakahola, uma área de mata nativa de 800 acres onde o pastor e seus fiéis viviam e onde os que morreram foram enterrados em covas rasas pelo menos desde 2021. Pelo menos 613 pessoas continuam desaparecidas, disseram autoridades do condado, enquanto outros 95 foram resgatados até agora.
O presidente do Quênia, William Ruto, um cristão devoto e o primeiro líder evangélico do país, nomeou uma comissão para investigar os assassinatos.
Kithure Kindiki, secretário de gabinete do Ministério do Interior do Quênia, disse que a floresta seria transformada em um memorial nacional. Mas grupos de direitos humanos argumentaram que o governo deveria fazer mais, incluindo compensar as vítimas e suas famílias.
Mackenzie foi taxista antes de fundar a Igreja Good News International e se transformar em pastor evangélico há quase duas décadas. À medida que sua congregação crescia, ele promoveu a Floresta Shakahola como um refúgio para evitar o apocalipse.
Mas, em vez disso, a floresta se tornou uma cena de crime e dominou a cobertura de notícias nos principais jornais e programas de televisão no Quênia. Enquanto muitas pessoas morreram de fome na floresta, patologistas do governo disseram que outras também morreram de asfixia e estrangulamento.
Mackenzie afirmou que não ordenou a ninguém em sua congregação que jejuasse ou morresse de fome. Mas os promotores alegam que ele os atraiu para a fome, e eles o prenderam junto com mais de três dúzias de outros colaboradores por acusações que incluem assassinato e terrorismo.
Problemas legais
Mesmo enfrentando sérias acusações no tribunal, a defesa de Mackenzie enfrenta desafios. Nesta semana, dois de seus advogados, que também representavam três dúzias de outros suspeitos, retiraram-se do caso alegando frustração com o governo pela falta de acesso adequado a seus clientes ou por não terem tempo suficiente para a preparação.
Um terceiro advogado disse que permaneceria para defender Mackenzie no tribunal.
“Estávamos apenas seguindo a lei para garantir que seus interesses como suspeito fossem seguidos”, disse Elisha Komora, um dos advogados que se retirou da representação de Mackenzie, em entrevista por telefone. / NYT