Suécia na Otan: por que depois de 200 anos de neutralidade país quer se juntar à aliança?


Em um grande recálculo de sua postura de segurança, acelerada pela invasão russa da Ucrânia, a Suécia está reaprendendo a ser uma potência militar

Por Steven Erlanger
Atualização:

THE NEW YORK TIMES, de Tofta, Suécia - O regimento de Gotland do Exército Sueco estava nos seu ritmo, praticando como usar seus mísseis antitanque leves projetados na Suécia, os NLAWs, que estão se mostrando tão eficazes na Ucrânia.

O regimento, ressuscitado em 2018 nesta ilha estratégica que ajuda a controlar o espaço aéreo e naval do Mar Báltico, está em processo de reconstrução com o objetivo de expandir dos atuais 400 soldados para 4.000 – ainda muito longe do 25.000 que serviram aqui durante a Guerra Fria.

Em um grande recálculo de sua postura de segurança, acelerada pela invasão russa da Ucrânia, a Suécia está reaprendendo a ser uma potência militar. E puxada por seu parceiro estratégico, a Finlândia, a Suécia confirmou que vai pedir a adesão à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), encerrando mais de 200 anos de neutralidade e não alinhamento militar.

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O novo comandante do regimento de Gotland, coronel Magnus Frykvall, tem uma visão clara dessa missão de reconstruir as defesas da Suécia, bem como a importância da ilha que seu regimento está protegendo. “Se você possui Gotland, pode controlar o movimento marítimo e aéreo em todo o sul do Báltico”, disse ele.

Aderir à Otan é uma decisão política, disse o coronel Frykvall, de 47 anos, mas ele é a favor. “Cooperação é uma coisa, mas a aliança é outra”, disse. “Uma aliança significa que você tem garantias.”

Tropas do regimento de Gotland na prática de tiro ao alvo. Os números da equipe serão aumentados para 4.000 dos atuais 400 Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times  Foto: NYT / NYT
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Tropas recarregam suas metralhadoras durante o treino de tiro na ilha de Gotland Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times Foto: NYT / NYT

Um relatório parlamentar apresentado na sexta-feira pela ministra das Relações Exteriores da Suécia, Ann Linde, disse que a adesão do país à Otan, ao lado da Finlândia, teria um efeito de dissuasão no norte da Europa, embora a análise também alerte que medidas de retaliação da Rússia não podem ser descartadas no período de transição se a Suécia solicitar a adesão à aliança.

Um dos soldados sob o comando do Coronel Frykvall, Sara Karlsson, 20, especialista em artilharia, disse que “todos os soldados aqui agora sentem que estamos fazendo a diferença, e sinto isso também em meus colegas, um novo senso de responsabilidade”.

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O mundo é perigoso e sempre há uma guerra em algum lugar, disse ela. “Mas a Ucrânia não está longe de Gotland, e podemos sentir isso.”

Se a anexação da Crimeia pela Rússia em 2014 foi um alerta silencioso, sua invasão sangrenta e em grande escala da Ucrânia em fevereiro foi um incêndio de grandes proporções.

“Tivemos nosso sonho tranquilo, mas agora é hora de acordar”, disse Robert Dalsjo, diretor de estudos da Agência Sueca de Pesquisa de Defesa. “O sonho acabou.”

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O sentimento na Finlândia, depois de ter travado duas guerras contra a União Soviética, pendeu nos últimos seis meses a favor da adesão à Otan, guiada por Sauli Niinisto, seu presidente.

Tropas em Gotland durante um exercício de treinamento. Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times Foto: NYT / NYT
Tropas do regimento de Gotland durante um exercício de treinamento. Gotland é um posto avançado estratégico que permite o controle do tráfego no Mar Báltico Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times Foto: NYT / NYT
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Agora, quase 80% dos finlandeses apoiam a adesão, em comparação com apenas 20% antes da guerra. Na quinta-feira, Niinisto e a primeira-ministra Sanna Marin tornaram público seu apoio ao pedido da Finlândia, com uma votação parlamentar prevista para segunda-feira.

Mas na Suécia, o debate é mais um psicodrama dentro do Partido Social-Democrata no poder. A primeira-ministra Magdalena Andersson descartou a adesão da Suécia à Otan em 8 de março, após a invasão russa. Mas em meados de abril, sua posição havia mudado.

“Há um antes e depois de 24 de fevereiro, o cenário de segurança mudou completamente”, disse ela. “Dada a situação, temos que realmente pensar no que é melhor para a Suécia e nossa paz nesta nova situação.”

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O público sueco acompanhou, com 52% se declarando a favor da adesão à Otan, especialmente se a Finlândia aderir, muito acima dos 27% antes da guerra.

No domingo, após discussões com membros de todos os 26 distritos do país, os social-democratas anunciarão sua decisão, disse Kenneth G. Forslund, membro do executivo do partido e presidente do Comitê de Relações Exteriores do Parlamento. O consenso é que o partido irá relutantemente aderir à Otan ao lado da Finlândia.

“Nós e os finlandeses estamos juntos”, disse Carl Bildt, ex-primeiro-ministro. “Se estivéssemos lá fora sozinhos, seríamos um museu, com nostalgia dos anos 1960.”

Poucos analistas na Suécia e na Finlândia duvidam que os dois países se candidatarão em conjunto, e que a Otan aceitará a adesão rapidamente. Tanto Washington quanto Londres - Washington em silêncio, Londres em voz alta - forneceram garantias bilaterais de segurança a ambos os países enquanto seus pedidos são ratificados.

O comandante do regimento de Gotland, coronel Magnus Frykvall. "Se você possui Gotland, você pode controlar o movimento marítimo e aéreo em todo o sul do Báltico", disse ele Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times Foto: NYT / NYT

Para a Suécia e a Finlândia, “os tempos mudaram”, disse Bjorn Fagersten, do Instituto Sueco de Assuntos Internacionais. “É um novo normal, um novo mundo.”

Após o colapso da União Soviética, Estocolmo decidiu que a guerra era coisa do passado. O país removeu quase todas as suas forças de Gotland e reduziu o exército nacional em cerca de 90% e a marinha e a força aérea em cerca de 70%. Na ocasião, um coronel aposentado, Mats Ekeroth, que administrava um museu militar em Gotland, afirmou ser “absolutamente idiota”.

A última vez que Gotland foi invadida foi em 1808 — pela Rússia. Os 1.800 russos foram expulsos em um mês, mas, como um tiro de despedida, a Rússia arrancou a Finlândia dos suecos. Apenas seis anos depois, em 1814, a Suécia travou sua última guerra.

Assim, a Rússia sempre foi uma presença iminente nos países nórdicos. A frota da Rússia em Kaliningrado fica a apenas 360 quilômetros de distância, assim como seus mísseis com capacidade nuclear Iskander.

“As suspeitas com a Rússia remontam a muito tempo, cerca de 700 anos”, disse Niklas Granholm, também da Agência Sueca de Pesquisa de Defesa. Ele acrescentou: “Esta guerra contra a Ucrânia não será esquecida por algumas gerações, porque é assim que a Rússia realmente é”.

As pessoas ficaram apavoradas mesmo antes da invasão, quando o presidente russo Vladimir Putin alertou a Suécia e a Finlândia de “retaliação” caso se juntassem à Otan.

“As ameaças diretas de Putin tiveram o efeito oposto”, disse Dalsjo. “O nível de ameaça percebido realmente aumentou, levando ambas as nações a querer ingressar na Otan”.

A reputação internacional da Suécia é de neutralidade, manutenção da paz, desarmamento nuclear, igualdade de gênero e uma “política externa feminista”. Os suecos em geral, como brincou Bildt, “consideram-se a voz esclarecida da humanidade”.

Mas suas mudanças não são tão repentinas quanto parecem. Mesmo sob Olof Palme, o histórico premiê sueco que impulsionou a política de paz do país, e cujas duras críticas à Guerra do Vietnã aborreceram Washington, a Suécia tinha uma relação de trabalho conjunto com Moscou, mas também uma estreita, silenciosa e bilateral relação de Defesa com os Estados Unidos.

Foi um relacionamento secreto por muitos anos, conhecido como “a aliança oculta”, embora tenha sido revelado a Moscou por um proeminente espião sueco. Como disse Bildt, “era uma política conhecida pelos russos, mas não pelos suecos”.

Lutar pelo desarmamento nuclear e pela paz enquanto tentava “construir pontes” com Moscou não era contraditório para garantir a capacidade da Suécia de se defender com ajuda americana e britânica.

Guarda de honra do exército sueco marchando para uma cerimônia de bandeira em Estocolmo no domingo Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times Foto: NYT / NYT
Visitantes assistem à cerimônia da bandeira em Estocolmo Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times Foto: NYT / NYT

De fato, apesar da sua política de desarmamento, a Suécia é silenciosamente um dos maiores fabricantes de armas per capita do mundo, com empresas importantes como a Saab, que fabrica caças, e a Bofors, agora parte da britânica BAE Systems.

A Suécia também se tornou um grande exportador de armas; em 2021, sua indústria militar exportou US$ 2 bilhões em armas, apesar das restrições à venda para ditaduras ou países em guerra – a Ucrânia agora é uma grande exceção.

Após o colapso da União Soviética, tanto a Suécia quanto a Finlândia se aproximaram do Ocidente, abandonando a neutralidade para se candidatar à União Europeia em 1992 e ao programa Parceria para a Paz da Otan em 1994, permanecendo militarmente não alinhados. Ambos os países se juntam aos exercícios da Otan.

Mas mesmo que a Rússia considere ambos os países efetivamente parte da aliança ocidental, a cooperação e as garantias em defesa não são plenas – certamente não do tipo previsto pelo Artigo 5 da OTAN, que compromete os Estados-membros com a defesa coletiva.

“Basicamente, estávamos pagando os custos, mas sem os benefícios do Artigo 5, e não estávamos enganando a Rússia”, disse Fagersten. “Estávamos tão alinhados à Otan quanto qualquer não-membro poderia estar.”

Mas a decisão causou angústia entre muitos suecos, preocupados que a participação em uma aliança nuclear limitará a capacidade da Suécia de pressionar pelo desarmamento nuclear, controle de armas e resolução pacífica de disputas.

“Não é assim que se constrói a paz e a segurança”, disse Gabriella Irsten, da Sociedade Sueca de Paz e Arbitragem, que condena veementemente a invasão russa, mas se opõe à adesão à Otan. “Você cria segurança junto com seu inimigo – se seu inimigo não está seguro, você não está.”

O não alinhamento serviu bem à Suécia “e nos manteve seguros”, disse ela, então parece errado descartá-lo agora.

“Eu também sinto que seria uma perda de nossa história”, disse ela. “Trabalhamos tanto com a visão de como construir a paz, e agora isso está sendo jogado no lixo sem discussão real e com todo esse medo.”

Tanto os Verdes como o Partido de Esquerda se opõem à adesão à Otan por razões semelhantes.

Marta Stenevi, dos Verdes, disse que a invasão russa significou “uma reavaliação de nossas posições em defesa e segurança”, mas pediu melhoria na defesa sueca e cooperação mais próxima com a Otan em vez de adesão, “que vem com certas obrigações”, como ir para a guerra em uma crise que não escolheu.

E depois há a possibilidade assustadora, disse ela, de um retorno ao poder do ex-presidente Trump.

“Queremos participar ativamente das crises que escolhermos”, disse Stenevi. “Manter uma voz forte para a paz e a democracia é mais fácil fora da aliança.”

THE NEW YORK TIMES, de Tofta, Suécia - O regimento de Gotland do Exército Sueco estava nos seu ritmo, praticando como usar seus mísseis antitanque leves projetados na Suécia, os NLAWs, que estão se mostrando tão eficazes na Ucrânia.

O regimento, ressuscitado em 2018 nesta ilha estratégica que ajuda a controlar o espaço aéreo e naval do Mar Báltico, está em processo de reconstrução com o objetivo de expandir dos atuais 400 soldados para 4.000 – ainda muito longe do 25.000 que serviram aqui durante a Guerra Fria.

Em um grande recálculo de sua postura de segurança, acelerada pela invasão russa da Ucrânia, a Suécia está reaprendendo a ser uma potência militar. E puxada por seu parceiro estratégico, a Finlândia, a Suécia confirmou que vai pedir a adesão à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), encerrando mais de 200 anos de neutralidade e não alinhamento militar.

O novo comandante do regimento de Gotland, coronel Magnus Frykvall, tem uma visão clara dessa missão de reconstruir as defesas da Suécia, bem como a importância da ilha que seu regimento está protegendo. “Se você possui Gotland, pode controlar o movimento marítimo e aéreo em todo o sul do Báltico”, disse ele.

Aderir à Otan é uma decisão política, disse o coronel Frykvall, de 47 anos, mas ele é a favor. “Cooperação é uma coisa, mas a aliança é outra”, disse. “Uma aliança significa que você tem garantias.”

Tropas do regimento de Gotland na prática de tiro ao alvo. Os números da equipe serão aumentados para 4.000 dos atuais 400 Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times  Foto: NYT / NYT
Tropas recarregam suas metralhadoras durante o treino de tiro na ilha de Gotland Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times Foto: NYT / NYT

Um relatório parlamentar apresentado na sexta-feira pela ministra das Relações Exteriores da Suécia, Ann Linde, disse que a adesão do país à Otan, ao lado da Finlândia, teria um efeito de dissuasão no norte da Europa, embora a análise também alerte que medidas de retaliação da Rússia não podem ser descartadas no período de transição se a Suécia solicitar a adesão à aliança.

Um dos soldados sob o comando do Coronel Frykvall, Sara Karlsson, 20, especialista em artilharia, disse que “todos os soldados aqui agora sentem que estamos fazendo a diferença, e sinto isso também em meus colegas, um novo senso de responsabilidade”.

O mundo é perigoso e sempre há uma guerra em algum lugar, disse ela. “Mas a Ucrânia não está longe de Gotland, e podemos sentir isso.”

Se a anexação da Crimeia pela Rússia em 2014 foi um alerta silencioso, sua invasão sangrenta e em grande escala da Ucrânia em fevereiro foi um incêndio de grandes proporções.

“Tivemos nosso sonho tranquilo, mas agora é hora de acordar”, disse Robert Dalsjo, diretor de estudos da Agência Sueca de Pesquisa de Defesa. “O sonho acabou.”

O sentimento na Finlândia, depois de ter travado duas guerras contra a União Soviética, pendeu nos últimos seis meses a favor da adesão à Otan, guiada por Sauli Niinisto, seu presidente.

Tropas em Gotland durante um exercício de treinamento. Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times Foto: NYT / NYT
Tropas do regimento de Gotland durante um exercício de treinamento. Gotland é um posto avançado estratégico que permite o controle do tráfego no Mar Báltico Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times Foto: NYT / NYT

Agora, quase 80% dos finlandeses apoiam a adesão, em comparação com apenas 20% antes da guerra. Na quinta-feira, Niinisto e a primeira-ministra Sanna Marin tornaram público seu apoio ao pedido da Finlândia, com uma votação parlamentar prevista para segunda-feira.

Mas na Suécia, o debate é mais um psicodrama dentro do Partido Social-Democrata no poder. A primeira-ministra Magdalena Andersson descartou a adesão da Suécia à Otan em 8 de março, após a invasão russa. Mas em meados de abril, sua posição havia mudado.

“Há um antes e depois de 24 de fevereiro, o cenário de segurança mudou completamente”, disse ela. “Dada a situação, temos que realmente pensar no que é melhor para a Suécia e nossa paz nesta nova situação.”

O público sueco acompanhou, com 52% se declarando a favor da adesão à Otan, especialmente se a Finlândia aderir, muito acima dos 27% antes da guerra.

No domingo, após discussões com membros de todos os 26 distritos do país, os social-democratas anunciarão sua decisão, disse Kenneth G. Forslund, membro do executivo do partido e presidente do Comitê de Relações Exteriores do Parlamento. O consenso é que o partido irá relutantemente aderir à Otan ao lado da Finlândia.

“Nós e os finlandeses estamos juntos”, disse Carl Bildt, ex-primeiro-ministro. “Se estivéssemos lá fora sozinhos, seríamos um museu, com nostalgia dos anos 1960.”

Poucos analistas na Suécia e na Finlândia duvidam que os dois países se candidatarão em conjunto, e que a Otan aceitará a adesão rapidamente. Tanto Washington quanto Londres - Washington em silêncio, Londres em voz alta - forneceram garantias bilaterais de segurança a ambos os países enquanto seus pedidos são ratificados.

O comandante do regimento de Gotland, coronel Magnus Frykvall. "Se você possui Gotland, você pode controlar o movimento marítimo e aéreo em todo o sul do Báltico", disse ele Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times Foto: NYT / NYT

Para a Suécia e a Finlândia, “os tempos mudaram”, disse Bjorn Fagersten, do Instituto Sueco de Assuntos Internacionais. “É um novo normal, um novo mundo.”

Após o colapso da União Soviética, Estocolmo decidiu que a guerra era coisa do passado. O país removeu quase todas as suas forças de Gotland e reduziu o exército nacional em cerca de 90% e a marinha e a força aérea em cerca de 70%. Na ocasião, um coronel aposentado, Mats Ekeroth, que administrava um museu militar em Gotland, afirmou ser “absolutamente idiota”.

A última vez que Gotland foi invadida foi em 1808 — pela Rússia. Os 1.800 russos foram expulsos em um mês, mas, como um tiro de despedida, a Rússia arrancou a Finlândia dos suecos. Apenas seis anos depois, em 1814, a Suécia travou sua última guerra.

Assim, a Rússia sempre foi uma presença iminente nos países nórdicos. A frota da Rússia em Kaliningrado fica a apenas 360 quilômetros de distância, assim como seus mísseis com capacidade nuclear Iskander.

“As suspeitas com a Rússia remontam a muito tempo, cerca de 700 anos”, disse Niklas Granholm, também da Agência Sueca de Pesquisa de Defesa. Ele acrescentou: “Esta guerra contra a Ucrânia não será esquecida por algumas gerações, porque é assim que a Rússia realmente é”.

As pessoas ficaram apavoradas mesmo antes da invasão, quando o presidente russo Vladimir Putin alertou a Suécia e a Finlândia de “retaliação” caso se juntassem à Otan.

“As ameaças diretas de Putin tiveram o efeito oposto”, disse Dalsjo. “O nível de ameaça percebido realmente aumentou, levando ambas as nações a querer ingressar na Otan”.

A reputação internacional da Suécia é de neutralidade, manutenção da paz, desarmamento nuclear, igualdade de gênero e uma “política externa feminista”. Os suecos em geral, como brincou Bildt, “consideram-se a voz esclarecida da humanidade”.

Mas suas mudanças não são tão repentinas quanto parecem. Mesmo sob Olof Palme, o histórico premiê sueco que impulsionou a política de paz do país, e cujas duras críticas à Guerra do Vietnã aborreceram Washington, a Suécia tinha uma relação de trabalho conjunto com Moscou, mas também uma estreita, silenciosa e bilateral relação de Defesa com os Estados Unidos.

Foi um relacionamento secreto por muitos anos, conhecido como “a aliança oculta”, embora tenha sido revelado a Moscou por um proeminente espião sueco. Como disse Bildt, “era uma política conhecida pelos russos, mas não pelos suecos”.

Lutar pelo desarmamento nuclear e pela paz enquanto tentava “construir pontes” com Moscou não era contraditório para garantir a capacidade da Suécia de se defender com ajuda americana e britânica.

Guarda de honra do exército sueco marchando para uma cerimônia de bandeira em Estocolmo no domingo Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times Foto: NYT / NYT
Visitantes assistem à cerimônia da bandeira em Estocolmo Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times Foto: NYT / NYT

De fato, apesar da sua política de desarmamento, a Suécia é silenciosamente um dos maiores fabricantes de armas per capita do mundo, com empresas importantes como a Saab, que fabrica caças, e a Bofors, agora parte da britânica BAE Systems.

A Suécia também se tornou um grande exportador de armas; em 2021, sua indústria militar exportou US$ 2 bilhões em armas, apesar das restrições à venda para ditaduras ou países em guerra – a Ucrânia agora é uma grande exceção.

Após o colapso da União Soviética, tanto a Suécia quanto a Finlândia se aproximaram do Ocidente, abandonando a neutralidade para se candidatar à União Europeia em 1992 e ao programa Parceria para a Paz da Otan em 1994, permanecendo militarmente não alinhados. Ambos os países se juntam aos exercícios da Otan.

Mas mesmo que a Rússia considere ambos os países efetivamente parte da aliança ocidental, a cooperação e as garantias em defesa não são plenas – certamente não do tipo previsto pelo Artigo 5 da OTAN, que compromete os Estados-membros com a defesa coletiva.

“Basicamente, estávamos pagando os custos, mas sem os benefícios do Artigo 5, e não estávamos enganando a Rússia”, disse Fagersten. “Estávamos tão alinhados à Otan quanto qualquer não-membro poderia estar.”

Mas a decisão causou angústia entre muitos suecos, preocupados que a participação em uma aliança nuclear limitará a capacidade da Suécia de pressionar pelo desarmamento nuclear, controle de armas e resolução pacífica de disputas.

“Não é assim que se constrói a paz e a segurança”, disse Gabriella Irsten, da Sociedade Sueca de Paz e Arbitragem, que condena veementemente a invasão russa, mas se opõe à adesão à Otan. “Você cria segurança junto com seu inimigo – se seu inimigo não está seguro, você não está.”

O não alinhamento serviu bem à Suécia “e nos manteve seguros”, disse ela, então parece errado descartá-lo agora.

“Eu também sinto que seria uma perda de nossa história”, disse ela. “Trabalhamos tanto com a visão de como construir a paz, e agora isso está sendo jogado no lixo sem discussão real e com todo esse medo.”

Tanto os Verdes como o Partido de Esquerda se opõem à adesão à Otan por razões semelhantes.

Marta Stenevi, dos Verdes, disse que a invasão russa significou “uma reavaliação de nossas posições em defesa e segurança”, mas pediu melhoria na defesa sueca e cooperação mais próxima com a Otan em vez de adesão, “que vem com certas obrigações”, como ir para a guerra em uma crise que não escolheu.

E depois há a possibilidade assustadora, disse ela, de um retorno ao poder do ex-presidente Trump.

“Queremos participar ativamente das crises que escolhermos”, disse Stenevi. “Manter uma voz forte para a paz e a democracia é mais fácil fora da aliança.”

THE NEW YORK TIMES, de Tofta, Suécia - O regimento de Gotland do Exército Sueco estava nos seu ritmo, praticando como usar seus mísseis antitanque leves projetados na Suécia, os NLAWs, que estão se mostrando tão eficazes na Ucrânia.

O regimento, ressuscitado em 2018 nesta ilha estratégica que ajuda a controlar o espaço aéreo e naval do Mar Báltico, está em processo de reconstrução com o objetivo de expandir dos atuais 400 soldados para 4.000 – ainda muito longe do 25.000 que serviram aqui durante a Guerra Fria.

Em um grande recálculo de sua postura de segurança, acelerada pela invasão russa da Ucrânia, a Suécia está reaprendendo a ser uma potência militar. E puxada por seu parceiro estratégico, a Finlândia, a Suécia confirmou que vai pedir a adesão à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), encerrando mais de 200 anos de neutralidade e não alinhamento militar.

O novo comandante do regimento de Gotland, coronel Magnus Frykvall, tem uma visão clara dessa missão de reconstruir as defesas da Suécia, bem como a importância da ilha que seu regimento está protegendo. “Se você possui Gotland, pode controlar o movimento marítimo e aéreo em todo o sul do Báltico”, disse ele.

Aderir à Otan é uma decisão política, disse o coronel Frykvall, de 47 anos, mas ele é a favor. “Cooperação é uma coisa, mas a aliança é outra”, disse. “Uma aliança significa que você tem garantias.”

Tropas do regimento de Gotland na prática de tiro ao alvo. Os números da equipe serão aumentados para 4.000 dos atuais 400 Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times  Foto: NYT / NYT
Tropas recarregam suas metralhadoras durante o treino de tiro na ilha de Gotland Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times Foto: NYT / NYT

Um relatório parlamentar apresentado na sexta-feira pela ministra das Relações Exteriores da Suécia, Ann Linde, disse que a adesão do país à Otan, ao lado da Finlândia, teria um efeito de dissuasão no norte da Europa, embora a análise também alerte que medidas de retaliação da Rússia não podem ser descartadas no período de transição se a Suécia solicitar a adesão à aliança.

Um dos soldados sob o comando do Coronel Frykvall, Sara Karlsson, 20, especialista em artilharia, disse que “todos os soldados aqui agora sentem que estamos fazendo a diferença, e sinto isso também em meus colegas, um novo senso de responsabilidade”.

O mundo é perigoso e sempre há uma guerra em algum lugar, disse ela. “Mas a Ucrânia não está longe de Gotland, e podemos sentir isso.”

Se a anexação da Crimeia pela Rússia em 2014 foi um alerta silencioso, sua invasão sangrenta e em grande escala da Ucrânia em fevereiro foi um incêndio de grandes proporções.

“Tivemos nosso sonho tranquilo, mas agora é hora de acordar”, disse Robert Dalsjo, diretor de estudos da Agência Sueca de Pesquisa de Defesa. “O sonho acabou.”

O sentimento na Finlândia, depois de ter travado duas guerras contra a União Soviética, pendeu nos últimos seis meses a favor da adesão à Otan, guiada por Sauli Niinisto, seu presidente.

Tropas em Gotland durante um exercício de treinamento. Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times Foto: NYT / NYT
Tropas do regimento de Gotland durante um exercício de treinamento. Gotland é um posto avançado estratégico que permite o controle do tráfego no Mar Báltico Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times Foto: NYT / NYT

Agora, quase 80% dos finlandeses apoiam a adesão, em comparação com apenas 20% antes da guerra. Na quinta-feira, Niinisto e a primeira-ministra Sanna Marin tornaram público seu apoio ao pedido da Finlândia, com uma votação parlamentar prevista para segunda-feira.

Mas na Suécia, o debate é mais um psicodrama dentro do Partido Social-Democrata no poder. A primeira-ministra Magdalena Andersson descartou a adesão da Suécia à Otan em 8 de março, após a invasão russa. Mas em meados de abril, sua posição havia mudado.

“Há um antes e depois de 24 de fevereiro, o cenário de segurança mudou completamente”, disse ela. “Dada a situação, temos que realmente pensar no que é melhor para a Suécia e nossa paz nesta nova situação.”

O público sueco acompanhou, com 52% se declarando a favor da adesão à Otan, especialmente se a Finlândia aderir, muito acima dos 27% antes da guerra.

No domingo, após discussões com membros de todos os 26 distritos do país, os social-democratas anunciarão sua decisão, disse Kenneth G. Forslund, membro do executivo do partido e presidente do Comitê de Relações Exteriores do Parlamento. O consenso é que o partido irá relutantemente aderir à Otan ao lado da Finlândia.

“Nós e os finlandeses estamos juntos”, disse Carl Bildt, ex-primeiro-ministro. “Se estivéssemos lá fora sozinhos, seríamos um museu, com nostalgia dos anos 1960.”

Poucos analistas na Suécia e na Finlândia duvidam que os dois países se candidatarão em conjunto, e que a Otan aceitará a adesão rapidamente. Tanto Washington quanto Londres - Washington em silêncio, Londres em voz alta - forneceram garantias bilaterais de segurança a ambos os países enquanto seus pedidos são ratificados.

O comandante do regimento de Gotland, coronel Magnus Frykvall. "Se você possui Gotland, você pode controlar o movimento marítimo e aéreo em todo o sul do Báltico", disse ele Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times Foto: NYT / NYT

Para a Suécia e a Finlândia, “os tempos mudaram”, disse Bjorn Fagersten, do Instituto Sueco de Assuntos Internacionais. “É um novo normal, um novo mundo.”

Após o colapso da União Soviética, Estocolmo decidiu que a guerra era coisa do passado. O país removeu quase todas as suas forças de Gotland e reduziu o exército nacional em cerca de 90% e a marinha e a força aérea em cerca de 70%. Na ocasião, um coronel aposentado, Mats Ekeroth, que administrava um museu militar em Gotland, afirmou ser “absolutamente idiota”.

A última vez que Gotland foi invadida foi em 1808 — pela Rússia. Os 1.800 russos foram expulsos em um mês, mas, como um tiro de despedida, a Rússia arrancou a Finlândia dos suecos. Apenas seis anos depois, em 1814, a Suécia travou sua última guerra.

Assim, a Rússia sempre foi uma presença iminente nos países nórdicos. A frota da Rússia em Kaliningrado fica a apenas 360 quilômetros de distância, assim como seus mísseis com capacidade nuclear Iskander.

“As suspeitas com a Rússia remontam a muito tempo, cerca de 700 anos”, disse Niklas Granholm, também da Agência Sueca de Pesquisa de Defesa. Ele acrescentou: “Esta guerra contra a Ucrânia não será esquecida por algumas gerações, porque é assim que a Rússia realmente é”.

As pessoas ficaram apavoradas mesmo antes da invasão, quando o presidente russo Vladimir Putin alertou a Suécia e a Finlândia de “retaliação” caso se juntassem à Otan.

“As ameaças diretas de Putin tiveram o efeito oposto”, disse Dalsjo. “O nível de ameaça percebido realmente aumentou, levando ambas as nações a querer ingressar na Otan”.

A reputação internacional da Suécia é de neutralidade, manutenção da paz, desarmamento nuclear, igualdade de gênero e uma “política externa feminista”. Os suecos em geral, como brincou Bildt, “consideram-se a voz esclarecida da humanidade”.

Mas suas mudanças não são tão repentinas quanto parecem. Mesmo sob Olof Palme, o histórico premiê sueco que impulsionou a política de paz do país, e cujas duras críticas à Guerra do Vietnã aborreceram Washington, a Suécia tinha uma relação de trabalho conjunto com Moscou, mas também uma estreita, silenciosa e bilateral relação de Defesa com os Estados Unidos.

Foi um relacionamento secreto por muitos anos, conhecido como “a aliança oculta”, embora tenha sido revelado a Moscou por um proeminente espião sueco. Como disse Bildt, “era uma política conhecida pelos russos, mas não pelos suecos”.

Lutar pelo desarmamento nuclear e pela paz enquanto tentava “construir pontes” com Moscou não era contraditório para garantir a capacidade da Suécia de se defender com ajuda americana e britânica.

Guarda de honra do exército sueco marchando para uma cerimônia de bandeira em Estocolmo no domingo Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times Foto: NYT / NYT
Visitantes assistem à cerimônia da bandeira em Estocolmo Foto: Sergey Ponomarev/The New York Times Foto: NYT / NYT

De fato, apesar da sua política de desarmamento, a Suécia é silenciosamente um dos maiores fabricantes de armas per capita do mundo, com empresas importantes como a Saab, que fabrica caças, e a Bofors, agora parte da britânica BAE Systems.

A Suécia também se tornou um grande exportador de armas; em 2021, sua indústria militar exportou US$ 2 bilhões em armas, apesar das restrições à venda para ditaduras ou países em guerra – a Ucrânia agora é uma grande exceção.

Após o colapso da União Soviética, tanto a Suécia quanto a Finlândia se aproximaram do Ocidente, abandonando a neutralidade para se candidatar à União Europeia em 1992 e ao programa Parceria para a Paz da Otan em 1994, permanecendo militarmente não alinhados. Ambos os países se juntam aos exercícios da Otan.

Mas mesmo que a Rússia considere ambos os países efetivamente parte da aliança ocidental, a cooperação e as garantias em defesa não são plenas – certamente não do tipo previsto pelo Artigo 5 da OTAN, que compromete os Estados-membros com a defesa coletiva.

“Basicamente, estávamos pagando os custos, mas sem os benefícios do Artigo 5, e não estávamos enganando a Rússia”, disse Fagersten. “Estávamos tão alinhados à Otan quanto qualquer não-membro poderia estar.”

Mas a decisão causou angústia entre muitos suecos, preocupados que a participação em uma aliança nuclear limitará a capacidade da Suécia de pressionar pelo desarmamento nuclear, controle de armas e resolução pacífica de disputas.

“Não é assim que se constrói a paz e a segurança”, disse Gabriella Irsten, da Sociedade Sueca de Paz e Arbitragem, que condena veementemente a invasão russa, mas se opõe à adesão à Otan. “Você cria segurança junto com seu inimigo – se seu inimigo não está seguro, você não está.”

O não alinhamento serviu bem à Suécia “e nos manteve seguros”, disse ela, então parece errado descartá-lo agora.

“Eu também sinto que seria uma perda de nossa história”, disse ela. “Trabalhamos tanto com a visão de como construir a paz, e agora isso está sendo jogado no lixo sem discussão real e com todo esse medo.”

Tanto os Verdes como o Partido de Esquerda se opõem à adesão à Otan por razões semelhantes.

Marta Stenevi, dos Verdes, disse que a invasão russa significou “uma reavaliação de nossas posições em defesa e segurança”, mas pediu melhoria na defesa sueca e cooperação mais próxima com a Otan em vez de adesão, “que vem com certas obrigações”, como ir para a guerra em uma crise que não escolheu.

E depois há a possibilidade assustadora, disse ela, de um retorno ao poder do ex-presidente Trump.

“Queremos participar ativamente das crises que escolhermos”, disse Stenevi. “Manter uma voz forte para a paz e a democracia é mais fácil fora da aliança.”

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