Suprema Corte de Israel julga lei que limita seu próprio poder e ameaça crise constitucional


O governo de Israel aprovou um projeto de lei em julho que limita a influência da Suprema Corte. Nesta semana, os juízes começaram a se reunir para decidir se rejeitam projeto de lei, o que pode criar a maior crise constitucional da história do país

Por Patrick Kingsley

THE NEW YORK TIMES - O Supremo Tribunal de Israel começa a se reunir nesta terça-feira, 12, para avaliar a possibilidade de derrubar ou alterar a controvertida reforma do Judiciário que limita o poder do próprio tribunal. A audiência prepara o terreno para um confronto constitucional entre os poderes Judiciário e Executivo do país.

O tribunal superior vai analisar o projeto de lei aprovado pelo Parlamento em julho – impulsionado pelo governo do primeiro-ministro Biniamyn Netanyahu, considerado o mais nacionalista e religiosamente conservador da história de Israel. A primeira parte da reforma aprovada define que os juízes da Suprema Corte já não podem anular decisões ministeriais usando o padrão legal de “razoabilidade”.

Em julho, a Knesset aprovou parte da reforma do Judiciário que limita a capacidade da Suprema Corte de anular decisões tomadas pelo governo. Esta parte da reforma modifica uma Lei Básica de Israel, que permitia que a Suprema Corte bloqueasse as decisões tomadas pelo primeiro-ministro pelo padrão da “razoabilidade”.

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Manifestantes exibem uma grande faixa enquanto participam de uma manifestação contra o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu e a reforma judicial de seu governo de coalizão nacionalista, em Tel Aviv, Israel Foto: Ilan Rosenberg / Reuters

A doutrina da razoabilidade não é exclusiva do Judiciário de Israel. O princípio também é usado, por exemplo, no Reino Unido, Canadá e Austrália. É usado pelos tribunais para determinar a constitucionalidade ou legalidade de uma determinada legislação aprovada e permite que os juízes atestem que as decisões tomadas pelos legisladores ou governantes sejam “razoáveis”, ou seja, estejam dentro de um padrão constitucional ou legal.

Enquanto a oposição afirma que a Suprema Corte de Israel contribui para o sistema de freios e contrapesos no país e teme que a reforma signifique uma diminuição no nível democrático do país, os que defendem a reforma, apontam que o poder acumulado pelo judiciário israelense não permite que o governo aplique propriamente a agenda pela qual foi eleito.

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Com uma coalizão formada por partidos extremistas e religiosos, Netanyahu deseja avançar para aprovar o restante do pacote de reformas após o recesso da Knesset (Parlamento), em outubro.

O caso é considerado um dos mais importantes da história de Israel. Os juízes podem levar até janeiro para chegar a uma decisão.

Esther Hayut, presidente da Suprema Corte de Israel, senta-se no banco com os juízes da Suprema Corte de Israel para analisar a legalidade da contenciosa reforma judicial do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, que o governo aprovou no parlamento em julho, em Jerusalém, Israel Foto: Debbie Hill / AP
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Obstáculo

O governo Netanyahu vê o tribunal como um obstáculo à sua visão de uma sociedade mais conservadora e nacionalista. O tribunal tem historicamente agido como um controle da influência religiosa na vida pública, de algumas atividades israelenses na Cisjordânia ocupada e de decisões que favorecem os judeus em detrimento dos árabes.

A oposição considera o tribunal um garantidor do caráter secular de Israel, um protetor das suas minorias e um baluarte contra o autoritarismo. Para eles, a legislação aprovada em julho foi uma tentativa do governo de enfraquecer o tribunal e impedi-lo de de anular decisões do governo alegando que não eram “razoáveis”.

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Os líderes da coalizão liderada por Netanyahu disseram que o conceito de razoabilidade – nunca definido em uma Constituição – era vago e, no passado, deu aos juízes não eleitos espaço para interferir nas decisões dos legisladores eleitos. A colizão disse que o tribunal ainda tinha várias outras ferramentas com as quais poderia conter medidas do governo.

Yariv Levin, o ministro da Justiça, disse na terça-feira que a decisão do tribunal de rever a lei foi outro exemplo de extrapolação das suas competências, o que constituiu “um dano mortal ao governo eleito pelo povo”.

O primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu e o ministro da Justiça Yariv Levin levantam uma taça para marcar o próximo feriado do Ano Novo Judaico durante a reunião semanal do Gabinete em Jerusalém em 10 de setembro de 2023 Foto: Ohad Zwigenberg/AFP
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Numa declaração, Levin acrescentou que, ao tentar governar com base no seu próprio poder, o tribunal “coloca-se acima do governo, acima do Parlamento, acima do povo e acima da lei. Esta situação é completamente contrária à democracia”.

A suprema Corte vai ouvir argumentos de oito peticionários contra a lei, a maioria deles organizações da sociedade civil que fazem campanha contra a reforma, bem como representantes do governo e do Parlamento.

Os opositores da lei argumentam que a legislação mina a democracia de Israel ao limitar o poder do Supremo Tribunal, que é o principal controle dos excessos do governo. Israel não tem uma Constituição escrita, apenas um conjunto de leis básicas. Também não tem uma segunda câmara do Parlamento, que equivaleria a um Senado, aumentando a importância do tribunal como contrapeso ao poder do gabinete de governo e da legislatura.

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Eliad Shraga, que lidera um dos grupos que entraram com ações contra a reforma, disse na terça-feira que a lei era uma espécie de “golpe”. “Este é um dia histórico, um acontecimento histórico”, acrescentou Shraga, pouco antes de entrar na sala do tribunal com os seus filhos. “Espero que seja um sinal vermelho para o atual governo.”

Novas etapas da reforma do Judiciário

A lei faz parte de um pacote legislativo mais amplo, que o governo Netanyahu até agora não conseguiu implementar. O governo ainda espera aprovar na volta do recesso parlamentar, em outubro, outra lei que lhe dê maior controle sobre quem pode ser juiz. Mas Netanyahu descartou a possibilidade de prosseguir com uma terceira parte da reforma que teria permitido ao Parlamento anular as decisões do Supremo Tribunal.

O pacote desencadeou o que muitos consideram a pior crise política interna da história de Israel, que alargou as divergências de longa data entre israelenses seculares e religiosos, bem como entre judeus de ascendência europeia e do Oriente Médio.

Os oponentes da lei protestam há 36 semanas consecutivas. A reforma do Judiciário também levou investidores a tirarem capital de Israel, levou mais de 1.000 soldados da reserva a suspenderem o seu serviço voluntário nas Forças Armadas do país e prejudicou a relação de Israel com o governo dos Estados Unidos.

Num sinal da seriedade com que o Judiciário encara o recurso, a presidente do tribunal, Esther Hayut, decidiu que todos os 15 juízes do tribunal deveriam ouvir o caso – um número recorde que exigiu a reorganização da disposição do banco dos juízes. Normalmente, entre três e 11 juízes participam de cada caso perante o tribunal.

Em outro sinal da importância do caso, legisladores, diplomatas estrangeiros e jornalistas começaram a fazer fila fora da sala do tribunal pelo menos 90 minutos antes do início da audiência para garantir um lugar.

Yitzhak Beret, conselheiro jurídico do Parlamento, foi a primeira pessoa a falar pelos juízes – “uma enorme honra e privilégio”, disse ele. “Estou realmente emocionado por estar aqui hoje”, acrescentou Beret.

Analistas jurídicos disseram que é cedo para determinar como o tribunal vai julgar o caso. Mas a partir das perguntas e declarações iniciais dos juízes, ficou claro que pelo menos alguns membros do tribunal estavam preocupados com a lei.

“Parece que você certamente acredita que o dever de agir razoavelmente também se aplica ao governo e aos seus ministros”, disse o juiz Hayut a Yitzhak Beret, o conselheiro parlamentar. “Mas se a Suprema Corte for impedida de usar o padrão de razoabilidade, quem supervisiona se eles realmente agem de forma razoável?”.

THE NEW YORK TIMES - O Supremo Tribunal de Israel começa a se reunir nesta terça-feira, 12, para avaliar a possibilidade de derrubar ou alterar a controvertida reforma do Judiciário que limita o poder do próprio tribunal. A audiência prepara o terreno para um confronto constitucional entre os poderes Judiciário e Executivo do país.

O tribunal superior vai analisar o projeto de lei aprovado pelo Parlamento em julho – impulsionado pelo governo do primeiro-ministro Biniamyn Netanyahu, considerado o mais nacionalista e religiosamente conservador da história de Israel. A primeira parte da reforma aprovada define que os juízes da Suprema Corte já não podem anular decisões ministeriais usando o padrão legal de “razoabilidade”.

Em julho, a Knesset aprovou parte da reforma do Judiciário que limita a capacidade da Suprema Corte de anular decisões tomadas pelo governo. Esta parte da reforma modifica uma Lei Básica de Israel, que permitia que a Suprema Corte bloqueasse as decisões tomadas pelo primeiro-ministro pelo padrão da “razoabilidade”.

Manifestantes exibem uma grande faixa enquanto participam de uma manifestação contra o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu e a reforma judicial de seu governo de coalizão nacionalista, em Tel Aviv, Israel Foto: Ilan Rosenberg / Reuters

A doutrina da razoabilidade não é exclusiva do Judiciário de Israel. O princípio também é usado, por exemplo, no Reino Unido, Canadá e Austrália. É usado pelos tribunais para determinar a constitucionalidade ou legalidade de uma determinada legislação aprovada e permite que os juízes atestem que as decisões tomadas pelos legisladores ou governantes sejam “razoáveis”, ou seja, estejam dentro de um padrão constitucional ou legal.

Enquanto a oposição afirma que a Suprema Corte de Israel contribui para o sistema de freios e contrapesos no país e teme que a reforma signifique uma diminuição no nível democrático do país, os que defendem a reforma, apontam que o poder acumulado pelo judiciário israelense não permite que o governo aplique propriamente a agenda pela qual foi eleito.

Com uma coalizão formada por partidos extremistas e religiosos, Netanyahu deseja avançar para aprovar o restante do pacote de reformas após o recesso da Knesset (Parlamento), em outubro.

O caso é considerado um dos mais importantes da história de Israel. Os juízes podem levar até janeiro para chegar a uma decisão.

Esther Hayut, presidente da Suprema Corte de Israel, senta-se no banco com os juízes da Suprema Corte de Israel para analisar a legalidade da contenciosa reforma judicial do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, que o governo aprovou no parlamento em julho, em Jerusalém, Israel Foto: Debbie Hill / AP

Obstáculo

O governo Netanyahu vê o tribunal como um obstáculo à sua visão de uma sociedade mais conservadora e nacionalista. O tribunal tem historicamente agido como um controle da influência religiosa na vida pública, de algumas atividades israelenses na Cisjordânia ocupada e de decisões que favorecem os judeus em detrimento dos árabes.

A oposição considera o tribunal um garantidor do caráter secular de Israel, um protetor das suas minorias e um baluarte contra o autoritarismo. Para eles, a legislação aprovada em julho foi uma tentativa do governo de enfraquecer o tribunal e impedi-lo de de anular decisões do governo alegando que não eram “razoáveis”.

Os líderes da coalizão liderada por Netanyahu disseram que o conceito de razoabilidade – nunca definido em uma Constituição – era vago e, no passado, deu aos juízes não eleitos espaço para interferir nas decisões dos legisladores eleitos. A colizão disse que o tribunal ainda tinha várias outras ferramentas com as quais poderia conter medidas do governo.

Yariv Levin, o ministro da Justiça, disse na terça-feira que a decisão do tribunal de rever a lei foi outro exemplo de extrapolação das suas competências, o que constituiu “um dano mortal ao governo eleito pelo povo”.

O primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu e o ministro da Justiça Yariv Levin levantam uma taça para marcar o próximo feriado do Ano Novo Judaico durante a reunião semanal do Gabinete em Jerusalém em 10 de setembro de 2023 Foto: Ohad Zwigenberg/AFP

Numa declaração, Levin acrescentou que, ao tentar governar com base no seu próprio poder, o tribunal “coloca-se acima do governo, acima do Parlamento, acima do povo e acima da lei. Esta situação é completamente contrária à democracia”.

A suprema Corte vai ouvir argumentos de oito peticionários contra a lei, a maioria deles organizações da sociedade civil que fazem campanha contra a reforma, bem como representantes do governo e do Parlamento.

Os opositores da lei argumentam que a legislação mina a democracia de Israel ao limitar o poder do Supremo Tribunal, que é o principal controle dos excessos do governo. Israel não tem uma Constituição escrita, apenas um conjunto de leis básicas. Também não tem uma segunda câmara do Parlamento, que equivaleria a um Senado, aumentando a importância do tribunal como contrapeso ao poder do gabinete de governo e da legislatura.

Eliad Shraga, que lidera um dos grupos que entraram com ações contra a reforma, disse na terça-feira que a lei era uma espécie de “golpe”. “Este é um dia histórico, um acontecimento histórico”, acrescentou Shraga, pouco antes de entrar na sala do tribunal com os seus filhos. “Espero que seja um sinal vermelho para o atual governo.”

Novas etapas da reforma do Judiciário

A lei faz parte de um pacote legislativo mais amplo, que o governo Netanyahu até agora não conseguiu implementar. O governo ainda espera aprovar na volta do recesso parlamentar, em outubro, outra lei que lhe dê maior controle sobre quem pode ser juiz. Mas Netanyahu descartou a possibilidade de prosseguir com uma terceira parte da reforma que teria permitido ao Parlamento anular as decisões do Supremo Tribunal.

O pacote desencadeou o que muitos consideram a pior crise política interna da história de Israel, que alargou as divergências de longa data entre israelenses seculares e religiosos, bem como entre judeus de ascendência europeia e do Oriente Médio.

Os oponentes da lei protestam há 36 semanas consecutivas. A reforma do Judiciário também levou investidores a tirarem capital de Israel, levou mais de 1.000 soldados da reserva a suspenderem o seu serviço voluntário nas Forças Armadas do país e prejudicou a relação de Israel com o governo dos Estados Unidos.

Num sinal da seriedade com que o Judiciário encara o recurso, a presidente do tribunal, Esther Hayut, decidiu que todos os 15 juízes do tribunal deveriam ouvir o caso – um número recorde que exigiu a reorganização da disposição do banco dos juízes. Normalmente, entre três e 11 juízes participam de cada caso perante o tribunal.

Em outro sinal da importância do caso, legisladores, diplomatas estrangeiros e jornalistas começaram a fazer fila fora da sala do tribunal pelo menos 90 minutos antes do início da audiência para garantir um lugar.

Yitzhak Beret, conselheiro jurídico do Parlamento, foi a primeira pessoa a falar pelos juízes – “uma enorme honra e privilégio”, disse ele. “Estou realmente emocionado por estar aqui hoje”, acrescentou Beret.

Analistas jurídicos disseram que é cedo para determinar como o tribunal vai julgar o caso. Mas a partir das perguntas e declarações iniciais dos juízes, ficou claro que pelo menos alguns membros do tribunal estavam preocupados com a lei.

“Parece que você certamente acredita que o dever de agir razoavelmente também se aplica ao governo e aos seus ministros”, disse o juiz Hayut a Yitzhak Beret, o conselheiro parlamentar. “Mas se a Suprema Corte for impedida de usar o padrão de razoabilidade, quem supervisiona se eles realmente agem de forma razoável?”.

THE NEW YORK TIMES - O Supremo Tribunal de Israel começa a se reunir nesta terça-feira, 12, para avaliar a possibilidade de derrubar ou alterar a controvertida reforma do Judiciário que limita o poder do próprio tribunal. A audiência prepara o terreno para um confronto constitucional entre os poderes Judiciário e Executivo do país.

O tribunal superior vai analisar o projeto de lei aprovado pelo Parlamento em julho – impulsionado pelo governo do primeiro-ministro Biniamyn Netanyahu, considerado o mais nacionalista e religiosamente conservador da história de Israel. A primeira parte da reforma aprovada define que os juízes da Suprema Corte já não podem anular decisões ministeriais usando o padrão legal de “razoabilidade”.

Em julho, a Knesset aprovou parte da reforma do Judiciário que limita a capacidade da Suprema Corte de anular decisões tomadas pelo governo. Esta parte da reforma modifica uma Lei Básica de Israel, que permitia que a Suprema Corte bloqueasse as decisões tomadas pelo primeiro-ministro pelo padrão da “razoabilidade”.

Manifestantes exibem uma grande faixa enquanto participam de uma manifestação contra o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu e a reforma judicial de seu governo de coalizão nacionalista, em Tel Aviv, Israel Foto: Ilan Rosenberg / Reuters

A doutrina da razoabilidade não é exclusiva do Judiciário de Israel. O princípio também é usado, por exemplo, no Reino Unido, Canadá e Austrália. É usado pelos tribunais para determinar a constitucionalidade ou legalidade de uma determinada legislação aprovada e permite que os juízes atestem que as decisões tomadas pelos legisladores ou governantes sejam “razoáveis”, ou seja, estejam dentro de um padrão constitucional ou legal.

Enquanto a oposição afirma que a Suprema Corte de Israel contribui para o sistema de freios e contrapesos no país e teme que a reforma signifique uma diminuição no nível democrático do país, os que defendem a reforma, apontam que o poder acumulado pelo judiciário israelense não permite que o governo aplique propriamente a agenda pela qual foi eleito.

Com uma coalizão formada por partidos extremistas e religiosos, Netanyahu deseja avançar para aprovar o restante do pacote de reformas após o recesso da Knesset (Parlamento), em outubro.

O caso é considerado um dos mais importantes da história de Israel. Os juízes podem levar até janeiro para chegar a uma decisão.

Esther Hayut, presidente da Suprema Corte de Israel, senta-se no banco com os juízes da Suprema Corte de Israel para analisar a legalidade da contenciosa reforma judicial do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, que o governo aprovou no parlamento em julho, em Jerusalém, Israel Foto: Debbie Hill / AP

Obstáculo

O governo Netanyahu vê o tribunal como um obstáculo à sua visão de uma sociedade mais conservadora e nacionalista. O tribunal tem historicamente agido como um controle da influência religiosa na vida pública, de algumas atividades israelenses na Cisjordânia ocupada e de decisões que favorecem os judeus em detrimento dos árabes.

A oposição considera o tribunal um garantidor do caráter secular de Israel, um protetor das suas minorias e um baluarte contra o autoritarismo. Para eles, a legislação aprovada em julho foi uma tentativa do governo de enfraquecer o tribunal e impedi-lo de de anular decisões do governo alegando que não eram “razoáveis”.

Os líderes da coalizão liderada por Netanyahu disseram que o conceito de razoabilidade – nunca definido em uma Constituição – era vago e, no passado, deu aos juízes não eleitos espaço para interferir nas decisões dos legisladores eleitos. A colizão disse que o tribunal ainda tinha várias outras ferramentas com as quais poderia conter medidas do governo.

Yariv Levin, o ministro da Justiça, disse na terça-feira que a decisão do tribunal de rever a lei foi outro exemplo de extrapolação das suas competências, o que constituiu “um dano mortal ao governo eleito pelo povo”.

O primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu e o ministro da Justiça Yariv Levin levantam uma taça para marcar o próximo feriado do Ano Novo Judaico durante a reunião semanal do Gabinete em Jerusalém em 10 de setembro de 2023 Foto: Ohad Zwigenberg/AFP

Numa declaração, Levin acrescentou que, ao tentar governar com base no seu próprio poder, o tribunal “coloca-se acima do governo, acima do Parlamento, acima do povo e acima da lei. Esta situação é completamente contrária à democracia”.

A suprema Corte vai ouvir argumentos de oito peticionários contra a lei, a maioria deles organizações da sociedade civil que fazem campanha contra a reforma, bem como representantes do governo e do Parlamento.

Os opositores da lei argumentam que a legislação mina a democracia de Israel ao limitar o poder do Supremo Tribunal, que é o principal controle dos excessos do governo. Israel não tem uma Constituição escrita, apenas um conjunto de leis básicas. Também não tem uma segunda câmara do Parlamento, que equivaleria a um Senado, aumentando a importância do tribunal como contrapeso ao poder do gabinete de governo e da legislatura.

Eliad Shraga, que lidera um dos grupos que entraram com ações contra a reforma, disse na terça-feira que a lei era uma espécie de “golpe”. “Este é um dia histórico, um acontecimento histórico”, acrescentou Shraga, pouco antes de entrar na sala do tribunal com os seus filhos. “Espero que seja um sinal vermelho para o atual governo.”

Novas etapas da reforma do Judiciário

A lei faz parte de um pacote legislativo mais amplo, que o governo Netanyahu até agora não conseguiu implementar. O governo ainda espera aprovar na volta do recesso parlamentar, em outubro, outra lei que lhe dê maior controle sobre quem pode ser juiz. Mas Netanyahu descartou a possibilidade de prosseguir com uma terceira parte da reforma que teria permitido ao Parlamento anular as decisões do Supremo Tribunal.

O pacote desencadeou o que muitos consideram a pior crise política interna da história de Israel, que alargou as divergências de longa data entre israelenses seculares e religiosos, bem como entre judeus de ascendência europeia e do Oriente Médio.

Os oponentes da lei protestam há 36 semanas consecutivas. A reforma do Judiciário também levou investidores a tirarem capital de Israel, levou mais de 1.000 soldados da reserva a suspenderem o seu serviço voluntário nas Forças Armadas do país e prejudicou a relação de Israel com o governo dos Estados Unidos.

Num sinal da seriedade com que o Judiciário encara o recurso, a presidente do tribunal, Esther Hayut, decidiu que todos os 15 juízes do tribunal deveriam ouvir o caso – um número recorde que exigiu a reorganização da disposição do banco dos juízes. Normalmente, entre três e 11 juízes participam de cada caso perante o tribunal.

Em outro sinal da importância do caso, legisladores, diplomatas estrangeiros e jornalistas começaram a fazer fila fora da sala do tribunal pelo menos 90 minutos antes do início da audiência para garantir um lugar.

Yitzhak Beret, conselheiro jurídico do Parlamento, foi a primeira pessoa a falar pelos juízes – “uma enorme honra e privilégio”, disse ele. “Estou realmente emocionado por estar aqui hoje”, acrescentou Beret.

Analistas jurídicos disseram que é cedo para determinar como o tribunal vai julgar o caso. Mas a partir das perguntas e declarações iniciais dos juízes, ficou claro que pelo menos alguns membros do tribunal estavam preocupados com a lei.

“Parece que você certamente acredita que o dever de agir razoavelmente também se aplica ao governo e aos seus ministros”, disse o juiz Hayut a Yitzhak Beret, o conselheiro parlamentar. “Mas se a Suprema Corte for impedida de usar o padrão de razoabilidade, quem supervisiona se eles realmente agem de forma razoável?”.

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