A Pensilvânia é um dos Estados mais divididos dos EUA. Governado por um democrata, Tom Wolf, tem um senador de cada partido – Bob Casey, democrata, e Pat Toomey, republicano. O presidente, Joe Biden, derrotou Donald Trump, em 2020, por apenas 1,2 ponto porcentual. Agora, novamente, é ali que o futuro dos EUA será decidido.
A Pensilvânia é um estado pêndulo ou swing, como são chamados aqueles que não possuem uma tendência democrática e republicana clara e podem variar seu voto. Os olhos estão voltados para este lugar que poderia definir quem fica com a maioria nas duas Casas do Congresso.
No fim de semana, o ex-presidente e espécie de ‘garoto propaganda’ do Partido Democrata Barack Obama participou de um comício em Pittsburgh acompanhando o candidato ao senado pelo partido, John Fetterman.
Biden também escolheu o Estado para fechar a campanha dessas eleições de meio mandato, endossando a candidatura ao governo de Josh Shapiro.
A pequena Pennsburg, cidade da Pensilvânia com pouco menos de 4 mil habitantes, estava em festa na segunda-feira, 7, para acompanhar o comício final do candidato republicano ao Senado, Mehmet Oz.
Com o apoio de Trump, o cirurgião cardíaco com fama de popstar, mais conhecido como Dr. Oz, ganhou popularidade por seu trabalho na televisão como apresentador do Dr. Oz Show.
Muitos dos que enfrentaram a fria noite de Pennsburg para prestigiar o evento estão descrentes no sistema de votação de seu país, como Tara Kyle e sua família.
“Estou esperançosa de que eles façam a coisa certa e contem os votos corretamente. Espero que eles contem todos os votos, não apenas os que eles querem”, reclama Tara, referindo-se à narrativa que tem dominado as corridas eleitorais mais recentes na Pensilvânia.
“Todos estão dizendo que teremos mais votos, mas isso não significa que nosso candidato vá ganhar”, desconfia ela.
“Eles vão trapacear. É por isso que eles não estão com medo agora, eles sabem que não precisam se preocupar. Eles vão fazer a mesma coisa que fizeram da última vez”, conclui referindo-se às eleições presidenciais de 2020 nas quais Trump dizia ter sido roubado.
Kelly Shall Meyer diz ainda não ter perdido completamente a confiança no sistema: “Espero que seja uma eleição justa, porque acho que, como americanos, é isso que merecemos”, diz.
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Donald Trump aposta na vitória de seu Partido Republicano nas eleições de meio de mandato da próxima semana, de olho nas presidenciais de 2024.
Sua desesperança se dirige mais ao futuro da economia e do pequeno empreendimento rural da família em um cenário de inflação recorde. “Nós temos um negócio de caminhões e escavadeiras, e também somos agricultores”, conta. “A alta do preço do combustível nos atingiu com muita força. Os preços dos fertilizantes também triplicaram para nós”, reclama.
Em sua realidade de produtora rural, o custo para operar os veículos dos quais depende para plantar e colher se tornaram quase inviáveis. “Ganhar a vida ficou muito difícil”, lamenta Kelly Shallmeyer.
Por mais distante que pareça a invasão do Capitólio contestando a vitória em uma eleição que os manifestantes radicais disseram ter sido roubada, a sensação de que os resultados não foram justos continua viva até mesmo entre pacatos americanos como Paul Dallmeier.
“Foi muito difícil olhar para um comício de Trump e ver milhões de pessoas e depois ir a um comício de Biden e ver cinco carros no estacionamento e pensar que ele ganhou. Mas eu não sou o cara mais inteligente do mundo. Só acho que tenho bom senso”, pondera.
Do lado democrata, a desconfiança é com a Justiça
Durante uma jornada eleitoral que a integrante do comitê do Partido Democrata de Newtown, na Pensilvânia, Nancy McWhirter, classifica como tranquila, os resultados são esperados apenas para a manhã de quarta-feira, 9.
Ainda que que muitos votos já tenha sido emitidos de modo antecipado, ou pelo correio, a contagem total dos votos em papel pode demorar ainda alguns dias.
No início de novembro, a Corte Suprema da Pensilvânia determinou que as autoridades eleitorais não contassem cédulas enviadas por correio que não tenham uma data escrita no lado de fora do envelope externo.
Para Nancy, essa foi uma decisão de última hora que acaba desvalorizando os votos enviados por correio anteriormente, mesmo que as cédulas contenham data e assinatura.
Para o professor de Ciências Políticas da Northwestern University, Ken Kollman, os tribunais estaduais se tornarão cada vez mais importantes à medida que a administração eleitoral convida ações judiciais e contestações legais.
Kollman diz acreditar que, do lado republicano, há uma estratégia concentrada para tentar restringir as cédulas que são enviadas pelo correio. “Há ainda uma estratégia específica para desestimular os votos das pessoas em certas áreas e partes dos Estados, especialmente daquelas com menor escolaridade, que podem estar mais inclinadas a votar pelos democratas”, avalia.
Sobre a desconfiança dos eleitores, o cientista político culpa a ansiedade gerada pelas constantes ameaças ao sistema. “Há muita ansiedade por todos os lados, sobre a condução das eleições e sobre as ameaças aos funcionários eleitorais”, diz.
Para o especialista, os republicanos estão espalhando dúvidas sobre a integridade das eleições, especialmente em Estados onde os democratas têm muita força.
“Os democratas estão preocupados com os adversários republicanos e os cargos administrativos que estão sendo preenchidos por pessoas que negam a legitimidade das eleições de 2020 e o que isso significará para o futuro”, diz Kollman.
Polarização do país
Essas questões estariam entre as que explicam a atual polarização no país hoje. “Remontam às dúvidas que Donald Trump levantou, mesmo antes das eleições de 2020, dizendo que ele poderia não aceitar os resultados”, analisa.
Para Kollman, o fato de o ex-presidente e possível candidato às eleições de 2024 não reconhecer a vitória de Biden e fazer alegações sem qualquer evidência de que a eleição foi roubada acabou gerando uma divisão dentro do próprio Partido Republicano. “Isso porque, hoje, estar de acordo com o Trump significa que você não acredita que ass eleições de 2020 tenham tido um resultado justo ou correto”, observa.
A semente da desconfiança plantada por Trump inspirou muitas ações para monitorar o processo eleitoral e “semear dúvidas sobre os resultados, mesmo antes da contagem dos votos para alegar que há trapaça do lado democrata”, diz Kollman.
Portanto, segundo a análise do professor da Northwestern University, uma vitória dos republicanos nas eleições de meio mandato não estaria necessariamente ligada a um voto pró-Trump ou à uma aprovação ao Partido Republicano. Para o cientista político, o partido de oposição pode se beneficiar do voto punitivo ao governo democrata, o qual os eleitores responsabilizam pelos atuais índices de inflação e criminalidade.