Tensões com a China avançam o sinal em disputa nos mares do Pacífico


O governo das Filipinas prometeu uma abordagem mais agressiva em relação a China por conta das disputas marítimas entre os dois países desde a vitória do presidente Ferdinand Marcos Jr

Por Sui-Lee Wee
Atualização:

THE NEW YORK TIMES - O vídeo pode parecer simples demais, despretensioso demais para marcar um incidente internacional grave no Mar do Sul da China: um breve clipe de um mergulhador usando uma faca para cortar uma corda debaixo d’água. Mas esse mergulhador é da Guarda Costeira filipina, e a corda era parte de uma barreira marítima instalada por forças chinesas para manter pescadores filipinos fora de uma região na qual eles têm direito de pescar. Naquele momento, as autoridades filipinas deram um dos passos mais contundentes até aqui no sentido de contestar as incessantes reivindicações territoriais da China cada vez mais próximas do arquipélago filipino.

“A barreira representava um perigo para a navegação, era uma violação clara do direito internacional”, afirmou o governo das Filipinas em um comunicado, acrescentando que a ação foi praticada sob ordem direta do presidente Ferdinand Marcos Jr.

Desde que assumiu a função, em junho de 2022, Marcos sinalizou a intenção de uma abordagem mais muscular de política externa em relação à China. Mas até aqui, essas ações tinham se restringido principalmente à retórica, aprofundando alianças com os Estados Unidos e outros países e publicando vídeos de atividades agressivas da Guarda Costeira chinesa contra embarcações filipinas.

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A surpresa desta vez é a ação partir do governo filipino, deixando pouca dúvida de que o país resistirá mais contundentemente aos desígnios territoriais da China.

Enquanto o governo Biden deverá considerar isso boa notícia, cresce na região a apreensão a respeito de como a China poderá reagir a essa resistência e sobre poder haver algum risco de ignição de um confronto militar direto entre a China e as Filipinas e seus aliados, que incluem a frota da Marinha dos EUA patrulhando a região.

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Depois que a corda foi cortada e as Filipinas içaram a âncora que mantinha a barreira no lugar, a China removeu o equipamento. Na terça-feira, um porta-voz do ministério chinês das Relações Exteriores respondeu bruscamente ao comunicado filipino. “Nós aconselhamos as Filipinas a não causar provocações nem problemas”, afirmou ele.

O comentarista e ex-oficial militar chinês Song Zhongping, radicado em Pequim, afirmou que os filipinos foram estimulados a cortar a barreira “porque os EUA continuam a encorajar as Filipinas a confrontar a China no Mar do Sul da China”.

Barcos da Guarda Costeira da China navegando perto de uma barreira flutuante em Scarborough Shoal, no Mar da China Meridional, em setembro Foto: Guarda Costeira das Filipinas/Reuter
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“A China tem de adotar medidas decisivas para pôr fim à provocação das Filipinas”, afirmou Song. “Nós não podemos permitir que as Filipinas cometam provocações intermináveis e apresentem uma grave ameaça à soberania nacional e à segurança da China.”

Pequim reivindica 90% do Mar do Sul da China, parte desse território a milhares de quilômetros da costa chinesa e abrangendo águas em torno de Vietnã, Malásia, Brunei, Indonésia e Filipinas. Na década recente, a China tem imposto um controle cada vez maior sobre essas águas, usando dois arquipélagos conhecidos como Ilhas Paracel e Ilhas Spratlys para expandir sua presença militar construindo e fortificando postos avançados e aeroportos.

Essas ações têm causado alarme em grande parte da Ásia e nos EUA, que afirmam ter interesse particular em manter a liberdade de navegação em uma das rotas comerciais mais movimentadas do planeta. O fortalecimento militar da China e as ações cada vez mais agressivas de sua Guarda Costeira e de sua milícia marítima também levantam dúvidas a respeito das intenções dos chineses na região e sua disposição em agir de acordo com as normas internacionais.

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Uma embarcação da Guarda Costeira da China passa por barcos de pescadores das Filipinas na área marítima disputada pelos dois países  Foto: Ted Aljibe/AFP

Ação militar

As tensões são especialmente pronunciadas nas Filipinas, onde pescadores têm sido impedidos de pescar por embarcações chinesas. E as Filipinas foram impedidas de explorar totalmente depósitos de petróleo e gás natural em uma área que uma corte de Haia, nos Países Baixos, decidiu em 2016 que pertence à zona comercial exclusiva das Filipinas.

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Muitos analistas afirmam que a China deverá evitar uma ação militar contra as Filipinas, que são aliadas dos EUA segundo tratado, por temer envolver-se em um conflito mais amplo com os americanos e outros aliados de Washington na região. Em agosto, o secretário da Defesa americano, Lloyd Austin, reafirmou que um tratado de defesa mútua com os EUA “se estende às embarcações e aeronaves públicas e Forças Armadas filipinas — a incluir a Guarda Costeira — no Pacífico, incluindo no Mar do Sul da China”.

“Se os EUA tiverem de se envolver em um confronto militar com a China no Mar do Sul da China nós não poderemos esperar que Austrália e Japão, por exemplo, fiquem apenas assistindo sem fazer nada enquanto seus aliados americanos estiverem combatendo os chineses”, afirmou Collin Koh, pesquisador sênior do Instituto de Estudos Estratégicos e de Defesa, em Cingapura. “Eles serão atraídos de alguma forma, portanto eu acredito que isso é algo que qualquer estrategista chinês terá de considerar.”

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Koh diz esperar que a China intensifique sua presença no Mar do Sul da China, talvez enviando mais embarcações para o entorno de regiões disputadas, como a Ilha Thitu e o Segundo Atol Thomas, para evitar que pescadores filipinos operem livremente e bloquear embarcações de policiamento marítimo.

Bilahari Kausikan, ex-diplomata do Ministério de Relações Exteriores de Cingapura, disse acreditar que “Pequim já tem bastante contratempos domésticos e não vai querer aumentar seus problemas arrumando também um confronto com os EUA”.

Kausikan afirmou que “o risco de conflito seria mais alto” se as Filipinas não tivessem removido a barreira, “porque então os chineses se veriam tentados a pressionar ainda mais os limites”.

Mas Leonardo Cuaresma, presidente da Nova Associação de Pescadores de Masinloc afirmou que, na municipalidade em que a barreira foi cortada, as pessoas ficaram nervosas sobre a possível reação da China. “Aqui em Masinloc é natural sentir medo, porque se houver um conflito nós seremos os primeiros a sentir”, afirmou Cuaresma. “É difícil, porque nós não sabemos se haverá guerra ou algo assim. Nós estamos ansiosos.”

Cuaresma afirmou que seus colegas não conseguiram pescar no Atol Scarborough por anos por causa da China. “No instante em que nos aproximávamos da entrada do atol, eles nos bloqueavam imediatamente”, afirmou ele. “Eles emparelhavam seus barcos, menores, com os nossos e nos diziam, ‘Vão embora, filipinos’.”

Um navio da Guarda Costeira da China acompanhando barcos de pesca filipinos perto de Scarborough Shoal em setembro. Ambos os países reivindicam aquela área do Mar da China Meridional. Foto: Ted Aljibe/AFP

Ao lado dessa tensão há também uma ansiedade nas Filipinas a respeito de como lidar com a China.

Koko Pimentel, líder da minoria no Senado filipino, disse em uma sessão na Câmara Alta que concorda com a decisão do governo Marcos de remover a barreira chinesa. Mas posteriormente, em mensagem à reportagem do New York Times, ele foi cauteloso: “Nós devemos evitar o conflito o máximo possível, devemos fazer tudo por meio de diálogo e diplomacia. Posições diferentes são coisas da vida, e nós devemos ser capazes de viver a vida com esta realidade.”

Antonio Carpio, ex-ministro sênior associado da Suprema Corte filipina e especialista em Mar do Sul da China, afirmou que as Filipinas estão simplesmente repetindo o que Malásia e Indonésia fizeram recentemente quando enviaram navios de pesquisa a águas disputadas apesar de ameaças da China. “Se você faz valer seu direito e fica firme, bem, a China não faz nada”, acrescentou ele.

Carpio afirmou que, mais amplamente, a comunidade internacional deve prestar atenção ao que está acontecendo no Mar do Sul da China, porque “exatamente o mesmo está em jogo tanto na Ucrânia quanto no Mar do Sul da China”.

“Todas as nações devem se opor a isso, porque não se trata apenas de uma questão filipina; é o futuro do mundo que está em jogo”, afirmou ele. “Se a Carta da ONU, que tornou ilegal guerras de agressão, for abolida, então somente as potências nucleares serão capazes de resolver disputas de acordo com seus próprios ditames. A doutrina ‘quem tem força tem direito’ retornará.” / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

THE NEW YORK TIMES - O vídeo pode parecer simples demais, despretensioso demais para marcar um incidente internacional grave no Mar do Sul da China: um breve clipe de um mergulhador usando uma faca para cortar uma corda debaixo d’água. Mas esse mergulhador é da Guarda Costeira filipina, e a corda era parte de uma barreira marítima instalada por forças chinesas para manter pescadores filipinos fora de uma região na qual eles têm direito de pescar. Naquele momento, as autoridades filipinas deram um dos passos mais contundentes até aqui no sentido de contestar as incessantes reivindicações territoriais da China cada vez mais próximas do arquipélago filipino.

“A barreira representava um perigo para a navegação, era uma violação clara do direito internacional”, afirmou o governo das Filipinas em um comunicado, acrescentando que a ação foi praticada sob ordem direta do presidente Ferdinand Marcos Jr.

Desde que assumiu a função, em junho de 2022, Marcos sinalizou a intenção de uma abordagem mais muscular de política externa em relação à China. Mas até aqui, essas ações tinham se restringido principalmente à retórica, aprofundando alianças com os Estados Unidos e outros países e publicando vídeos de atividades agressivas da Guarda Costeira chinesa contra embarcações filipinas.

A surpresa desta vez é a ação partir do governo filipino, deixando pouca dúvida de que o país resistirá mais contundentemente aos desígnios territoriais da China.

Enquanto o governo Biden deverá considerar isso boa notícia, cresce na região a apreensão a respeito de como a China poderá reagir a essa resistência e sobre poder haver algum risco de ignição de um confronto militar direto entre a China e as Filipinas e seus aliados, que incluem a frota da Marinha dos EUA patrulhando a região.

Depois que a corda foi cortada e as Filipinas içaram a âncora que mantinha a barreira no lugar, a China removeu o equipamento. Na terça-feira, um porta-voz do ministério chinês das Relações Exteriores respondeu bruscamente ao comunicado filipino. “Nós aconselhamos as Filipinas a não causar provocações nem problemas”, afirmou ele.

O comentarista e ex-oficial militar chinês Song Zhongping, radicado em Pequim, afirmou que os filipinos foram estimulados a cortar a barreira “porque os EUA continuam a encorajar as Filipinas a confrontar a China no Mar do Sul da China”.

Barcos da Guarda Costeira da China navegando perto de uma barreira flutuante em Scarborough Shoal, no Mar da China Meridional, em setembro Foto: Guarda Costeira das Filipinas/Reuter

“A China tem de adotar medidas decisivas para pôr fim à provocação das Filipinas”, afirmou Song. “Nós não podemos permitir que as Filipinas cometam provocações intermináveis e apresentem uma grave ameaça à soberania nacional e à segurança da China.”

Pequim reivindica 90% do Mar do Sul da China, parte desse território a milhares de quilômetros da costa chinesa e abrangendo águas em torno de Vietnã, Malásia, Brunei, Indonésia e Filipinas. Na década recente, a China tem imposto um controle cada vez maior sobre essas águas, usando dois arquipélagos conhecidos como Ilhas Paracel e Ilhas Spratlys para expandir sua presença militar construindo e fortificando postos avançados e aeroportos.

Essas ações têm causado alarme em grande parte da Ásia e nos EUA, que afirmam ter interesse particular em manter a liberdade de navegação em uma das rotas comerciais mais movimentadas do planeta. O fortalecimento militar da China e as ações cada vez mais agressivas de sua Guarda Costeira e de sua milícia marítima também levantam dúvidas a respeito das intenções dos chineses na região e sua disposição em agir de acordo com as normas internacionais.

Uma embarcação da Guarda Costeira da China passa por barcos de pescadores das Filipinas na área marítima disputada pelos dois países  Foto: Ted Aljibe/AFP

Ação militar

As tensões são especialmente pronunciadas nas Filipinas, onde pescadores têm sido impedidos de pescar por embarcações chinesas. E as Filipinas foram impedidas de explorar totalmente depósitos de petróleo e gás natural em uma área que uma corte de Haia, nos Países Baixos, decidiu em 2016 que pertence à zona comercial exclusiva das Filipinas.

Muitos analistas afirmam que a China deverá evitar uma ação militar contra as Filipinas, que são aliadas dos EUA segundo tratado, por temer envolver-se em um conflito mais amplo com os americanos e outros aliados de Washington na região. Em agosto, o secretário da Defesa americano, Lloyd Austin, reafirmou que um tratado de defesa mútua com os EUA “se estende às embarcações e aeronaves públicas e Forças Armadas filipinas — a incluir a Guarda Costeira — no Pacífico, incluindo no Mar do Sul da China”.

“Se os EUA tiverem de se envolver em um confronto militar com a China no Mar do Sul da China nós não poderemos esperar que Austrália e Japão, por exemplo, fiquem apenas assistindo sem fazer nada enquanto seus aliados americanos estiverem combatendo os chineses”, afirmou Collin Koh, pesquisador sênior do Instituto de Estudos Estratégicos e de Defesa, em Cingapura. “Eles serão atraídos de alguma forma, portanto eu acredito que isso é algo que qualquer estrategista chinês terá de considerar.”

Koh diz esperar que a China intensifique sua presença no Mar do Sul da China, talvez enviando mais embarcações para o entorno de regiões disputadas, como a Ilha Thitu e o Segundo Atol Thomas, para evitar que pescadores filipinos operem livremente e bloquear embarcações de policiamento marítimo.

Bilahari Kausikan, ex-diplomata do Ministério de Relações Exteriores de Cingapura, disse acreditar que “Pequim já tem bastante contratempos domésticos e não vai querer aumentar seus problemas arrumando também um confronto com os EUA”.

Kausikan afirmou que “o risco de conflito seria mais alto” se as Filipinas não tivessem removido a barreira, “porque então os chineses se veriam tentados a pressionar ainda mais os limites”.

Mas Leonardo Cuaresma, presidente da Nova Associação de Pescadores de Masinloc afirmou que, na municipalidade em que a barreira foi cortada, as pessoas ficaram nervosas sobre a possível reação da China. “Aqui em Masinloc é natural sentir medo, porque se houver um conflito nós seremos os primeiros a sentir”, afirmou Cuaresma. “É difícil, porque nós não sabemos se haverá guerra ou algo assim. Nós estamos ansiosos.”

Cuaresma afirmou que seus colegas não conseguiram pescar no Atol Scarborough por anos por causa da China. “No instante em que nos aproximávamos da entrada do atol, eles nos bloqueavam imediatamente”, afirmou ele. “Eles emparelhavam seus barcos, menores, com os nossos e nos diziam, ‘Vão embora, filipinos’.”

Um navio da Guarda Costeira da China acompanhando barcos de pesca filipinos perto de Scarborough Shoal em setembro. Ambos os países reivindicam aquela área do Mar da China Meridional. Foto: Ted Aljibe/AFP

Ao lado dessa tensão há também uma ansiedade nas Filipinas a respeito de como lidar com a China.

Koko Pimentel, líder da minoria no Senado filipino, disse em uma sessão na Câmara Alta que concorda com a decisão do governo Marcos de remover a barreira chinesa. Mas posteriormente, em mensagem à reportagem do New York Times, ele foi cauteloso: “Nós devemos evitar o conflito o máximo possível, devemos fazer tudo por meio de diálogo e diplomacia. Posições diferentes são coisas da vida, e nós devemos ser capazes de viver a vida com esta realidade.”

Antonio Carpio, ex-ministro sênior associado da Suprema Corte filipina e especialista em Mar do Sul da China, afirmou que as Filipinas estão simplesmente repetindo o que Malásia e Indonésia fizeram recentemente quando enviaram navios de pesquisa a águas disputadas apesar de ameaças da China. “Se você faz valer seu direito e fica firme, bem, a China não faz nada”, acrescentou ele.

Carpio afirmou que, mais amplamente, a comunidade internacional deve prestar atenção ao que está acontecendo no Mar do Sul da China, porque “exatamente o mesmo está em jogo tanto na Ucrânia quanto no Mar do Sul da China”.

“Todas as nações devem se opor a isso, porque não se trata apenas de uma questão filipina; é o futuro do mundo que está em jogo”, afirmou ele. “Se a Carta da ONU, que tornou ilegal guerras de agressão, for abolida, então somente as potências nucleares serão capazes de resolver disputas de acordo com seus próprios ditames. A doutrina ‘quem tem força tem direito’ retornará.” / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

THE NEW YORK TIMES - O vídeo pode parecer simples demais, despretensioso demais para marcar um incidente internacional grave no Mar do Sul da China: um breve clipe de um mergulhador usando uma faca para cortar uma corda debaixo d’água. Mas esse mergulhador é da Guarda Costeira filipina, e a corda era parte de uma barreira marítima instalada por forças chinesas para manter pescadores filipinos fora de uma região na qual eles têm direito de pescar. Naquele momento, as autoridades filipinas deram um dos passos mais contundentes até aqui no sentido de contestar as incessantes reivindicações territoriais da China cada vez mais próximas do arquipélago filipino.

“A barreira representava um perigo para a navegação, era uma violação clara do direito internacional”, afirmou o governo das Filipinas em um comunicado, acrescentando que a ação foi praticada sob ordem direta do presidente Ferdinand Marcos Jr.

Desde que assumiu a função, em junho de 2022, Marcos sinalizou a intenção de uma abordagem mais muscular de política externa em relação à China. Mas até aqui, essas ações tinham se restringido principalmente à retórica, aprofundando alianças com os Estados Unidos e outros países e publicando vídeos de atividades agressivas da Guarda Costeira chinesa contra embarcações filipinas.

A surpresa desta vez é a ação partir do governo filipino, deixando pouca dúvida de que o país resistirá mais contundentemente aos desígnios territoriais da China.

Enquanto o governo Biden deverá considerar isso boa notícia, cresce na região a apreensão a respeito de como a China poderá reagir a essa resistência e sobre poder haver algum risco de ignição de um confronto militar direto entre a China e as Filipinas e seus aliados, que incluem a frota da Marinha dos EUA patrulhando a região.

Depois que a corda foi cortada e as Filipinas içaram a âncora que mantinha a barreira no lugar, a China removeu o equipamento. Na terça-feira, um porta-voz do ministério chinês das Relações Exteriores respondeu bruscamente ao comunicado filipino. “Nós aconselhamos as Filipinas a não causar provocações nem problemas”, afirmou ele.

O comentarista e ex-oficial militar chinês Song Zhongping, radicado em Pequim, afirmou que os filipinos foram estimulados a cortar a barreira “porque os EUA continuam a encorajar as Filipinas a confrontar a China no Mar do Sul da China”.

Barcos da Guarda Costeira da China navegando perto de uma barreira flutuante em Scarborough Shoal, no Mar da China Meridional, em setembro Foto: Guarda Costeira das Filipinas/Reuter

“A China tem de adotar medidas decisivas para pôr fim à provocação das Filipinas”, afirmou Song. “Nós não podemos permitir que as Filipinas cometam provocações intermináveis e apresentem uma grave ameaça à soberania nacional e à segurança da China.”

Pequim reivindica 90% do Mar do Sul da China, parte desse território a milhares de quilômetros da costa chinesa e abrangendo águas em torno de Vietnã, Malásia, Brunei, Indonésia e Filipinas. Na década recente, a China tem imposto um controle cada vez maior sobre essas águas, usando dois arquipélagos conhecidos como Ilhas Paracel e Ilhas Spratlys para expandir sua presença militar construindo e fortificando postos avançados e aeroportos.

Essas ações têm causado alarme em grande parte da Ásia e nos EUA, que afirmam ter interesse particular em manter a liberdade de navegação em uma das rotas comerciais mais movimentadas do planeta. O fortalecimento militar da China e as ações cada vez mais agressivas de sua Guarda Costeira e de sua milícia marítima também levantam dúvidas a respeito das intenções dos chineses na região e sua disposição em agir de acordo com as normas internacionais.

Uma embarcação da Guarda Costeira da China passa por barcos de pescadores das Filipinas na área marítima disputada pelos dois países  Foto: Ted Aljibe/AFP

Ação militar

As tensões são especialmente pronunciadas nas Filipinas, onde pescadores têm sido impedidos de pescar por embarcações chinesas. E as Filipinas foram impedidas de explorar totalmente depósitos de petróleo e gás natural em uma área que uma corte de Haia, nos Países Baixos, decidiu em 2016 que pertence à zona comercial exclusiva das Filipinas.

Muitos analistas afirmam que a China deverá evitar uma ação militar contra as Filipinas, que são aliadas dos EUA segundo tratado, por temer envolver-se em um conflito mais amplo com os americanos e outros aliados de Washington na região. Em agosto, o secretário da Defesa americano, Lloyd Austin, reafirmou que um tratado de defesa mútua com os EUA “se estende às embarcações e aeronaves públicas e Forças Armadas filipinas — a incluir a Guarda Costeira — no Pacífico, incluindo no Mar do Sul da China”.

“Se os EUA tiverem de se envolver em um confronto militar com a China no Mar do Sul da China nós não poderemos esperar que Austrália e Japão, por exemplo, fiquem apenas assistindo sem fazer nada enquanto seus aliados americanos estiverem combatendo os chineses”, afirmou Collin Koh, pesquisador sênior do Instituto de Estudos Estratégicos e de Defesa, em Cingapura. “Eles serão atraídos de alguma forma, portanto eu acredito que isso é algo que qualquer estrategista chinês terá de considerar.”

Koh diz esperar que a China intensifique sua presença no Mar do Sul da China, talvez enviando mais embarcações para o entorno de regiões disputadas, como a Ilha Thitu e o Segundo Atol Thomas, para evitar que pescadores filipinos operem livremente e bloquear embarcações de policiamento marítimo.

Bilahari Kausikan, ex-diplomata do Ministério de Relações Exteriores de Cingapura, disse acreditar que “Pequim já tem bastante contratempos domésticos e não vai querer aumentar seus problemas arrumando também um confronto com os EUA”.

Kausikan afirmou que “o risco de conflito seria mais alto” se as Filipinas não tivessem removido a barreira, “porque então os chineses se veriam tentados a pressionar ainda mais os limites”.

Mas Leonardo Cuaresma, presidente da Nova Associação de Pescadores de Masinloc afirmou que, na municipalidade em que a barreira foi cortada, as pessoas ficaram nervosas sobre a possível reação da China. “Aqui em Masinloc é natural sentir medo, porque se houver um conflito nós seremos os primeiros a sentir”, afirmou Cuaresma. “É difícil, porque nós não sabemos se haverá guerra ou algo assim. Nós estamos ansiosos.”

Cuaresma afirmou que seus colegas não conseguiram pescar no Atol Scarborough por anos por causa da China. “No instante em que nos aproximávamos da entrada do atol, eles nos bloqueavam imediatamente”, afirmou ele. “Eles emparelhavam seus barcos, menores, com os nossos e nos diziam, ‘Vão embora, filipinos’.”

Um navio da Guarda Costeira da China acompanhando barcos de pesca filipinos perto de Scarborough Shoal em setembro. Ambos os países reivindicam aquela área do Mar da China Meridional. Foto: Ted Aljibe/AFP

Ao lado dessa tensão há também uma ansiedade nas Filipinas a respeito de como lidar com a China.

Koko Pimentel, líder da minoria no Senado filipino, disse em uma sessão na Câmara Alta que concorda com a decisão do governo Marcos de remover a barreira chinesa. Mas posteriormente, em mensagem à reportagem do New York Times, ele foi cauteloso: “Nós devemos evitar o conflito o máximo possível, devemos fazer tudo por meio de diálogo e diplomacia. Posições diferentes são coisas da vida, e nós devemos ser capazes de viver a vida com esta realidade.”

Antonio Carpio, ex-ministro sênior associado da Suprema Corte filipina e especialista em Mar do Sul da China, afirmou que as Filipinas estão simplesmente repetindo o que Malásia e Indonésia fizeram recentemente quando enviaram navios de pesquisa a águas disputadas apesar de ameaças da China. “Se você faz valer seu direito e fica firme, bem, a China não faz nada”, acrescentou ele.

Carpio afirmou que, mais amplamente, a comunidade internacional deve prestar atenção ao que está acontecendo no Mar do Sul da China, porque “exatamente o mesmo está em jogo tanto na Ucrânia quanto no Mar do Sul da China”.

“Todas as nações devem se opor a isso, porque não se trata apenas de uma questão filipina; é o futuro do mundo que está em jogo”, afirmou ele. “Se a Carta da ONU, que tornou ilegal guerras de agressão, for abolida, então somente as potências nucleares serão capazes de resolver disputas de acordo com seus próprios ditames. A doutrina ‘quem tem força tem direito’ retornará.” / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

THE NEW YORK TIMES - O vídeo pode parecer simples demais, despretensioso demais para marcar um incidente internacional grave no Mar do Sul da China: um breve clipe de um mergulhador usando uma faca para cortar uma corda debaixo d’água. Mas esse mergulhador é da Guarda Costeira filipina, e a corda era parte de uma barreira marítima instalada por forças chinesas para manter pescadores filipinos fora de uma região na qual eles têm direito de pescar. Naquele momento, as autoridades filipinas deram um dos passos mais contundentes até aqui no sentido de contestar as incessantes reivindicações territoriais da China cada vez mais próximas do arquipélago filipino.

“A barreira representava um perigo para a navegação, era uma violação clara do direito internacional”, afirmou o governo das Filipinas em um comunicado, acrescentando que a ação foi praticada sob ordem direta do presidente Ferdinand Marcos Jr.

Desde que assumiu a função, em junho de 2022, Marcos sinalizou a intenção de uma abordagem mais muscular de política externa em relação à China. Mas até aqui, essas ações tinham se restringido principalmente à retórica, aprofundando alianças com os Estados Unidos e outros países e publicando vídeos de atividades agressivas da Guarda Costeira chinesa contra embarcações filipinas.

A surpresa desta vez é a ação partir do governo filipino, deixando pouca dúvida de que o país resistirá mais contundentemente aos desígnios territoriais da China.

Enquanto o governo Biden deverá considerar isso boa notícia, cresce na região a apreensão a respeito de como a China poderá reagir a essa resistência e sobre poder haver algum risco de ignição de um confronto militar direto entre a China e as Filipinas e seus aliados, que incluem a frota da Marinha dos EUA patrulhando a região.

Depois que a corda foi cortada e as Filipinas içaram a âncora que mantinha a barreira no lugar, a China removeu o equipamento. Na terça-feira, um porta-voz do ministério chinês das Relações Exteriores respondeu bruscamente ao comunicado filipino. “Nós aconselhamos as Filipinas a não causar provocações nem problemas”, afirmou ele.

O comentarista e ex-oficial militar chinês Song Zhongping, radicado em Pequim, afirmou que os filipinos foram estimulados a cortar a barreira “porque os EUA continuam a encorajar as Filipinas a confrontar a China no Mar do Sul da China”.

Barcos da Guarda Costeira da China navegando perto de uma barreira flutuante em Scarborough Shoal, no Mar da China Meridional, em setembro Foto: Guarda Costeira das Filipinas/Reuter

“A China tem de adotar medidas decisivas para pôr fim à provocação das Filipinas”, afirmou Song. “Nós não podemos permitir que as Filipinas cometam provocações intermináveis e apresentem uma grave ameaça à soberania nacional e à segurança da China.”

Pequim reivindica 90% do Mar do Sul da China, parte desse território a milhares de quilômetros da costa chinesa e abrangendo águas em torno de Vietnã, Malásia, Brunei, Indonésia e Filipinas. Na década recente, a China tem imposto um controle cada vez maior sobre essas águas, usando dois arquipélagos conhecidos como Ilhas Paracel e Ilhas Spratlys para expandir sua presença militar construindo e fortificando postos avançados e aeroportos.

Essas ações têm causado alarme em grande parte da Ásia e nos EUA, que afirmam ter interesse particular em manter a liberdade de navegação em uma das rotas comerciais mais movimentadas do planeta. O fortalecimento militar da China e as ações cada vez mais agressivas de sua Guarda Costeira e de sua milícia marítima também levantam dúvidas a respeito das intenções dos chineses na região e sua disposição em agir de acordo com as normas internacionais.

Uma embarcação da Guarda Costeira da China passa por barcos de pescadores das Filipinas na área marítima disputada pelos dois países  Foto: Ted Aljibe/AFP

Ação militar

As tensões são especialmente pronunciadas nas Filipinas, onde pescadores têm sido impedidos de pescar por embarcações chinesas. E as Filipinas foram impedidas de explorar totalmente depósitos de petróleo e gás natural em uma área que uma corte de Haia, nos Países Baixos, decidiu em 2016 que pertence à zona comercial exclusiva das Filipinas.

Muitos analistas afirmam que a China deverá evitar uma ação militar contra as Filipinas, que são aliadas dos EUA segundo tratado, por temer envolver-se em um conflito mais amplo com os americanos e outros aliados de Washington na região. Em agosto, o secretário da Defesa americano, Lloyd Austin, reafirmou que um tratado de defesa mútua com os EUA “se estende às embarcações e aeronaves públicas e Forças Armadas filipinas — a incluir a Guarda Costeira — no Pacífico, incluindo no Mar do Sul da China”.

“Se os EUA tiverem de se envolver em um confronto militar com a China no Mar do Sul da China nós não poderemos esperar que Austrália e Japão, por exemplo, fiquem apenas assistindo sem fazer nada enquanto seus aliados americanos estiverem combatendo os chineses”, afirmou Collin Koh, pesquisador sênior do Instituto de Estudos Estratégicos e de Defesa, em Cingapura. “Eles serão atraídos de alguma forma, portanto eu acredito que isso é algo que qualquer estrategista chinês terá de considerar.”

Koh diz esperar que a China intensifique sua presença no Mar do Sul da China, talvez enviando mais embarcações para o entorno de regiões disputadas, como a Ilha Thitu e o Segundo Atol Thomas, para evitar que pescadores filipinos operem livremente e bloquear embarcações de policiamento marítimo.

Bilahari Kausikan, ex-diplomata do Ministério de Relações Exteriores de Cingapura, disse acreditar que “Pequim já tem bastante contratempos domésticos e não vai querer aumentar seus problemas arrumando também um confronto com os EUA”.

Kausikan afirmou que “o risco de conflito seria mais alto” se as Filipinas não tivessem removido a barreira, “porque então os chineses se veriam tentados a pressionar ainda mais os limites”.

Mas Leonardo Cuaresma, presidente da Nova Associação de Pescadores de Masinloc afirmou que, na municipalidade em que a barreira foi cortada, as pessoas ficaram nervosas sobre a possível reação da China. “Aqui em Masinloc é natural sentir medo, porque se houver um conflito nós seremos os primeiros a sentir”, afirmou Cuaresma. “É difícil, porque nós não sabemos se haverá guerra ou algo assim. Nós estamos ansiosos.”

Cuaresma afirmou que seus colegas não conseguiram pescar no Atol Scarborough por anos por causa da China. “No instante em que nos aproximávamos da entrada do atol, eles nos bloqueavam imediatamente”, afirmou ele. “Eles emparelhavam seus barcos, menores, com os nossos e nos diziam, ‘Vão embora, filipinos’.”

Um navio da Guarda Costeira da China acompanhando barcos de pesca filipinos perto de Scarborough Shoal em setembro. Ambos os países reivindicam aquela área do Mar da China Meridional. Foto: Ted Aljibe/AFP

Ao lado dessa tensão há também uma ansiedade nas Filipinas a respeito de como lidar com a China.

Koko Pimentel, líder da minoria no Senado filipino, disse em uma sessão na Câmara Alta que concorda com a decisão do governo Marcos de remover a barreira chinesa. Mas posteriormente, em mensagem à reportagem do New York Times, ele foi cauteloso: “Nós devemos evitar o conflito o máximo possível, devemos fazer tudo por meio de diálogo e diplomacia. Posições diferentes são coisas da vida, e nós devemos ser capazes de viver a vida com esta realidade.”

Antonio Carpio, ex-ministro sênior associado da Suprema Corte filipina e especialista em Mar do Sul da China, afirmou que as Filipinas estão simplesmente repetindo o que Malásia e Indonésia fizeram recentemente quando enviaram navios de pesquisa a águas disputadas apesar de ameaças da China. “Se você faz valer seu direito e fica firme, bem, a China não faz nada”, acrescentou ele.

Carpio afirmou que, mais amplamente, a comunidade internacional deve prestar atenção ao que está acontecendo no Mar do Sul da China, porque “exatamente o mesmo está em jogo tanto na Ucrânia quanto no Mar do Sul da China”.

“Todas as nações devem se opor a isso, porque não se trata apenas de uma questão filipina; é o futuro do mundo que está em jogo”, afirmou ele. “Se a Carta da ONU, que tornou ilegal guerras de agressão, for abolida, então somente as potências nucleares serão capazes de resolver disputas de acordo com seus próprios ditames. A doutrina ‘quem tem força tem direito’ retornará.” / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

THE NEW YORK TIMES - O vídeo pode parecer simples demais, despretensioso demais para marcar um incidente internacional grave no Mar do Sul da China: um breve clipe de um mergulhador usando uma faca para cortar uma corda debaixo d’água. Mas esse mergulhador é da Guarda Costeira filipina, e a corda era parte de uma barreira marítima instalada por forças chinesas para manter pescadores filipinos fora de uma região na qual eles têm direito de pescar. Naquele momento, as autoridades filipinas deram um dos passos mais contundentes até aqui no sentido de contestar as incessantes reivindicações territoriais da China cada vez mais próximas do arquipélago filipino.

“A barreira representava um perigo para a navegação, era uma violação clara do direito internacional”, afirmou o governo das Filipinas em um comunicado, acrescentando que a ação foi praticada sob ordem direta do presidente Ferdinand Marcos Jr.

Desde que assumiu a função, em junho de 2022, Marcos sinalizou a intenção de uma abordagem mais muscular de política externa em relação à China. Mas até aqui, essas ações tinham se restringido principalmente à retórica, aprofundando alianças com os Estados Unidos e outros países e publicando vídeos de atividades agressivas da Guarda Costeira chinesa contra embarcações filipinas.

A surpresa desta vez é a ação partir do governo filipino, deixando pouca dúvida de que o país resistirá mais contundentemente aos desígnios territoriais da China.

Enquanto o governo Biden deverá considerar isso boa notícia, cresce na região a apreensão a respeito de como a China poderá reagir a essa resistência e sobre poder haver algum risco de ignição de um confronto militar direto entre a China e as Filipinas e seus aliados, que incluem a frota da Marinha dos EUA patrulhando a região.

Depois que a corda foi cortada e as Filipinas içaram a âncora que mantinha a barreira no lugar, a China removeu o equipamento. Na terça-feira, um porta-voz do ministério chinês das Relações Exteriores respondeu bruscamente ao comunicado filipino. “Nós aconselhamos as Filipinas a não causar provocações nem problemas”, afirmou ele.

O comentarista e ex-oficial militar chinês Song Zhongping, radicado em Pequim, afirmou que os filipinos foram estimulados a cortar a barreira “porque os EUA continuam a encorajar as Filipinas a confrontar a China no Mar do Sul da China”.

Barcos da Guarda Costeira da China navegando perto de uma barreira flutuante em Scarborough Shoal, no Mar da China Meridional, em setembro Foto: Guarda Costeira das Filipinas/Reuter

“A China tem de adotar medidas decisivas para pôr fim à provocação das Filipinas”, afirmou Song. “Nós não podemos permitir que as Filipinas cometam provocações intermináveis e apresentem uma grave ameaça à soberania nacional e à segurança da China.”

Pequim reivindica 90% do Mar do Sul da China, parte desse território a milhares de quilômetros da costa chinesa e abrangendo águas em torno de Vietnã, Malásia, Brunei, Indonésia e Filipinas. Na década recente, a China tem imposto um controle cada vez maior sobre essas águas, usando dois arquipélagos conhecidos como Ilhas Paracel e Ilhas Spratlys para expandir sua presença militar construindo e fortificando postos avançados e aeroportos.

Essas ações têm causado alarme em grande parte da Ásia e nos EUA, que afirmam ter interesse particular em manter a liberdade de navegação em uma das rotas comerciais mais movimentadas do planeta. O fortalecimento militar da China e as ações cada vez mais agressivas de sua Guarda Costeira e de sua milícia marítima também levantam dúvidas a respeito das intenções dos chineses na região e sua disposição em agir de acordo com as normas internacionais.

Uma embarcação da Guarda Costeira da China passa por barcos de pescadores das Filipinas na área marítima disputada pelos dois países  Foto: Ted Aljibe/AFP

Ação militar

As tensões são especialmente pronunciadas nas Filipinas, onde pescadores têm sido impedidos de pescar por embarcações chinesas. E as Filipinas foram impedidas de explorar totalmente depósitos de petróleo e gás natural em uma área que uma corte de Haia, nos Países Baixos, decidiu em 2016 que pertence à zona comercial exclusiva das Filipinas.

Muitos analistas afirmam que a China deverá evitar uma ação militar contra as Filipinas, que são aliadas dos EUA segundo tratado, por temer envolver-se em um conflito mais amplo com os americanos e outros aliados de Washington na região. Em agosto, o secretário da Defesa americano, Lloyd Austin, reafirmou que um tratado de defesa mútua com os EUA “se estende às embarcações e aeronaves públicas e Forças Armadas filipinas — a incluir a Guarda Costeira — no Pacífico, incluindo no Mar do Sul da China”.

“Se os EUA tiverem de se envolver em um confronto militar com a China no Mar do Sul da China nós não poderemos esperar que Austrália e Japão, por exemplo, fiquem apenas assistindo sem fazer nada enquanto seus aliados americanos estiverem combatendo os chineses”, afirmou Collin Koh, pesquisador sênior do Instituto de Estudos Estratégicos e de Defesa, em Cingapura. “Eles serão atraídos de alguma forma, portanto eu acredito que isso é algo que qualquer estrategista chinês terá de considerar.”

Koh diz esperar que a China intensifique sua presença no Mar do Sul da China, talvez enviando mais embarcações para o entorno de regiões disputadas, como a Ilha Thitu e o Segundo Atol Thomas, para evitar que pescadores filipinos operem livremente e bloquear embarcações de policiamento marítimo.

Bilahari Kausikan, ex-diplomata do Ministério de Relações Exteriores de Cingapura, disse acreditar que “Pequim já tem bastante contratempos domésticos e não vai querer aumentar seus problemas arrumando também um confronto com os EUA”.

Kausikan afirmou que “o risco de conflito seria mais alto” se as Filipinas não tivessem removido a barreira, “porque então os chineses se veriam tentados a pressionar ainda mais os limites”.

Mas Leonardo Cuaresma, presidente da Nova Associação de Pescadores de Masinloc afirmou que, na municipalidade em que a barreira foi cortada, as pessoas ficaram nervosas sobre a possível reação da China. “Aqui em Masinloc é natural sentir medo, porque se houver um conflito nós seremos os primeiros a sentir”, afirmou Cuaresma. “É difícil, porque nós não sabemos se haverá guerra ou algo assim. Nós estamos ansiosos.”

Cuaresma afirmou que seus colegas não conseguiram pescar no Atol Scarborough por anos por causa da China. “No instante em que nos aproximávamos da entrada do atol, eles nos bloqueavam imediatamente”, afirmou ele. “Eles emparelhavam seus barcos, menores, com os nossos e nos diziam, ‘Vão embora, filipinos’.”

Um navio da Guarda Costeira da China acompanhando barcos de pesca filipinos perto de Scarborough Shoal em setembro. Ambos os países reivindicam aquela área do Mar da China Meridional. Foto: Ted Aljibe/AFP

Ao lado dessa tensão há também uma ansiedade nas Filipinas a respeito de como lidar com a China.

Koko Pimentel, líder da minoria no Senado filipino, disse em uma sessão na Câmara Alta que concorda com a decisão do governo Marcos de remover a barreira chinesa. Mas posteriormente, em mensagem à reportagem do New York Times, ele foi cauteloso: “Nós devemos evitar o conflito o máximo possível, devemos fazer tudo por meio de diálogo e diplomacia. Posições diferentes são coisas da vida, e nós devemos ser capazes de viver a vida com esta realidade.”

Antonio Carpio, ex-ministro sênior associado da Suprema Corte filipina e especialista em Mar do Sul da China, afirmou que as Filipinas estão simplesmente repetindo o que Malásia e Indonésia fizeram recentemente quando enviaram navios de pesquisa a águas disputadas apesar de ameaças da China. “Se você faz valer seu direito e fica firme, bem, a China não faz nada”, acrescentou ele.

Carpio afirmou que, mais amplamente, a comunidade internacional deve prestar atenção ao que está acontecendo no Mar do Sul da China, porque “exatamente o mesmo está em jogo tanto na Ucrânia quanto no Mar do Sul da China”.

“Todas as nações devem se opor a isso, porque não se trata apenas de uma questão filipina; é o futuro do mundo que está em jogo”, afirmou ele. “Se a Carta da ONU, que tornou ilegal guerras de agressão, for abolida, então somente as potências nucleares serão capazes de resolver disputas de acordo com seus próprios ditames. A doutrina ‘quem tem força tem direito’ retornará.” / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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