Novos lançamentos de mísseis pela Coreia do Norte nos primeiros dias de outubro tem novamente chamando a atenção sobre as intenções do líder norte-coreano, Kim Jong-un. No entanto, as preocupações internacionais não se resumem às ações de Pyongyang, pois a região do nordeste da Ásia apresenta um quadro volátil de segurança.
Iniciando pela própria Coreia do Norte, pode-se atribuir pelo menos três razões para o teste de um míssil, no dia 3 de outubro, que pela primeira vez desde 2017 sobrevoou o Japão. O primeiro motivo pode ter sido dar uma mensagem política de insatisfação com o governo de Tóquio.
Normalmente, a Coreia do Norte faz o lançamento dos mísseis com uma trajetória para o alto, para que eles caiam nas águas entre o país e o Japão para evitar ameaças à segurança de seus vizinhos. Nesse caso, além de passar sobre o território japonês, não houve nenhum aviso com antecedência.
Uma das últimas divergências foi a reclamação da Coreia do Norte de que o governo japonês, devido a sanções ligadas aos programas nuclear e de mísseis norte-coreanos, teria anulado a Declaração de Pyongyang de 2002, na qual se estabeleceu um acordo em fazer esforços para normalização das relações.
Além disso, regularmente, Japão e EUA fazem exercícios militares conjuntos, que são entendidos pela Coreia do Norte como ações hostis e ameaça a sua segurança.
Uma outra motivação pode ter sido a de mandar um recado à comunidade internacional, particularmente aos EUA, da sua insatisfação pela falta de progresso nas negociações e a busca de uma demonstração dos avanços das capacidades militares durante o impasse.
Esse último ponto vincula-se à declaração de Kim no desfile que celebrou os 90 anos da fundação do Exército Revolucionário do Povo Coreano, em abril, ao afirmar que os armamentos nucleares são “um símbolo do poder nacional” e que “fortaleceria e desenvolveria” o programa nuclear e de armas de seu país na velocidade “mais alta possível”.
Desde então, a Coreia do Norte vem realizando sucessivos testes, sinalizando essa busca pela aceleração no aprimoramento de suas armas e há expectativas de que haja também testes nucleares.
Esses fatos, por si só, seriam preocupantes, contudo, neste momento, podem ser adicionados pelo menos outros cinco fatores de instabilidade envolvendo importantes atores dessa região:
- Após a invasão da Ucrânia pela Rússia, houve um fortalecimento das relações entre russos e norte-coreanos, e há discussões sobre o fornecimento de equipamentos e armamentos pela Coreia do Norte às forças russas;
- Há uma deterioração das relações russo-japonesas, em decorrência das posições de Tóquio contrárias às ações de Moscou na guerra na Ucrânia;
- Há um crescimento das tensões entre Taiwan e China - país com quem a Coreia do Norte também tem importantes relações - incluindo ameaças chinesas de ações militares;
- As tensões entre a China e os EUA decorrentes das divergências entre os dois países sobre o status de Taiwan nas relações internacionais;
- O novo presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk-yeol, eleito em maio, tem demonstrado uma posição mais dura em relação à Coreia do Norte e pouca tolerância em relação aos sucessivos testes norte-coreanos que têm sido realizados.
Como pode-se observar, os testes militares de Pyongyang podem ser apenas a ponta do iceberg, os fatores de instabilidade não se restringem a eles, mas ao conjunto de complexas relações geopolíticas na região do nordeste asiático.
*É COORDENADOR DO NÚCLEO DE ESTUDOS E NEGÓCIOS ASIÁTICOS DA ESPM