Sete meses atrás, Emmanuel Macron estava nos jardins do Palais du Pharo, em Marselha, diante do cenário ensolarado do antigo porto, e declarou: “Se não tivermos sucesso em Marselha, não teremos sucesso na França”.
Em 16 de abril, o presidente estava de volta ao mesmo cenário majestoso para seu primeiro comício antes do voto final nas eleições presidenciais francesas. A cidade mediterrânea não votou em Macron no primeiro turno, preferindo o esquerdista radical Jean-Luc Mélenchon. Então, o presidente estava em território hostil. Mas, ao retornar à cidade vivaz e rebelde, Macron parecia estar dizendo: se conseguir vencer em Marselha, vencerá em toda a França.
Jovens na mira
Nos últimos dias da campanha, os dois finalistas, o centrista Macron e a populista nacionalista Marine Le Pen, estavam perseguindo os votos daqueles eleitores que não escolheram nenhum deles no primeiro turno. A maioria faz parte dos 7,7 milhões de pessoas (22% dos eleitores) que apoiaram Mélenchon, muitos deles jovens e de mentalidade ambientalista.
Promessas
Consciente disso, Macron prometeu em Marselha colocar o meio ambiente “no centro” de um segundo mandato, dobrar o ritmo do esforço francês para reduzir as emissões de carbono e transformar a França no primeiro grande país a acabar com o uso de combustíveis fósseis. O segundo turno, declarou ele, é uma escolha entre medo e ódio, de um lado, e respeito, diversidade e ecologia, do outro.
No dia anterior, uma hora ao norte de Marselha, no sopé das colinas de Luberon, uma radiante Le Pen estava fazendo corpo a corpo no mercado local. Durante uma hora, ela passou por barracas que vendiam aspargos, azeitonas e embutidos, curvando-se para abraçar crianças ou posando para selfies com transeuntes. Alguns manifestantes gritavam “vá para casa” ou “fascista”.
Fátima Benmalek, uma avó de origem argelina, pediu a Le Pen que não proibisse o uso do véu muçulmano em público, como a candidata prometeu. Mas as boas-vindas que Le Pen recebeu da maioria das pessoas que enchiam suas sacolas mostra até que ponto ela ampliou seu apelo. “Ela está calma, equilibrada, menos agressiva do que antes”, disse Josiane, florista aposentada. “Ela está visitando todas as aldeias. Macron não é muito próximo do povo.”
Popular
Embora criada dentro de uma mansão nos arredores de Paris, Le Pen se autodenominou, com sucesso, como defensora do “povo” contra a elite parisiense, encarnada pelo presidente “globalista”, e como uma mãe divorciada que sofreu tanto quanto qualquer outra pessoa. Ela evitou a capital e viajou pela França rural, onde seu voto é mais forte, prometendo reduzir os impostos sobre contas de calefação, combustíveis e alimentos.
Com uma campanha inteligente, a líder populista nunca esteve tão perto de conquistar a presidência. Vinte anos atrás, seu pai, Jean-Marie Le Pen – cofundador do partido que ela renomeou, de Frente Nacional para Reagrupamento Nacional, e liderou por mais de uma década – obteve apenas 18% no segundo turno presidencial. Em 2017, Le Pen quase dobrou esse número, conquistando 34% dos votos, contra 66% de Macron. Em 20 de abril, a média de pesquisas da Economist a colocou com 45%, ante 55% para Macron.
Debate
Mas ainda é uma distância enorme. Na verdade, a dinâmica do segundo turno mudou a favor de Macron. Quanto mais se examina o manifesto de Le Pen, mais se amplia a liderança de Macron. Isso ficou particularmente claro durante o único debate direto, na quarta-feira, que durou mais de duas horas e meia. Macron mencionou as ligações de Le Pen com a Rússia, lembrando aos espectadores de seu empréstimo pendente junto a um banco russo.
“Quando fala da Rússia, a senhora está falando do seu banqueiro.” Sua fantasia de construir uma “aliança de nações” dentro da União Europeia, disse ele, equivale a nada menos do que “tirar a França” do bloco. Sem surpresa, ele superou Le Pen nos detalhes técnicos e na compreensão da política.
Divergências
De sua parte, Le Pen estava mais calma do que quando debateu com Macron em 2017, demonstrando muita empatia por aqueles que lutam para sobreviver e esperando momentos de condescendência para levar a melhor sobre Macron.
A dupla entrou em conflito a respeito de turbinas eólicas (que ela quer desmontar), da idade legal para aposentadoria (que ele quer aumentar de 62 para 65 anos) e da proposta de proibição do véu muçulmano em público (que ele rejeitou vigorosamente). Tal proibição, declarou Macron, iria “disparar uma guerra civil”.
É improvável que o debate mude muito as intenções de voto. Mesmo antes de acontecer, os eleitores de esquerda, que são instintivamente hostis a Macron, pareciam estar se preparando para deixar seus sentimentos de lado e apoiá-lo, mesmo que apenas para derrotar Le Pen. A parcela de eleitores de Mélenchon que disse que apoiaria Macron saltou dez pontos, no fim de semana da Páscoa, para 38%. Apenas 16% afirmaram que migrariam para Le Pen.
País fraturado
Em Marselha, havia pouco da emoção que cercava o jovem Macron em 2017. Seus apoiadores estavam mais para moderados que para fervorosos. “Ele talvez não seja um presidente muito popular, mas é corajoso”, disse Victor, funcionário público de Montpellier.
Alguns aplaudiram a rejeição de Macron à proibição do véu proposta por Le Pen. Outros destacaram sua defesa da Europa e sua gestão da pandemia. “Ele não foi bem em tudo, mas não foi mal diante do que está acontecendo”, disse Marianne, cuidadora.
Em 20 de abril, o modelo de previsão da Economist apontava para uma probabilidade de 93% de vitória para Macron. A reeleição seria uma façanha para o político de 44 anos, que não havia disputado nenhuma eleição até concorrer à presidência em 2017.
Sob a Quinta República, os franceses nunca reelegeram um presidente com maioria no Parlamento. No entanto, se vencer, Macron enfrentará um país fraturado e descontente, cuja maioria da população não gosta muito dele. A vitória seria um grande feito. Mas um segundo mandato teria de se concentrar no gerenciamento tanto do desânimo quanto das expectativas. /TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU