Hannes Booyens, vestido com uma camisa de fazendeiros africânderes, aponta para as árvores carregadas de toranjas, que logo serão colhidas para exportação. Hezekiel Nkosi, presidente da associação comunitária de Moletele, na África do Sul, que é dono da terra e emprega Booyens, concorda com a cabeça. “Estamos felizes”, diz Nkosi. “Precisamos da melhor tecnologia, dos melhores gerentes agrícolas. Do contrário, esta seria uma operação infrutífera.”
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As pessoas de Moletele foram tiradas à força da terra, um canto pitoresco da Província de Limpopo, na África do Sul, nas décadas de 50 e 60. Receberam de volta 7 mil hectares de fazendas de frutas em 2007, depois de reivindicá-las legalmente, mas enfrentaram dificuldades na operação.
Uma das fazendas faliu. Os líderes de Moletele foram em busca de ajuda. O Fundo Consultor de Vumelana, uma instituição sem fins lucrativos que ajuda projetos de reforma agrária, nomeou conselheiros para desenvolver uma parceria comercial. Agora, a comunidade de Moletele tem acesso ao capital e à experiência. Os jovens estão sendo treinados para administrar as fazendas no futuro. “A melhor saída era nos associarmos às pessoas que têm a capacitação”, diz Nkosi.
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Sob o domínio colonial e no apartheid, os sul-africanos negros foram sistematicamente afastados da terra. Os brancos ainda possuem grande parte dela. Corrigir essa injustiça tem sido um processo intoleravelmente lento nos 24 anos de democracia. O governo prometeu transferir 30% das terras dos brancos para os negros até 1999. A maioria das estimativas calcula que só 10% foram transferidos.
O ritmo lento, combinado com a estagnação econômica e com o aumento do desemprego (37%), proporciona um terreno fértil para políticos populistas. O mais ruidoso tem sido o Economic Freedom Fighters (Combatentes pela Liberdade Econômica), violento grupo de oposição que atrai negros pobres com promessas de nacionalização de bancos e confisco de terras de brancos.
Isso pressiona o Congresso Nacional Africano (CNA), partido governista, a elevar o tom. Em uma conferência em dezembro, o partido decidiu alterar a Constituição para permitir o confisco de terras sem compensação.
Cyril Ramaphosa, empresário, líder do CNA e novo presidente do país, tentou cautelosamente caminhar pela corda bamba entre os radicais do seu partido e a catástrofe econômica. “A expropriação poderia tornar o país o jardim do Éden”, disse ele, com uma ressalva: não se deve prejudicar a economia, a produção agrícola ou a segurança alimentar.
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O Parlamento da África do Sul nomeou nesta quinta-feira o empresário Cyril Ramaphosa como novo presidente do país, após a renúncia na quarta-feira de Jacob Zuma como chefe de Estado.
Esse é o código para não copiar Robert Mugabe, ex-presidente do vizinho Zimbábue. Quando Mugabe começou a confiscar fazendas de brancos, em 2000, destruiu uma indústria agrícola bem-sucedida e esmagou o que já foi uma das economias mais diversificadas da África. Mineração, turismo e manufatura entraram em colapso em poucos anos.
Apesar da retórica, o CNA mostrou um fraco vigor no uso das leis que já existem. Sua verba destinada à compra de terras para redistribuição caiu para menos de 0,1% do orçamento nacional. Ele está imobilizado sobre as 4 mil fazendas que comprou, mas que ainda não foram entregues a proprietários negros.
Os fracassos do governo não param por aí. Muitas fazendas que foram entregues já faliram porque os novos proprietários não têm capacidade para gerir grandes fazendas comerciais. Cerca de 70% dos 8 milhões de hectares transferidos pelo Estado desde o fim do apartheid estão ociosos.
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Em vez de corrigir os erros, o governo está piorando a situação. Nos últimos anos, parou de transferir a propriedade da terra para agricultores negros, por temer que eles vendam os títulos para brancos. Em vez disso, o governo agora arrenda a terra para inquilinos negros. Sem recursos para contrair empréstimos, os novos agricultores têm dificuldade para obter capital.
No entanto, se bem realizada, a reforma agrária poderia ser um bálsamo para as feridas abertas. A questão é como executar bem a tarefa. Peter Setou, principal executivo do Fundo Consultor de Vumelana, diz que as parcerias entre investidores privados e comunidades que recebem terras parecem funcionar. Mas a confusão sobre a política do CNA de expropriação prejudica os investimentos. “Não podemos ter esse nível de incerteza”, disse.
Sob outro modelo, conhecido como o sistema 50-50, o governo compra terras e as arrenda de volta para uma empresa de copropriedade do produtor e dos trabalhadores agrícolas. O fazendeiro Andrew Braithwaite participou de um projeto que transformou trabalhadores em coproprietários de uma empresa agrícola em KwaZulu-Natal. “As pessoas sentem que têm algo a perder”, afirmou.
Não é apenas mudar as fazendas de mãos. Ramaphosa diz que as terras do Estado devem ser liberadas para habitação. Isso tornaria mais fácil para as pessoas mudarem para as cidades, onde estão os empregos. Por enquanto, a agricultura gera 2% do PIB.
Os eleitores podem gostar da ideia de redistribuição da terra, mas ainda querem bons empregos na cidade. Isso vale também para os que foram expulsos de suas terras durante o apartheid. A maioria dos que pediram restituição, optaram por dinheiro como compensação, em vez das fazendas. / TRADUÇÃO DE CLAUDIA BOZZO © 2017 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM