The Economist: Paz que rendeu Nobel a etíope está incompleta


Primeiro-ministro da Etiópia tem muito o que fazer para resolver conflito com Eritreia, apesar do acordo de 2018

Por The Economist

Existem dois tipos de ganhadores do Prêmio Nobel da Paz. Há os indiscutíveis, frequentemente ativistas, como Nadia Murad (que venceu no ano passado por seu trabalho destacando o estupro durante a guerra) ou a Organização para a Proibição de Armas Químicas (Opaq), que venceu em 2013. 

Os controvertidos são frequentemente os políticos que negociam acordos de paz – pense em Yasser Arafat ou Frederik de Klerk. A política em lugares violentos é um assunto desagradável e confuso, e os acordos de paz nem sempre duram. A concessão do prêmio ontem a Abiy Ahmed, primeiro-ministro da Etiópia, provocará mais debates do que a maioria.

Presidente da Eritreia,Isaias Afwerki (esq.), epremiê da Etiópia, Abiy Ahmed, celebram de mãos dadaso acordo de paz entre os dois países Foto: Mulugeta Ayene / AP
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No lado positivo, Ahmed tentou ser um unificador desde que assumiu o cargo, no ano passado. Ele costuma usar a palavra etíope amárica “medemer” (para somar) em discursos. Milhões de etíopes saudaram suas promessas de democracia, reconciliação e reforma em um país há muito oprimido.

Em junho de 2018, ele assinou um acordo histórico de paz com a Eritreia, um vizinho menor que se separou da Etiópia em 1993. O acordo terminou com duas décadas de conflito sem sentido, por causa de um pedaço de terra árida. A guerra deixou dezenas de milhares de mortos, destruiu famílias e rompeu os laços profundos de sangue, cultura e idioma entre os dois países.

Ahmed rompeu o impasse prometendo se retirar dos territórios disputados, implementando, assim, as conclusões de uma comissão da ONU que a Etiópia havia rejeitado muito tempo atrás. Ele também aproveitou seu estreito relacionamento com a Arábia Saudita e os Emirados Árabes, cuja generosidade financeira pode ter ajudado a empurrar o presidente da Eritreia, Isaias Afwerki, para a mesa de negociações. Após o acordo de paz, famílias e amigos se reuniram e o comércio entre as fronteiras floresceu.

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Berit Reiss-Andersen, presidente do Comitê do Nobel, disse que o prêmio reconhece os “esforços de Ahmed para alcançar a paz e a cooperação internacional e, em particular, sua iniciativa decisiva para resolver o conflito fronteiriço com a vizinha Eritreia”. Ele também foi elogiado por ajudar a mediar um acordo de compartilhamento de poder entre manifestantes pró-democracia e uma junta militar que assumiu o poder no início deste ano no Sudão.

No entanto, a paz que ele forjou com a Eritreia está longe de ser completa. No início deste ano, a Eritreia voltou a fechar suas passagens fronteiriças com a Etiópia. Um acordo comercial elaborado por negociadores etíopes acumula poeira na capital da Eritreia, Asmara, há quase um ano. A demarcação física da fronteira, a parte mais complicada do acordo, ainda não começou: as áreas em disputa permanecem sob administração etíope.

A falta de progresso destaca algumas das deficiências de Ahmed como negociador da paz. Ahmed Soliman, da Chatham House, centro de estudos de Londres, fala sobre seu “charme e iniciativas pessoais ousadas” à custa das instituições. Ele ignorou o Ministério das Relações Exteriores da Etiópia para fechar seu acordo com Isaias (cujos detalhes jamais foram divulgados). Suas tentativas de promover a aproximação entre o Quênia e a Somália, envolvidos em uma disputa sobre sua fronteira marítima, assim como entre facções em guerra no Sudão do Sul, ainda não apresentaram resultados.

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O histórico do primeiro-ministro como pacificador na Etiópia também é contraditoriamente preocupante. Ele libertou prisioneiros políticos e prometeu eleições justas. Mas não conseguiu manter a ordem. Em 2018, quase 3 milhões de etíopes foram expulsos de suas casas por conflitos étnicos. As causas eram complexas e muitas das tensões são anteriores ao seu mandato. 

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O primeiro-ministro da Etiópia, Abiy Ahmed, artífice da grande reconciliação entre seu país e a Eritreia, foi anunciado nesta sexta-feira como o vencedor do Prêmio Nobel da Paz.

Seu governo, porém, demorou a reagir e, às vezes, parecia mais preocupado com sua imagem pública do que em controlar a crise humana em espiral no sul do país. Durante vários meses, a administração impediu que a ajuda chegasse a abrigos para desabrigados e forçou as pessoas a voltar contra sua vontade para áreas que ainda não eram seguras. Isso contribuiu para mais violência e fome.

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O Prêmio Nobel será um incentivo para o primeiro-ministro, que enfrenta uma eleição nacional no ano que vem. “Em casa, estamos sempre brigando, mas quando se trata do mundo exterior, estaremos do lado de todo etíope”, diz um morador da capital, Adis-Abeba. 

Abel Abate Demissie, analista político, sugere que o reconhecimento internacional possa manter Ahmed honesto, especialmente porque seu governo mostra sinais de reverter as táticas autoritárias de seu antecessor. “Espero que isso o encoraje a estar à altura do prêmio”, diz. “Ele sabe que todos os olhos estarão sobre ele agora.” / TRADUÇÃO DE CLAUDIA BOZZO 

© 2019 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM

Existem dois tipos de ganhadores do Prêmio Nobel da Paz. Há os indiscutíveis, frequentemente ativistas, como Nadia Murad (que venceu no ano passado por seu trabalho destacando o estupro durante a guerra) ou a Organização para a Proibição de Armas Químicas (Opaq), que venceu em 2013. 

Os controvertidos são frequentemente os políticos que negociam acordos de paz – pense em Yasser Arafat ou Frederik de Klerk. A política em lugares violentos é um assunto desagradável e confuso, e os acordos de paz nem sempre duram. A concessão do prêmio ontem a Abiy Ahmed, primeiro-ministro da Etiópia, provocará mais debates do que a maioria.

Presidente da Eritreia,Isaias Afwerki (esq.), epremiê da Etiópia, Abiy Ahmed, celebram de mãos dadaso acordo de paz entre os dois países Foto: Mulugeta Ayene / AP

No lado positivo, Ahmed tentou ser um unificador desde que assumiu o cargo, no ano passado. Ele costuma usar a palavra etíope amárica “medemer” (para somar) em discursos. Milhões de etíopes saudaram suas promessas de democracia, reconciliação e reforma em um país há muito oprimido.

Em junho de 2018, ele assinou um acordo histórico de paz com a Eritreia, um vizinho menor que se separou da Etiópia em 1993. O acordo terminou com duas décadas de conflito sem sentido, por causa de um pedaço de terra árida. A guerra deixou dezenas de milhares de mortos, destruiu famílias e rompeu os laços profundos de sangue, cultura e idioma entre os dois países.

Ahmed rompeu o impasse prometendo se retirar dos territórios disputados, implementando, assim, as conclusões de uma comissão da ONU que a Etiópia havia rejeitado muito tempo atrás. Ele também aproveitou seu estreito relacionamento com a Arábia Saudita e os Emirados Árabes, cuja generosidade financeira pode ter ajudado a empurrar o presidente da Eritreia, Isaias Afwerki, para a mesa de negociações. Após o acordo de paz, famílias e amigos se reuniram e o comércio entre as fronteiras floresceu.

Berit Reiss-Andersen, presidente do Comitê do Nobel, disse que o prêmio reconhece os “esforços de Ahmed para alcançar a paz e a cooperação internacional e, em particular, sua iniciativa decisiva para resolver o conflito fronteiriço com a vizinha Eritreia”. Ele também foi elogiado por ajudar a mediar um acordo de compartilhamento de poder entre manifestantes pró-democracia e uma junta militar que assumiu o poder no início deste ano no Sudão.

No entanto, a paz que ele forjou com a Eritreia está longe de ser completa. No início deste ano, a Eritreia voltou a fechar suas passagens fronteiriças com a Etiópia. Um acordo comercial elaborado por negociadores etíopes acumula poeira na capital da Eritreia, Asmara, há quase um ano. A demarcação física da fronteira, a parte mais complicada do acordo, ainda não começou: as áreas em disputa permanecem sob administração etíope.

A falta de progresso destaca algumas das deficiências de Ahmed como negociador da paz. Ahmed Soliman, da Chatham House, centro de estudos de Londres, fala sobre seu “charme e iniciativas pessoais ousadas” à custa das instituições. Ele ignorou o Ministério das Relações Exteriores da Etiópia para fechar seu acordo com Isaias (cujos detalhes jamais foram divulgados). Suas tentativas de promover a aproximação entre o Quênia e a Somália, envolvidos em uma disputa sobre sua fronteira marítima, assim como entre facções em guerra no Sudão do Sul, ainda não apresentaram resultados.

O histórico do primeiro-ministro como pacificador na Etiópia também é contraditoriamente preocupante. Ele libertou prisioneiros políticos e prometeu eleições justas. Mas não conseguiu manter a ordem. Em 2018, quase 3 milhões de etíopes foram expulsos de suas casas por conflitos étnicos. As causas eram complexas e muitas das tensões são anteriores ao seu mandato. 

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O primeiro-ministro da Etiópia, Abiy Ahmed, artífice da grande reconciliação entre seu país e a Eritreia, foi anunciado nesta sexta-feira como o vencedor do Prêmio Nobel da Paz.

Seu governo, porém, demorou a reagir e, às vezes, parecia mais preocupado com sua imagem pública do que em controlar a crise humana em espiral no sul do país. Durante vários meses, a administração impediu que a ajuda chegasse a abrigos para desabrigados e forçou as pessoas a voltar contra sua vontade para áreas que ainda não eram seguras. Isso contribuiu para mais violência e fome.

O Prêmio Nobel será um incentivo para o primeiro-ministro, que enfrenta uma eleição nacional no ano que vem. “Em casa, estamos sempre brigando, mas quando se trata do mundo exterior, estaremos do lado de todo etíope”, diz um morador da capital, Adis-Abeba. 

Abel Abate Demissie, analista político, sugere que o reconhecimento internacional possa manter Ahmed honesto, especialmente porque seu governo mostra sinais de reverter as táticas autoritárias de seu antecessor. “Espero que isso o encoraje a estar à altura do prêmio”, diz. “Ele sabe que todos os olhos estarão sobre ele agora.” / TRADUÇÃO DE CLAUDIA BOZZO 

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Existem dois tipos de ganhadores do Prêmio Nobel da Paz. Há os indiscutíveis, frequentemente ativistas, como Nadia Murad (que venceu no ano passado por seu trabalho destacando o estupro durante a guerra) ou a Organização para a Proibição de Armas Químicas (Opaq), que venceu em 2013. 

Os controvertidos são frequentemente os políticos que negociam acordos de paz – pense em Yasser Arafat ou Frederik de Klerk. A política em lugares violentos é um assunto desagradável e confuso, e os acordos de paz nem sempre duram. A concessão do prêmio ontem a Abiy Ahmed, primeiro-ministro da Etiópia, provocará mais debates do que a maioria.

Presidente da Eritreia,Isaias Afwerki (esq.), epremiê da Etiópia, Abiy Ahmed, celebram de mãos dadaso acordo de paz entre os dois países Foto: Mulugeta Ayene / AP

No lado positivo, Ahmed tentou ser um unificador desde que assumiu o cargo, no ano passado. Ele costuma usar a palavra etíope amárica “medemer” (para somar) em discursos. Milhões de etíopes saudaram suas promessas de democracia, reconciliação e reforma em um país há muito oprimido.

Em junho de 2018, ele assinou um acordo histórico de paz com a Eritreia, um vizinho menor que se separou da Etiópia em 1993. O acordo terminou com duas décadas de conflito sem sentido, por causa de um pedaço de terra árida. A guerra deixou dezenas de milhares de mortos, destruiu famílias e rompeu os laços profundos de sangue, cultura e idioma entre os dois países.

Ahmed rompeu o impasse prometendo se retirar dos territórios disputados, implementando, assim, as conclusões de uma comissão da ONU que a Etiópia havia rejeitado muito tempo atrás. Ele também aproveitou seu estreito relacionamento com a Arábia Saudita e os Emirados Árabes, cuja generosidade financeira pode ter ajudado a empurrar o presidente da Eritreia, Isaias Afwerki, para a mesa de negociações. Após o acordo de paz, famílias e amigos se reuniram e o comércio entre as fronteiras floresceu.

Berit Reiss-Andersen, presidente do Comitê do Nobel, disse que o prêmio reconhece os “esforços de Ahmed para alcançar a paz e a cooperação internacional e, em particular, sua iniciativa decisiva para resolver o conflito fronteiriço com a vizinha Eritreia”. Ele também foi elogiado por ajudar a mediar um acordo de compartilhamento de poder entre manifestantes pró-democracia e uma junta militar que assumiu o poder no início deste ano no Sudão.

No entanto, a paz que ele forjou com a Eritreia está longe de ser completa. No início deste ano, a Eritreia voltou a fechar suas passagens fronteiriças com a Etiópia. Um acordo comercial elaborado por negociadores etíopes acumula poeira na capital da Eritreia, Asmara, há quase um ano. A demarcação física da fronteira, a parte mais complicada do acordo, ainda não começou: as áreas em disputa permanecem sob administração etíope.

A falta de progresso destaca algumas das deficiências de Ahmed como negociador da paz. Ahmed Soliman, da Chatham House, centro de estudos de Londres, fala sobre seu “charme e iniciativas pessoais ousadas” à custa das instituições. Ele ignorou o Ministério das Relações Exteriores da Etiópia para fechar seu acordo com Isaias (cujos detalhes jamais foram divulgados). Suas tentativas de promover a aproximação entre o Quênia e a Somália, envolvidos em uma disputa sobre sua fronteira marítima, assim como entre facções em guerra no Sudão do Sul, ainda não apresentaram resultados.

O histórico do primeiro-ministro como pacificador na Etiópia também é contraditoriamente preocupante. Ele libertou prisioneiros políticos e prometeu eleições justas. Mas não conseguiu manter a ordem. Em 2018, quase 3 milhões de etíopes foram expulsos de suas casas por conflitos étnicos. As causas eram complexas e muitas das tensões são anteriores ao seu mandato. 

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O primeiro-ministro da Etiópia, Abiy Ahmed, artífice da grande reconciliação entre seu país e a Eritreia, foi anunciado nesta sexta-feira como o vencedor do Prêmio Nobel da Paz.

Seu governo, porém, demorou a reagir e, às vezes, parecia mais preocupado com sua imagem pública do que em controlar a crise humana em espiral no sul do país. Durante vários meses, a administração impediu que a ajuda chegasse a abrigos para desabrigados e forçou as pessoas a voltar contra sua vontade para áreas que ainda não eram seguras. Isso contribuiu para mais violência e fome.

O Prêmio Nobel será um incentivo para o primeiro-ministro, que enfrenta uma eleição nacional no ano que vem. “Em casa, estamos sempre brigando, mas quando se trata do mundo exterior, estaremos do lado de todo etíope”, diz um morador da capital, Adis-Abeba. 

Abel Abate Demissie, analista político, sugere que o reconhecimento internacional possa manter Ahmed honesto, especialmente porque seu governo mostra sinais de reverter as táticas autoritárias de seu antecessor. “Espero que isso o encoraje a estar à altura do prêmio”, diz. “Ele sabe que todos os olhos estarão sobre ele agora.” / TRADUÇÃO DE CLAUDIA BOZZO 

© 2019 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM

Existem dois tipos de ganhadores do Prêmio Nobel da Paz. Há os indiscutíveis, frequentemente ativistas, como Nadia Murad (que venceu no ano passado por seu trabalho destacando o estupro durante a guerra) ou a Organização para a Proibição de Armas Químicas (Opaq), que venceu em 2013. 

Os controvertidos são frequentemente os políticos que negociam acordos de paz – pense em Yasser Arafat ou Frederik de Klerk. A política em lugares violentos é um assunto desagradável e confuso, e os acordos de paz nem sempre duram. A concessão do prêmio ontem a Abiy Ahmed, primeiro-ministro da Etiópia, provocará mais debates do que a maioria.

Presidente da Eritreia,Isaias Afwerki (esq.), epremiê da Etiópia, Abiy Ahmed, celebram de mãos dadaso acordo de paz entre os dois países Foto: Mulugeta Ayene / AP

No lado positivo, Ahmed tentou ser um unificador desde que assumiu o cargo, no ano passado. Ele costuma usar a palavra etíope amárica “medemer” (para somar) em discursos. Milhões de etíopes saudaram suas promessas de democracia, reconciliação e reforma em um país há muito oprimido.

Em junho de 2018, ele assinou um acordo histórico de paz com a Eritreia, um vizinho menor que se separou da Etiópia em 1993. O acordo terminou com duas décadas de conflito sem sentido, por causa de um pedaço de terra árida. A guerra deixou dezenas de milhares de mortos, destruiu famílias e rompeu os laços profundos de sangue, cultura e idioma entre os dois países.

Ahmed rompeu o impasse prometendo se retirar dos territórios disputados, implementando, assim, as conclusões de uma comissão da ONU que a Etiópia havia rejeitado muito tempo atrás. Ele também aproveitou seu estreito relacionamento com a Arábia Saudita e os Emirados Árabes, cuja generosidade financeira pode ter ajudado a empurrar o presidente da Eritreia, Isaias Afwerki, para a mesa de negociações. Após o acordo de paz, famílias e amigos se reuniram e o comércio entre as fronteiras floresceu.

Berit Reiss-Andersen, presidente do Comitê do Nobel, disse que o prêmio reconhece os “esforços de Ahmed para alcançar a paz e a cooperação internacional e, em particular, sua iniciativa decisiva para resolver o conflito fronteiriço com a vizinha Eritreia”. Ele também foi elogiado por ajudar a mediar um acordo de compartilhamento de poder entre manifestantes pró-democracia e uma junta militar que assumiu o poder no início deste ano no Sudão.

No entanto, a paz que ele forjou com a Eritreia está longe de ser completa. No início deste ano, a Eritreia voltou a fechar suas passagens fronteiriças com a Etiópia. Um acordo comercial elaborado por negociadores etíopes acumula poeira na capital da Eritreia, Asmara, há quase um ano. A demarcação física da fronteira, a parte mais complicada do acordo, ainda não começou: as áreas em disputa permanecem sob administração etíope.

A falta de progresso destaca algumas das deficiências de Ahmed como negociador da paz. Ahmed Soliman, da Chatham House, centro de estudos de Londres, fala sobre seu “charme e iniciativas pessoais ousadas” à custa das instituições. Ele ignorou o Ministério das Relações Exteriores da Etiópia para fechar seu acordo com Isaias (cujos detalhes jamais foram divulgados). Suas tentativas de promover a aproximação entre o Quênia e a Somália, envolvidos em uma disputa sobre sua fronteira marítima, assim como entre facções em guerra no Sudão do Sul, ainda não apresentaram resultados.

O histórico do primeiro-ministro como pacificador na Etiópia também é contraditoriamente preocupante. Ele libertou prisioneiros políticos e prometeu eleições justas. Mas não conseguiu manter a ordem. Em 2018, quase 3 milhões de etíopes foram expulsos de suas casas por conflitos étnicos. As causas eram complexas e muitas das tensões são anteriores ao seu mandato. 

Seu navegador não suporta esse video.

O primeiro-ministro da Etiópia, Abiy Ahmed, artífice da grande reconciliação entre seu país e a Eritreia, foi anunciado nesta sexta-feira como o vencedor do Prêmio Nobel da Paz.

Seu governo, porém, demorou a reagir e, às vezes, parecia mais preocupado com sua imagem pública do que em controlar a crise humana em espiral no sul do país. Durante vários meses, a administração impediu que a ajuda chegasse a abrigos para desabrigados e forçou as pessoas a voltar contra sua vontade para áreas que ainda não eram seguras. Isso contribuiu para mais violência e fome.

O Prêmio Nobel será um incentivo para o primeiro-ministro, que enfrenta uma eleição nacional no ano que vem. “Em casa, estamos sempre brigando, mas quando se trata do mundo exterior, estaremos do lado de todo etíope”, diz um morador da capital, Adis-Abeba. 

Abel Abate Demissie, analista político, sugere que o reconhecimento internacional possa manter Ahmed honesto, especialmente porque seu governo mostra sinais de reverter as táticas autoritárias de seu antecessor. “Espero que isso o encoraje a estar à altura do prêmio”, diz. “Ele sabe que todos os olhos estarão sobre ele agora.” / TRADUÇÃO DE CLAUDIA BOZZO 

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Existem dois tipos de ganhadores do Prêmio Nobel da Paz. Há os indiscutíveis, frequentemente ativistas, como Nadia Murad (que venceu no ano passado por seu trabalho destacando o estupro durante a guerra) ou a Organização para a Proibição de Armas Químicas (Opaq), que venceu em 2013. 

Os controvertidos são frequentemente os políticos que negociam acordos de paz – pense em Yasser Arafat ou Frederik de Klerk. A política em lugares violentos é um assunto desagradável e confuso, e os acordos de paz nem sempre duram. A concessão do prêmio ontem a Abiy Ahmed, primeiro-ministro da Etiópia, provocará mais debates do que a maioria.

Presidente da Eritreia,Isaias Afwerki (esq.), epremiê da Etiópia, Abiy Ahmed, celebram de mãos dadaso acordo de paz entre os dois países Foto: Mulugeta Ayene / AP

No lado positivo, Ahmed tentou ser um unificador desde que assumiu o cargo, no ano passado. Ele costuma usar a palavra etíope amárica “medemer” (para somar) em discursos. Milhões de etíopes saudaram suas promessas de democracia, reconciliação e reforma em um país há muito oprimido.

Em junho de 2018, ele assinou um acordo histórico de paz com a Eritreia, um vizinho menor que se separou da Etiópia em 1993. O acordo terminou com duas décadas de conflito sem sentido, por causa de um pedaço de terra árida. A guerra deixou dezenas de milhares de mortos, destruiu famílias e rompeu os laços profundos de sangue, cultura e idioma entre os dois países.

Ahmed rompeu o impasse prometendo se retirar dos territórios disputados, implementando, assim, as conclusões de uma comissão da ONU que a Etiópia havia rejeitado muito tempo atrás. Ele também aproveitou seu estreito relacionamento com a Arábia Saudita e os Emirados Árabes, cuja generosidade financeira pode ter ajudado a empurrar o presidente da Eritreia, Isaias Afwerki, para a mesa de negociações. Após o acordo de paz, famílias e amigos se reuniram e o comércio entre as fronteiras floresceu.

Berit Reiss-Andersen, presidente do Comitê do Nobel, disse que o prêmio reconhece os “esforços de Ahmed para alcançar a paz e a cooperação internacional e, em particular, sua iniciativa decisiva para resolver o conflito fronteiriço com a vizinha Eritreia”. Ele também foi elogiado por ajudar a mediar um acordo de compartilhamento de poder entre manifestantes pró-democracia e uma junta militar que assumiu o poder no início deste ano no Sudão.

No entanto, a paz que ele forjou com a Eritreia está longe de ser completa. No início deste ano, a Eritreia voltou a fechar suas passagens fronteiriças com a Etiópia. Um acordo comercial elaborado por negociadores etíopes acumula poeira na capital da Eritreia, Asmara, há quase um ano. A demarcação física da fronteira, a parte mais complicada do acordo, ainda não começou: as áreas em disputa permanecem sob administração etíope.

A falta de progresso destaca algumas das deficiências de Ahmed como negociador da paz. Ahmed Soliman, da Chatham House, centro de estudos de Londres, fala sobre seu “charme e iniciativas pessoais ousadas” à custa das instituições. Ele ignorou o Ministério das Relações Exteriores da Etiópia para fechar seu acordo com Isaias (cujos detalhes jamais foram divulgados). Suas tentativas de promover a aproximação entre o Quênia e a Somália, envolvidos em uma disputa sobre sua fronteira marítima, assim como entre facções em guerra no Sudão do Sul, ainda não apresentaram resultados.

O histórico do primeiro-ministro como pacificador na Etiópia também é contraditoriamente preocupante. Ele libertou prisioneiros políticos e prometeu eleições justas. Mas não conseguiu manter a ordem. Em 2018, quase 3 milhões de etíopes foram expulsos de suas casas por conflitos étnicos. As causas eram complexas e muitas das tensões são anteriores ao seu mandato. 

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Seu governo, porém, demorou a reagir e, às vezes, parecia mais preocupado com sua imagem pública do que em controlar a crise humana em espiral no sul do país. Durante vários meses, a administração impediu que a ajuda chegasse a abrigos para desabrigados e forçou as pessoas a voltar contra sua vontade para áreas que ainda não eram seguras. Isso contribuiu para mais violência e fome.

O Prêmio Nobel será um incentivo para o primeiro-ministro, que enfrenta uma eleição nacional no ano que vem. “Em casa, estamos sempre brigando, mas quando se trata do mundo exterior, estaremos do lado de todo etíope”, diz um morador da capital, Adis-Abeba. 

Abel Abate Demissie, analista político, sugere que o reconhecimento internacional possa manter Ahmed honesto, especialmente porque seu governo mostra sinais de reverter as táticas autoritárias de seu antecessor. “Espero que isso o encoraje a estar à altura do prêmio”, diz. “Ele sabe que todos os olhos estarão sobre ele agora.” / TRADUÇÃO DE CLAUDIA BOZZO 

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