Tropa internacional cria desafios para a Ucrânia; leia análise


Como ocorreu na Espanha, há dúvidas sobre o crivo ideológico do recrutamento na Ucrânia

Por Ariel Mae Lambe e Fraser Raeburn
Atualização:

A invasão russa à Ucrânia tem sido definida no Ocidente como um ponto de ignição crucial de uma luta ideológica mais ampla contra o militarismo e o autoritarismo. Contudo, por causa do risco de guerra nuclear global, as democracias ocidentais não podem arriscar uma participação direta. Nessas circunstâncias, está montado o cenário para uma atuação proeminente de combatentes internacionais voluntários neste conflito.

Em 27 de fevereiro, o presidente ucraniano, Volodmir Zelenski, anunciou a criação de uma Legião Internacional dentro das forças terrestres ucranianas, dispensando a necessidade de vistos, aceitando inscrições por meio de suas embaixadas e publicando instruções passo a passo para voluntários em potencial. Vários governos estrangeiros indicaram que viam com olhos positivos a iniciativa, e reportagens indicam que milhares de pessoas já podem ter se alistado.

O chamado de Zelenski por voluntários estrangeiros tem precedentes, mais notavelmente nos voluntários estrangeiros que combateram na Guerra Civil Espanhola. A história oferece uma perspectiva a respeito do que devem esperar os voluntários e o mundo. Ainda que haja problemas práticos e inconvenientes a se considerar ao convidar recrutas estrangeiros, esse tipo de voluntários já fez significativas contribuições no passado, tanto enquanto combatentes quanto como símbolos duradouros da solidariedade global.

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Voluntários da Belarus, aliada da Rússia, também decidiram lutar ao lado do Exército ucraniano  Foto: Efrem Lukatsky/AP

Em 1936, uma feroz guerra civil tomou conta da Espanha, e tropas lutaram pelo controle da capital, Madri. Enquanto o governo republicano, eleito pelo voto popular, lutava contra os nacionalistas rebelados de Francisco Franco, uma coluna de voluntários estrangeiros chegou ao país para auxiliar os defensores de Madri. Essas unidades ficaram conhecidas como Brigadas Internacionais e chegaram a reunir dezenas de milhares de voluntários estrangeiros no combate em defesa da frágil, ainda que inspiradora, democracia espanhola.

Nas palavras do político comunista britânico Harry Pollitt, eles estavam “lutando pela democracia não apenas da Espanha, mas também do Reino Unido e de toda a Europa”. Todas as democracias, ressaltou ele, deveriam “apoiar e fortalecer” quem confrontava o fascismo em seu nome.

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Uma retórica parecida alimenta a resposta global à crise atual, enquanto as autoridades ucranianas definem o conflito como uma ameaça à existência não apenas da Ucrânia — nas palavras de Zelenski: “Se nós cairmos, vocês cairão”.

Um número extraordinário de estrangeiros se voluntariou para lutar na Espanha. Tamanho recrutamento foi possível não apenas em virtude da ampla simpatia à causa da República Espanhola, mas também porque essa simpatia estava profundamente arraigada nos movimentos antifascistas existentes na época e particularmente nas redes transnacionais do comunismo internacional.

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Essas redes facilitaram o alistamento de voluntários em vários níveis. Garantiram que os voluntários tivessem pontos de contato locais que pudessem ajudar a organizar e financiar sua viagem até a zona de guerra. Ainda mais importante, essas redes garantiam que o recrutamento não ocorresse entre indivíduos isolados. Em vez disso, a convocação alcançava grupos sociais unidos, com perspectivas ideológicas compartilhadas, capazes de decidir coletivamente que se voluntariar era a resposta correta para a crise.

Redes funcionavam como filtro

Isso aumentou dramaticamente a adesão. Assim como o pan-hispanismo, no caso dos recrutas de fala espanhola vindos das Américas, cuja afinidade com base na língua e na cultura compartilhada proveu à República Espanhola valorosos voluntários. Devido a essa afinidade, esses recrutas foram capazes de se integrar ao conflito espanhol com muito mais facilidade do que a maioria dos voluntários que não falava espanhol, e alguns bilíngues atuaram como vitais intérpretes de línguas e culturas.

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As redes existentes facilitavam o recrutamento — mas também funcionavam como filtro. Rapidamente ficou claro que muitos dos que haviam se voluntariado inicialmente não era aptos, em razão de idade, preparo físico ou por não serem confiáveis ideologicamente. A presença desses voluntários na zona de conflito se provou um grave desperdício de recursos.

Mas mandá-los de volta enquanto outros voluntários tinham negadas oportunidades de folgar se provou impopular. Como resultado, padrões mais rígidos de recrutamento foram impostos, incluindo avaliações médicas obrigatórias, assim como esforços intensificados para garantir que os voluntários fossem antifascistas comprometidos, com motivações e convicções políticas consideradas compatíveis com as Brigadas Internacionais.

Os voluntários estrangeiros que lutaram na Espanha vieram de dezenas de países: de toda a Europa, da Irlanda à Grécia; de todas as Américas, do Canadá à Argentina; e de lugares tão remotos quanto Etiópia, Nova Zelândia e China. Ainda que circunstâncias individuais variassem em grande medida, a maioria lutava para confrontar e conter a agressão fascista na Europa. Com a Alemanha nazista e a Itália fascista intervindo ativamente na guerra civil desde seus primeiros dias, os voluntários tinham esperança de que conter suas ambições na Espanha impediria sua diplomacia expansionista e fortaleceria o comprometimento europeu com a segurança coletiva.

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Mesmo com um senso compartilhado de missão a cumprir e muita boa-vontade, trabalhar conjuntamente ainda se provou um desafio. Com dezenas de línguas em uso regular, foi difícil para os voluntários se coordenar eficazmente com as unidades militares espanholas, e a cooperação entre as diferentes unidades internacionais também podia ser difícil.

Enquanto problemas linguísticos limitaram a eficiência militar dos voluntários nos campos de batalha, a dura realidade foi que 35 mil recrutas estrangeiros não foram suficientes para mudar a direção de um conflito combatido entre centenas de milhares de soldados de ambos os lados. As repentinas chegadas de voluntários desempenharam, sim, um papel crucial na fortificação da defesa de Madri entre 1936 e 1937, mas a grande quantidade de baixas e crescentes dificuldades para repor os contingentes tornaram as Brigadas Internacionais menos eficazes conforme o conflito se exasperou. Até um quarto dos voluntários estrangeiros morreu na Espanha, como resultado não apenas das intensas batalhas que combateram, mas também de sua limitada experiência e pouco treinamento.

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Enfrentando o Exército espanhol rebelado — e seus aliados alemães e italianos — as forças republicanas espanholas e as Brigadas Internacionais foram com frequência superadas em treinamento e equipamento. A maioria dos brigadistas internacionais remanescentes foi retirada da Espanha poucos meses antes da vitória de Franco, no início de 1939. Nas décadas que seguiram, enquanto a repressão de Franco silenciava quase toda a Espanha, brigadistas internacionais veteranos e republicanos espanhóis no exílio ajudaram a manter vivas a memória e o conhecimento a respeito de sua luta.

Essa história aponta para um registro de sucessos e fracassos na incorporação de voluntários internacionais a uma força militar durante a guerra. Ainda que voluntários médicos e especialistas técnicos possam desempenhar papéis particularmente valiosos na Ucrânia, ter de treinar grandes contingentes de voluntários internacionais sem experiência militar poderia ser custoso. Colocar o foco em recrutar voluntários com experiência militar verdadeira e treinados para usar armamentos ou qualificados para os trabalhos médicos e técnicos necessários ao esforço de guerra poderia fazer esses custos valerem a pena. Talvez essa lição tenha de ser reaprendida do jeito difícil — as autoridades ucranianas afirmaram em 5 de março que qualquer candidato a voluntário era bem-vindo, com ou sem experiência em combate.

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O finlandês Kenneth Gregg vive na Ucrânia há três anos trabalhando em energia renovável e agora treina voluntários dispostos a combater as tropas russas

Como na Espanha, há dúvidas sobre o crivo ideológico. Há risco, por exemplo, de grupos radicais de direita se transformarem em redes de recrutamento. Ainda que a extrema direita dificilmente esteja unificada em relação à Ucrânia, associações de voluntários desse campo político podem aumentar a eficácia da propaganda russa, que retrata a Ucrânia como “fascista”. Guerra de propaganda e informação tem sido vital para o conflito até aqui, e o governo ucraniano não pode se permitir recrutar combatentes estrangeiros sem se importar com suas origens e motivações.

Talvez os recrutas mais úteis para a Ucrânia possam vir da diáspora ucraniana, particularmente os indivíduos com experiência ou treinamento militar. Aliás, em 5 de março, o Ministério da Defesa da Ucrânia afirmou que 66 mil ucranianos tinham retornado ao país para lutar — um número impressionante se correto. Esses voluntários seriam capazes de se integrar tanto às Forças Armadas ucranianas quanto à paisagem civil com relativa facilidade. Ainda que o inglês provavelmente emerja como língua franca entre os voluntários estrangeiros de hoje, interações com soldados locais, civis e estruturas de comando ainda tornam vital conhecer a língua local.

De acordo com o historiador Nir Arielli, combatentes estrangeiros podem servir três propósitos principais: compensar escassez de força humana, preencher lacunas em habilidades vitais e divulgar propaganda política. No curto prazo, pelo menos este último propósito é o mais premente. As autoridades ucranianas estão habilmente unindo a opinião pública ao seu lado, e os voluntários estrangeiros são agora parte importante de sua estratégia de comunicação.

Recrutas do exterior criarão conexões entre a zona de guerra e o mundo, mantendo o investimento público nos eventos mesmo após o choque inicial da guerra e o espetáculo da agressão perderem força. Sem intervenção estrangeira direta — que é hoje tão improvável quanto já foi na Espanha — voluntários do exterior podem se tornar símbolos importantes e duradouros da solidariedade internacional. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

*SÃO HISTORIADORES E AUTORES

A invasão russa à Ucrânia tem sido definida no Ocidente como um ponto de ignição crucial de uma luta ideológica mais ampla contra o militarismo e o autoritarismo. Contudo, por causa do risco de guerra nuclear global, as democracias ocidentais não podem arriscar uma participação direta. Nessas circunstâncias, está montado o cenário para uma atuação proeminente de combatentes internacionais voluntários neste conflito.

Em 27 de fevereiro, o presidente ucraniano, Volodmir Zelenski, anunciou a criação de uma Legião Internacional dentro das forças terrestres ucranianas, dispensando a necessidade de vistos, aceitando inscrições por meio de suas embaixadas e publicando instruções passo a passo para voluntários em potencial. Vários governos estrangeiros indicaram que viam com olhos positivos a iniciativa, e reportagens indicam que milhares de pessoas já podem ter se alistado.

O chamado de Zelenski por voluntários estrangeiros tem precedentes, mais notavelmente nos voluntários estrangeiros que combateram na Guerra Civil Espanhola. A história oferece uma perspectiva a respeito do que devem esperar os voluntários e o mundo. Ainda que haja problemas práticos e inconvenientes a se considerar ao convidar recrutas estrangeiros, esse tipo de voluntários já fez significativas contribuições no passado, tanto enquanto combatentes quanto como símbolos duradouros da solidariedade global.

Voluntários da Belarus, aliada da Rússia, também decidiram lutar ao lado do Exército ucraniano  Foto: Efrem Lukatsky/AP

Em 1936, uma feroz guerra civil tomou conta da Espanha, e tropas lutaram pelo controle da capital, Madri. Enquanto o governo republicano, eleito pelo voto popular, lutava contra os nacionalistas rebelados de Francisco Franco, uma coluna de voluntários estrangeiros chegou ao país para auxiliar os defensores de Madri. Essas unidades ficaram conhecidas como Brigadas Internacionais e chegaram a reunir dezenas de milhares de voluntários estrangeiros no combate em defesa da frágil, ainda que inspiradora, democracia espanhola.

Nas palavras do político comunista britânico Harry Pollitt, eles estavam “lutando pela democracia não apenas da Espanha, mas também do Reino Unido e de toda a Europa”. Todas as democracias, ressaltou ele, deveriam “apoiar e fortalecer” quem confrontava o fascismo em seu nome.

Uma retórica parecida alimenta a resposta global à crise atual, enquanto as autoridades ucranianas definem o conflito como uma ameaça à existência não apenas da Ucrânia — nas palavras de Zelenski: “Se nós cairmos, vocês cairão”.

Um número extraordinário de estrangeiros se voluntariou para lutar na Espanha. Tamanho recrutamento foi possível não apenas em virtude da ampla simpatia à causa da República Espanhola, mas também porque essa simpatia estava profundamente arraigada nos movimentos antifascistas existentes na época e particularmente nas redes transnacionais do comunismo internacional.

Essas redes facilitaram o alistamento de voluntários em vários níveis. Garantiram que os voluntários tivessem pontos de contato locais que pudessem ajudar a organizar e financiar sua viagem até a zona de guerra. Ainda mais importante, essas redes garantiam que o recrutamento não ocorresse entre indivíduos isolados. Em vez disso, a convocação alcançava grupos sociais unidos, com perspectivas ideológicas compartilhadas, capazes de decidir coletivamente que se voluntariar era a resposta correta para a crise.

Redes funcionavam como filtro

Isso aumentou dramaticamente a adesão. Assim como o pan-hispanismo, no caso dos recrutas de fala espanhola vindos das Américas, cuja afinidade com base na língua e na cultura compartilhada proveu à República Espanhola valorosos voluntários. Devido a essa afinidade, esses recrutas foram capazes de se integrar ao conflito espanhol com muito mais facilidade do que a maioria dos voluntários que não falava espanhol, e alguns bilíngues atuaram como vitais intérpretes de línguas e culturas.

As redes existentes facilitavam o recrutamento — mas também funcionavam como filtro. Rapidamente ficou claro que muitos dos que haviam se voluntariado inicialmente não era aptos, em razão de idade, preparo físico ou por não serem confiáveis ideologicamente. A presença desses voluntários na zona de conflito se provou um grave desperdício de recursos.

Mas mandá-los de volta enquanto outros voluntários tinham negadas oportunidades de folgar se provou impopular. Como resultado, padrões mais rígidos de recrutamento foram impostos, incluindo avaliações médicas obrigatórias, assim como esforços intensificados para garantir que os voluntários fossem antifascistas comprometidos, com motivações e convicções políticas consideradas compatíveis com as Brigadas Internacionais.

Os voluntários estrangeiros que lutaram na Espanha vieram de dezenas de países: de toda a Europa, da Irlanda à Grécia; de todas as Américas, do Canadá à Argentina; e de lugares tão remotos quanto Etiópia, Nova Zelândia e China. Ainda que circunstâncias individuais variassem em grande medida, a maioria lutava para confrontar e conter a agressão fascista na Europa. Com a Alemanha nazista e a Itália fascista intervindo ativamente na guerra civil desde seus primeiros dias, os voluntários tinham esperança de que conter suas ambições na Espanha impediria sua diplomacia expansionista e fortaleceria o comprometimento europeu com a segurança coletiva.

Mesmo com um senso compartilhado de missão a cumprir e muita boa-vontade, trabalhar conjuntamente ainda se provou um desafio. Com dezenas de línguas em uso regular, foi difícil para os voluntários se coordenar eficazmente com as unidades militares espanholas, e a cooperação entre as diferentes unidades internacionais também podia ser difícil.

Enquanto problemas linguísticos limitaram a eficiência militar dos voluntários nos campos de batalha, a dura realidade foi que 35 mil recrutas estrangeiros não foram suficientes para mudar a direção de um conflito combatido entre centenas de milhares de soldados de ambos os lados. As repentinas chegadas de voluntários desempenharam, sim, um papel crucial na fortificação da defesa de Madri entre 1936 e 1937, mas a grande quantidade de baixas e crescentes dificuldades para repor os contingentes tornaram as Brigadas Internacionais menos eficazes conforme o conflito se exasperou. Até um quarto dos voluntários estrangeiros morreu na Espanha, como resultado não apenas das intensas batalhas que combateram, mas também de sua limitada experiência e pouco treinamento.

Enfrentando o Exército espanhol rebelado — e seus aliados alemães e italianos — as forças republicanas espanholas e as Brigadas Internacionais foram com frequência superadas em treinamento e equipamento. A maioria dos brigadistas internacionais remanescentes foi retirada da Espanha poucos meses antes da vitória de Franco, no início de 1939. Nas décadas que seguiram, enquanto a repressão de Franco silenciava quase toda a Espanha, brigadistas internacionais veteranos e republicanos espanhóis no exílio ajudaram a manter vivas a memória e o conhecimento a respeito de sua luta.

Essa história aponta para um registro de sucessos e fracassos na incorporação de voluntários internacionais a uma força militar durante a guerra. Ainda que voluntários médicos e especialistas técnicos possam desempenhar papéis particularmente valiosos na Ucrânia, ter de treinar grandes contingentes de voluntários internacionais sem experiência militar poderia ser custoso. Colocar o foco em recrutar voluntários com experiência militar verdadeira e treinados para usar armamentos ou qualificados para os trabalhos médicos e técnicos necessários ao esforço de guerra poderia fazer esses custos valerem a pena. Talvez essa lição tenha de ser reaprendida do jeito difícil — as autoridades ucranianas afirmaram em 5 de março que qualquer candidato a voluntário era bem-vindo, com ou sem experiência em combate.

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O finlandês Kenneth Gregg vive na Ucrânia há três anos trabalhando em energia renovável e agora treina voluntários dispostos a combater as tropas russas

Como na Espanha, há dúvidas sobre o crivo ideológico. Há risco, por exemplo, de grupos radicais de direita se transformarem em redes de recrutamento. Ainda que a extrema direita dificilmente esteja unificada em relação à Ucrânia, associações de voluntários desse campo político podem aumentar a eficácia da propaganda russa, que retrata a Ucrânia como “fascista”. Guerra de propaganda e informação tem sido vital para o conflito até aqui, e o governo ucraniano não pode se permitir recrutar combatentes estrangeiros sem se importar com suas origens e motivações.

Talvez os recrutas mais úteis para a Ucrânia possam vir da diáspora ucraniana, particularmente os indivíduos com experiência ou treinamento militar. Aliás, em 5 de março, o Ministério da Defesa da Ucrânia afirmou que 66 mil ucranianos tinham retornado ao país para lutar — um número impressionante se correto. Esses voluntários seriam capazes de se integrar tanto às Forças Armadas ucranianas quanto à paisagem civil com relativa facilidade. Ainda que o inglês provavelmente emerja como língua franca entre os voluntários estrangeiros de hoje, interações com soldados locais, civis e estruturas de comando ainda tornam vital conhecer a língua local.

De acordo com o historiador Nir Arielli, combatentes estrangeiros podem servir três propósitos principais: compensar escassez de força humana, preencher lacunas em habilidades vitais e divulgar propaganda política. No curto prazo, pelo menos este último propósito é o mais premente. As autoridades ucranianas estão habilmente unindo a opinião pública ao seu lado, e os voluntários estrangeiros são agora parte importante de sua estratégia de comunicação.

Recrutas do exterior criarão conexões entre a zona de guerra e o mundo, mantendo o investimento público nos eventos mesmo após o choque inicial da guerra e o espetáculo da agressão perderem força. Sem intervenção estrangeira direta — que é hoje tão improvável quanto já foi na Espanha — voluntários do exterior podem se tornar símbolos importantes e duradouros da solidariedade internacional. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

*SÃO HISTORIADORES E AUTORES

A invasão russa à Ucrânia tem sido definida no Ocidente como um ponto de ignição crucial de uma luta ideológica mais ampla contra o militarismo e o autoritarismo. Contudo, por causa do risco de guerra nuclear global, as democracias ocidentais não podem arriscar uma participação direta. Nessas circunstâncias, está montado o cenário para uma atuação proeminente de combatentes internacionais voluntários neste conflito.

Em 27 de fevereiro, o presidente ucraniano, Volodmir Zelenski, anunciou a criação de uma Legião Internacional dentro das forças terrestres ucranianas, dispensando a necessidade de vistos, aceitando inscrições por meio de suas embaixadas e publicando instruções passo a passo para voluntários em potencial. Vários governos estrangeiros indicaram que viam com olhos positivos a iniciativa, e reportagens indicam que milhares de pessoas já podem ter se alistado.

O chamado de Zelenski por voluntários estrangeiros tem precedentes, mais notavelmente nos voluntários estrangeiros que combateram na Guerra Civil Espanhola. A história oferece uma perspectiva a respeito do que devem esperar os voluntários e o mundo. Ainda que haja problemas práticos e inconvenientes a se considerar ao convidar recrutas estrangeiros, esse tipo de voluntários já fez significativas contribuições no passado, tanto enquanto combatentes quanto como símbolos duradouros da solidariedade global.

Voluntários da Belarus, aliada da Rússia, também decidiram lutar ao lado do Exército ucraniano  Foto: Efrem Lukatsky/AP

Em 1936, uma feroz guerra civil tomou conta da Espanha, e tropas lutaram pelo controle da capital, Madri. Enquanto o governo republicano, eleito pelo voto popular, lutava contra os nacionalistas rebelados de Francisco Franco, uma coluna de voluntários estrangeiros chegou ao país para auxiliar os defensores de Madri. Essas unidades ficaram conhecidas como Brigadas Internacionais e chegaram a reunir dezenas de milhares de voluntários estrangeiros no combate em defesa da frágil, ainda que inspiradora, democracia espanhola.

Nas palavras do político comunista britânico Harry Pollitt, eles estavam “lutando pela democracia não apenas da Espanha, mas também do Reino Unido e de toda a Europa”. Todas as democracias, ressaltou ele, deveriam “apoiar e fortalecer” quem confrontava o fascismo em seu nome.

Uma retórica parecida alimenta a resposta global à crise atual, enquanto as autoridades ucranianas definem o conflito como uma ameaça à existência não apenas da Ucrânia — nas palavras de Zelenski: “Se nós cairmos, vocês cairão”.

Um número extraordinário de estrangeiros se voluntariou para lutar na Espanha. Tamanho recrutamento foi possível não apenas em virtude da ampla simpatia à causa da República Espanhola, mas também porque essa simpatia estava profundamente arraigada nos movimentos antifascistas existentes na época e particularmente nas redes transnacionais do comunismo internacional.

Essas redes facilitaram o alistamento de voluntários em vários níveis. Garantiram que os voluntários tivessem pontos de contato locais que pudessem ajudar a organizar e financiar sua viagem até a zona de guerra. Ainda mais importante, essas redes garantiam que o recrutamento não ocorresse entre indivíduos isolados. Em vez disso, a convocação alcançava grupos sociais unidos, com perspectivas ideológicas compartilhadas, capazes de decidir coletivamente que se voluntariar era a resposta correta para a crise.

Redes funcionavam como filtro

Isso aumentou dramaticamente a adesão. Assim como o pan-hispanismo, no caso dos recrutas de fala espanhola vindos das Américas, cuja afinidade com base na língua e na cultura compartilhada proveu à República Espanhola valorosos voluntários. Devido a essa afinidade, esses recrutas foram capazes de se integrar ao conflito espanhol com muito mais facilidade do que a maioria dos voluntários que não falava espanhol, e alguns bilíngues atuaram como vitais intérpretes de línguas e culturas.

As redes existentes facilitavam o recrutamento — mas também funcionavam como filtro. Rapidamente ficou claro que muitos dos que haviam se voluntariado inicialmente não era aptos, em razão de idade, preparo físico ou por não serem confiáveis ideologicamente. A presença desses voluntários na zona de conflito se provou um grave desperdício de recursos.

Mas mandá-los de volta enquanto outros voluntários tinham negadas oportunidades de folgar se provou impopular. Como resultado, padrões mais rígidos de recrutamento foram impostos, incluindo avaliações médicas obrigatórias, assim como esforços intensificados para garantir que os voluntários fossem antifascistas comprometidos, com motivações e convicções políticas consideradas compatíveis com as Brigadas Internacionais.

Os voluntários estrangeiros que lutaram na Espanha vieram de dezenas de países: de toda a Europa, da Irlanda à Grécia; de todas as Américas, do Canadá à Argentina; e de lugares tão remotos quanto Etiópia, Nova Zelândia e China. Ainda que circunstâncias individuais variassem em grande medida, a maioria lutava para confrontar e conter a agressão fascista na Europa. Com a Alemanha nazista e a Itália fascista intervindo ativamente na guerra civil desde seus primeiros dias, os voluntários tinham esperança de que conter suas ambições na Espanha impediria sua diplomacia expansionista e fortaleceria o comprometimento europeu com a segurança coletiva.

Mesmo com um senso compartilhado de missão a cumprir e muita boa-vontade, trabalhar conjuntamente ainda se provou um desafio. Com dezenas de línguas em uso regular, foi difícil para os voluntários se coordenar eficazmente com as unidades militares espanholas, e a cooperação entre as diferentes unidades internacionais também podia ser difícil.

Enquanto problemas linguísticos limitaram a eficiência militar dos voluntários nos campos de batalha, a dura realidade foi que 35 mil recrutas estrangeiros não foram suficientes para mudar a direção de um conflito combatido entre centenas de milhares de soldados de ambos os lados. As repentinas chegadas de voluntários desempenharam, sim, um papel crucial na fortificação da defesa de Madri entre 1936 e 1937, mas a grande quantidade de baixas e crescentes dificuldades para repor os contingentes tornaram as Brigadas Internacionais menos eficazes conforme o conflito se exasperou. Até um quarto dos voluntários estrangeiros morreu na Espanha, como resultado não apenas das intensas batalhas que combateram, mas também de sua limitada experiência e pouco treinamento.

Enfrentando o Exército espanhol rebelado — e seus aliados alemães e italianos — as forças republicanas espanholas e as Brigadas Internacionais foram com frequência superadas em treinamento e equipamento. A maioria dos brigadistas internacionais remanescentes foi retirada da Espanha poucos meses antes da vitória de Franco, no início de 1939. Nas décadas que seguiram, enquanto a repressão de Franco silenciava quase toda a Espanha, brigadistas internacionais veteranos e republicanos espanhóis no exílio ajudaram a manter vivas a memória e o conhecimento a respeito de sua luta.

Essa história aponta para um registro de sucessos e fracassos na incorporação de voluntários internacionais a uma força militar durante a guerra. Ainda que voluntários médicos e especialistas técnicos possam desempenhar papéis particularmente valiosos na Ucrânia, ter de treinar grandes contingentes de voluntários internacionais sem experiência militar poderia ser custoso. Colocar o foco em recrutar voluntários com experiência militar verdadeira e treinados para usar armamentos ou qualificados para os trabalhos médicos e técnicos necessários ao esforço de guerra poderia fazer esses custos valerem a pena. Talvez essa lição tenha de ser reaprendida do jeito difícil — as autoridades ucranianas afirmaram em 5 de março que qualquer candidato a voluntário era bem-vindo, com ou sem experiência em combate.

Seu navegador não suporta esse video.

O finlandês Kenneth Gregg vive na Ucrânia há três anos trabalhando em energia renovável e agora treina voluntários dispostos a combater as tropas russas

Como na Espanha, há dúvidas sobre o crivo ideológico. Há risco, por exemplo, de grupos radicais de direita se transformarem em redes de recrutamento. Ainda que a extrema direita dificilmente esteja unificada em relação à Ucrânia, associações de voluntários desse campo político podem aumentar a eficácia da propaganda russa, que retrata a Ucrânia como “fascista”. Guerra de propaganda e informação tem sido vital para o conflito até aqui, e o governo ucraniano não pode se permitir recrutar combatentes estrangeiros sem se importar com suas origens e motivações.

Talvez os recrutas mais úteis para a Ucrânia possam vir da diáspora ucraniana, particularmente os indivíduos com experiência ou treinamento militar. Aliás, em 5 de março, o Ministério da Defesa da Ucrânia afirmou que 66 mil ucranianos tinham retornado ao país para lutar — um número impressionante se correto. Esses voluntários seriam capazes de se integrar tanto às Forças Armadas ucranianas quanto à paisagem civil com relativa facilidade. Ainda que o inglês provavelmente emerja como língua franca entre os voluntários estrangeiros de hoje, interações com soldados locais, civis e estruturas de comando ainda tornam vital conhecer a língua local.

De acordo com o historiador Nir Arielli, combatentes estrangeiros podem servir três propósitos principais: compensar escassez de força humana, preencher lacunas em habilidades vitais e divulgar propaganda política. No curto prazo, pelo menos este último propósito é o mais premente. As autoridades ucranianas estão habilmente unindo a opinião pública ao seu lado, e os voluntários estrangeiros são agora parte importante de sua estratégia de comunicação.

Recrutas do exterior criarão conexões entre a zona de guerra e o mundo, mantendo o investimento público nos eventos mesmo após o choque inicial da guerra e o espetáculo da agressão perderem força. Sem intervenção estrangeira direta — que é hoje tão improvável quanto já foi na Espanha — voluntários do exterior podem se tornar símbolos importantes e duradouros da solidariedade internacional. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

*SÃO HISTORIADORES E AUTORES

A invasão russa à Ucrânia tem sido definida no Ocidente como um ponto de ignição crucial de uma luta ideológica mais ampla contra o militarismo e o autoritarismo. Contudo, por causa do risco de guerra nuclear global, as democracias ocidentais não podem arriscar uma participação direta. Nessas circunstâncias, está montado o cenário para uma atuação proeminente de combatentes internacionais voluntários neste conflito.

Em 27 de fevereiro, o presidente ucraniano, Volodmir Zelenski, anunciou a criação de uma Legião Internacional dentro das forças terrestres ucranianas, dispensando a necessidade de vistos, aceitando inscrições por meio de suas embaixadas e publicando instruções passo a passo para voluntários em potencial. Vários governos estrangeiros indicaram que viam com olhos positivos a iniciativa, e reportagens indicam que milhares de pessoas já podem ter se alistado.

O chamado de Zelenski por voluntários estrangeiros tem precedentes, mais notavelmente nos voluntários estrangeiros que combateram na Guerra Civil Espanhola. A história oferece uma perspectiva a respeito do que devem esperar os voluntários e o mundo. Ainda que haja problemas práticos e inconvenientes a se considerar ao convidar recrutas estrangeiros, esse tipo de voluntários já fez significativas contribuições no passado, tanto enquanto combatentes quanto como símbolos duradouros da solidariedade global.

Voluntários da Belarus, aliada da Rússia, também decidiram lutar ao lado do Exército ucraniano  Foto: Efrem Lukatsky/AP

Em 1936, uma feroz guerra civil tomou conta da Espanha, e tropas lutaram pelo controle da capital, Madri. Enquanto o governo republicano, eleito pelo voto popular, lutava contra os nacionalistas rebelados de Francisco Franco, uma coluna de voluntários estrangeiros chegou ao país para auxiliar os defensores de Madri. Essas unidades ficaram conhecidas como Brigadas Internacionais e chegaram a reunir dezenas de milhares de voluntários estrangeiros no combate em defesa da frágil, ainda que inspiradora, democracia espanhola.

Nas palavras do político comunista britânico Harry Pollitt, eles estavam “lutando pela democracia não apenas da Espanha, mas também do Reino Unido e de toda a Europa”. Todas as democracias, ressaltou ele, deveriam “apoiar e fortalecer” quem confrontava o fascismo em seu nome.

Uma retórica parecida alimenta a resposta global à crise atual, enquanto as autoridades ucranianas definem o conflito como uma ameaça à existência não apenas da Ucrânia — nas palavras de Zelenski: “Se nós cairmos, vocês cairão”.

Um número extraordinário de estrangeiros se voluntariou para lutar na Espanha. Tamanho recrutamento foi possível não apenas em virtude da ampla simpatia à causa da República Espanhola, mas também porque essa simpatia estava profundamente arraigada nos movimentos antifascistas existentes na época e particularmente nas redes transnacionais do comunismo internacional.

Essas redes facilitaram o alistamento de voluntários em vários níveis. Garantiram que os voluntários tivessem pontos de contato locais que pudessem ajudar a organizar e financiar sua viagem até a zona de guerra. Ainda mais importante, essas redes garantiam que o recrutamento não ocorresse entre indivíduos isolados. Em vez disso, a convocação alcançava grupos sociais unidos, com perspectivas ideológicas compartilhadas, capazes de decidir coletivamente que se voluntariar era a resposta correta para a crise.

Redes funcionavam como filtro

Isso aumentou dramaticamente a adesão. Assim como o pan-hispanismo, no caso dos recrutas de fala espanhola vindos das Américas, cuja afinidade com base na língua e na cultura compartilhada proveu à República Espanhola valorosos voluntários. Devido a essa afinidade, esses recrutas foram capazes de se integrar ao conflito espanhol com muito mais facilidade do que a maioria dos voluntários que não falava espanhol, e alguns bilíngues atuaram como vitais intérpretes de línguas e culturas.

As redes existentes facilitavam o recrutamento — mas também funcionavam como filtro. Rapidamente ficou claro que muitos dos que haviam se voluntariado inicialmente não era aptos, em razão de idade, preparo físico ou por não serem confiáveis ideologicamente. A presença desses voluntários na zona de conflito se provou um grave desperdício de recursos.

Mas mandá-los de volta enquanto outros voluntários tinham negadas oportunidades de folgar se provou impopular. Como resultado, padrões mais rígidos de recrutamento foram impostos, incluindo avaliações médicas obrigatórias, assim como esforços intensificados para garantir que os voluntários fossem antifascistas comprometidos, com motivações e convicções políticas consideradas compatíveis com as Brigadas Internacionais.

Os voluntários estrangeiros que lutaram na Espanha vieram de dezenas de países: de toda a Europa, da Irlanda à Grécia; de todas as Américas, do Canadá à Argentina; e de lugares tão remotos quanto Etiópia, Nova Zelândia e China. Ainda que circunstâncias individuais variassem em grande medida, a maioria lutava para confrontar e conter a agressão fascista na Europa. Com a Alemanha nazista e a Itália fascista intervindo ativamente na guerra civil desde seus primeiros dias, os voluntários tinham esperança de que conter suas ambições na Espanha impediria sua diplomacia expansionista e fortaleceria o comprometimento europeu com a segurança coletiva.

Mesmo com um senso compartilhado de missão a cumprir e muita boa-vontade, trabalhar conjuntamente ainda se provou um desafio. Com dezenas de línguas em uso regular, foi difícil para os voluntários se coordenar eficazmente com as unidades militares espanholas, e a cooperação entre as diferentes unidades internacionais também podia ser difícil.

Enquanto problemas linguísticos limitaram a eficiência militar dos voluntários nos campos de batalha, a dura realidade foi que 35 mil recrutas estrangeiros não foram suficientes para mudar a direção de um conflito combatido entre centenas de milhares de soldados de ambos os lados. As repentinas chegadas de voluntários desempenharam, sim, um papel crucial na fortificação da defesa de Madri entre 1936 e 1937, mas a grande quantidade de baixas e crescentes dificuldades para repor os contingentes tornaram as Brigadas Internacionais menos eficazes conforme o conflito se exasperou. Até um quarto dos voluntários estrangeiros morreu na Espanha, como resultado não apenas das intensas batalhas que combateram, mas também de sua limitada experiência e pouco treinamento.

Enfrentando o Exército espanhol rebelado — e seus aliados alemães e italianos — as forças republicanas espanholas e as Brigadas Internacionais foram com frequência superadas em treinamento e equipamento. A maioria dos brigadistas internacionais remanescentes foi retirada da Espanha poucos meses antes da vitória de Franco, no início de 1939. Nas décadas que seguiram, enquanto a repressão de Franco silenciava quase toda a Espanha, brigadistas internacionais veteranos e republicanos espanhóis no exílio ajudaram a manter vivas a memória e o conhecimento a respeito de sua luta.

Essa história aponta para um registro de sucessos e fracassos na incorporação de voluntários internacionais a uma força militar durante a guerra. Ainda que voluntários médicos e especialistas técnicos possam desempenhar papéis particularmente valiosos na Ucrânia, ter de treinar grandes contingentes de voluntários internacionais sem experiência militar poderia ser custoso. Colocar o foco em recrutar voluntários com experiência militar verdadeira e treinados para usar armamentos ou qualificados para os trabalhos médicos e técnicos necessários ao esforço de guerra poderia fazer esses custos valerem a pena. Talvez essa lição tenha de ser reaprendida do jeito difícil — as autoridades ucranianas afirmaram em 5 de março que qualquer candidato a voluntário era bem-vindo, com ou sem experiência em combate.

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O finlandês Kenneth Gregg vive na Ucrânia há três anos trabalhando em energia renovável e agora treina voluntários dispostos a combater as tropas russas

Como na Espanha, há dúvidas sobre o crivo ideológico. Há risco, por exemplo, de grupos radicais de direita se transformarem em redes de recrutamento. Ainda que a extrema direita dificilmente esteja unificada em relação à Ucrânia, associações de voluntários desse campo político podem aumentar a eficácia da propaganda russa, que retrata a Ucrânia como “fascista”. Guerra de propaganda e informação tem sido vital para o conflito até aqui, e o governo ucraniano não pode se permitir recrutar combatentes estrangeiros sem se importar com suas origens e motivações.

Talvez os recrutas mais úteis para a Ucrânia possam vir da diáspora ucraniana, particularmente os indivíduos com experiência ou treinamento militar. Aliás, em 5 de março, o Ministério da Defesa da Ucrânia afirmou que 66 mil ucranianos tinham retornado ao país para lutar — um número impressionante se correto. Esses voluntários seriam capazes de se integrar tanto às Forças Armadas ucranianas quanto à paisagem civil com relativa facilidade. Ainda que o inglês provavelmente emerja como língua franca entre os voluntários estrangeiros de hoje, interações com soldados locais, civis e estruturas de comando ainda tornam vital conhecer a língua local.

De acordo com o historiador Nir Arielli, combatentes estrangeiros podem servir três propósitos principais: compensar escassez de força humana, preencher lacunas em habilidades vitais e divulgar propaganda política. No curto prazo, pelo menos este último propósito é o mais premente. As autoridades ucranianas estão habilmente unindo a opinião pública ao seu lado, e os voluntários estrangeiros são agora parte importante de sua estratégia de comunicação.

Recrutas do exterior criarão conexões entre a zona de guerra e o mundo, mantendo o investimento público nos eventos mesmo após o choque inicial da guerra e o espetáculo da agressão perderem força. Sem intervenção estrangeira direta — que é hoje tão improvável quanto já foi na Espanha — voluntários do exterior podem se tornar símbolos importantes e duradouros da solidariedade internacional. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

*SÃO HISTORIADORES E AUTORES

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