Opinião|Trump pode vencer a disputa com a China de uma vez por todas


Se Trump conseguir aliar o seu estilo agressivo à uma estratégia mais focada, os próximos quatro anos serão uma oportunidade de ouro para manter Pequim na defensiva

Por Craig Singleton

O primeiro mandato de Donald Trump sinalizou uma mudança histórica na política dos EUA em relação à China. Sua combinação estratégica de pressão econômica, imprevisibilidade, sanções e tarifas desequilibrou Pequim. Foi um ponto de virada: Washington passou da aceitação passiva das ambições revisionistas da China para uma oposição assertiva. O governo Biden, sabiamente, manteve e, em alguns casos, ampliou essa estrutura.

O segundo mandato de Trump pode ajudar os Estados Unidos a vencer essa disputa estratégica. A China enfrenta uma série de desafios, especialmente uma economia estagnada, o que a torna vulnerável às táticas assertivas do presidente eleito. Se Trump conseguir aliar o estilo agressivo de seu primeiro mandato à uma estratégia mais focada e a uma disciplina mais rígida, os próximos quatro anos serão uma oportunidade de ouro para manter Pequim na defensiva e transformar permanentemente a rivalidade em favor dos Estados Unidos.

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Para a China, o resultado ideal nas eleições dos EUA teria sido mais quatro anos de abordagem cautelosa do governo Biden-Kamala Harris. Embora o presidente Biden mantivesse uma pressão direcionada sobre Pequim, sua ênfase na distensão e aversão à escalada teria proporcionado ao líder chinês, Xi Jinping, a previsibilidade de que ele precisa para lidar com seus problemas domésticos e promover as ambições da China em áreas críticas, como tecnologia, comércio e o futuro de Taiwan.

O então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, cumprimenta o presidente da China, Xi Jinping, após uma reunião bilateral em Osaka, Japão  Foto: Susan Walsh/AP

Mas Trump não está satisfeito em apenas administrar a concorrência com Pequim. Ele pretende vencê-la. Sua abordagem de soma zero e suas táticas não convencionais - bem como um gabinete emergente de políticos linha-dura em relação à China - provavelmente negarão a Xi o espaço para respirar de que ele precisa desesperadamente e empurrarão o líder chinês para um teste de alto risco que ele não pode controlar ou prever facilmente.

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Apesar de uma década de projeção de força externa, a China é, de fato, uma potência em declínio, tendo sua ascensão sido desfeita pela má administração, repressão pesada e erros estratégicos de Xi. O país enfrenta uma dívida devastadora, desemprego recorde entre os jovens e uma população que está diminuindo e envelhecendo rapidamente. Sua abordagem orientada por ideologia, que coloca o Partido Comunista Chinês no centro da tomada de decisões econômicas, corroeu a confiança dos empresários, estimulou a fuga de capitais e levou a quedas sem precedentes no investimento estrangeiro.

A era de crescimento altíssimo da China está dando lugar a uma estagnação que lembra a chamada década perdida do Japão, um período de deflação e inércia econômica do qual o Japão ainda não se recuperou totalmente. Até mesmo Xi advertiu os cidadãos no ano passado para que se preparassem para “comer amargura”, uma frase chinesa que indica tempos difíceis que estão por vir.

O presidente da China, Xi Jinping, desembarca em Lima, Peru  Foto: Ernesto Benavides/AFP
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A economia dos EUA, enquanto isso, está ganhando impulso, e Trump - que considera o modelo chinês de planejamento centralizado e de fabricação pesada como predatório e prejudicial aos trabalhadores americanos - parece pronto para alavancar agressivamente a força dos EUA, como fez em seu primeiro mandato. Ele propôs tarifas de até 60% sobre as importações chinesas. De acordo com algumas estimativas, isso poderia reduzir em até dois pontos porcentuais o produto interno bruto da China.

A fanfarronice e as bravatas do primeiro mandato de Trump também podem ser de grande valia em relação a Taiwan. O objetivo de Xi é colocar a ilha democraticamente governada sob o domínio chinês, pela força, se necessário. Trump, no entanto, está ameaçando impor tarifas de até 200% sobre os produtos chineses se a China tomar medidas militares. O presidente eleito resumiu melhor a situação quando observou no mês passado que Xi não ousaria provocá-lo em relação a Taiwan porque o líder chinês sabe que ele é “louco”.

Ansiedade

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A ansiedade chinesa com o retorno de Trump já está aparecendo. Durante o governo Biden, Pequim sempre adotou um tom desafiador, acusando os Estados Unidos de cerco e contenção. Porém, após a vitória esmagadora de Trump nas eleições, os líderes chineses rapidamente adotaram um tom mais conciliador, pedindo uma coexistência pacífica e uma nova era de cooperação.

No entanto, os Estados Unidos precisam aproveitar o impulso atual, especialmente na disputa de alto risco com a China por tecnologias essenciais, como semicondutores, inteligência artificial, veículos autônomos e computação quântica - os motores da revolução industrial do futuro. Permitir que a China assuma a liderança inclinaria perigosamente a dinâmica do poder global a seu favor, prejudicando a segurança nacional dos EUA.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, cumprimenta o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, na Casa Branca  Foto: Evan Vucci/AP
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Trump reconhece esse risco e sinalizou que provavelmente intensificaria as tarifas, os controles de exportação e as sanções sobre os setores de tecnologia e industriais da China que já prejudicaram a economia do país e seu potencial de inovação. Ele também pode defender uma triagem mais rigorosa dos investimentos dos EUA no setor de tecnologia da China, uma estratégia que tem apoio bipartidário e pode impedir o desenvolvimento e a implantação de recursos militares avançados da China.

Xi Jinping está depositando as esperanças econômicas da China em um modelo ultrapassado de fabricação para exportação subsidiado pelo Estado. Mas essa estratégia é altamente vulnerável às tarifas dos EUA. Xi pode apelar para os instintos de negociação de Trump, oferecendo concessões seletivas para atenuar o impacto das tarifas, mas é improvável que isso influencie Trump por muito tempo.

Xi tem suas próprias ferramentas que pode usar, mas quase todas elas são arriscadas. Ele poderia fortalecer sua economia cortando as taxas de juros, ampliando os descontos fiscais ou subsidiando ainda mais os exportadores. Mas esses são remédios de curto prazo que provavelmente piorarão a instabilidade econômica de longo prazo ao inflar a impressionante dívida da China, que atualmente é estimada em quase três vezes o tamanho do PIB do país.

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O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, conversa com o presidente da China, Xi Jinping, em Woodside, California  Foto: Doug Mills/NYT

Retaliação

Xi poderia retaliar restringindo o acesso das empresas americanas aos mercados chineses, mas isso poderia desestabilizar ainda mais os investidores estrangeiros já desconfiados da trajetória econômica da China. Reduzir as exportações chinesas de minerais essenciais para a fabricação de alta tecnologia também poderia ser um tiro pela culatra, acelerando os esforços liderados pelos EUA para garantir fontes alternativas. A desvalorização da moeda chinesa tornaria as exportações do país mais baratas, compensando o impacto das tarifas. No entanto, é provável que isso acelere a fuga de capitais e prejudique as relações com outros parceiros comerciais.

Como último recurso, Xi poderia aumentar as tensões sobre Taiwan ou no Mar do Sul da China, mas isso corre o risco de galvanizar as alianças dos EUA e convidar uma presença militar americana mais forte na região.

Para capitalizar totalmente as vulnerabilidades atuais da China e garantir vantagens americanas duradouras, o próximo governo Trump deve reconhecer a oportunidade histórica que tem pela frente. O cenário internacional de hoje ecoa os últimos estágios da Guerra Fria, quando o presidente Ronald Reagan enfrentou uma União Soviética enfraquecida e acelerou seu colapso ao forçar Moscou a tomar decisões caras de alocação de recursos que acabaram por levá-la à falência. Isso não quer dizer que o objetivo dos Estados Unidos com a China deva ser a mudança de regime; ao contrário, os Estados Unidos devem ir além da mera coexistência. Devem usar com confiança a força moral e econômica de seu modelo democrático até que os líderes e o povo da China reconheçam que seu sistema é insustentável e adotem um caminho mais livre e menos hostil.

Mas para obter um sucesso duradouro será necessário mais do que pressionar a China. Isso exigirá uma abordagem mais ampla de paz por meio da força que combine a renovação doméstica americana, o aumento dos gastos militares, o dinamismo empresarial e, principalmente, a rede de alianças que Biden revitalizou na Ásia e na Europa. O novo governo precisa entender que essa é uma peça crucial do quebra-cabeça no confronto com a China e garantir que uma abordagem renovada “America First” se concentre no compartilhamento justo de encargos entre os aliados, em vez de tarifas excessivas sobre os aliados ou de questionar os compromissos americanos com acordos de defesa mútua. Isso só prejudicaria a dissuasão e criaria fendas diplomáticas que a China exploraria rapidamente.

O estilo ousado de Trump não é para os fracos de coração. Em uma época de concorrência global acirrada, ele vê o equilíbrio como fraqueza e a coexistência como capitulação. No entanto, se ele conseguir tirar proveito das lições do passado, engajar-se com nossos aliados e manter-se disciplinado, talvez seja louco o suficiente para enfrentar a China - e vencer.

O primeiro mandato de Donald Trump sinalizou uma mudança histórica na política dos EUA em relação à China. Sua combinação estratégica de pressão econômica, imprevisibilidade, sanções e tarifas desequilibrou Pequim. Foi um ponto de virada: Washington passou da aceitação passiva das ambições revisionistas da China para uma oposição assertiva. O governo Biden, sabiamente, manteve e, em alguns casos, ampliou essa estrutura.

O segundo mandato de Trump pode ajudar os Estados Unidos a vencer essa disputa estratégica. A China enfrenta uma série de desafios, especialmente uma economia estagnada, o que a torna vulnerável às táticas assertivas do presidente eleito. Se Trump conseguir aliar o estilo agressivo de seu primeiro mandato à uma estratégia mais focada e a uma disciplina mais rígida, os próximos quatro anos serão uma oportunidade de ouro para manter Pequim na defensiva e transformar permanentemente a rivalidade em favor dos Estados Unidos.

Para a China, o resultado ideal nas eleições dos EUA teria sido mais quatro anos de abordagem cautelosa do governo Biden-Kamala Harris. Embora o presidente Biden mantivesse uma pressão direcionada sobre Pequim, sua ênfase na distensão e aversão à escalada teria proporcionado ao líder chinês, Xi Jinping, a previsibilidade de que ele precisa para lidar com seus problemas domésticos e promover as ambições da China em áreas críticas, como tecnologia, comércio e o futuro de Taiwan.

O então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, cumprimenta o presidente da China, Xi Jinping, após uma reunião bilateral em Osaka, Japão  Foto: Susan Walsh/AP

Mas Trump não está satisfeito em apenas administrar a concorrência com Pequim. Ele pretende vencê-la. Sua abordagem de soma zero e suas táticas não convencionais - bem como um gabinete emergente de políticos linha-dura em relação à China - provavelmente negarão a Xi o espaço para respirar de que ele precisa desesperadamente e empurrarão o líder chinês para um teste de alto risco que ele não pode controlar ou prever facilmente.

Apesar de uma década de projeção de força externa, a China é, de fato, uma potência em declínio, tendo sua ascensão sido desfeita pela má administração, repressão pesada e erros estratégicos de Xi. O país enfrenta uma dívida devastadora, desemprego recorde entre os jovens e uma população que está diminuindo e envelhecendo rapidamente. Sua abordagem orientada por ideologia, que coloca o Partido Comunista Chinês no centro da tomada de decisões econômicas, corroeu a confiança dos empresários, estimulou a fuga de capitais e levou a quedas sem precedentes no investimento estrangeiro.

A era de crescimento altíssimo da China está dando lugar a uma estagnação que lembra a chamada década perdida do Japão, um período de deflação e inércia econômica do qual o Japão ainda não se recuperou totalmente. Até mesmo Xi advertiu os cidadãos no ano passado para que se preparassem para “comer amargura”, uma frase chinesa que indica tempos difíceis que estão por vir.

O presidente da China, Xi Jinping, desembarca em Lima, Peru  Foto: Ernesto Benavides/AFP

A economia dos EUA, enquanto isso, está ganhando impulso, e Trump - que considera o modelo chinês de planejamento centralizado e de fabricação pesada como predatório e prejudicial aos trabalhadores americanos - parece pronto para alavancar agressivamente a força dos EUA, como fez em seu primeiro mandato. Ele propôs tarifas de até 60% sobre as importações chinesas. De acordo com algumas estimativas, isso poderia reduzir em até dois pontos porcentuais o produto interno bruto da China.

A fanfarronice e as bravatas do primeiro mandato de Trump também podem ser de grande valia em relação a Taiwan. O objetivo de Xi é colocar a ilha democraticamente governada sob o domínio chinês, pela força, se necessário. Trump, no entanto, está ameaçando impor tarifas de até 200% sobre os produtos chineses se a China tomar medidas militares. O presidente eleito resumiu melhor a situação quando observou no mês passado que Xi não ousaria provocá-lo em relação a Taiwan porque o líder chinês sabe que ele é “louco”.

Ansiedade

A ansiedade chinesa com o retorno de Trump já está aparecendo. Durante o governo Biden, Pequim sempre adotou um tom desafiador, acusando os Estados Unidos de cerco e contenção. Porém, após a vitória esmagadora de Trump nas eleições, os líderes chineses rapidamente adotaram um tom mais conciliador, pedindo uma coexistência pacífica e uma nova era de cooperação.

No entanto, os Estados Unidos precisam aproveitar o impulso atual, especialmente na disputa de alto risco com a China por tecnologias essenciais, como semicondutores, inteligência artificial, veículos autônomos e computação quântica - os motores da revolução industrial do futuro. Permitir que a China assuma a liderança inclinaria perigosamente a dinâmica do poder global a seu favor, prejudicando a segurança nacional dos EUA.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, cumprimenta o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, na Casa Branca  Foto: Evan Vucci/AP

Trump reconhece esse risco e sinalizou que provavelmente intensificaria as tarifas, os controles de exportação e as sanções sobre os setores de tecnologia e industriais da China que já prejudicaram a economia do país e seu potencial de inovação. Ele também pode defender uma triagem mais rigorosa dos investimentos dos EUA no setor de tecnologia da China, uma estratégia que tem apoio bipartidário e pode impedir o desenvolvimento e a implantação de recursos militares avançados da China.

Xi Jinping está depositando as esperanças econômicas da China em um modelo ultrapassado de fabricação para exportação subsidiado pelo Estado. Mas essa estratégia é altamente vulnerável às tarifas dos EUA. Xi pode apelar para os instintos de negociação de Trump, oferecendo concessões seletivas para atenuar o impacto das tarifas, mas é improvável que isso influencie Trump por muito tempo.

Xi tem suas próprias ferramentas que pode usar, mas quase todas elas são arriscadas. Ele poderia fortalecer sua economia cortando as taxas de juros, ampliando os descontos fiscais ou subsidiando ainda mais os exportadores. Mas esses são remédios de curto prazo que provavelmente piorarão a instabilidade econômica de longo prazo ao inflar a impressionante dívida da China, que atualmente é estimada em quase três vezes o tamanho do PIB do país.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, conversa com o presidente da China, Xi Jinping, em Woodside, California  Foto: Doug Mills/NYT

Retaliação

Xi poderia retaliar restringindo o acesso das empresas americanas aos mercados chineses, mas isso poderia desestabilizar ainda mais os investidores estrangeiros já desconfiados da trajetória econômica da China. Reduzir as exportações chinesas de minerais essenciais para a fabricação de alta tecnologia também poderia ser um tiro pela culatra, acelerando os esforços liderados pelos EUA para garantir fontes alternativas. A desvalorização da moeda chinesa tornaria as exportações do país mais baratas, compensando o impacto das tarifas. No entanto, é provável que isso acelere a fuga de capitais e prejudique as relações com outros parceiros comerciais.

Como último recurso, Xi poderia aumentar as tensões sobre Taiwan ou no Mar do Sul da China, mas isso corre o risco de galvanizar as alianças dos EUA e convidar uma presença militar americana mais forte na região.

Para capitalizar totalmente as vulnerabilidades atuais da China e garantir vantagens americanas duradouras, o próximo governo Trump deve reconhecer a oportunidade histórica que tem pela frente. O cenário internacional de hoje ecoa os últimos estágios da Guerra Fria, quando o presidente Ronald Reagan enfrentou uma União Soviética enfraquecida e acelerou seu colapso ao forçar Moscou a tomar decisões caras de alocação de recursos que acabaram por levá-la à falência. Isso não quer dizer que o objetivo dos Estados Unidos com a China deva ser a mudança de regime; ao contrário, os Estados Unidos devem ir além da mera coexistência. Devem usar com confiança a força moral e econômica de seu modelo democrático até que os líderes e o povo da China reconheçam que seu sistema é insustentável e adotem um caminho mais livre e menos hostil.

Mas para obter um sucesso duradouro será necessário mais do que pressionar a China. Isso exigirá uma abordagem mais ampla de paz por meio da força que combine a renovação doméstica americana, o aumento dos gastos militares, o dinamismo empresarial e, principalmente, a rede de alianças que Biden revitalizou na Ásia e na Europa. O novo governo precisa entender que essa é uma peça crucial do quebra-cabeça no confronto com a China e garantir que uma abordagem renovada “America First” se concentre no compartilhamento justo de encargos entre os aliados, em vez de tarifas excessivas sobre os aliados ou de questionar os compromissos americanos com acordos de defesa mútua. Isso só prejudicaria a dissuasão e criaria fendas diplomáticas que a China exploraria rapidamente.

O estilo ousado de Trump não é para os fracos de coração. Em uma época de concorrência global acirrada, ele vê o equilíbrio como fraqueza e a coexistência como capitulação. No entanto, se ele conseguir tirar proveito das lições do passado, engajar-se com nossos aliados e manter-se disciplinado, talvez seja louco o suficiente para enfrentar a China - e vencer.

O primeiro mandato de Donald Trump sinalizou uma mudança histórica na política dos EUA em relação à China. Sua combinação estratégica de pressão econômica, imprevisibilidade, sanções e tarifas desequilibrou Pequim. Foi um ponto de virada: Washington passou da aceitação passiva das ambições revisionistas da China para uma oposição assertiva. O governo Biden, sabiamente, manteve e, em alguns casos, ampliou essa estrutura.

O segundo mandato de Trump pode ajudar os Estados Unidos a vencer essa disputa estratégica. A China enfrenta uma série de desafios, especialmente uma economia estagnada, o que a torna vulnerável às táticas assertivas do presidente eleito. Se Trump conseguir aliar o estilo agressivo de seu primeiro mandato à uma estratégia mais focada e a uma disciplina mais rígida, os próximos quatro anos serão uma oportunidade de ouro para manter Pequim na defensiva e transformar permanentemente a rivalidade em favor dos Estados Unidos.

Para a China, o resultado ideal nas eleições dos EUA teria sido mais quatro anos de abordagem cautelosa do governo Biden-Kamala Harris. Embora o presidente Biden mantivesse uma pressão direcionada sobre Pequim, sua ênfase na distensão e aversão à escalada teria proporcionado ao líder chinês, Xi Jinping, a previsibilidade de que ele precisa para lidar com seus problemas domésticos e promover as ambições da China em áreas críticas, como tecnologia, comércio e o futuro de Taiwan.

O então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, cumprimenta o presidente da China, Xi Jinping, após uma reunião bilateral em Osaka, Japão  Foto: Susan Walsh/AP

Mas Trump não está satisfeito em apenas administrar a concorrência com Pequim. Ele pretende vencê-la. Sua abordagem de soma zero e suas táticas não convencionais - bem como um gabinete emergente de políticos linha-dura em relação à China - provavelmente negarão a Xi o espaço para respirar de que ele precisa desesperadamente e empurrarão o líder chinês para um teste de alto risco que ele não pode controlar ou prever facilmente.

Apesar de uma década de projeção de força externa, a China é, de fato, uma potência em declínio, tendo sua ascensão sido desfeita pela má administração, repressão pesada e erros estratégicos de Xi. O país enfrenta uma dívida devastadora, desemprego recorde entre os jovens e uma população que está diminuindo e envelhecendo rapidamente. Sua abordagem orientada por ideologia, que coloca o Partido Comunista Chinês no centro da tomada de decisões econômicas, corroeu a confiança dos empresários, estimulou a fuga de capitais e levou a quedas sem precedentes no investimento estrangeiro.

A era de crescimento altíssimo da China está dando lugar a uma estagnação que lembra a chamada década perdida do Japão, um período de deflação e inércia econômica do qual o Japão ainda não se recuperou totalmente. Até mesmo Xi advertiu os cidadãos no ano passado para que se preparassem para “comer amargura”, uma frase chinesa que indica tempos difíceis que estão por vir.

O presidente da China, Xi Jinping, desembarca em Lima, Peru  Foto: Ernesto Benavides/AFP

A economia dos EUA, enquanto isso, está ganhando impulso, e Trump - que considera o modelo chinês de planejamento centralizado e de fabricação pesada como predatório e prejudicial aos trabalhadores americanos - parece pronto para alavancar agressivamente a força dos EUA, como fez em seu primeiro mandato. Ele propôs tarifas de até 60% sobre as importações chinesas. De acordo com algumas estimativas, isso poderia reduzir em até dois pontos porcentuais o produto interno bruto da China.

A fanfarronice e as bravatas do primeiro mandato de Trump também podem ser de grande valia em relação a Taiwan. O objetivo de Xi é colocar a ilha democraticamente governada sob o domínio chinês, pela força, se necessário. Trump, no entanto, está ameaçando impor tarifas de até 200% sobre os produtos chineses se a China tomar medidas militares. O presidente eleito resumiu melhor a situação quando observou no mês passado que Xi não ousaria provocá-lo em relação a Taiwan porque o líder chinês sabe que ele é “louco”.

Ansiedade

A ansiedade chinesa com o retorno de Trump já está aparecendo. Durante o governo Biden, Pequim sempre adotou um tom desafiador, acusando os Estados Unidos de cerco e contenção. Porém, após a vitória esmagadora de Trump nas eleições, os líderes chineses rapidamente adotaram um tom mais conciliador, pedindo uma coexistência pacífica e uma nova era de cooperação.

No entanto, os Estados Unidos precisam aproveitar o impulso atual, especialmente na disputa de alto risco com a China por tecnologias essenciais, como semicondutores, inteligência artificial, veículos autônomos e computação quântica - os motores da revolução industrial do futuro. Permitir que a China assuma a liderança inclinaria perigosamente a dinâmica do poder global a seu favor, prejudicando a segurança nacional dos EUA.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, cumprimenta o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, na Casa Branca  Foto: Evan Vucci/AP

Trump reconhece esse risco e sinalizou que provavelmente intensificaria as tarifas, os controles de exportação e as sanções sobre os setores de tecnologia e industriais da China que já prejudicaram a economia do país e seu potencial de inovação. Ele também pode defender uma triagem mais rigorosa dos investimentos dos EUA no setor de tecnologia da China, uma estratégia que tem apoio bipartidário e pode impedir o desenvolvimento e a implantação de recursos militares avançados da China.

Xi Jinping está depositando as esperanças econômicas da China em um modelo ultrapassado de fabricação para exportação subsidiado pelo Estado. Mas essa estratégia é altamente vulnerável às tarifas dos EUA. Xi pode apelar para os instintos de negociação de Trump, oferecendo concessões seletivas para atenuar o impacto das tarifas, mas é improvável que isso influencie Trump por muito tempo.

Xi tem suas próprias ferramentas que pode usar, mas quase todas elas são arriscadas. Ele poderia fortalecer sua economia cortando as taxas de juros, ampliando os descontos fiscais ou subsidiando ainda mais os exportadores. Mas esses são remédios de curto prazo que provavelmente piorarão a instabilidade econômica de longo prazo ao inflar a impressionante dívida da China, que atualmente é estimada em quase três vezes o tamanho do PIB do país.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, conversa com o presidente da China, Xi Jinping, em Woodside, California  Foto: Doug Mills/NYT

Retaliação

Xi poderia retaliar restringindo o acesso das empresas americanas aos mercados chineses, mas isso poderia desestabilizar ainda mais os investidores estrangeiros já desconfiados da trajetória econômica da China. Reduzir as exportações chinesas de minerais essenciais para a fabricação de alta tecnologia também poderia ser um tiro pela culatra, acelerando os esforços liderados pelos EUA para garantir fontes alternativas. A desvalorização da moeda chinesa tornaria as exportações do país mais baratas, compensando o impacto das tarifas. No entanto, é provável que isso acelere a fuga de capitais e prejudique as relações com outros parceiros comerciais.

Como último recurso, Xi poderia aumentar as tensões sobre Taiwan ou no Mar do Sul da China, mas isso corre o risco de galvanizar as alianças dos EUA e convidar uma presença militar americana mais forte na região.

Para capitalizar totalmente as vulnerabilidades atuais da China e garantir vantagens americanas duradouras, o próximo governo Trump deve reconhecer a oportunidade histórica que tem pela frente. O cenário internacional de hoje ecoa os últimos estágios da Guerra Fria, quando o presidente Ronald Reagan enfrentou uma União Soviética enfraquecida e acelerou seu colapso ao forçar Moscou a tomar decisões caras de alocação de recursos que acabaram por levá-la à falência. Isso não quer dizer que o objetivo dos Estados Unidos com a China deva ser a mudança de regime; ao contrário, os Estados Unidos devem ir além da mera coexistência. Devem usar com confiança a força moral e econômica de seu modelo democrático até que os líderes e o povo da China reconheçam que seu sistema é insustentável e adotem um caminho mais livre e menos hostil.

Mas para obter um sucesso duradouro será necessário mais do que pressionar a China. Isso exigirá uma abordagem mais ampla de paz por meio da força que combine a renovação doméstica americana, o aumento dos gastos militares, o dinamismo empresarial e, principalmente, a rede de alianças que Biden revitalizou na Ásia e na Europa. O novo governo precisa entender que essa é uma peça crucial do quebra-cabeça no confronto com a China e garantir que uma abordagem renovada “America First” se concentre no compartilhamento justo de encargos entre os aliados, em vez de tarifas excessivas sobre os aliados ou de questionar os compromissos americanos com acordos de defesa mútua. Isso só prejudicaria a dissuasão e criaria fendas diplomáticas que a China exploraria rapidamente.

O estilo ousado de Trump não é para os fracos de coração. Em uma época de concorrência global acirrada, ele vê o equilíbrio como fraqueza e a coexistência como capitulação. No entanto, se ele conseguir tirar proveito das lições do passado, engajar-se com nossos aliados e manter-se disciplinado, talvez seja louco o suficiente para enfrentar a China - e vencer.

O primeiro mandato de Donald Trump sinalizou uma mudança histórica na política dos EUA em relação à China. Sua combinação estratégica de pressão econômica, imprevisibilidade, sanções e tarifas desequilibrou Pequim. Foi um ponto de virada: Washington passou da aceitação passiva das ambições revisionistas da China para uma oposição assertiva. O governo Biden, sabiamente, manteve e, em alguns casos, ampliou essa estrutura.

O segundo mandato de Trump pode ajudar os Estados Unidos a vencer essa disputa estratégica. A China enfrenta uma série de desafios, especialmente uma economia estagnada, o que a torna vulnerável às táticas assertivas do presidente eleito. Se Trump conseguir aliar o estilo agressivo de seu primeiro mandato à uma estratégia mais focada e a uma disciplina mais rígida, os próximos quatro anos serão uma oportunidade de ouro para manter Pequim na defensiva e transformar permanentemente a rivalidade em favor dos Estados Unidos.

Para a China, o resultado ideal nas eleições dos EUA teria sido mais quatro anos de abordagem cautelosa do governo Biden-Kamala Harris. Embora o presidente Biden mantivesse uma pressão direcionada sobre Pequim, sua ênfase na distensão e aversão à escalada teria proporcionado ao líder chinês, Xi Jinping, a previsibilidade de que ele precisa para lidar com seus problemas domésticos e promover as ambições da China em áreas críticas, como tecnologia, comércio e o futuro de Taiwan.

O então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, cumprimenta o presidente da China, Xi Jinping, após uma reunião bilateral em Osaka, Japão  Foto: Susan Walsh/AP

Mas Trump não está satisfeito em apenas administrar a concorrência com Pequim. Ele pretende vencê-la. Sua abordagem de soma zero e suas táticas não convencionais - bem como um gabinete emergente de políticos linha-dura em relação à China - provavelmente negarão a Xi o espaço para respirar de que ele precisa desesperadamente e empurrarão o líder chinês para um teste de alto risco que ele não pode controlar ou prever facilmente.

Apesar de uma década de projeção de força externa, a China é, de fato, uma potência em declínio, tendo sua ascensão sido desfeita pela má administração, repressão pesada e erros estratégicos de Xi. O país enfrenta uma dívida devastadora, desemprego recorde entre os jovens e uma população que está diminuindo e envelhecendo rapidamente. Sua abordagem orientada por ideologia, que coloca o Partido Comunista Chinês no centro da tomada de decisões econômicas, corroeu a confiança dos empresários, estimulou a fuga de capitais e levou a quedas sem precedentes no investimento estrangeiro.

A era de crescimento altíssimo da China está dando lugar a uma estagnação que lembra a chamada década perdida do Japão, um período de deflação e inércia econômica do qual o Japão ainda não se recuperou totalmente. Até mesmo Xi advertiu os cidadãos no ano passado para que se preparassem para “comer amargura”, uma frase chinesa que indica tempos difíceis que estão por vir.

O presidente da China, Xi Jinping, desembarca em Lima, Peru  Foto: Ernesto Benavides/AFP

A economia dos EUA, enquanto isso, está ganhando impulso, e Trump - que considera o modelo chinês de planejamento centralizado e de fabricação pesada como predatório e prejudicial aos trabalhadores americanos - parece pronto para alavancar agressivamente a força dos EUA, como fez em seu primeiro mandato. Ele propôs tarifas de até 60% sobre as importações chinesas. De acordo com algumas estimativas, isso poderia reduzir em até dois pontos porcentuais o produto interno bruto da China.

A fanfarronice e as bravatas do primeiro mandato de Trump também podem ser de grande valia em relação a Taiwan. O objetivo de Xi é colocar a ilha democraticamente governada sob o domínio chinês, pela força, se necessário. Trump, no entanto, está ameaçando impor tarifas de até 200% sobre os produtos chineses se a China tomar medidas militares. O presidente eleito resumiu melhor a situação quando observou no mês passado que Xi não ousaria provocá-lo em relação a Taiwan porque o líder chinês sabe que ele é “louco”.

Ansiedade

A ansiedade chinesa com o retorno de Trump já está aparecendo. Durante o governo Biden, Pequim sempre adotou um tom desafiador, acusando os Estados Unidos de cerco e contenção. Porém, após a vitória esmagadora de Trump nas eleições, os líderes chineses rapidamente adotaram um tom mais conciliador, pedindo uma coexistência pacífica e uma nova era de cooperação.

No entanto, os Estados Unidos precisam aproveitar o impulso atual, especialmente na disputa de alto risco com a China por tecnologias essenciais, como semicondutores, inteligência artificial, veículos autônomos e computação quântica - os motores da revolução industrial do futuro. Permitir que a China assuma a liderança inclinaria perigosamente a dinâmica do poder global a seu favor, prejudicando a segurança nacional dos EUA.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, cumprimenta o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, na Casa Branca  Foto: Evan Vucci/AP

Trump reconhece esse risco e sinalizou que provavelmente intensificaria as tarifas, os controles de exportação e as sanções sobre os setores de tecnologia e industriais da China que já prejudicaram a economia do país e seu potencial de inovação. Ele também pode defender uma triagem mais rigorosa dos investimentos dos EUA no setor de tecnologia da China, uma estratégia que tem apoio bipartidário e pode impedir o desenvolvimento e a implantação de recursos militares avançados da China.

Xi Jinping está depositando as esperanças econômicas da China em um modelo ultrapassado de fabricação para exportação subsidiado pelo Estado. Mas essa estratégia é altamente vulnerável às tarifas dos EUA. Xi pode apelar para os instintos de negociação de Trump, oferecendo concessões seletivas para atenuar o impacto das tarifas, mas é improvável que isso influencie Trump por muito tempo.

Xi tem suas próprias ferramentas que pode usar, mas quase todas elas são arriscadas. Ele poderia fortalecer sua economia cortando as taxas de juros, ampliando os descontos fiscais ou subsidiando ainda mais os exportadores. Mas esses são remédios de curto prazo que provavelmente piorarão a instabilidade econômica de longo prazo ao inflar a impressionante dívida da China, que atualmente é estimada em quase três vezes o tamanho do PIB do país.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, conversa com o presidente da China, Xi Jinping, em Woodside, California  Foto: Doug Mills/NYT

Retaliação

Xi poderia retaliar restringindo o acesso das empresas americanas aos mercados chineses, mas isso poderia desestabilizar ainda mais os investidores estrangeiros já desconfiados da trajetória econômica da China. Reduzir as exportações chinesas de minerais essenciais para a fabricação de alta tecnologia também poderia ser um tiro pela culatra, acelerando os esforços liderados pelos EUA para garantir fontes alternativas. A desvalorização da moeda chinesa tornaria as exportações do país mais baratas, compensando o impacto das tarifas. No entanto, é provável que isso acelere a fuga de capitais e prejudique as relações com outros parceiros comerciais.

Como último recurso, Xi poderia aumentar as tensões sobre Taiwan ou no Mar do Sul da China, mas isso corre o risco de galvanizar as alianças dos EUA e convidar uma presença militar americana mais forte na região.

Para capitalizar totalmente as vulnerabilidades atuais da China e garantir vantagens americanas duradouras, o próximo governo Trump deve reconhecer a oportunidade histórica que tem pela frente. O cenário internacional de hoje ecoa os últimos estágios da Guerra Fria, quando o presidente Ronald Reagan enfrentou uma União Soviética enfraquecida e acelerou seu colapso ao forçar Moscou a tomar decisões caras de alocação de recursos que acabaram por levá-la à falência. Isso não quer dizer que o objetivo dos Estados Unidos com a China deva ser a mudança de regime; ao contrário, os Estados Unidos devem ir além da mera coexistência. Devem usar com confiança a força moral e econômica de seu modelo democrático até que os líderes e o povo da China reconheçam que seu sistema é insustentável e adotem um caminho mais livre e menos hostil.

Mas para obter um sucesso duradouro será necessário mais do que pressionar a China. Isso exigirá uma abordagem mais ampla de paz por meio da força que combine a renovação doméstica americana, o aumento dos gastos militares, o dinamismo empresarial e, principalmente, a rede de alianças que Biden revitalizou na Ásia e na Europa. O novo governo precisa entender que essa é uma peça crucial do quebra-cabeça no confronto com a China e garantir que uma abordagem renovada “America First” se concentre no compartilhamento justo de encargos entre os aliados, em vez de tarifas excessivas sobre os aliados ou de questionar os compromissos americanos com acordos de defesa mútua. Isso só prejudicaria a dissuasão e criaria fendas diplomáticas que a China exploraria rapidamente.

O estilo ousado de Trump não é para os fracos de coração. Em uma época de concorrência global acirrada, ele vê o equilíbrio como fraqueza e a coexistência como capitulação. No entanto, se ele conseguir tirar proveito das lições do passado, engajar-se com nossos aliados e manter-se disciplinado, talvez seja louco o suficiente para enfrentar a China - e vencer.

Opinião por Craig Singleton

Singleton é analista de China e membro sênior da Fundação para a Defesa das Democracias em Washington.

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