A empresa Combat Armor Defense do Brasil, cujo presidente é o americano Daniel Beck, conhecido militante trumpista participante da marcha em Washington que terminou no dia 6 de janeiro na invasão do Capitólio, ganhou em dezembro uma licitação de R$ 11,7 milhões para blindar veículos da Polícia Rodoviária Federal (PRF). A contratação ocorreu por pregão eletrônico, para transformações de viaturas da Superintendência da PFR do Rio. A PRF é subordinada ao Ministério da Justiça.
A Combat Armor Defense também venceu uma segunda licitação, no Ministério da Defesa, em 24 de novembro de 2020 para a compra de uma caminhonete blindada no valor de R$ 273 mil, mas a reportagem não encontrou no Portal da Transparência informações sobre a assinatura desse contrato. A empresa se instalou no Brasil em 2019, em Vinhedo (SP), após a eleição de Jair Bolsonaro.
Beck fez campanha para a reeleição de Donald Trump. Ele é adepto de teorias da conspiração que, sem apresentar provas, alegam que a eleição de Joe Biden foi fraudada. Também afirmava em janeiro que Trump teria um segundo mandato, apesar de ter sido derrotado nas eleições de 2020. Defendia ainda o uso da ivermectina contra a covid-19 e dizia que a maior epidemia do mundo hoje é a de pedofilia e não a causada pelo Sars-Cov-2.
O empresário é filho do fundador da empresa, Doyle Beck. Dan Beck esteve presente em Washington, no Trump International Hotel, no dia 5 de janeiro deste ano (véspera da invasão ao Congresso dos EUA) e postou vídeo em suas redes sociais dizendo que havia se encontrado com Rudolph Giuliani, então advogado de Trump, e com Michael Lindell, CEO da empresa Mypillow, conselheiro de Trump. Lindell mantém contatos com o filho do presidente Bolsonaro, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) pelo menos desde 2018. Eduardo estava em Washington naquele dia.
Em seu site, a Combat Armor informa estar presente em 30 países. No Brasil, pretende vender veículos blindados e blindagens para as polícias estaduais e para o Exército. Um de seus principais produtos é uma versão do caveirão, feita por meio da adaptação de um picape. Ela foi testada pelas polícias do Rio, Espírito Santo e Minas. A direção da empresa demonstra ter interesse nos Bolsonaros - entre as 17 pessoas que o perfil dela segue nas redes sociais estão os de toda a família Bolsonaro.
A licitação da PRF que deu origem ao contrato com a empresa dos aliados de Trump foi lançada em dezembro passado e finalizada no mesmo mês. Era na modalidade "Pregão Eletrônico", em que o governo apresenta um preço de referência e sai vencedora a empresa que dá o maior desconto em relação a esse preço. No caso desta compra, não houve desconto.
Segundo dados do Portal da Transparência, a Combat Armor Defense venceu dois itens da disputa (que tinha cinco itens) apresentando o mesmo preço de referência, uma vez que teve adversários. Ela levou o principal item, que consistia na adaptação de 30 Viaturas Blindadas de Operações Táticas (VBOTs), enquanto os demais itens tinham uma viatura cada. Esse lote estava orçado em R$ 11,5 milhões - o outro item incluía a reforma de uma viatura com caçamba por R$ 200 mil.
A outra empresa na disputa - Linkway Importação e Exportação - venceu três itens, num valor total de R$ 610 mil. Até 31 de dezembro, a PRF já havia empenhado R$ 11,1 milhões. Foi a primeira vez que a Combat, criada segundo a Junta Comercial paulista em março de 2019, fez negócios com o governo brasileiro. O Estadão procurou representantes da Combat Armor Defense na sede da empresa. Mas ninguém atendeu. Também procurou ontem a PRF e o Ministério da Defesa.