Um sistema de vigilância global a serviço do bem


Sensores e satélites examinam o planeta como nunca e o dado coletado está cada vez mais barato, um risco para criminosos

Por The Economist

A grande esperança dos anos 1990 e 2000 era que a internet fosse uma força de abertura e liberdade. Conforme a Stewart Brand, uma pioneira das comunidades online definiu, “a informação quer ser livre, porque o custo de divulgá-la fica cada vez mais baixo”. Mas não seria assim. Com frequência, a informação ruim tomou o lugar da informação boa. Estados autoritários cooptaram tecnologias que deveriam ter aliviado a opressão que exerciam. Informação foi usada como arma de guerra. Em meio a essa decepção, um desdobramento dá razão para uma nova esperança: a emergência da era da inteligência de código aberto (Osint).

Novos sensores, de enfadonhas câmeras veiculares ou satélites capazes de enxergar por meio de espectros magnéticos, estão examinando o planeta e sua gente como nunca antes. A informação que eles coletam está cada vez mais barata. Imagens de satélite que custavam vários milhares de dólares 20 anos atrás hoje são com frequência oferecidas gratuitamente e possuem altíssima – e incomparável – qualidade. Obter uma fotografia de qualquer ponto na Terra, seja de um petroleiro encalhado ou de rotas que corredores usam numa cidade, requer poucos cliques. E comunidades online e ferramentas colaborativas, como Slack, permitem a amadores e especialistas dispor dessa cornucópia de dados para resolver mistérios e escancarar transgressões a uma velocidade impressionante.

A Human Rights Watch analisou imagens de satélite para documentar limpeza étnica em Mianmar. Nanossatélites registram o sistema automático de identificação de embarcações usadas em pesca ilegal. Detetives amadores auxiliaram a Europol, a força policial da União Europeia, a investigar a exploração sexual infantil identificando paisagens em fotografias e localizando-as geograficamente. Até fundos de hedge rastreiam rotineiramente os movimentos de executivos em jatos privados, que são monitorados por uma rede de amadores em todo o mundo para prever fusões e aquisições.

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Refugiados da minoria rohingya deixam Mianmar em 2017: imagens de satélite foram usadas para documentar abusos no país Foto: Hannah McKay/Reuters

A Osint, neste sentido, fortalece a sociedade civil e as forças policiais, o que torna os mercados mais eficientes. A tecnologia também é capaz de sujeitar alguns dos países mais poderosos do mundo.

Em face a veementes negações do Kremlin, o Bellingcat, um grupo de investigação, demonstrou meticulosamente o papel da Rússia na derrubada do Voo MH17 da Malaysian Airlines, na Ucrânia, em 2014, usando algumas fotografias, imagens de satélite e geometria elementar. O grupo continuou trabalhando e identificou os agentes russos que tentaram assassinar Serguei Skripal, um ex-espião russo, na Inglaterra, em 2018. Analistas amadores e jornalistas usaram Osint para revelar a real dimensão dos campos de internamento de uigures em Xinjiang. Nas semanas recentes, pesquisadores debruçados sobre imagens de satélite viram a China construindo centenas de silos para mísseis nucleares no deserto.

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Tamanha liberdade de informação promete surtir efeitos profundos. A natureza descentralizada e igualitária da Osint mina o poder de árbitros tradicionais da verdade e da falácia, particularmente governos, seus espiões e soldados. Para aqueles que acreditam que a privacidade pode ser violada facilmente demais pelas pessoas no poder, a Osint é bem-vinda.

A possibilidade de que a verdade venha à tona eleva o custo de delitos cometidos por governos. Ainda que a Osint não seja capaz de impedir a Rússia de invadir a Ucrânia ou evitar que a China construa seus gulags, ela expõe a inconsistência de suas mentiras. Eliot Higgins, fundador do Bellingcat, está correto quando descreve sua organização como “uma agência de inteligência a serviço do povo”. Não surpreende que o chefe de inteligência da Rússia difamou a entidade – mais recentemente, este mês. 

Democracias liberais também serão forçadas a permanecer mais honestas. Cidadãos não terão mais que acreditar, simplesmente, no governo. Meios de comunicação terão novas maneiras de cobrar as autoridades. Os atuais códigos e mecanismos abertos teriam revelado mais detalhes a respeito da acusação do governo Bush, em 2003, de que o Iraque desenvolvia armas químicas, biológicas e nucleares. Isso poderia ter submetido a invasão americana ao país a um escrutínio maior. Poderia até mesmo tê-la evitado. 

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Alguns alertarão que a Osint ameaça a segurança nacional – como quando, por exemplo, pesquisadores usam dados de aplicativos de condicionamento físico para revelar destacamentos avançados da CIA e utilizam radares de satélites para localizar sistemas de defesa antiaérea dos EUA. Se a Osint, porém, pode revelar ao mundo informações desse tipo, o inimigo de um país já tem capacidade de conhecê-las. Fingir que não é assim não contribui para a segurança dos Estados.

Uns afirmarão que a Osint pode errar. Após o atentado na Maratona de Boston, em 2013, usuários da internet vasculharam detalhadamente imagens da cena do crime e identificaram vários suspeitos – todos inocentes. Outros dirão que a Osint poderia ser usada por malfeitores para espalhar notícias falsas e teorias de conspiração.

Toda e qualquer fonte de informação, porém, é falível, e a análise de imagens e dados é mais empírica do que a maioria delas. Neste sentido, quando a Osint for equivocada ou maligna, confrontá-la com outra informação da mesma natureza será com frequência a melhor maneira de corrigir um erro. E com o tempo pesquisadores e investigadores poderão desenvolver reputação de honestidade, análises de som e bom discernimento, facilitando para as pessoas distinguir o charlatanismo de fontes confiáveis de inteligência.

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A maior preocupação é que a explosão de dados por trás das investigações de código aberto também invada a privacidade dos indivíduos. Dados gerados por telefones, vendidos por intermediários, permitiram ao Bellingcat identificar os espiões russos que envenenaram o líder de oposição Alexei Navalni no ano passado. Dados similares foram usados para identificar um graduado sacerdote católico nos EUA, que largou a batina no mês passado após sua localização ser associada ao uso do Grindr, um aplicativo de namoro gay.

Um mundo transparente

A privacidade dos indivíduos na era digital é repleta de concessões. No nível de Estados e organizações da sociedade civil, porém, a Osint promete ser uma força para o bem. E também incontrolável. Antes da invasão do Afeganistão, em 2001, o governo americano era capaz de comprar praticamente todas as imagens de satélite produzidas comercialmente que considerasse relevantes. Hoje em dia, há dados demais disponíveis para que isso seja possível.

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Um mundo em que várias empresas de satélite – americanas, europeias, chinesas e russas – competem para vender imagens é um mundo em que a vigilância mútua está assegurada. Esse é um futuro que as sociedades livres demonstrariam sabedoria em aceitar. Ferramentas e comunidades capazes de descobrir silos de mísseis e revelar espiões tornarão o mundo menos misterioso e um pouco menos perigoso. A informação ainda quer ser livre – e a missão da Osint é libertá-la./ TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

© 2021 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM 

A grande esperança dos anos 1990 e 2000 era que a internet fosse uma força de abertura e liberdade. Conforme a Stewart Brand, uma pioneira das comunidades online definiu, “a informação quer ser livre, porque o custo de divulgá-la fica cada vez mais baixo”. Mas não seria assim. Com frequência, a informação ruim tomou o lugar da informação boa. Estados autoritários cooptaram tecnologias que deveriam ter aliviado a opressão que exerciam. Informação foi usada como arma de guerra. Em meio a essa decepção, um desdobramento dá razão para uma nova esperança: a emergência da era da inteligência de código aberto (Osint).

Novos sensores, de enfadonhas câmeras veiculares ou satélites capazes de enxergar por meio de espectros magnéticos, estão examinando o planeta e sua gente como nunca antes. A informação que eles coletam está cada vez mais barata. Imagens de satélite que custavam vários milhares de dólares 20 anos atrás hoje são com frequência oferecidas gratuitamente e possuem altíssima – e incomparável – qualidade. Obter uma fotografia de qualquer ponto na Terra, seja de um petroleiro encalhado ou de rotas que corredores usam numa cidade, requer poucos cliques. E comunidades online e ferramentas colaborativas, como Slack, permitem a amadores e especialistas dispor dessa cornucópia de dados para resolver mistérios e escancarar transgressões a uma velocidade impressionante.

A Human Rights Watch analisou imagens de satélite para documentar limpeza étnica em Mianmar. Nanossatélites registram o sistema automático de identificação de embarcações usadas em pesca ilegal. Detetives amadores auxiliaram a Europol, a força policial da União Europeia, a investigar a exploração sexual infantil identificando paisagens em fotografias e localizando-as geograficamente. Até fundos de hedge rastreiam rotineiramente os movimentos de executivos em jatos privados, que são monitorados por uma rede de amadores em todo o mundo para prever fusões e aquisições.

Refugiados da minoria rohingya deixam Mianmar em 2017: imagens de satélite foram usadas para documentar abusos no país Foto: Hannah McKay/Reuters

A Osint, neste sentido, fortalece a sociedade civil e as forças policiais, o que torna os mercados mais eficientes. A tecnologia também é capaz de sujeitar alguns dos países mais poderosos do mundo.

Em face a veementes negações do Kremlin, o Bellingcat, um grupo de investigação, demonstrou meticulosamente o papel da Rússia na derrubada do Voo MH17 da Malaysian Airlines, na Ucrânia, em 2014, usando algumas fotografias, imagens de satélite e geometria elementar. O grupo continuou trabalhando e identificou os agentes russos que tentaram assassinar Serguei Skripal, um ex-espião russo, na Inglaterra, em 2018. Analistas amadores e jornalistas usaram Osint para revelar a real dimensão dos campos de internamento de uigures em Xinjiang. Nas semanas recentes, pesquisadores debruçados sobre imagens de satélite viram a China construindo centenas de silos para mísseis nucleares no deserto.

Tamanha liberdade de informação promete surtir efeitos profundos. A natureza descentralizada e igualitária da Osint mina o poder de árbitros tradicionais da verdade e da falácia, particularmente governos, seus espiões e soldados. Para aqueles que acreditam que a privacidade pode ser violada facilmente demais pelas pessoas no poder, a Osint é bem-vinda.

A possibilidade de que a verdade venha à tona eleva o custo de delitos cometidos por governos. Ainda que a Osint não seja capaz de impedir a Rússia de invadir a Ucrânia ou evitar que a China construa seus gulags, ela expõe a inconsistência de suas mentiras. Eliot Higgins, fundador do Bellingcat, está correto quando descreve sua organização como “uma agência de inteligência a serviço do povo”. Não surpreende que o chefe de inteligência da Rússia difamou a entidade – mais recentemente, este mês. 

Democracias liberais também serão forçadas a permanecer mais honestas. Cidadãos não terão mais que acreditar, simplesmente, no governo. Meios de comunicação terão novas maneiras de cobrar as autoridades. Os atuais códigos e mecanismos abertos teriam revelado mais detalhes a respeito da acusação do governo Bush, em 2003, de que o Iraque desenvolvia armas químicas, biológicas e nucleares. Isso poderia ter submetido a invasão americana ao país a um escrutínio maior. Poderia até mesmo tê-la evitado. 

Alguns alertarão que a Osint ameaça a segurança nacional – como quando, por exemplo, pesquisadores usam dados de aplicativos de condicionamento físico para revelar destacamentos avançados da CIA e utilizam radares de satélites para localizar sistemas de defesa antiaérea dos EUA. Se a Osint, porém, pode revelar ao mundo informações desse tipo, o inimigo de um país já tem capacidade de conhecê-las. Fingir que não é assim não contribui para a segurança dos Estados.

Uns afirmarão que a Osint pode errar. Após o atentado na Maratona de Boston, em 2013, usuários da internet vasculharam detalhadamente imagens da cena do crime e identificaram vários suspeitos – todos inocentes. Outros dirão que a Osint poderia ser usada por malfeitores para espalhar notícias falsas e teorias de conspiração.

Toda e qualquer fonte de informação, porém, é falível, e a análise de imagens e dados é mais empírica do que a maioria delas. Neste sentido, quando a Osint for equivocada ou maligna, confrontá-la com outra informação da mesma natureza será com frequência a melhor maneira de corrigir um erro. E com o tempo pesquisadores e investigadores poderão desenvolver reputação de honestidade, análises de som e bom discernimento, facilitando para as pessoas distinguir o charlatanismo de fontes confiáveis de inteligência.

A maior preocupação é que a explosão de dados por trás das investigações de código aberto também invada a privacidade dos indivíduos. Dados gerados por telefones, vendidos por intermediários, permitiram ao Bellingcat identificar os espiões russos que envenenaram o líder de oposição Alexei Navalni no ano passado. Dados similares foram usados para identificar um graduado sacerdote católico nos EUA, que largou a batina no mês passado após sua localização ser associada ao uso do Grindr, um aplicativo de namoro gay.

Um mundo transparente

A privacidade dos indivíduos na era digital é repleta de concessões. No nível de Estados e organizações da sociedade civil, porém, a Osint promete ser uma força para o bem. E também incontrolável. Antes da invasão do Afeganistão, em 2001, o governo americano era capaz de comprar praticamente todas as imagens de satélite produzidas comercialmente que considerasse relevantes. Hoje em dia, há dados demais disponíveis para que isso seja possível.

Um mundo em que várias empresas de satélite – americanas, europeias, chinesas e russas – competem para vender imagens é um mundo em que a vigilância mútua está assegurada. Esse é um futuro que as sociedades livres demonstrariam sabedoria em aceitar. Ferramentas e comunidades capazes de descobrir silos de mísseis e revelar espiões tornarão o mundo menos misterioso e um pouco menos perigoso. A informação ainda quer ser livre – e a missão da Osint é libertá-la./ TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

© 2021 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM 

A grande esperança dos anos 1990 e 2000 era que a internet fosse uma força de abertura e liberdade. Conforme a Stewart Brand, uma pioneira das comunidades online definiu, “a informação quer ser livre, porque o custo de divulgá-la fica cada vez mais baixo”. Mas não seria assim. Com frequência, a informação ruim tomou o lugar da informação boa. Estados autoritários cooptaram tecnologias que deveriam ter aliviado a opressão que exerciam. Informação foi usada como arma de guerra. Em meio a essa decepção, um desdobramento dá razão para uma nova esperança: a emergência da era da inteligência de código aberto (Osint).

Novos sensores, de enfadonhas câmeras veiculares ou satélites capazes de enxergar por meio de espectros magnéticos, estão examinando o planeta e sua gente como nunca antes. A informação que eles coletam está cada vez mais barata. Imagens de satélite que custavam vários milhares de dólares 20 anos atrás hoje são com frequência oferecidas gratuitamente e possuem altíssima – e incomparável – qualidade. Obter uma fotografia de qualquer ponto na Terra, seja de um petroleiro encalhado ou de rotas que corredores usam numa cidade, requer poucos cliques. E comunidades online e ferramentas colaborativas, como Slack, permitem a amadores e especialistas dispor dessa cornucópia de dados para resolver mistérios e escancarar transgressões a uma velocidade impressionante.

A Human Rights Watch analisou imagens de satélite para documentar limpeza étnica em Mianmar. Nanossatélites registram o sistema automático de identificação de embarcações usadas em pesca ilegal. Detetives amadores auxiliaram a Europol, a força policial da União Europeia, a investigar a exploração sexual infantil identificando paisagens em fotografias e localizando-as geograficamente. Até fundos de hedge rastreiam rotineiramente os movimentos de executivos em jatos privados, que são monitorados por uma rede de amadores em todo o mundo para prever fusões e aquisições.

Refugiados da minoria rohingya deixam Mianmar em 2017: imagens de satélite foram usadas para documentar abusos no país Foto: Hannah McKay/Reuters

A Osint, neste sentido, fortalece a sociedade civil e as forças policiais, o que torna os mercados mais eficientes. A tecnologia também é capaz de sujeitar alguns dos países mais poderosos do mundo.

Em face a veementes negações do Kremlin, o Bellingcat, um grupo de investigação, demonstrou meticulosamente o papel da Rússia na derrubada do Voo MH17 da Malaysian Airlines, na Ucrânia, em 2014, usando algumas fotografias, imagens de satélite e geometria elementar. O grupo continuou trabalhando e identificou os agentes russos que tentaram assassinar Serguei Skripal, um ex-espião russo, na Inglaterra, em 2018. Analistas amadores e jornalistas usaram Osint para revelar a real dimensão dos campos de internamento de uigures em Xinjiang. Nas semanas recentes, pesquisadores debruçados sobre imagens de satélite viram a China construindo centenas de silos para mísseis nucleares no deserto.

Tamanha liberdade de informação promete surtir efeitos profundos. A natureza descentralizada e igualitária da Osint mina o poder de árbitros tradicionais da verdade e da falácia, particularmente governos, seus espiões e soldados. Para aqueles que acreditam que a privacidade pode ser violada facilmente demais pelas pessoas no poder, a Osint é bem-vinda.

A possibilidade de que a verdade venha à tona eleva o custo de delitos cometidos por governos. Ainda que a Osint não seja capaz de impedir a Rússia de invadir a Ucrânia ou evitar que a China construa seus gulags, ela expõe a inconsistência de suas mentiras. Eliot Higgins, fundador do Bellingcat, está correto quando descreve sua organização como “uma agência de inteligência a serviço do povo”. Não surpreende que o chefe de inteligência da Rússia difamou a entidade – mais recentemente, este mês. 

Democracias liberais também serão forçadas a permanecer mais honestas. Cidadãos não terão mais que acreditar, simplesmente, no governo. Meios de comunicação terão novas maneiras de cobrar as autoridades. Os atuais códigos e mecanismos abertos teriam revelado mais detalhes a respeito da acusação do governo Bush, em 2003, de que o Iraque desenvolvia armas químicas, biológicas e nucleares. Isso poderia ter submetido a invasão americana ao país a um escrutínio maior. Poderia até mesmo tê-la evitado. 

Alguns alertarão que a Osint ameaça a segurança nacional – como quando, por exemplo, pesquisadores usam dados de aplicativos de condicionamento físico para revelar destacamentos avançados da CIA e utilizam radares de satélites para localizar sistemas de defesa antiaérea dos EUA. Se a Osint, porém, pode revelar ao mundo informações desse tipo, o inimigo de um país já tem capacidade de conhecê-las. Fingir que não é assim não contribui para a segurança dos Estados.

Uns afirmarão que a Osint pode errar. Após o atentado na Maratona de Boston, em 2013, usuários da internet vasculharam detalhadamente imagens da cena do crime e identificaram vários suspeitos – todos inocentes. Outros dirão que a Osint poderia ser usada por malfeitores para espalhar notícias falsas e teorias de conspiração.

Toda e qualquer fonte de informação, porém, é falível, e a análise de imagens e dados é mais empírica do que a maioria delas. Neste sentido, quando a Osint for equivocada ou maligna, confrontá-la com outra informação da mesma natureza será com frequência a melhor maneira de corrigir um erro. E com o tempo pesquisadores e investigadores poderão desenvolver reputação de honestidade, análises de som e bom discernimento, facilitando para as pessoas distinguir o charlatanismo de fontes confiáveis de inteligência.

A maior preocupação é que a explosão de dados por trás das investigações de código aberto também invada a privacidade dos indivíduos. Dados gerados por telefones, vendidos por intermediários, permitiram ao Bellingcat identificar os espiões russos que envenenaram o líder de oposição Alexei Navalni no ano passado. Dados similares foram usados para identificar um graduado sacerdote católico nos EUA, que largou a batina no mês passado após sua localização ser associada ao uso do Grindr, um aplicativo de namoro gay.

Um mundo transparente

A privacidade dos indivíduos na era digital é repleta de concessões. No nível de Estados e organizações da sociedade civil, porém, a Osint promete ser uma força para o bem. E também incontrolável. Antes da invasão do Afeganistão, em 2001, o governo americano era capaz de comprar praticamente todas as imagens de satélite produzidas comercialmente que considerasse relevantes. Hoje em dia, há dados demais disponíveis para que isso seja possível.

Um mundo em que várias empresas de satélite – americanas, europeias, chinesas e russas – competem para vender imagens é um mundo em que a vigilância mútua está assegurada. Esse é um futuro que as sociedades livres demonstrariam sabedoria em aceitar. Ferramentas e comunidades capazes de descobrir silos de mísseis e revelar espiões tornarão o mundo menos misterioso e um pouco menos perigoso. A informação ainda quer ser livre – e a missão da Osint é libertá-la./ TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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