Vitória da oposição na Venezuela ocorreu sem indícios de fraude em atas, mostra estudo dos EUA


Análise estatística das mais de 25 mil atas divulgadas pela coalizão de Edmundo González e María Corina descartou irregularidades nos votos, enquanto o chavismo ainda não divulgou as atas originais

Por Carolina Marins
Atualização:

Menos de um mês depois das eleições presidenciais na Venezuela, o ditador Nicolás Maduro ainda não apresentou as atas de votação que comprovariam a sua contestada vitória certificada pelo Conselho Nacional Eleitoral, que é controlado pelo chavismo. A oposição, porém, continua indo às ruas para defender a vitória de Edmundo González Urrutia, atestada em 80% das atas obtidas por seus partidários diretamente nos colégios eleitorais e divulgadas online. Em meio ao impasse, análises independentes têm atestado os resultados apresentados pela oposição à ditadura chavista.

Um novo estudo, conduzido pelo professor Walter Mebane da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, se debruçou sobre as mais de 25 mil atas de votação divulgadas pela oposição. Com base nesses dados, ele chegou à conclusão de que a chance de os números apresentados pela chapa de González Urrutia serem reais é de 99,97%.

Para isso, o professor utilizou uma técnica de análise de dados eleitorais chamada Eforensics que utiliza a chamada estimativa bayesiana, muito utilizada em análises de pesquisas de intenção de votos, para calcular as probabilidades de diferentes tipos de fraudes em votos individuais.

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A líder da oposição da Venezuela María Corina Machado em um protesto contra os resultados eleitorais em 17 de agosto Foto: Federico Parra/AFP

O método de Mebane utiliza três variáveis no caso venezuelano: eleitores registrados para votar, votos válidos totais e os votos do vencedor. A partir disso, ele analisa se há irregularidades que poderiam estar beneficiando os números do “líder”, que neste caso é Edmundo González.

O cálculo pode apontar três resultados diferentes: sem indícios de fraude, fraude incremental - em pequena escala que altera ligeiramente a contagem dos votos - ou fraude extrema que é capaz de alterar o resultado.

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No caso das eleições de 28 de julho, apenas duas das mais de 25 mil sessões eleitorais apresentaram indícios de fraude, sendo que o número de votos que poderiam ter sido falsos é de 57,9 - um número muito baixo - com índice de confiança de 99,5%. De acordo com o estudo, é provável que nenhum desses votos fraudulentos tenham ido para González Urrutia.

“Outras eleições recentes na Venezuela têm mais fraudes no padrão eforensics e votos fraudulentos [que as de 2024]”, aponta o estudo.

“Como o modelo não gera nenhum aviso de que a estimativa apresenta problemas, posso dizer que isso é uma prova sólida de que a eleição mostrou González vencendo com grande margem de acordo com 80% das atas que foram divulgadas. Isso sem nenhuma fraude”, afirmou Walter Mebane em entrevista ao Estadão.

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O que é fraude, segundo o modelo

Por fraude o modelo interpreta dois tipos: votos fabricados, que deveriam ter sido abstenções ou que foram deliberadamente inseridos para favorecer o líder; e votos roubados, que deveriam ter ido para um candidato para foram contabilizados com outro ou que contou com eleitores falsos.

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“Em muitos países, as listas de eleitores são expandidas com eleitores falsos e então eles votam no dia da eleição, um exemplo disso é a Rússia”, afirma Mebane, que também analisou fraudes eleitorais na Rússia, bem como em outros países como a contestada vitória de Evo Morales na Bolívia em 2019.

O pesquisador alerta, no entanto, que o modelo não é capaz de detectar mudanças de padrões de comportamento, por exemplo, supressão de votos, ou seja, pessoas que foram impedidas de votar, ou eleitores que votaram sob ameaça e coação ou até votos que foram deliberadamente escondidos. Não há, porém, notícias de que isto tenha ocorrido na Venezuela no dia da eleição - apenas antes, com eleitores sendo impedidos de se registrarem.

O modelo analisou os números com base nas atas publicadas pela oposição em um website, já que o Conselho Nacional Eleitoral não divulgou nenhuma ata até hoje. O CNE proclamou Nicolás Maduro como vencedor das eleições com 51% dos votos contra 44% de González.

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Já a oposição, que conseguiu coletar 80% das atas, aponta que González venceu com 67% dos votos. A alegação é suportada por contagens independentes realizadas pela Associated Press, The Washington Post e uma plataforma chamada AltaVista, do qual Mebane também faz parte em conjunto com pesquisadores brasileiros e venezuelanos.

O ditador da Venezuela Nicolás Maduro, acompanhado de Diosdado Cabello, o número 2 de seu partido, e sua esposa Cilia Flores em 17 de agosto Foto: Cristian Hernandez/AP

Veracidade

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É importante ressaltar que o método de Mebane não é capaz de determinar se as atas em si são forjadas, apenas estuda os dados inseridos nelas. No entanto, outras análises das mesmas atas corroboraram sua veracidade. Cada ata possui um QR Code e um código hash que permite identificar sua origem.

As atas são documentos que comprovam os dados da eleição, que no Brasil são sempre coladas nas portas das seções eleitorais ao fim da votação. Na Venezuela, no entanto, cópias são entregues diretamente aos fiscais de urna dos partidos - os chamados testigos.

No domingo de 28 de julho, ao fim da votação, o CNE recebeu todas as atas de votação via um sistema de totalização e deveria deixá-las disponíveis imediatamente após o pleito em seu site e até 48 horas depois deveria publicar os resultados urna por urna. Como essa publicação não ocorreu, a oposição correu para coletas as atas individuais entregue aos fiscais e as divulgou no site “Resultados con Vzla”.

Caso o CNE publique as atas originais, Mebane diz que pretende submeter os documentos à análise do seu modelo.

“Eu vi que o lado do governo não liberou nenhuma evidência que seja para apoiar suas reivindicações, e talvez eles estejam fabricando evidências enquanto falamos. Quanto mais tempo demoram para liberá-la, menos crível será. Se eles liberarem os dados, a versão deles, claro, tentaremos obtê-la e rodar o modelo. Mas neste ponto, é meio que sem valor algum, porque quem sabe como os dados serão?”

Eleições de 2019 da Bolívia

O professor já aplicou o modelo para outras eleições no mundo, incluindo na Rússia, nos EUA, na própria Venezuela em eleições anteriores e na controvertida eleição de 2019 da Bolívia. Neste pleito, Evo Morales havia sido reeleito, mas sua vitória foi contestada e levou a grandes protestos e pedidos das Forças Armadas para que o presidente renunciasse.

Uma auditoria da OEA (Organização dos Estados Americanos) na época apontou indícios de irregularidades, alegação que mais tarde foi contestada por diversos estudos da eleição, incluindo o modelo de Mebane. No fim, Morales renunciou e as eleições foram repetidas em 2020, com seu herdeiro político Luis Arce vendendo a disputa.

O ex-presidente da Bolívia e líder do partido MAS, Evo Morales, em entrevista coletiva em 20 de agosto Foto: Juan Karita/AP

Mebane aplicou o método neste pleito e concluiu que embora tenha ocorrido votos fraudulentos, não foram suficientes para alterar os resultados. Evo Moraes chegou a citar o estudo em suas redes sociais na época.

Segundo sua análise, Evo chegou a receber cerca de 30 mil votos considerados fraudulentos. Considerando que a diferença entre ele e o segundo colocado foi acima de 600 mil votos, o que dava mais de 10 pontos percentuais entre um e outro, o número não era suficiente para mudar a vitória do mandatário.

“Isso significa que é possível mesmo se você remover esses votos identificados como fraude e até se adicioná-los à oposição, possivelmente essa eleição poderia ter sido decidida por uma margem menor, mas 97% das estimativas dizem que isso não é um problema”, diz.

Mebane observa que desde as eleições bolivianas até as da Venezuela este ano o modelo passou por melhorias e hoje tem um grau maior de precisão.

O estudo reforça os alertas que especialistas vem fazendo de que o problema do pleito venezuelano não foi a votação em si, cujo sistema é eletrônico e tem um alto grau de segurança, mas sim o que ocorreu antes e depois de 28 de julho. Isso coloca em xeque a necessidade de repetir o pleito, como sugeriu Luiz Inácio Lula da Silva e Gustavo Petro.

O CNE declarou Maduro vencedor sem nunca ter publicado os dados que corroboram isso, enquanto a oposição fez um apuração paralela que deu um vitória contundente ao apadrinhado da líder María Corina Machado. Diversos países, incluindo os EUA, reconheceram a vitória de González com base nesta apuração paralela. Diferentemente de Brasil e Colômbia, aliados do chavismo, que exigem a publicação das atas por parte do CNE.

Na última quinta-feira, 22, o Tribunal Supremo de Justiça do país, que nunca decide contra o chavismo, ratificou a vitória de Nicolás Maduro, o que voltou a despertar reações internacionais.

Menos de um mês depois das eleições presidenciais na Venezuela, o ditador Nicolás Maduro ainda não apresentou as atas de votação que comprovariam a sua contestada vitória certificada pelo Conselho Nacional Eleitoral, que é controlado pelo chavismo. A oposição, porém, continua indo às ruas para defender a vitória de Edmundo González Urrutia, atestada em 80% das atas obtidas por seus partidários diretamente nos colégios eleitorais e divulgadas online. Em meio ao impasse, análises independentes têm atestado os resultados apresentados pela oposição à ditadura chavista.

Um novo estudo, conduzido pelo professor Walter Mebane da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, se debruçou sobre as mais de 25 mil atas de votação divulgadas pela oposição. Com base nesses dados, ele chegou à conclusão de que a chance de os números apresentados pela chapa de González Urrutia serem reais é de 99,97%.

Para isso, o professor utilizou uma técnica de análise de dados eleitorais chamada Eforensics que utiliza a chamada estimativa bayesiana, muito utilizada em análises de pesquisas de intenção de votos, para calcular as probabilidades de diferentes tipos de fraudes em votos individuais.

A líder da oposição da Venezuela María Corina Machado em um protesto contra os resultados eleitorais em 17 de agosto Foto: Federico Parra/AFP

O método de Mebane utiliza três variáveis no caso venezuelano: eleitores registrados para votar, votos válidos totais e os votos do vencedor. A partir disso, ele analisa se há irregularidades que poderiam estar beneficiando os números do “líder”, que neste caso é Edmundo González.

O cálculo pode apontar três resultados diferentes: sem indícios de fraude, fraude incremental - em pequena escala que altera ligeiramente a contagem dos votos - ou fraude extrema que é capaz de alterar o resultado.

No caso das eleições de 28 de julho, apenas duas das mais de 25 mil sessões eleitorais apresentaram indícios de fraude, sendo que o número de votos que poderiam ter sido falsos é de 57,9 - um número muito baixo - com índice de confiança de 99,5%. De acordo com o estudo, é provável que nenhum desses votos fraudulentos tenham ido para González Urrutia.

“Outras eleições recentes na Venezuela têm mais fraudes no padrão eforensics e votos fraudulentos [que as de 2024]”, aponta o estudo.

“Como o modelo não gera nenhum aviso de que a estimativa apresenta problemas, posso dizer que isso é uma prova sólida de que a eleição mostrou González vencendo com grande margem de acordo com 80% das atas que foram divulgadas. Isso sem nenhuma fraude”, afirmou Walter Mebane em entrevista ao Estadão.

O que é fraude, segundo o modelo

Por fraude o modelo interpreta dois tipos: votos fabricados, que deveriam ter sido abstenções ou que foram deliberadamente inseridos para favorecer o líder; e votos roubados, que deveriam ter ido para um candidato para foram contabilizados com outro ou que contou com eleitores falsos.

“Em muitos países, as listas de eleitores são expandidas com eleitores falsos e então eles votam no dia da eleição, um exemplo disso é a Rússia”, afirma Mebane, que também analisou fraudes eleitorais na Rússia, bem como em outros países como a contestada vitória de Evo Morales na Bolívia em 2019.

O pesquisador alerta, no entanto, que o modelo não é capaz de detectar mudanças de padrões de comportamento, por exemplo, supressão de votos, ou seja, pessoas que foram impedidas de votar, ou eleitores que votaram sob ameaça e coação ou até votos que foram deliberadamente escondidos. Não há, porém, notícias de que isto tenha ocorrido na Venezuela no dia da eleição - apenas antes, com eleitores sendo impedidos de se registrarem.

O modelo analisou os números com base nas atas publicadas pela oposição em um website, já que o Conselho Nacional Eleitoral não divulgou nenhuma ata até hoje. O CNE proclamou Nicolás Maduro como vencedor das eleições com 51% dos votos contra 44% de González.

Já a oposição, que conseguiu coletar 80% das atas, aponta que González venceu com 67% dos votos. A alegação é suportada por contagens independentes realizadas pela Associated Press, The Washington Post e uma plataforma chamada AltaVista, do qual Mebane também faz parte em conjunto com pesquisadores brasileiros e venezuelanos.

O ditador da Venezuela Nicolás Maduro, acompanhado de Diosdado Cabello, o número 2 de seu partido, e sua esposa Cilia Flores em 17 de agosto Foto: Cristian Hernandez/AP

Veracidade

É importante ressaltar que o método de Mebane não é capaz de determinar se as atas em si são forjadas, apenas estuda os dados inseridos nelas. No entanto, outras análises das mesmas atas corroboraram sua veracidade. Cada ata possui um QR Code e um código hash que permite identificar sua origem.

As atas são documentos que comprovam os dados da eleição, que no Brasil são sempre coladas nas portas das seções eleitorais ao fim da votação. Na Venezuela, no entanto, cópias são entregues diretamente aos fiscais de urna dos partidos - os chamados testigos.

No domingo de 28 de julho, ao fim da votação, o CNE recebeu todas as atas de votação via um sistema de totalização e deveria deixá-las disponíveis imediatamente após o pleito em seu site e até 48 horas depois deveria publicar os resultados urna por urna. Como essa publicação não ocorreu, a oposição correu para coletas as atas individuais entregue aos fiscais e as divulgou no site “Resultados con Vzla”.

Caso o CNE publique as atas originais, Mebane diz que pretende submeter os documentos à análise do seu modelo.

“Eu vi que o lado do governo não liberou nenhuma evidência que seja para apoiar suas reivindicações, e talvez eles estejam fabricando evidências enquanto falamos. Quanto mais tempo demoram para liberá-la, menos crível será. Se eles liberarem os dados, a versão deles, claro, tentaremos obtê-la e rodar o modelo. Mas neste ponto, é meio que sem valor algum, porque quem sabe como os dados serão?”

Eleições de 2019 da Bolívia

O professor já aplicou o modelo para outras eleições no mundo, incluindo na Rússia, nos EUA, na própria Venezuela em eleições anteriores e na controvertida eleição de 2019 da Bolívia. Neste pleito, Evo Morales havia sido reeleito, mas sua vitória foi contestada e levou a grandes protestos e pedidos das Forças Armadas para que o presidente renunciasse.

Uma auditoria da OEA (Organização dos Estados Americanos) na época apontou indícios de irregularidades, alegação que mais tarde foi contestada por diversos estudos da eleição, incluindo o modelo de Mebane. No fim, Morales renunciou e as eleições foram repetidas em 2020, com seu herdeiro político Luis Arce vendendo a disputa.

O ex-presidente da Bolívia e líder do partido MAS, Evo Morales, em entrevista coletiva em 20 de agosto Foto: Juan Karita/AP

Mebane aplicou o método neste pleito e concluiu que embora tenha ocorrido votos fraudulentos, não foram suficientes para alterar os resultados. Evo Moraes chegou a citar o estudo em suas redes sociais na época.

Segundo sua análise, Evo chegou a receber cerca de 30 mil votos considerados fraudulentos. Considerando que a diferença entre ele e o segundo colocado foi acima de 600 mil votos, o que dava mais de 10 pontos percentuais entre um e outro, o número não era suficiente para mudar a vitória do mandatário.

“Isso significa que é possível mesmo se você remover esses votos identificados como fraude e até se adicioná-los à oposição, possivelmente essa eleição poderia ter sido decidida por uma margem menor, mas 97% das estimativas dizem que isso não é um problema”, diz.

Mebane observa que desde as eleições bolivianas até as da Venezuela este ano o modelo passou por melhorias e hoje tem um grau maior de precisão.

O estudo reforça os alertas que especialistas vem fazendo de que o problema do pleito venezuelano não foi a votação em si, cujo sistema é eletrônico e tem um alto grau de segurança, mas sim o que ocorreu antes e depois de 28 de julho. Isso coloca em xeque a necessidade de repetir o pleito, como sugeriu Luiz Inácio Lula da Silva e Gustavo Petro.

O CNE declarou Maduro vencedor sem nunca ter publicado os dados que corroboram isso, enquanto a oposição fez um apuração paralela que deu um vitória contundente ao apadrinhado da líder María Corina Machado. Diversos países, incluindo os EUA, reconheceram a vitória de González com base nesta apuração paralela. Diferentemente de Brasil e Colômbia, aliados do chavismo, que exigem a publicação das atas por parte do CNE.

Na última quinta-feira, 22, o Tribunal Supremo de Justiça do país, que nunca decide contra o chavismo, ratificou a vitória de Nicolás Maduro, o que voltou a despertar reações internacionais.

Menos de um mês depois das eleições presidenciais na Venezuela, o ditador Nicolás Maduro ainda não apresentou as atas de votação que comprovariam a sua contestada vitória certificada pelo Conselho Nacional Eleitoral, que é controlado pelo chavismo. A oposição, porém, continua indo às ruas para defender a vitória de Edmundo González Urrutia, atestada em 80% das atas obtidas por seus partidários diretamente nos colégios eleitorais e divulgadas online. Em meio ao impasse, análises independentes têm atestado os resultados apresentados pela oposição à ditadura chavista.

Um novo estudo, conduzido pelo professor Walter Mebane da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, se debruçou sobre as mais de 25 mil atas de votação divulgadas pela oposição. Com base nesses dados, ele chegou à conclusão de que a chance de os números apresentados pela chapa de González Urrutia serem reais é de 99,97%.

Para isso, o professor utilizou uma técnica de análise de dados eleitorais chamada Eforensics que utiliza a chamada estimativa bayesiana, muito utilizada em análises de pesquisas de intenção de votos, para calcular as probabilidades de diferentes tipos de fraudes em votos individuais.

A líder da oposição da Venezuela María Corina Machado em um protesto contra os resultados eleitorais em 17 de agosto Foto: Federico Parra/AFP

O método de Mebane utiliza três variáveis no caso venezuelano: eleitores registrados para votar, votos válidos totais e os votos do vencedor. A partir disso, ele analisa se há irregularidades que poderiam estar beneficiando os números do “líder”, que neste caso é Edmundo González.

O cálculo pode apontar três resultados diferentes: sem indícios de fraude, fraude incremental - em pequena escala que altera ligeiramente a contagem dos votos - ou fraude extrema que é capaz de alterar o resultado.

No caso das eleições de 28 de julho, apenas duas das mais de 25 mil sessões eleitorais apresentaram indícios de fraude, sendo que o número de votos que poderiam ter sido falsos é de 57,9 - um número muito baixo - com índice de confiança de 99,5%. De acordo com o estudo, é provável que nenhum desses votos fraudulentos tenham ido para González Urrutia.

“Outras eleições recentes na Venezuela têm mais fraudes no padrão eforensics e votos fraudulentos [que as de 2024]”, aponta o estudo.

“Como o modelo não gera nenhum aviso de que a estimativa apresenta problemas, posso dizer que isso é uma prova sólida de que a eleição mostrou González vencendo com grande margem de acordo com 80% das atas que foram divulgadas. Isso sem nenhuma fraude”, afirmou Walter Mebane em entrevista ao Estadão.

O que é fraude, segundo o modelo

Por fraude o modelo interpreta dois tipos: votos fabricados, que deveriam ter sido abstenções ou que foram deliberadamente inseridos para favorecer o líder; e votos roubados, que deveriam ter ido para um candidato para foram contabilizados com outro ou que contou com eleitores falsos.

“Em muitos países, as listas de eleitores são expandidas com eleitores falsos e então eles votam no dia da eleição, um exemplo disso é a Rússia”, afirma Mebane, que também analisou fraudes eleitorais na Rússia, bem como em outros países como a contestada vitória de Evo Morales na Bolívia em 2019.

O pesquisador alerta, no entanto, que o modelo não é capaz de detectar mudanças de padrões de comportamento, por exemplo, supressão de votos, ou seja, pessoas que foram impedidas de votar, ou eleitores que votaram sob ameaça e coação ou até votos que foram deliberadamente escondidos. Não há, porém, notícias de que isto tenha ocorrido na Venezuela no dia da eleição - apenas antes, com eleitores sendo impedidos de se registrarem.

O modelo analisou os números com base nas atas publicadas pela oposição em um website, já que o Conselho Nacional Eleitoral não divulgou nenhuma ata até hoje. O CNE proclamou Nicolás Maduro como vencedor das eleições com 51% dos votos contra 44% de González.

Já a oposição, que conseguiu coletar 80% das atas, aponta que González venceu com 67% dos votos. A alegação é suportada por contagens independentes realizadas pela Associated Press, The Washington Post e uma plataforma chamada AltaVista, do qual Mebane também faz parte em conjunto com pesquisadores brasileiros e venezuelanos.

O ditador da Venezuela Nicolás Maduro, acompanhado de Diosdado Cabello, o número 2 de seu partido, e sua esposa Cilia Flores em 17 de agosto Foto: Cristian Hernandez/AP

Veracidade

É importante ressaltar que o método de Mebane não é capaz de determinar se as atas em si são forjadas, apenas estuda os dados inseridos nelas. No entanto, outras análises das mesmas atas corroboraram sua veracidade. Cada ata possui um QR Code e um código hash que permite identificar sua origem.

As atas são documentos que comprovam os dados da eleição, que no Brasil são sempre coladas nas portas das seções eleitorais ao fim da votação. Na Venezuela, no entanto, cópias são entregues diretamente aos fiscais de urna dos partidos - os chamados testigos.

No domingo de 28 de julho, ao fim da votação, o CNE recebeu todas as atas de votação via um sistema de totalização e deveria deixá-las disponíveis imediatamente após o pleito em seu site e até 48 horas depois deveria publicar os resultados urna por urna. Como essa publicação não ocorreu, a oposição correu para coletas as atas individuais entregue aos fiscais e as divulgou no site “Resultados con Vzla”.

Caso o CNE publique as atas originais, Mebane diz que pretende submeter os documentos à análise do seu modelo.

“Eu vi que o lado do governo não liberou nenhuma evidência que seja para apoiar suas reivindicações, e talvez eles estejam fabricando evidências enquanto falamos. Quanto mais tempo demoram para liberá-la, menos crível será. Se eles liberarem os dados, a versão deles, claro, tentaremos obtê-la e rodar o modelo. Mas neste ponto, é meio que sem valor algum, porque quem sabe como os dados serão?”

Eleições de 2019 da Bolívia

O professor já aplicou o modelo para outras eleições no mundo, incluindo na Rússia, nos EUA, na própria Venezuela em eleições anteriores e na controvertida eleição de 2019 da Bolívia. Neste pleito, Evo Morales havia sido reeleito, mas sua vitória foi contestada e levou a grandes protestos e pedidos das Forças Armadas para que o presidente renunciasse.

Uma auditoria da OEA (Organização dos Estados Americanos) na época apontou indícios de irregularidades, alegação que mais tarde foi contestada por diversos estudos da eleição, incluindo o modelo de Mebane. No fim, Morales renunciou e as eleições foram repetidas em 2020, com seu herdeiro político Luis Arce vendendo a disputa.

O ex-presidente da Bolívia e líder do partido MAS, Evo Morales, em entrevista coletiva em 20 de agosto Foto: Juan Karita/AP

Mebane aplicou o método neste pleito e concluiu que embora tenha ocorrido votos fraudulentos, não foram suficientes para alterar os resultados. Evo Moraes chegou a citar o estudo em suas redes sociais na época.

Segundo sua análise, Evo chegou a receber cerca de 30 mil votos considerados fraudulentos. Considerando que a diferença entre ele e o segundo colocado foi acima de 600 mil votos, o que dava mais de 10 pontos percentuais entre um e outro, o número não era suficiente para mudar a vitória do mandatário.

“Isso significa que é possível mesmo se você remover esses votos identificados como fraude e até se adicioná-los à oposição, possivelmente essa eleição poderia ter sido decidida por uma margem menor, mas 97% das estimativas dizem que isso não é um problema”, diz.

Mebane observa que desde as eleições bolivianas até as da Venezuela este ano o modelo passou por melhorias e hoje tem um grau maior de precisão.

O estudo reforça os alertas que especialistas vem fazendo de que o problema do pleito venezuelano não foi a votação em si, cujo sistema é eletrônico e tem um alto grau de segurança, mas sim o que ocorreu antes e depois de 28 de julho. Isso coloca em xeque a necessidade de repetir o pleito, como sugeriu Luiz Inácio Lula da Silva e Gustavo Petro.

O CNE declarou Maduro vencedor sem nunca ter publicado os dados que corroboram isso, enquanto a oposição fez um apuração paralela que deu um vitória contundente ao apadrinhado da líder María Corina Machado. Diversos países, incluindo os EUA, reconheceram a vitória de González com base nesta apuração paralela. Diferentemente de Brasil e Colômbia, aliados do chavismo, que exigem a publicação das atas por parte do CNE.

Na última quinta-feira, 22, o Tribunal Supremo de Justiça do país, que nunca decide contra o chavismo, ratificou a vitória de Nicolás Maduro, o que voltou a despertar reações internacionais.

Menos de um mês depois das eleições presidenciais na Venezuela, o ditador Nicolás Maduro ainda não apresentou as atas de votação que comprovariam a sua contestada vitória certificada pelo Conselho Nacional Eleitoral, que é controlado pelo chavismo. A oposição, porém, continua indo às ruas para defender a vitória de Edmundo González Urrutia, atestada em 80% das atas obtidas por seus partidários diretamente nos colégios eleitorais e divulgadas online. Em meio ao impasse, análises independentes têm atestado os resultados apresentados pela oposição à ditadura chavista.

Um novo estudo, conduzido pelo professor Walter Mebane da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, se debruçou sobre as mais de 25 mil atas de votação divulgadas pela oposição. Com base nesses dados, ele chegou à conclusão de que a chance de os números apresentados pela chapa de González Urrutia serem reais é de 99,97%.

Para isso, o professor utilizou uma técnica de análise de dados eleitorais chamada Eforensics que utiliza a chamada estimativa bayesiana, muito utilizada em análises de pesquisas de intenção de votos, para calcular as probabilidades de diferentes tipos de fraudes em votos individuais.

A líder da oposição da Venezuela María Corina Machado em um protesto contra os resultados eleitorais em 17 de agosto Foto: Federico Parra/AFP

O método de Mebane utiliza três variáveis no caso venezuelano: eleitores registrados para votar, votos válidos totais e os votos do vencedor. A partir disso, ele analisa se há irregularidades que poderiam estar beneficiando os números do “líder”, que neste caso é Edmundo González.

O cálculo pode apontar três resultados diferentes: sem indícios de fraude, fraude incremental - em pequena escala que altera ligeiramente a contagem dos votos - ou fraude extrema que é capaz de alterar o resultado.

No caso das eleições de 28 de julho, apenas duas das mais de 25 mil sessões eleitorais apresentaram indícios de fraude, sendo que o número de votos que poderiam ter sido falsos é de 57,9 - um número muito baixo - com índice de confiança de 99,5%. De acordo com o estudo, é provável que nenhum desses votos fraudulentos tenham ido para González Urrutia.

“Outras eleições recentes na Venezuela têm mais fraudes no padrão eforensics e votos fraudulentos [que as de 2024]”, aponta o estudo.

“Como o modelo não gera nenhum aviso de que a estimativa apresenta problemas, posso dizer que isso é uma prova sólida de que a eleição mostrou González vencendo com grande margem de acordo com 80% das atas que foram divulgadas. Isso sem nenhuma fraude”, afirmou Walter Mebane em entrevista ao Estadão.

O que é fraude, segundo o modelo

Por fraude o modelo interpreta dois tipos: votos fabricados, que deveriam ter sido abstenções ou que foram deliberadamente inseridos para favorecer o líder; e votos roubados, que deveriam ter ido para um candidato para foram contabilizados com outro ou que contou com eleitores falsos.

“Em muitos países, as listas de eleitores são expandidas com eleitores falsos e então eles votam no dia da eleição, um exemplo disso é a Rússia”, afirma Mebane, que também analisou fraudes eleitorais na Rússia, bem como em outros países como a contestada vitória de Evo Morales na Bolívia em 2019.

O pesquisador alerta, no entanto, que o modelo não é capaz de detectar mudanças de padrões de comportamento, por exemplo, supressão de votos, ou seja, pessoas que foram impedidas de votar, ou eleitores que votaram sob ameaça e coação ou até votos que foram deliberadamente escondidos. Não há, porém, notícias de que isto tenha ocorrido na Venezuela no dia da eleição - apenas antes, com eleitores sendo impedidos de se registrarem.

O modelo analisou os números com base nas atas publicadas pela oposição em um website, já que o Conselho Nacional Eleitoral não divulgou nenhuma ata até hoje. O CNE proclamou Nicolás Maduro como vencedor das eleições com 51% dos votos contra 44% de González.

Já a oposição, que conseguiu coletar 80% das atas, aponta que González venceu com 67% dos votos. A alegação é suportada por contagens independentes realizadas pela Associated Press, The Washington Post e uma plataforma chamada AltaVista, do qual Mebane também faz parte em conjunto com pesquisadores brasileiros e venezuelanos.

O ditador da Venezuela Nicolás Maduro, acompanhado de Diosdado Cabello, o número 2 de seu partido, e sua esposa Cilia Flores em 17 de agosto Foto: Cristian Hernandez/AP

Veracidade

É importante ressaltar que o método de Mebane não é capaz de determinar se as atas em si são forjadas, apenas estuda os dados inseridos nelas. No entanto, outras análises das mesmas atas corroboraram sua veracidade. Cada ata possui um QR Code e um código hash que permite identificar sua origem.

As atas são documentos que comprovam os dados da eleição, que no Brasil são sempre coladas nas portas das seções eleitorais ao fim da votação. Na Venezuela, no entanto, cópias são entregues diretamente aos fiscais de urna dos partidos - os chamados testigos.

No domingo de 28 de julho, ao fim da votação, o CNE recebeu todas as atas de votação via um sistema de totalização e deveria deixá-las disponíveis imediatamente após o pleito em seu site e até 48 horas depois deveria publicar os resultados urna por urna. Como essa publicação não ocorreu, a oposição correu para coletas as atas individuais entregue aos fiscais e as divulgou no site “Resultados con Vzla”.

Caso o CNE publique as atas originais, Mebane diz que pretende submeter os documentos à análise do seu modelo.

“Eu vi que o lado do governo não liberou nenhuma evidência que seja para apoiar suas reivindicações, e talvez eles estejam fabricando evidências enquanto falamos. Quanto mais tempo demoram para liberá-la, menos crível será. Se eles liberarem os dados, a versão deles, claro, tentaremos obtê-la e rodar o modelo. Mas neste ponto, é meio que sem valor algum, porque quem sabe como os dados serão?”

Eleições de 2019 da Bolívia

O professor já aplicou o modelo para outras eleições no mundo, incluindo na Rússia, nos EUA, na própria Venezuela em eleições anteriores e na controvertida eleição de 2019 da Bolívia. Neste pleito, Evo Morales havia sido reeleito, mas sua vitória foi contestada e levou a grandes protestos e pedidos das Forças Armadas para que o presidente renunciasse.

Uma auditoria da OEA (Organização dos Estados Americanos) na época apontou indícios de irregularidades, alegação que mais tarde foi contestada por diversos estudos da eleição, incluindo o modelo de Mebane. No fim, Morales renunciou e as eleições foram repetidas em 2020, com seu herdeiro político Luis Arce vendendo a disputa.

O ex-presidente da Bolívia e líder do partido MAS, Evo Morales, em entrevista coletiva em 20 de agosto Foto: Juan Karita/AP

Mebane aplicou o método neste pleito e concluiu que embora tenha ocorrido votos fraudulentos, não foram suficientes para alterar os resultados. Evo Moraes chegou a citar o estudo em suas redes sociais na época.

Segundo sua análise, Evo chegou a receber cerca de 30 mil votos considerados fraudulentos. Considerando que a diferença entre ele e o segundo colocado foi acima de 600 mil votos, o que dava mais de 10 pontos percentuais entre um e outro, o número não era suficiente para mudar a vitória do mandatário.

“Isso significa que é possível mesmo se você remover esses votos identificados como fraude e até se adicioná-los à oposição, possivelmente essa eleição poderia ter sido decidida por uma margem menor, mas 97% das estimativas dizem que isso não é um problema”, diz.

Mebane observa que desde as eleições bolivianas até as da Venezuela este ano o modelo passou por melhorias e hoje tem um grau maior de precisão.

O estudo reforça os alertas que especialistas vem fazendo de que o problema do pleito venezuelano não foi a votação em si, cujo sistema é eletrônico e tem um alto grau de segurança, mas sim o que ocorreu antes e depois de 28 de julho. Isso coloca em xeque a necessidade de repetir o pleito, como sugeriu Luiz Inácio Lula da Silva e Gustavo Petro.

O CNE declarou Maduro vencedor sem nunca ter publicado os dados que corroboram isso, enquanto a oposição fez um apuração paralela que deu um vitória contundente ao apadrinhado da líder María Corina Machado. Diversos países, incluindo os EUA, reconheceram a vitória de González com base nesta apuração paralela. Diferentemente de Brasil e Colômbia, aliados do chavismo, que exigem a publicação das atas por parte do CNE.

Na última quinta-feira, 22, o Tribunal Supremo de Justiça do país, que nunca decide contra o chavismo, ratificou a vitória de Nicolás Maduro, o que voltou a despertar reações internacionais.

Menos de um mês depois das eleições presidenciais na Venezuela, o ditador Nicolás Maduro ainda não apresentou as atas de votação que comprovariam a sua contestada vitória certificada pelo Conselho Nacional Eleitoral, que é controlado pelo chavismo. A oposição, porém, continua indo às ruas para defender a vitória de Edmundo González Urrutia, atestada em 80% das atas obtidas por seus partidários diretamente nos colégios eleitorais e divulgadas online. Em meio ao impasse, análises independentes têm atestado os resultados apresentados pela oposição à ditadura chavista.

Um novo estudo, conduzido pelo professor Walter Mebane da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, se debruçou sobre as mais de 25 mil atas de votação divulgadas pela oposição. Com base nesses dados, ele chegou à conclusão de que a chance de os números apresentados pela chapa de González Urrutia serem reais é de 99,97%.

Para isso, o professor utilizou uma técnica de análise de dados eleitorais chamada Eforensics que utiliza a chamada estimativa bayesiana, muito utilizada em análises de pesquisas de intenção de votos, para calcular as probabilidades de diferentes tipos de fraudes em votos individuais.

A líder da oposição da Venezuela María Corina Machado em um protesto contra os resultados eleitorais em 17 de agosto Foto: Federico Parra/AFP

O método de Mebane utiliza três variáveis no caso venezuelano: eleitores registrados para votar, votos válidos totais e os votos do vencedor. A partir disso, ele analisa se há irregularidades que poderiam estar beneficiando os números do “líder”, que neste caso é Edmundo González.

O cálculo pode apontar três resultados diferentes: sem indícios de fraude, fraude incremental - em pequena escala que altera ligeiramente a contagem dos votos - ou fraude extrema que é capaz de alterar o resultado.

No caso das eleições de 28 de julho, apenas duas das mais de 25 mil sessões eleitorais apresentaram indícios de fraude, sendo que o número de votos que poderiam ter sido falsos é de 57,9 - um número muito baixo - com índice de confiança de 99,5%. De acordo com o estudo, é provável que nenhum desses votos fraudulentos tenham ido para González Urrutia.

“Outras eleições recentes na Venezuela têm mais fraudes no padrão eforensics e votos fraudulentos [que as de 2024]”, aponta o estudo.

“Como o modelo não gera nenhum aviso de que a estimativa apresenta problemas, posso dizer que isso é uma prova sólida de que a eleição mostrou González vencendo com grande margem de acordo com 80% das atas que foram divulgadas. Isso sem nenhuma fraude”, afirmou Walter Mebane em entrevista ao Estadão.

O que é fraude, segundo o modelo

Por fraude o modelo interpreta dois tipos: votos fabricados, que deveriam ter sido abstenções ou que foram deliberadamente inseridos para favorecer o líder; e votos roubados, que deveriam ter ido para um candidato para foram contabilizados com outro ou que contou com eleitores falsos.

“Em muitos países, as listas de eleitores são expandidas com eleitores falsos e então eles votam no dia da eleição, um exemplo disso é a Rússia”, afirma Mebane, que também analisou fraudes eleitorais na Rússia, bem como em outros países como a contestada vitória de Evo Morales na Bolívia em 2019.

O pesquisador alerta, no entanto, que o modelo não é capaz de detectar mudanças de padrões de comportamento, por exemplo, supressão de votos, ou seja, pessoas que foram impedidas de votar, ou eleitores que votaram sob ameaça e coação ou até votos que foram deliberadamente escondidos. Não há, porém, notícias de que isto tenha ocorrido na Venezuela no dia da eleição - apenas antes, com eleitores sendo impedidos de se registrarem.

O modelo analisou os números com base nas atas publicadas pela oposição em um website, já que o Conselho Nacional Eleitoral não divulgou nenhuma ata até hoje. O CNE proclamou Nicolás Maduro como vencedor das eleições com 51% dos votos contra 44% de González.

Já a oposição, que conseguiu coletar 80% das atas, aponta que González venceu com 67% dos votos. A alegação é suportada por contagens independentes realizadas pela Associated Press, The Washington Post e uma plataforma chamada AltaVista, do qual Mebane também faz parte em conjunto com pesquisadores brasileiros e venezuelanos.

O ditador da Venezuela Nicolás Maduro, acompanhado de Diosdado Cabello, o número 2 de seu partido, e sua esposa Cilia Flores em 17 de agosto Foto: Cristian Hernandez/AP

Veracidade

É importante ressaltar que o método de Mebane não é capaz de determinar se as atas em si são forjadas, apenas estuda os dados inseridos nelas. No entanto, outras análises das mesmas atas corroboraram sua veracidade. Cada ata possui um QR Code e um código hash que permite identificar sua origem.

As atas são documentos que comprovam os dados da eleição, que no Brasil são sempre coladas nas portas das seções eleitorais ao fim da votação. Na Venezuela, no entanto, cópias são entregues diretamente aos fiscais de urna dos partidos - os chamados testigos.

No domingo de 28 de julho, ao fim da votação, o CNE recebeu todas as atas de votação via um sistema de totalização e deveria deixá-las disponíveis imediatamente após o pleito em seu site e até 48 horas depois deveria publicar os resultados urna por urna. Como essa publicação não ocorreu, a oposição correu para coletas as atas individuais entregue aos fiscais e as divulgou no site “Resultados con Vzla”.

Caso o CNE publique as atas originais, Mebane diz que pretende submeter os documentos à análise do seu modelo.

“Eu vi que o lado do governo não liberou nenhuma evidência que seja para apoiar suas reivindicações, e talvez eles estejam fabricando evidências enquanto falamos. Quanto mais tempo demoram para liberá-la, menos crível será. Se eles liberarem os dados, a versão deles, claro, tentaremos obtê-la e rodar o modelo. Mas neste ponto, é meio que sem valor algum, porque quem sabe como os dados serão?”

Eleições de 2019 da Bolívia

O professor já aplicou o modelo para outras eleições no mundo, incluindo na Rússia, nos EUA, na própria Venezuela em eleições anteriores e na controvertida eleição de 2019 da Bolívia. Neste pleito, Evo Morales havia sido reeleito, mas sua vitória foi contestada e levou a grandes protestos e pedidos das Forças Armadas para que o presidente renunciasse.

Uma auditoria da OEA (Organização dos Estados Americanos) na época apontou indícios de irregularidades, alegação que mais tarde foi contestada por diversos estudos da eleição, incluindo o modelo de Mebane. No fim, Morales renunciou e as eleições foram repetidas em 2020, com seu herdeiro político Luis Arce vendendo a disputa.

O ex-presidente da Bolívia e líder do partido MAS, Evo Morales, em entrevista coletiva em 20 de agosto Foto: Juan Karita/AP

Mebane aplicou o método neste pleito e concluiu que embora tenha ocorrido votos fraudulentos, não foram suficientes para alterar os resultados. Evo Moraes chegou a citar o estudo em suas redes sociais na época.

Segundo sua análise, Evo chegou a receber cerca de 30 mil votos considerados fraudulentos. Considerando que a diferença entre ele e o segundo colocado foi acima de 600 mil votos, o que dava mais de 10 pontos percentuais entre um e outro, o número não era suficiente para mudar a vitória do mandatário.

“Isso significa que é possível mesmo se você remover esses votos identificados como fraude e até se adicioná-los à oposição, possivelmente essa eleição poderia ter sido decidida por uma margem menor, mas 97% das estimativas dizem que isso não é um problema”, diz.

Mebane observa que desde as eleições bolivianas até as da Venezuela este ano o modelo passou por melhorias e hoje tem um grau maior de precisão.

O estudo reforça os alertas que especialistas vem fazendo de que o problema do pleito venezuelano não foi a votação em si, cujo sistema é eletrônico e tem um alto grau de segurança, mas sim o que ocorreu antes e depois de 28 de julho. Isso coloca em xeque a necessidade de repetir o pleito, como sugeriu Luiz Inácio Lula da Silva e Gustavo Petro.

O CNE declarou Maduro vencedor sem nunca ter publicado os dados que corroboram isso, enquanto a oposição fez um apuração paralela que deu um vitória contundente ao apadrinhado da líder María Corina Machado. Diversos países, incluindo os EUA, reconheceram a vitória de González com base nesta apuração paralela. Diferentemente de Brasil e Colômbia, aliados do chavismo, que exigem a publicação das atas por parte do CNE.

Na última quinta-feira, 22, o Tribunal Supremo de Justiça do país, que nunca decide contra o chavismo, ratificou a vitória de Nicolás Maduro, o que voltou a despertar reações internacionais.

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