Adolescentes ‘luditas’: Eles abandonaram seus smartphones e fogem das redes sociais


Quando a única coisa melhor do que um celular flip é não ter nenhum telefone.

Por Alex Vadukul

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Em um domingo recente, um grupo de adolescentes se reuniu nos degraus da Biblioteca Central no Brooklyn para a reunião semanal do Luddite Club (“Clube Ludita”), um grupo do ensino médio que promove um estilo de vida de autolibertação das redes sociais e da tecnologia. Enquanto os doze adolescentes se dirigiam para o Prospect Park, eles esconderam seus iPhones - ou, no caso dos membros mais devotos, seus celulares flip, que alguns decoraram com adesivos e esmaltes.

Eles marcharam colina acima em direção ao local de sempre, um monte de terra longe das multidões do parque. Entre eles estava Odille Zexter-Kaiser, aluna do último ano da Edward R. Murrow High School, que se arrastava pelas folhas usando calçados Doc Martens e meias de lã que não combinavam.

“Não é visto com bons olhos se alguém não aparecer”, disse Odille. “Estamos aqui todos os domingos, faça chuva ou faça sol, ou mesmo neve. Nós não mantemos contato uns com os outros, então você tem que aparecer.”

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Depois que os membros do clube juntaram toras para formar um círculo, eles se sentaram e se retiraram para uma bolha de serenidade.

Clementine Karlin-Pustilnik, Odille Zexter-Kaiser e Jameson Butler em uma reunião recente do Luddite Club em Prospect Park, no Brooklyn. Foto: Scott Rossi/The New York Times

Alguns desenhavam em cadernos. Outros pintavam com um kit de aquarela. Um deles fechou os olhos para ouvir o vento. Muitos leram atentamente - os livros em suas mochilas incluíam Crime e Castigo de Fiódor Dostoiévski, Maus II de Art Spiegelman e A Consolação da Filosofia de Boécio. Os membros do clube citam escritores libertinos como Hunter S. Thompson e Jack Kerouac como heróis, e eles gostam de obras que condenam a tecnologia, como Piano Mecânico de Kurt Vonnegut. Arthur, o porco-formigueiro de óculos da PBS, é o mascote deles.

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“Muitos de nós lemos este livro chamado Na Natureza Selvagem”, disse Lola Shub, aluna do último ano da Essex Street Academy, referindo-se ao livro de não ficção de Jon Krakauer de 1996 sobre Chris McCandless, um nômade que morreu enquanto tentava viver da terra no deserto do Alasca. “Todos nós temos essa teoria de que não devemos ficar confinados apenas a prédios e trabalho. E aquele cara estava experimentando a vida. A vida real. Redes sociais e telefones não são a vida real.

“Quando recebi meu celular flip, as coisas mudaram instantaneamente”, continuou Lola. “Comecei a usar meu cérebro. Isso me fez me observar como pessoa. Eu tenho tentado escrever um livro também. Tenho 12 páginas agora.”

Os membros do clube discutiram brevemente como estava indo a divulgação do evangelho ludita. Fundado no ano passado por outra aluna da Murrow High School, Logan Lane, o clube leva o nome de Ned Ludd, o folclórico trabalhador têxtil inglês do século 18 que supostamente quebrou um tear mecanizado, inspirando outros a adotar seu nome e se revoltar contra a industrialização.

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O Luddite Club tem se reunido uma vez por semana. “É um pouco desaprovado se alguém não aparecer”, disse um membro. Foto: Scott Rossi/The New York Times

“Acabei de realizar a primeira reunião ludita bem-sucedida em Beacon”, disse Biruk Watling, aluno do último ano da Beacon High School, em Manhattan, que usa um celular flip pintado de verde com a foto de uma Lauryn Hill da era Fugees.

“Ouvi dizer que está se espalhando no Brooklyn Tech”, disse outra pessoa.

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Alguns membros levaram um tempo para exaltar os benefícios de se tornar ludita.

Jameson Butler, um estudante com uma camiseta do Black Flag que estava esculpindo um pedaço de madeira com um canivete, explicou: “Eu exclui aqueles de quem quero ser amigo. Agora me dá trabalho manter amizades. Alguns entraram em contato quando desliguei o iPhone e disseram: ‘Não gosto mais de enviar mensagens de texto para você porque suas mensagens são verdes’. Isso me disse muito”.

Vee De La Cruz, que tinha uma cópia de As Almas do Povo Negro de W.E.B. Du Bois, disse: “Você publica algo nas redes sociais, não recebe curtidas suficientes e não se sente bem consigo mesmo. Isso não deveria acontecer com ninguém.

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“Estar neste clube me lembra que estamos todos vivendo em uma rocha flutuante e que tudo ficará bem.”

Logan Lane, fundadora do clube, em seu quarto. O movimento que ela iniciou na Murrow High School, no Brooklyn, se espalhou para outras escolas de Nova York. Foto: Scott Rossi/The New York Times

Alguns dias antes do encontro, depois de serem dispensados às 15h da Murrow High School, uma enxurrada de alunos emergiu do prédio para a rua. Muitos deles estavam olhando para seus smartphones, mas não Logan Lane, a fundadora de 17 anos do Luddite Club.

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No quarteirão da escola, ela se sentou para uma entrevista em uma cafeteria Chock full o’Nuts. Ela usava uma jaqueta folgada de veludo cotelê e jeans acolchoados que ela mesma havia costurado com uma máquina Singer.

“Temos problemas para recrutar membros”, ela disse, “mas realmente não nos importamos. Todos nós nos unimos por esta causa única. Para estar no Luddite Club, há um certo nível de desajuste.” Ela acrescentou: “Mas nem sempre fui uma ludita, é claro”.

Tudo começou durante o lockdown, ela disse, quando seu uso de redes sociais deu uma guinada preocupante.

“Fiquei completamente absorvida”, ela disse. “Eu não conseguia deixar de postar uma boa foto se tivesse uma. E eu tinha essa personalidade online de ‘não me importo’, mas na verdade me importava. Eu definitivamente estava assistindo a tudo.”

Um pôster do Luddite Club no quarto de Logan Lane com o slogan do clube “Não seja falso”. Foto: Scott Rossi/The New York Times

Por fim, cansada demais para passar por mais uma selfie perfeita no Instagram, ela excluiu o aplicativo.

“Mas isso não foi o suficiente”, ela disse. “Então coloquei meu telefone em uma caixa.”

Pela primeira vez, ela experimentou a vida na cidade como uma adolescente sem um iPhone. Ela pegava romances emprestados da biblioteca e os lia sozinha no parque. Ela começou a admirar os grafites quando andava de metrô, depois conheceu alguns adolescentes que a ensinaram a pintar com spray em um pátio de trens de carga no Queens. E ela começou a acordar sem despertador às 7 da manhã, não mais adormecendo com o brilho do telefone à meia-noite. Uma vez, como ela escreveu mais tarde em um texto intitulado “Manifesto Ludita”, ela pensou em jogar seu iPhone no Canal Gowanus.

Enquanto os pais de Logan apreciavam sua metamorfose, especialmente porque ela voltava regularmente para casa para jantar para contar suas andanças, eles ficavam angustiados por não poderem saber da filha em uma noite de sexta-feira. E depois que ela convenientemente perdeu o smartphone que eles pediram que ela levasse a Paris para um programa de verão no exterior, eles ficaram perturbados. Eles acabaram insistindo para que ela pelo menos começasse a carregar um celular flip.

“Para estar no Luddite Club, há um certo nível de desajuste”, disse Logan. Foto: Scott Rossi/The New York Times

“Ainda desejo não ter telefone algum”, ela disse. “Meus pais são tão viciados. Minha mãe entrou no Twitter e eu vi isso destruí-la. Mas acho que também gosto, porque me sinto um pouco superior a eles.”

Hoje, o clube tem cerca de 25 membros, e a filial de Murrow se reúne na escola todas as terças-feiras. Eles dão as boas-vindas aos alunos que ainda não desistiram de seus iPhones, oferecendo-lhes o desafio de ignorar seus aparelhos para a reunião de uma hora (para que não atraiam caras feias dos teimosos). Nas reuniões de domingo no parque, os luditas costumam montar redes para ler quando o tempo está bom.

Enquanto Logan contava a história da origem do clube comendo um croissant de amêndoas na cafeteria, um novo membro, Julian, apareceu. Embora ainda não tivesse mudado para um celular flip, ele disse que já estava se beneficiando da mensagem do grupo. Então ele brincou com Logan sobre uma crítica que um aluno havia feito sobre o clube.

“Um garoto disse que é classista”, ele disse. “Acho que o clube é legal, porque tenho uma folga do meu telefone, mas entendo o ponto de vista deles. Alguns de nós precisam da tecnologia para sermos incluídos na sociedade. Alguns de nós precisam de um telefone”.

“Recebemos reações negativas”, respondeu Logan. “O argumento que ouvi é que somos um monte de crianças ricas e esperar que todos abandonem seus telefones é coisa de privilegiado”.

Depois que Julian saiu, Logan admitiu que ela debateu o assunto e que o tema gerou uma discussão acalorada entre os membros do clube.

Odille, Clementine, Jameson, Logan e Max Frackman a caminho de sua reunião semanal. Foto: Scott Rossi/The New York Times

“Fiquei muito desanimada quando ouvi a coisa classista e quase pronta para me despedir do clube”, ela disse. “Conversei com meu conselheiro, porém, e ele me disse que a maioria das revoluções realmente começa com pessoas de origens industriais, como Che Guevara.

“Não esperamos que todos tenham um celular flip. Vemos apenas um problema de saúde mental e uso de telas”.

Em uma rua arborizada no bairro de Cobble Hill, ela entrou na casa de sua família, onde foi saudada por uma Goldendoodle chamada Phoebe, e correu escada acima para seu quarto. A decoração refletia seus interesses: havia pilhas de livros, paredes grafitadas e, além da máquina de costura, uma máquina de escrever Royal e um toca-fitas Sony.

Na sala de estar do andar de baixo, seu pai, Seth Lane, um executivo que trabalha com tecnologia da informação, sentou-se ao lado de uma lareira e refletiu sobre a jornada de sua filha.

“Estou orgulhoso dela e do que o clube representa”, ele disse. “Mas também há a parte dos pais, e não sabemos onde está nosso filho. Você segue seus filhos agora. Você os rastreia. É um pouco orwelliano, eu acho, mas somos a geração de pais helicópteros. Então, quando ela se livrou do iPhone, isso inicialmente foi um problema para nós .”

Ele tinha ouvido falar das preocupações do Luddite Club sobre questões de privilégio.

“Bem, é classista fazer as pessoas precisarem ter smartphones também, certo?” Lane disse. “Eu acho que eles estão tendo uma ótima conversa. Não há resposta certa.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Em um domingo recente, um grupo de adolescentes se reuniu nos degraus da Biblioteca Central no Brooklyn para a reunião semanal do Luddite Club (“Clube Ludita”), um grupo do ensino médio que promove um estilo de vida de autolibertação das redes sociais e da tecnologia. Enquanto os doze adolescentes se dirigiam para o Prospect Park, eles esconderam seus iPhones - ou, no caso dos membros mais devotos, seus celulares flip, que alguns decoraram com adesivos e esmaltes.

Eles marcharam colina acima em direção ao local de sempre, um monte de terra longe das multidões do parque. Entre eles estava Odille Zexter-Kaiser, aluna do último ano da Edward R. Murrow High School, que se arrastava pelas folhas usando calçados Doc Martens e meias de lã que não combinavam.

“Não é visto com bons olhos se alguém não aparecer”, disse Odille. “Estamos aqui todos os domingos, faça chuva ou faça sol, ou mesmo neve. Nós não mantemos contato uns com os outros, então você tem que aparecer.”

Depois que os membros do clube juntaram toras para formar um círculo, eles se sentaram e se retiraram para uma bolha de serenidade.

Clementine Karlin-Pustilnik, Odille Zexter-Kaiser e Jameson Butler em uma reunião recente do Luddite Club em Prospect Park, no Brooklyn. Foto: Scott Rossi/The New York Times

Alguns desenhavam em cadernos. Outros pintavam com um kit de aquarela. Um deles fechou os olhos para ouvir o vento. Muitos leram atentamente - os livros em suas mochilas incluíam Crime e Castigo de Fiódor Dostoiévski, Maus II de Art Spiegelman e A Consolação da Filosofia de Boécio. Os membros do clube citam escritores libertinos como Hunter S. Thompson e Jack Kerouac como heróis, e eles gostam de obras que condenam a tecnologia, como Piano Mecânico de Kurt Vonnegut. Arthur, o porco-formigueiro de óculos da PBS, é o mascote deles.

“Muitos de nós lemos este livro chamado Na Natureza Selvagem”, disse Lola Shub, aluna do último ano da Essex Street Academy, referindo-se ao livro de não ficção de Jon Krakauer de 1996 sobre Chris McCandless, um nômade que morreu enquanto tentava viver da terra no deserto do Alasca. “Todos nós temos essa teoria de que não devemos ficar confinados apenas a prédios e trabalho. E aquele cara estava experimentando a vida. A vida real. Redes sociais e telefones não são a vida real.

“Quando recebi meu celular flip, as coisas mudaram instantaneamente”, continuou Lola. “Comecei a usar meu cérebro. Isso me fez me observar como pessoa. Eu tenho tentado escrever um livro também. Tenho 12 páginas agora.”

Os membros do clube discutiram brevemente como estava indo a divulgação do evangelho ludita. Fundado no ano passado por outra aluna da Murrow High School, Logan Lane, o clube leva o nome de Ned Ludd, o folclórico trabalhador têxtil inglês do século 18 que supostamente quebrou um tear mecanizado, inspirando outros a adotar seu nome e se revoltar contra a industrialização.

O Luddite Club tem se reunido uma vez por semana. “É um pouco desaprovado se alguém não aparecer”, disse um membro. Foto: Scott Rossi/The New York Times

“Acabei de realizar a primeira reunião ludita bem-sucedida em Beacon”, disse Biruk Watling, aluno do último ano da Beacon High School, em Manhattan, que usa um celular flip pintado de verde com a foto de uma Lauryn Hill da era Fugees.

“Ouvi dizer que está se espalhando no Brooklyn Tech”, disse outra pessoa.

Alguns membros levaram um tempo para exaltar os benefícios de se tornar ludita.

Jameson Butler, um estudante com uma camiseta do Black Flag que estava esculpindo um pedaço de madeira com um canivete, explicou: “Eu exclui aqueles de quem quero ser amigo. Agora me dá trabalho manter amizades. Alguns entraram em contato quando desliguei o iPhone e disseram: ‘Não gosto mais de enviar mensagens de texto para você porque suas mensagens são verdes’. Isso me disse muito”.

Vee De La Cruz, que tinha uma cópia de As Almas do Povo Negro de W.E.B. Du Bois, disse: “Você publica algo nas redes sociais, não recebe curtidas suficientes e não se sente bem consigo mesmo. Isso não deveria acontecer com ninguém.

“Estar neste clube me lembra que estamos todos vivendo em uma rocha flutuante e que tudo ficará bem.”

Logan Lane, fundadora do clube, em seu quarto. O movimento que ela iniciou na Murrow High School, no Brooklyn, se espalhou para outras escolas de Nova York. Foto: Scott Rossi/The New York Times

Alguns dias antes do encontro, depois de serem dispensados às 15h da Murrow High School, uma enxurrada de alunos emergiu do prédio para a rua. Muitos deles estavam olhando para seus smartphones, mas não Logan Lane, a fundadora de 17 anos do Luddite Club.

No quarteirão da escola, ela se sentou para uma entrevista em uma cafeteria Chock full o’Nuts. Ela usava uma jaqueta folgada de veludo cotelê e jeans acolchoados que ela mesma havia costurado com uma máquina Singer.

“Temos problemas para recrutar membros”, ela disse, “mas realmente não nos importamos. Todos nós nos unimos por esta causa única. Para estar no Luddite Club, há um certo nível de desajuste.” Ela acrescentou: “Mas nem sempre fui uma ludita, é claro”.

Tudo começou durante o lockdown, ela disse, quando seu uso de redes sociais deu uma guinada preocupante.

“Fiquei completamente absorvida”, ela disse. “Eu não conseguia deixar de postar uma boa foto se tivesse uma. E eu tinha essa personalidade online de ‘não me importo’, mas na verdade me importava. Eu definitivamente estava assistindo a tudo.”

Um pôster do Luddite Club no quarto de Logan Lane com o slogan do clube “Não seja falso”. Foto: Scott Rossi/The New York Times

Por fim, cansada demais para passar por mais uma selfie perfeita no Instagram, ela excluiu o aplicativo.

“Mas isso não foi o suficiente”, ela disse. “Então coloquei meu telefone em uma caixa.”

Pela primeira vez, ela experimentou a vida na cidade como uma adolescente sem um iPhone. Ela pegava romances emprestados da biblioteca e os lia sozinha no parque. Ela começou a admirar os grafites quando andava de metrô, depois conheceu alguns adolescentes que a ensinaram a pintar com spray em um pátio de trens de carga no Queens. E ela começou a acordar sem despertador às 7 da manhã, não mais adormecendo com o brilho do telefone à meia-noite. Uma vez, como ela escreveu mais tarde em um texto intitulado “Manifesto Ludita”, ela pensou em jogar seu iPhone no Canal Gowanus.

Enquanto os pais de Logan apreciavam sua metamorfose, especialmente porque ela voltava regularmente para casa para jantar para contar suas andanças, eles ficavam angustiados por não poderem saber da filha em uma noite de sexta-feira. E depois que ela convenientemente perdeu o smartphone que eles pediram que ela levasse a Paris para um programa de verão no exterior, eles ficaram perturbados. Eles acabaram insistindo para que ela pelo menos começasse a carregar um celular flip.

“Para estar no Luddite Club, há um certo nível de desajuste”, disse Logan. Foto: Scott Rossi/The New York Times

“Ainda desejo não ter telefone algum”, ela disse. “Meus pais são tão viciados. Minha mãe entrou no Twitter e eu vi isso destruí-la. Mas acho que também gosto, porque me sinto um pouco superior a eles.”

Hoje, o clube tem cerca de 25 membros, e a filial de Murrow se reúne na escola todas as terças-feiras. Eles dão as boas-vindas aos alunos que ainda não desistiram de seus iPhones, oferecendo-lhes o desafio de ignorar seus aparelhos para a reunião de uma hora (para que não atraiam caras feias dos teimosos). Nas reuniões de domingo no parque, os luditas costumam montar redes para ler quando o tempo está bom.

Enquanto Logan contava a história da origem do clube comendo um croissant de amêndoas na cafeteria, um novo membro, Julian, apareceu. Embora ainda não tivesse mudado para um celular flip, ele disse que já estava se beneficiando da mensagem do grupo. Então ele brincou com Logan sobre uma crítica que um aluno havia feito sobre o clube.

“Um garoto disse que é classista”, ele disse. “Acho que o clube é legal, porque tenho uma folga do meu telefone, mas entendo o ponto de vista deles. Alguns de nós precisam da tecnologia para sermos incluídos na sociedade. Alguns de nós precisam de um telefone”.

“Recebemos reações negativas”, respondeu Logan. “O argumento que ouvi é que somos um monte de crianças ricas e esperar que todos abandonem seus telefones é coisa de privilegiado”.

Depois que Julian saiu, Logan admitiu que ela debateu o assunto e que o tema gerou uma discussão acalorada entre os membros do clube.

Odille, Clementine, Jameson, Logan e Max Frackman a caminho de sua reunião semanal. Foto: Scott Rossi/The New York Times

“Fiquei muito desanimada quando ouvi a coisa classista e quase pronta para me despedir do clube”, ela disse. “Conversei com meu conselheiro, porém, e ele me disse que a maioria das revoluções realmente começa com pessoas de origens industriais, como Che Guevara.

“Não esperamos que todos tenham um celular flip. Vemos apenas um problema de saúde mental e uso de telas”.

Em uma rua arborizada no bairro de Cobble Hill, ela entrou na casa de sua família, onde foi saudada por uma Goldendoodle chamada Phoebe, e correu escada acima para seu quarto. A decoração refletia seus interesses: havia pilhas de livros, paredes grafitadas e, além da máquina de costura, uma máquina de escrever Royal e um toca-fitas Sony.

Na sala de estar do andar de baixo, seu pai, Seth Lane, um executivo que trabalha com tecnologia da informação, sentou-se ao lado de uma lareira e refletiu sobre a jornada de sua filha.

“Estou orgulhoso dela e do que o clube representa”, ele disse. “Mas também há a parte dos pais, e não sabemos onde está nosso filho. Você segue seus filhos agora. Você os rastreia. É um pouco orwelliano, eu acho, mas somos a geração de pais helicópteros. Então, quando ela se livrou do iPhone, isso inicialmente foi um problema para nós .”

Ele tinha ouvido falar das preocupações do Luddite Club sobre questões de privilégio.

“Bem, é classista fazer as pessoas precisarem ter smartphones também, certo?” Lane disse. “Eu acho que eles estão tendo uma ótima conversa. Não há resposta certa.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Em um domingo recente, um grupo de adolescentes se reuniu nos degraus da Biblioteca Central no Brooklyn para a reunião semanal do Luddite Club (“Clube Ludita”), um grupo do ensino médio que promove um estilo de vida de autolibertação das redes sociais e da tecnologia. Enquanto os doze adolescentes se dirigiam para o Prospect Park, eles esconderam seus iPhones - ou, no caso dos membros mais devotos, seus celulares flip, que alguns decoraram com adesivos e esmaltes.

Eles marcharam colina acima em direção ao local de sempre, um monte de terra longe das multidões do parque. Entre eles estava Odille Zexter-Kaiser, aluna do último ano da Edward R. Murrow High School, que se arrastava pelas folhas usando calçados Doc Martens e meias de lã que não combinavam.

“Não é visto com bons olhos se alguém não aparecer”, disse Odille. “Estamos aqui todos os domingos, faça chuva ou faça sol, ou mesmo neve. Nós não mantemos contato uns com os outros, então você tem que aparecer.”

Depois que os membros do clube juntaram toras para formar um círculo, eles se sentaram e se retiraram para uma bolha de serenidade.

Clementine Karlin-Pustilnik, Odille Zexter-Kaiser e Jameson Butler em uma reunião recente do Luddite Club em Prospect Park, no Brooklyn. Foto: Scott Rossi/The New York Times

Alguns desenhavam em cadernos. Outros pintavam com um kit de aquarela. Um deles fechou os olhos para ouvir o vento. Muitos leram atentamente - os livros em suas mochilas incluíam Crime e Castigo de Fiódor Dostoiévski, Maus II de Art Spiegelman e A Consolação da Filosofia de Boécio. Os membros do clube citam escritores libertinos como Hunter S. Thompson e Jack Kerouac como heróis, e eles gostam de obras que condenam a tecnologia, como Piano Mecânico de Kurt Vonnegut. Arthur, o porco-formigueiro de óculos da PBS, é o mascote deles.

“Muitos de nós lemos este livro chamado Na Natureza Selvagem”, disse Lola Shub, aluna do último ano da Essex Street Academy, referindo-se ao livro de não ficção de Jon Krakauer de 1996 sobre Chris McCandless, um nômade que morreu enquanto tentava viver da terra no deserto do Alasca. “Todos nós temos essa teoria de que não devemos ficar confinados apenas a prédios e trabalho. E aquele cara estava experimentando a vida. A vida real. Redes sociais e telefones não são a vida real.

“Quando recebi meu celular flip, as coisas mudaram instantaneamente”, continuou Lola. “Comecei a usar meu cérebro. Isso me fez me observar como pessoa. Eu tenho tentado escrever um livro também. Tenho 12 páginas agora.”

Os membros do clube discutiram brevemente como estava indo a divulgação do evangelho ludita. Fundado no ano passado por outra aluna da Murrow High School, Logan Lane, o clube leva o nome de Ned Ludd, o folclórico trabalhador têxtil inglês do século 18 que supostamente quebrou um tear mecanizado, inspirando outros a adotar seu nome e se revoltar contra a industrialização.

O Luddite Club tem se reunido uma vez por semana. “É um pouco desaprovado se alguém não aparecer”, disse um membro. Foto: Scott Rossi/The New York Times

“Acabei de realizar a primeira reunião ludita bem-sucedida em Beacon”, disse Biruk Watling, aluno do último ano da Beacon High School, em Manhattan, que usa um celular flip pintado de verde com a foto de uma Lauryn Hill da era Fugees.

“Ouvi dizer que está se espalhando no Brooklyn Tech”, disse outra pessoa.

Alguns membros levaram um tempo para exaltar os benefícios de se tornar ludita.

Jameson Butler, um estudante com uma camiseta do Black Flag que estava esculpindo um pedaço de madeira com um canivete, explicou: “Eu exclui aqueles de quem quero ser amigo. Agora me dá trabalho manter amizades. Alguns entraram em contato quando desliguei o iPhone e disseram: ‘Não gosto mais de enviar mensagens de texto para você porque suas mensagens são verdes’. Isso me disse muito”.

Vee De La Cruz, que tinha uma cópia de As Almas do Povo Negro de W.E.B. Du Bois, disse: “Você publica algo nas redes sociais, não recebe curtidas suficientes e não se sente bem consigo mesmo. Isso não deveria acontecer com ninguém.

“Estar neste clube me lembra que estamos todos vivendo em uma rocha flutuante e que tudo ficará bem.”

Logan Lane, fundadora do clube, em seu quarto. O movimento que ela iniciou na Murrow High School, no Brooklyn, se espalhou para outras escolas de Nova York. Foto: Scott Rossi/The New York Times

Alguns dias antes do encontro, depois de serem dispensados às 15h da Murrow High School, uma enxurrada de alunos emergiu do prédio para a rua. Muitos deles estavam olhando para seus smartphones, mas não Logan Lane, a fundadora de 17 anos do Luddite Club.

No quarteirão da escola, ela se sentou para uma entrevista em uma cafeteria Chock full o’Nuts. Ela usava uma jaqueta folgada de veludo cotelê e jeans acolchoados que ela mesma havia costurado com uma máquina Singer.

“Temos problemas para recrutar membros”, ela disse, “mas realmente não nos importamos. Todos nós nos unimos por esta causa única. Para estar no Luddite Club, há um certo nível de desajuste.” Ela acrescentou: “Mas nem sempre fui uma ludita, é claro”.

Tudo começou durante o lockdown, ela disse, quando seu uso de redes sociais deu uma guinada preocupante.

“Fiquei completamente absorvida”, ela disse. “Eu não conseguia deixar de postar uma boa foto se tivesse uma. E eu tinha essa personalidade online de ‘não me importo’, mas na verdade me importava. Eu definitivamente estava assistindo a tudo.”

Um pôster do Luddite Club no quarto de Logan Lane com o slogan do clube “Não seja falso”. Foto: Scott Rossi/The New York Times

Por fim, cansada demais para passar por mais uma selfie perfeita no Instagram, ela excluiu o aplicativo.

“Mas isso não foi o suficiente”, ela disse. “Então coloquei meu telefone em uma caixa.”

Pela primeira vez, ela experimentou a vida na cidade como uma adolescente sem um iPhone. Ela pegava romances emprestados da biblioteca e os lia sozinha no parque. Ela começou a admirar os grafites quando andava de metrô, depois conheceu alguns adolescentes que a ensinaram a pintar com spray em um pátio de trens de carga no Queens. E ela começou a acordar sem despertador às 7 da manhã, não mais adormecendo com o brilho do telefone à meia-noite. Uma vez, como ela escreveu mais tarde em um texto intitulado “Manifesto Ludita”, ela pensou em jogar seu iPhone no Canal Gowanus.

Enquanto os pais de Logan apreciavam sua metamorfose, especialmente porque ela voltava regularmente para casa para jantar para contar suas andanças, eles ficavam angustiados por não poderem saber da filha em uma noite de sexta-feira. E depois que ela convenientemente perdeu o smartphone que eles pediram que ela levasse a Paris para um programa de verão no exterior, eles ficaram perturbados. Eles acabaram insistindo para que ela pelo menos começasse a carregar um celular flip.

“Para estar no Luddite Club, há um certo nível de desajuste”, disse Logan. Foto: Scott Rossi/The New York Times

“Ainda desejo não ter telefone algum”, ela disse. “Meus pais são tão viciados. Minha mãe entrou no Twitter e eu vi isso destruí-la. Mas acho que também gosto, porque me sinto um pouco superior a eles.”

Hoje, o clube tem cerca de 25 membros, e a filial de Murrow se reúne na escola todas as terças-feiras. Eles dão as boas-vindas aos alunos que ainda não desistiram de seus iPhones, oferecendo-lhes o desafio de ignorar seus aparelhos para a reunião de uma hora (para que não atraiam caras feias dos teimosos). Nas reuniões de domingo no parque, os luditas costumam montar redes para ler quando o tempo está bom.

Enquanto Logan contava a história da origem do clube comendo um croissant de amêndoas na cafeteria, um novo membro, Julian, apareceu. Embora ainda não tivesse mudado para um celular flip, ele disse que já estava se beneficiando da mensagem do grupo. Então ele brincou com Logan sobre uma crítica que um aluno havia feito sobre o clube.

“Um garoto disse que é classista”, ele disse. “Acho que o clube é legal, porque tenho uma folga do meu telefone, mas entendo o ponto de vista deles. Alguns de nós precisam da tecnologia para sermos incluídos na sociedade. Alguns de nós precisam de um telefone”.

“Recebemos reações negativas”, respondeu Logan. “O argumento que ouvi é que somos um monte de crianças ricas e esperar que todos abandonem seus telefones é coisa de privilegiado”.

Depois que Julian saiu, Logan admitiu que ela debateu o assunto e que o tema gerou uma discussão acalorada entre os membros do clube.

Odille, Clementine, Jameson, Logan e Max Frackman a caminho de sua reunião semanal. Foto: Scott Rossi/The New York Times

“Fiquei muito desanimada quando ouvi a coisa classista e quase pronta para me despedir do clube”, ela disse. “Conversei com meu conselheiro, porém, e ele me disse que a maioria das revoluções realmente começa com pessoas de origens industriais, como Che Guevara.

“Não esperamos que todos tenham um celular flip. Vemos apenas um problema de saúde mental e uso de telas”.

Em uma rua arborizada no bairro de Cobble Hill, ela entrou na casa de sua família, onde foi saudada por uma Goldendoodle chamada Phoebe, e correu escada acima para seu quarto. A decoração refletia seus interesses: havia pilhas de livros, paredes grafitadas e, além da máquina de costura, uma máquina de escrever Royal e um toca-fitas Sony.

Na sala de estar do andar de baixo, seu pai, Seth Lane, um executivo que trabalha com tecnologia da informação, sentou-se ao lado de uma lareira e refletiu sobre a jornada de sua filha.

“Estou orgulhoso dela e do que o clube representa”, ele disse. “Mas também há a parte dos pais, e não sabemos onde está nosso filho. Você segue seus filhos agora. Você os rastreia. É um pouco orwelliano, eu acho, mas somos a geração de pais helicópteros. Então, quando ela se livrou do iPhone, isso inicialmente foi um problema para nós .”

Ele tinha ouvido falar das preocupações do Luddite Club sobre questões de privilégio.

“Bem, é classista fazer as pessoas precisarem ter smartphones também, certo?” Lane disse. “Eu acho que eles estão tendo uma ótima conversa. Não há resposta certa.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Em um domingo recente, um grupo de adolescentes se reuniu nos degraus da Biblioteca Central no Brooklyn para a reunião semanal do Luddite Club (“Clube Ludita”), um grupo do ensino médio que promove um estilo de vida de autolibertação das redes sociais e da tecnologia. Enquanto os doze adolescentes se dirigiam para o Prospect Park, eles esconderam seus iPhones - ou, no caso dos membros mais devotos, seus celulares flip, que alguns decoraram com adesivos e esmaltes.

Eles marcharam colina acima em direção ao local de sempre, um monte de terra longe das multidões do parque. Entre eles estava Odille Zexter-Kaiser, aluna do último ano da Edward R. Murrow High School, que se arrastava pelas folhas usando calçados Doc Martens e meias de lã que não combinavam.

“Não é visto com bons olhos se alguém não aparecer”, disse Odille. “Estamos aqui todos os domingos, faça chuva ou faça sol, ou mesmo neve. Nós não mantemos contato uns com os outros, então você tem que aparecer.”

Depois que os membros do clube juntaram toras para formar um círculo, eles se sentaram e se retiraram para uma bolha de serenidade.

Clementine Karlin-Pustilnik, Odille Zexter-Kaiser e Jameson Butler em uma reunião recente do Luddite Club em Prospect Park, no Brooklyn. Foto: Scott Rossi/The New York Times

Alguns desenhavam em cadernos. Outros pintavam com um kit de aquarela. Um deles fechou os olhos para ouvir o vento. Muitos leram atentamente - os livros em suas mochilas incluíam Crime e Castigo de Fiódor Dostoiévski, Maus II de Art Spiegelman e A Consolação da Filosofia de Boécio. Os membros do clube citam escritores libertinos como Hunter S. Thompson e Jack Kerouac como heróis, e eles gostam de obras que condenam a tecnologia, como Piano Mecânico de Kurt Vonnegut. Arthur, o porco-formigueiro de óculos da PBS, é o mascote deles.

“Muitos de nós lemos este livro chamado Na Natureza Selvagem”, disse Lola Shub, aluna do último ano da Essex Street Academy, referindo-se ao livro de não ficção de Jon Krakauer de 1996 sobre Chris McCandless, um nômade que morreu enquanto tentava viver da terra no deserto do Alasca. “Todos nós temos essa teoria de que não devemos ficar confinados apenas a prédios e trabalho. E aquele cara estava experimentando a vida. A vida real. Redes sociais e telefones não são a vida real.

“Quando recebi meu celular flip, as coisas mudaram instantaneamente”, continuou Lola. “Comecei a usar meu cérebro. Isso me fez me observar como pessoa. Eu tenho tentado escrever um livro também. Tenho 12 páginas agora.”

Os membros do clube discutiram brevemente como estava indo a divulgação do evangelho ludita. Fundado no ano passado por outra aluna da Murrow High School, Logan Lane, o clube leva o nome de Ned Ludd, o folclórico trabalhador têxtil inglês do século 18 que supostamente quebrou um tear mecanizado, inspirando outros a adotar seu nome e se revoltar contra a industrialização.

O Luddite Club tem se reunido uma vez por semana. “É um pouco desaprovado se alguém não aparecer”, disse um membro. Foto: Scott Rossi/The New York Times

“Acabei de realizar a primeira reunião ludita bem-sucedida em Beacon”, disse Biruk Watling, aluno do último ano da Beacon High School, em Manhattan, que usa um celular flip pintado de verde com a foto de uma Lauryn Hill da era Fugees.

“Ouvi dizer que está se espalhando no Brooklyn Tech”, disse outra pessoa.

Alguns membros levaram um tempo para exaltar os benefícios de se tornar ludita.

Jameson Butler, um estudante com uma camiseta do Black Flag que estava esculpindo um pedaço de madeira com um canivete, explicou: “Eu exclui aqueles de quem quero ser amigo. Agora me dá trabalho manter amizades. Alguns entraram em contato quando desliguei o iPhone e disseram: ‘Não gosto mais de enviar mensagens de texto para você porque suas mensagens são verdes’. Isso me disse muito”.

Vee De La Cruz, que tinha uma cópia de As Almas do Povo Negro de W.E.B. Du Bois, disse: “Você publica algo nas redes sociais, não recebe curtidas suficientes e não se sente bem consigo mesmo. Isso não deveria acontecer com ninguém.

“Estar neste clube me lembra que estamos todos vivendo em uma rocha flutuante e que tudo ficará bem.”

Logan Lane, fundadora do clube, em seu quarto. O movimento que ela iniciou na Murrow High School, no Brooklyn, se espalhou para outras escolas de Nova York. Foto: Scott Rossi/The New York Times

Alguns dias antes do encontro, depois de serem dispensados às 15h da Murrow High School, uma enxurrada de alunos emergiu do prédio para a rua. Muitos deles estavam olhando para seus smartphones, mas não Logan Lane, a fundadora de 17 anos do Luddite Club.

No quarteirão da escola, ela se sentou para uma entrevista em uma cafeteria Chock full o’Nuts. Ela usava uma jaqueta folgada de veludo cotelê e jeans acolchoados que ela mesma havia costurado com uma máquina Singer.

“Temos problemas para recrutar membros”, ela disse, “mas realmente não nos importamos. Todos nós nos unimos por esta causa única. Para estar no Luddite Club, há um certo nível de desajuste.” Ela acrescentou: “Mas nem sempre fui uma ludita, é claro”.

Tudo começou durante o lockdown, ela disse, quando seu uso de redes sociais deu uma guinada preocupante.

“Fiquei completamente absorvida”, ela disse. “Eu não conseguia deixar de postar uma boa foto se tivesse uma. E eu tinha essa personalidade online de ‘não me importo’, mas na verdade me importava. Eu definitivamente estava assistindo a tudo.”

Um pôster do Luddite Club no quarto de Logan Lane com o slogan do clube “Não seja falso”. Foto: Scott Rossi/The New York Times

Por fim, cansada demais para passar por mais uma selfie perfeita no Instagram, ela excluiu o aplicativo.

“Mas isso não foi o suficiente”, ela disse. “Então coloquei meu telefone em uma caixa.”

Pela primeira vez, ela experimentou a vida na cidade como uma adolescente sem um iPhone. Ela pegava romances emprestados da biblioteca e os lia sozinha no parque. Ela começou a admirar os grafites quando andava de metrô, depois conheceu alguns adolescentes que a ensinaram a pintar com spray em um pátio de trens de carga no Queens. E ela começou a acordar sem despertador às 7 da manhã, não mais adormecendo com o brilho do telefone à meia-noite. Uma vez, como ela escreveu mais tarde em um texto intitulado “Manifesto Ludita”, ela pensou em jogar seu iPhone no Canal Gowanus.

Enquanto os pais de Logan apreciavam sua metamorfose, especialmente porque ela voltava regularmente para casa para jantar para contar suas andanças, eles ficavam angustiados por não poderem saber da filha em uma noite de sexta-feira. E depois que ela convenientemente perdeu o smartphone que eles pediram que ela levasse a Paris para um programa de verão no exterior, eles ficaram perturbados. Eles acabaram insistindo para que ela pelo menos começasse a carregar um celular flip.

“Para estar no Luddite Club, há um certo nível de desajuste”, disse Logan. Foto: Scott Rossi/The New York Times

“Ainda desejo não ter telefone algum”, ela disse. “Meus pais são tão viciados. Minha mãe entrou no Twitter e eu vi isso destruí-la. Mas acho que também gosto, porque me sinto um pouco superior a eles.”

Hoje, o clube tem cerca de 25 membros, e a filial de Murrow se reúne na escola todas as terças-feiras. Eles dão as boas-vindas aos alunos que ainda não desistiram de seus iPhones, oferecendo-lhes o desafio de ignorar seus aparelhos para a reunião de uma hora (para que não atraiam caras feias dos teimosos). Nas reuniões de domingo no parque, os luditas costumam montar redes para ler quando o tempo está bom.

Enquanto Logan contava a história da origem do clube comendo um croissant de amêndoas na cafeteria, um novo membro, Julian, apareceu. Embora ainda não tivesse mudado para um celular flip, ele disse que já estava se beneficiando da mensagem do grupo. Então ele brincou com Logan sobre uma crítica que um aluno havia feito sobre o clube.

“Um garoto disse que é classista”, ele disse. “Acho que o clube é legal, porque tenho uma folga do meu telefone, mas entendo o ponto de vista deles. Alguns de nós precisam da tecnologia para sermos incluídos na sociedade. Alguns de nós precisam de um telefone”.

“Recebemos reações negativas”, respondeu Logan. “O argumento que ouvi é que somos um monte de crianças ricas e esperar que todos abandonem seus telefones é coisa de privilegiado”.

Depois que Julian saiu, Logan admitiu que ela debateu o assunto e que o tema gerou uma discussão acalorada entre os membros do clube.

Odille, Clementine, Jameson, Logan e Max Frackman a caminho de sua reunião semanal. Foto: Scott Rossi/The New York Times

“Fiquei muito desanimada quando ouvi a coisa classista e quase pronta para me despedir do clube”, ela disse. “Conversei com meu conselheiro, porém, e ele me disse que a maioria das revoluções realmente começa com pessoas de origens industriais, como Che Guevara.

“Não esperamos que todos tenham um celular flip. Vemos apenas um problema de saúde mental e uso de telas”.

Em uma rua arborizada no bairro de Cobble Hill, ela entrou na casa de sua família, onde foi saudada por uma Goldendoodle chamada Phoebe, e correu escada acima para seu quarto. A decoração refletia seus interesses: havia pilhas de livros, paredes grafitadas e, além da máquina de costura, uma máquina de escrever Royal e um toca-fitas Sony.

Na sala de estar do andar de baixo, seu pai, Seth Lane, um executivo que trabalha com tecnologia da informação, sentou-se ao lado de uma lareira e refletiu sobre a jornada de sua filha.

“Estou orgulhoso dela e do que o clube representa”, ele disse. “Mas também há a parte dos pais, e não sabemos onde está nosso filho. Você segue seus filhos agora. Você os rastreia. É um pouco orwelliano, eu acho, mas somos a geração de pais helicópteros. Então, quando ela se livrou do iPhone, isso inicialmente foi um problema para nós .”

Ele tinha ouvido falar das preocupações do Luddite Club sobre questões de privilégio.

“Bem, é classista fazer as pessoas precisarem ter smartphones também, certo?” Lane disse. “Eu acho que eles estão tendo uma ótima conversa. Não há resposta certa.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Em um domingo recente, um grupo de adolescentes se reuniu nos degraus da Biblioteca Central no Brooklyn para a reunião semanal do Luddite Club (“Clube Ludita”), um grupo do ensino médio que promove um estilo de vida de autolibertação das redes sociais e da tecnologia. Enquanto os doze adolescentes se dirigiam para o Prospect Park, eles esconderam seus iPhones - ou, no caso dos membros mais devotos, seus celulares flip, que alguns decoraram com adesivos e esmaltes.

Eles marcharam colina acima em direção ao local de sempre, um monte de terra longe das multidões do parque. Entre eles estava Odille Zexter-Kaiser, aluna do último ano da Edward R. Murrow High School, que se arrastava pelas folhas usando calçados Doc Martens e meias de lã que não combinavam.

“Não é visto com bons olhos se alguém não aparecer”, disse Odille. “Estamos aqui todos os domingos, faça chuva ou faça sol, ou mesmo neve. Nós não mantemos contato uns com os outros, então você tem que aparecer.”

Depois que os membros do clube juntaram toras para formar um círculo, eles se sentaram e se retiraram para uma bolha de serenidade.

Clementine Karlin-Pustilnik, Odille Zexter-Kaiser e Jameson Butler em uma reunião recente do Luddite Club em Prospect Park, no Brooklyn. Foto: Scott Rossi/The New York Times

Alguns desenhavam em cadernos. Outros pintavam com um kit de aquarela. Um deles fechou os olhos para ouvir o vento. Muitos leram atentamente - os livros em suas mochilas incluíam Crime e Castigo de Fiódor Dostoiévski, Maus II de Art Spiegelman e A Consolação da Filosofia de Boécio. Os membros do clube citam escritores libertinos como Hunter S. Thompson e Jack Kerouac como heróis, e eles gostam de obras que condenam a tecnologia, como Piano Mecânico de Kurt Vonnegut. Arthur, o porco-formigueiro de óculos da PBS, é o mascote deles.

“Muitos de nós lemos este livro chamado Na Natureza Selvagem”, disse Lola Shub, aluna do último ano da Essex Street Academy, referindo-se ao livro de não ficção de Jon Krakauer de 1996 sobre Chris McCandless, um nômade que morreu enquanto tentava viver da terra no deserto do Alasca. “Todos nós temos essa teoria de que não devemos ficar confinados apenas a prédios e trabalho. E aquele cara estava experimentando a vida. A vida real. Redes sociais e telefones não são a vida real.

“Quando recebi meu celular flip, as coisas mudaram instantaneamente”, continuou Lola. “Comecei a usar meu cérebro. Isso me fez me observar como pessoa. Eu tenho tentado escrever um livro também. Tenho 12 páginas agora.”

Os membros do clube discutiram brevemente como estava indo a divulgação do evangelho ludita. Fundado no ano passado por outra aluna da Murrow High School, Logan Lane, o clube leva o nome de Ned Ludd, o folclórico trabalhador têxtil inglês do século 18 que supostamente quebrou um tear mecanizado, inspirando outros a adotar seu nome e se revoltar contra a industrialização.

O Luddite Club tem se reunido uma vez por semana. “É um pouco desaprovado se alguém não aparecer”, disse um membro. Foto: Scott Rossi/The New York Times

“Acabei de realizar a primeira reunião ludita bem-sucedida em Beacon”, disse Biruk Watling, aluno do último ano da Beacon High School, em Manhattan, que usa um celular flip pintado de verde com a foto de uma Lauryn Hill da era Fugees.

“Ouvi dizer que está se espalhando no Brooklyn Tech”, disse outra pessoa.

Alguns membros levaram um tempo para exaltar os benefícios de se tornar ludita.

Jameson Butler, um estudante com uma camiseta do Black Flag que estava esculpindo um pedaço de madeira com um canivete, explicou: “Eu exclui aqueles de quem quero ser amigo. Agora me dá trabalho manter amizades. Alguns entraram em contato quando desliguei o iPhone e disseram: ‘Não gosto mais de enviar mensagens de texto para você porque suas mensagens são verdes’. Isso me disse muito”.

Vee De La Cruz, que tinha uma cópia de As Almas do Povo Negro de W.E.B. Du Bois, disse: “Você publica algo nas redes sociais, não recebe curtidas suficientes e não se sente bem consigo mesmo. Isso não deveria acontecer com ninguém.

“Estar neste clube me lembra que estamos todos vivendo em uma rocha flutuante e que tudo ficará bem.”

Logan Lane, fundadora do clube, em seu quarto. O movimento que ela iniciou na Murrow High School, no Brooklyn, se espalhou para outras escolas de Nova York. Foto: Scott Rossi/The New York Times

Alguns dias antes do encontro, depois de serem dispensados às 15h da Murrow High School, uma enxurrada de alunos emergiu do prédio para a rua. Muitos deles estavam olhando para seus smartphones, mas não Logan Lane, a fundadora de 17 anos do Luddite Club.

No quarteirão da escola, ela se sentou para uma entrevista em uma cafeteria Chock full o’Nuts. Ela usava uma jaqueta folgada de veludo cotelê e jeans acolchoados que ela mesma havia costurado com uma máquina Singer.

“Temos problemas para recrutar membros”, ela disse, “mas realmente não nos importamos. Todos nós nos unimos por esta causa única. Para estar no Luddite Club, há um certo nível de desajuste.” Ela acrescentou: “Mas nem sempre fui uma ludita, é claro”.

Tudo começou durante o lockdown, ela disse, quando seu uso de redes sociais deu uma guinada preocupante.

“Fiquei completamente absorvida”, ela disse. “Eu não conseguia deixar de postar uma boa foto se tivesse uma. E eu tinha essa personalidade online de ‘não me importo’, mas na verdade me importava. Eu definitivamente estava assistindo a tudo.”

Um pôster do Luddite Club no quarto de Logan Lane com o slogan do clube “Não seja falso”. Foto: Scott Rossi/The New York Times

Por fim, cansada demais para passar por mais uma selfie perfeita no Instagram, ela excluiu o aplicativo.

“Mas isso não foi o suficiente”, ela disse. “Então coloquei meu telefone em uma caixa.”

Pela primeira vez, ela experimentou a vida na cidade como uma adolescente sem um iPhone. Ela pegava romances emprestados da biblioteca e os lia sozinha no parque. Ela começou a admirar os grafites quando andava de metrô, depois conheceu alguns adolescentes que a ensinaram a pintar com spray em um pátio de trens de carga no Queens. E ela começou a acordar sem despertador às 7 da manhã, não mais adormecendo com o brilho do telefone à meia-noite. Uma vez, como ela escreveu mais tarde em um texto intitulado “Manifesto Ludita”, ela pensou em jogar seu iPhone no Canal Gowanus.

Enquanto os pais de Logan apreciavam sua metamorfose, especialmente porque ela voltava regularmente para casa para jantar para contar suas andanças, eles ficavam angustiados por não poderem saber da filha em uma noite de sexta-feira. E depois que ela convenientemente perdeu o smartphone que eles pediram que ela levasse a Paris para um programa de verão no exterior, eles ficaram perturbados. Eles acabaram insistindo para que ela pelo menos começasse a carregar um celular flip.

“Para estar no Luddite Club, há um certo nível de desajuste”, disse Logan. Foto: Scott Rossi/The New York Times

“Ainda desejo não ter telefone algum”, ela disse. “Meus pais são tão viciados. Minha mãe entrou no Twitter e eu vi isso destruí-la. Mas acho que também gosto, porque me sinto um pouco superior a eles.”

Hoje, o clube tem cerca de 25 membros, e a filial de Murrow se reúne na escola todas as terças-feiras. Eles dão as boas-vindas aos alunos que ainda não desistiram de seus iPhones, oferecendo-lhes o desafio de ignorar seus aparelhos para a reunião de uma hora (para que não atraiam caras feias dos teimosos). Nas reuniões de domingo no parque, os luditas costumam montar redes para ler quando o tempo está bom.

Enquanto Logan contava a história da origem do clube comendo um croissant de amêndoas na cafeteria, um novo membro, Julian, apareceu. Embora ainda não tivesse mudado para um celular flip, ele disse que já estava se beneficiando da mensagem do grupo. Então ele brincou com Logan sobre uma crítica que um aluno havia feito sobre o clube.

“Um garoto disse que é classista”, ele disse. “Acho que o clube é legal, porque tenho uma folga do meu telefone, mas entendo o ponto de vista deles. Alguns de nós precisam da tecnologia para sermos incluídos na sociedade. Alguns de nós precisam de um telefone”.

“Recebemos reações negativas”, respondeu Logan. “O argumento que ouvi é que somos um monte de crianças ricas e esperar que todos abandonem seus telefones é coisa de privilegiado”.

Depois que Julian saiu, Logan admitiu que ela debateu o assunto e que o tema gerou uma discussão acalorada entre os membros do clube.

Odille, Clementine, Jameson, Logan e Max Frackman a caminho de sua reunião semanal. Foto: Scott Rossi/The New York Times

“Fiquei muito desanimada quando ouvi a coisa classista e quase pronta para me despedir do clube”, ela disse. “Conversei com meu conselheiro, porém, e ele me disse que a maioria das revoluções realmente começa com pessoas de origens industriais, como Che Guevara.

“Não esperamos que todos tenham um celular flip. Vemos apenas um problema de saúde mental e uso de telas”.

Em uma rua arborizada no bairro de Cobble Hill, ela entrou na casa de sua família, onde foi saudada por uma Goldendoodle chamada Phoebe, e correu escada acima para seu quarto. A decoração refletia seus interesses: havia pilhas de livros, paredes grafitadas e, além da máquina de costura, uma máquina de escrever Royal e um toca-fitas Sony.

Na sala de estar do andar de baixo, seu pai, Seth Lane, um executivo que trabalha com tecnologia da informação, sentou-se ao lado de uma lareira e refletiu sobre a jornada de sua filha.

“Estou orgulhoso dela e do que o clube representa”, ele disse. “Mas também há a parte dos pais, e não sabemos onde está nosso filho. Você segue seus filhos agora. Você os rastreia. É um pouco orwelliano, eu acho, mas somos a geração de pais helicópteros. Então, quando ela se livrou do iPhone, isso inicialmente foi um problema para nós .”

Ele tinha ouvido falar das preocupações do Luddite Club sobre questões de privilégio.

“Bem, é classista fazer as pessoas precisarem ter smartphones também, certo?” Lane disse. “Eu acho que eles estão tendo uma ótima conversa. Não há resposta certa.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

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