O truque em que uma pessoa é serrada ao meio nunca envelhece. Nem mesmo 100 anos depois


A história de um dos mais famosos truques de mágica do mundo em seu centenário

Por Alex Marshall

LONDRES – No dia 17 de janeiro de 1921, o mágico P.T.Selbit se apresentou no palco no Finsbury Park Empire, em Londres, acompanhado por Betty Baker, sua assistente, que ele logo fez entrar em uma caixa de madeira de pé.

Selbit – cujo nome verdadeiro era Percy Tibbles – amarrou pulsos, tornozelos e o pescoço de Betty e puxou as cordas pelos buracos da caixa. Depois chamou alguns espectadores ao palco e pediu que as puxassem bem, para que Betty não pudesse se mexer de modo algum.

Ilustração de Nolan Pelletier/The New York Times 
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Fechou a caixa com um cadeado e a deitou com ajuda de assistentes; em seguida, começou a trabalhar.

Primeiramente, empurrou folhas de vidro através umas fendas para parecer que elas cortavam a jovem e saíam do outro lado. Depois, como se isto não bastasse, pegou uma serra e cortou a caixa ao meio, espalhando serragem por toda parte.

Segundo os especialistas em mágica, era a primeira vez que um artista cortava ao meio uma pessoa – um truque que se tornou um ícone da mágica, superado apenas pelo coelho tirado da cartola. Causou sensação. Logo, Selbit se exibia com o seu número em todo Reino Unido, usando como marketing alguns abracadabra para avivar o interesse. Antes de cada espetáculo, os ajudantes espalhavam um balde de sangue falso fora do teatro como se tivesse ocorrido um terrível acidente.

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Selbit tinha consciência de ter criado algo sensacional, mas não podia saber que havia criado uma sensação que os mágicos procurariam reinventar pelos 100 anos seguintes.

No YouTube, hoje,  pode-se assistir a dezenas de ilusionistas cortando pessoas ao meio, das maneiras mais variadas. Alguns serram suas assistentes da cabeça aos pés, em lugar de cortar a cintura. Outros cortam duas pessoas ao meio e depois  trocam as pernas delas.

Até uma criança foi fatiada. Em 2017, Justin Flom, um mágico muito famoso com 7 milhões de seguidores no Facebook, provocou uma tempestade on-line exibindo um vídeo que viralizou no qual ele fazia o truque com a filha de 4 meses, usando dois livros em vez de uma serra.

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Por que este truque sobreviveu, enquanto tantos outros não conseguiram? Perguntando aos mágicos – eu falei com seis – eles acabam dando uma única resposta. “É por causa da simplicidade do truque”, disse Mike Caveney, que está escrevendo uma história do truque. “Os mágicos dizem que um bom truque é o que pode ser descrito com poucas palavras, e ‘serrar uma senhora em duas’ são de fato poucas”, acrescentou.

Mas o segredo que existe em torno do mecanismo do truque obviamente também aumenta a curiosidade. Quase todo mundo acha que sabe como funciona. “Hoje, há talvez 20 métodos diferentes,” segundo Flom.

Na realidade, a maioria dos mágicos não quer que sejam revelados, como descobri pesquisando para este artigo. Inclusive, seria como “contar a história do Papai Noel, e depois afirmar no final: ‘Ele não existe’”, falou Caveney.

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(Se vocês acreditam em mágica, não se preocupem – não irei revelar coisas demais.)

As imitações e as inovações do truque de Selbit começaram praticamente enquanto ele estava no palco. Em poucas semanas Horace Goldin – um mágico dos Estados Unidos – começou a apresentar a própria versão. Ele declarava ter inventado totalmente o truque, anos antes, e seu obituário no jornal “The New York Times”, de 1939, lhe dá o crédito.

Ilustração deNolan Pelletier/The New York Times 
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A versão de Goldin era mais parecida com a que conhecemos hoje, com a cabeça, as mãos e os pés da assistente aparecendo fora da caixa. Quando Goldin acabava de serrar a assistente ao meio, ele separava as duas partes da caixa, e em seguida as montava de novo, como por milagre. (Na sua primeira exibição pública, ele usou um mensageiro do hotel, não uma mulher).

Goldin não só excursionou com o truque, ele o patenteou, o licenciou para outros mágicos e processou quem o realizava sem a sua permissão, ou quem revelasse como funcionava.

Mas no prazo de alguns anos, o truque havia se tornado clichê, e os mágicos começaram a aplicar a própria imaginação. Reduziram o tamanho da caixa. Dispensaram totalmente o uso da caixa. Passaram a usar serras circulares e motosserras. On-line, é possível assistir a versões que confundem totalmente o espectador; e, às vezes, parecem verdadeiros assassinatos ao vivo.

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“Serrar uma pessoa ao meio não é um truque”, disse Teller, da dupla de mágicos comediantes Penn & Teller. “Há muitas coisas diferentes que você pode expressar com os mesmos elementos fundamentais”. As variações de Penn & Teller sobre o truque em geral também contam para o público como elas são feitas, e depois atrapalham a explicação. Em uma delas, Georgia Bernasek, uma das assistentes, entra em uma caixa, e Penn & Teller executam o clássico corte ao meio. Mas depois explicam como é feito. A mesa sobre a qual a caixa é colocada, tem um buraco, diz Teller, então Georgia pode afundarfora do alcance da serra. Quando o público pensa que está tudo explicado e o truque acabou, os dois mágicos acidentalmente a cortam em pedaços, deixando o público perplexo mais uma vez.

A mensagem é óbvia, disse Teller: “Você acha que sabe como são feitos os truques de mágica. E talvez saiba, ou talvez não”.

De todos os mágicos que apresentaram o truque, David Copperfield é considerado por muitos o mestre, graças à sua versão de 1986, conhecida como “Serra da Morte’, que reinventa a ilusão como um espetáculo no estilo de Las Vegas, usando uma enorme lâmina rotativa que vem descendo.

Quando a serra circular cortou Copperfield em dois, duas assistentes puxam as seções e ele mexe o pé serrado, então, por alguma mágica, volta no tempo e cola suas duas partes novamente.

Levou dois anos para montá-la, explicou Copperfield em uma entrevista por telefone, e precisou de “muito papelão, espuma e fita em quartos de hotel”.

A versão de Copperfield do número clássico se distingue das outras, em parte porque o próprio mágico é cortado ao meio. Como na maioria dos truques um homem corta uma mulher em duas, o truque é considerado por alguns um símbolo de misoginia.

Flom foi o único mágico com o qual eu falei que ficou feliz em explicar como funcionava o seu truque. Custou aproximadamente US$ 15 mil, ele contou, na maior parte gastos com um espelho especial, e vários outros elementos que não revelarei. (Certa ajuda da avó foi gratuita.)

Teller disse que não tinha nenhum problema moral em revelar o seu, apenas um problema artístico: isto acabaria com a graça de tentar adivinhar, ele disse. Tudo o que nós precisamos saber a respeito de como cortar uma pessoa em duas partes, afirmou Teller, é que, na realidade, ninguém é cortado ao meio. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

LONDRES – No dia 17 de janeiro de 1921, o mágico P.T.Selbit se apresentou no palco no Finsbury Park Empire, em Londres, acompanhado por Betty Baker, sua assistente, que ele logo fez entrar em uma caixa de madeira de pé.

Selbit – cujo nome verdadeiro era Percy Tibbles – amarrou pulsos, tornozelos e o pescoço de Betty e puxou as cordas pelos buracos da caixa. Depois chamou alguns espectadores ao palco e pediu que as puxassem bem, para que Betty não pudesse se mexer de modo algum.

Ilustração de Nolan Pelletier/The New York Times 

Fechou a caixa com um cadeado e a deitou com ajuda de assistentes; em seguida, começou a trabalhar.

Primeiramente, empurrou folhas de vidro através umas fendas para parecer que elas cortavam a jovem e saíam do outro lado. Depois, como se isto não bastasse, pegou uma serra e cortou a caixa ao meio, espalhando serragem por toda parte.

Segundo os especialistas em mágica, era a primeira vez que um artista cortava ao meio uma pessoa – um truque que se tornou um ícone da mágica, superado apenas pelo coelho tirado da cartola. Causou sensação. Logo, Selbit se exibia com o seu número em todo Reino Unido, usando como marketing alguns abracadabra para avivar o interesse. Antes de cada espetáculo, os ajudantes espalhavam um balde de sangue falso fora do teatro como se tivesse ocorrido um terrível acidente.

Selbit tinha consciência de ter criado algo sensacional, mas não podia saber que havia criado uma sensação que os mágicos procurariam reinventar pelos 100 anos seguintes.

No YouTube, hoje,  pode-se assistir a dezenas de ilusionistas cortando pessoas ao meio, das maneiras mais variadas. Alguns serram suas assistentes da cabeça aos pés, em lugar de cortar a cintura. Outros cortam duas pessoas ao meio e depois  trocam as pernas delas.

Até uma criança foi fatiada. Em 2017, Justin Flom, um mágico muito famoso com 7 milhões de seguidores no Facebook, provocou uma tempestade on-line exibindo um vídeo que viralizou no qual ele fazia o truque com a filha de 4 meses, usando dois livros em vez de uma serra.

Por que este truque sobreviveu, enquanto tantos outros não conseguiram? Perguntando aos mágicos – eu falei com seis – eles acabam dando uma única resposta. “É por causa da simplicidade do truque”, disse Mike Caveney, que está escrevendo uma história do truque. “Os mágicos dizem que um bom truque é o que pode ser descrito com poucas palavras, e ‘serrar uma senhora em duas’ são de fato poucas”, acrescentou.

Mas o segredo que existe em torno do mecanismo do truque obviamente também aumenta a curiosidade. Quase todo mundo acha que sabe como funciona. “Hoje, há talvez 20 métodos diferentes,” segundo Flom.

Na realidade, a maioria dos mágicos não quer que sejam revelados, como descobri pesquisando para este artigo. Inclusive, seria como “contar a história do Papai Noel, e depois afirmar no final: ‘Ele não existe’”, falou Caveney.

(Se vocês acreditam em mágica, não se preocupem – não irei revelar coisas demais.)

As imitações e as inovações do truque de Selbit começaram praticamente enquanto ele estava no palco. Em poucas semanas Horace Goldin – um mágico dos Estados Unidos – começou a apresentar a própria versão. Ele declarava ter inventado totalmente o truque, anos antes, e seu obituário no jornal “The New York Times”, de 1939, lhe dá o crédito.

Ilustração deNolan Pelletier/The New York Times 

A versão de Goldin era mais parecida com a que conhecemos hoje, com a cabeça, as mãos e os pés da assistente aparecendo fora da caixa. Quando Goldin acabava de serrar a assistente ao meio, ele separava as duas partes da caixa, e em seguida as montava de novo, como por milagre. (Na sua primeira exibição pública, ele usou um mensageiro do hotel, não uma mulher).

Goldin não só excursionou com o truque, ele o patenteou, o licenciou para outros mágicos e processou quem o realizava sem a sua permissão, ou quem revelasse como funcionava.

Mas no prazo de alguns anos, o truque havia se tornado clichê, e os mágicos começaram a aplicar a própria imaginação. Reduziram o tamanho da caixa. Dispensaram totalmente o uso da caixa. Passaram a usar serras circulares e motosserras. On-line, é possível assistir a versões que confundem totalmente o espectador; e, às vezes, parecem verdadeiros assassinatos ao vivo.

“Serrar uma pessoa ao meio não é um truque”, disse Teller, da dupla de mágicos comediantes Penn & Teller. “Há muitas coisas diferentes que você pode expressar com os mesmos elementos fundamentais”. As variações de Penn & Teller sobre o truque em geral também contam para o público como elas são feitas, e depois atrapalham a explicação. Em uma delas, Georgia Bernasek, uma das assistentes, entra em uma caixa, e Penn & Teller executam o clássico corte ao meio. Mas depois explicam como é feito. A mesa sobre a qual a caixa é colocada, tem um buraco, diz Teller, então Georgia pode afundarfora do alcance da serra. Quando o público pensa que está tudo explicado e o truque acabou, os dois mágicos acidentalmente a cortam em pedaços, deixando o público perplexo mais uma vez.

A mensagem é óbvia, disse Teller: “Você acha que sabe como são feitos os truques de mágica. E talvez saiba, ou talvez não”.

De todos os mágicos que apresentaram o truque, David Copperfield é considerado por muitos o mestre, graças à sua versão de 1986, conhecida como “Serra da Morte’, que reinventa a ilusão como um espetáculo no estilo de Las Vegas, usando uma enorme lâmina rotativa que vem descendo.

Quando a serra circular cortou Copperfield em dois, duas assistentes puxam as seções e ele mexe o pé serrado, então, por alguma mágica, volta no tempo e cola suas duas partes novamente.

Levou dois anos para montá-la, explicou Copperfield em uma entrevista por telefone, e precisou de “muito papelão, espuma e fita em quartos de hotel”.

A versão de Copperfield do número clássico se distingue das outras, em parte porque o próprio mágico é cortado ao meio. Como na maioria dos truques um homem corta uma mulher em duas, o truque é considerado por alguns um símbolo de misoginia.

Flom foi o único mágico com o qual eu falei que ficou feliz em explicar como funcionava o seu truque. Custou aproximadamente US$ 15 mil, ele contou, na maior parte gastos com um espelho especial, e vários outros elementos que não revelarei. (Certa ajuda da avó foi gratuita.)

Teller disse que não tinha nenhum problema moral em revelar o seu, apenas um problema artístico: isto acabaria com a graça de tentar adivinhar, ele disse. Tudo o que nós precisamos saber a respeito de como cortar uma pessoa em duas partes, afirmou Teller, é que, na realidade, ninguém é cortado ao meio. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

LONDRES – No dia 17 de janeiro de 1921, o mágico P.T.Selbit se apresentou no palco no Finsbury Park Empire, em Londres, acompanhado por Betty Baker, sua assistente, que ele logo fez entrar em uma caixa de madeira de pé.

Selbit – cujo nome verdadeiro era Percy Tibbles – amarrou pulsos, tornozelos e o pescoço de Betty e puxou as cordas pelos buracos da caixa. Depois chamou alguns espectadores ao palco e pediu que as puxassem bem, para que Betty não pudesse se mexer de modo algum.

Ilustração de Nolan Pelletier/The New York Times 

Fechou a caixa com um cadeado e a deitou com ajuda de assistentes; em seguida, começou a trabalhar.

Primeiramente, empurrou folhas de vidro através umas fendas para parecer que elas cortavam a jovem e saíam do outro lado. Depois, como se isto não bastasse, pegou uma serra e cortou a caixa ao meio, espalhando serragem por toda parte.

Segundo os especialistas em mágica, era a primeira vez que um artista cortava ao meio uma pessoa – um truque que se tornou um ícone da mágica, superado apenas pelo coelho tirado da cartola. Causou sensação. Logo, Selbit se exibia com o seu número em todo Reino Unido, usando como marketing alguns abracadabra para avivar o interesse. Antes de cada espetáculo, os ajudantes espalhavam um balde de sangue falso fora do teatro como se tivesse ocorrido um terrível acidente.

Selbit tinha consciência de ter criado algo sensacional, mas não podia saber que havia criado uma sensação que os mágicos procurariam reinventar pelos 100 anos seguintes.

No YouTube, hoje,  pode-se assistir a dezenas de ilusionistas cortando pessoas ao meio, das maneiras mais variadas. Alguns serram suas assistentes da cabeça aos pés, em lugar de cortar a cintura. Outros cortam duas pessoas ao meio e depois  trocam as pernas delas.

Até uma criança foi fatiada. Em 2017, Justin Flom, um mágico muito famoso com 7 milhões de seguidores no Facebook, provocou uma tempestade on-line exibindo um vídeo que viralizou no qual ele fazia o truque com a filha de 4 meses, usando dois livros em vez de uma serra.

Por que este truque sobreviveu, enquanto tantos outros não conseguiram? Perguntando aos mágicos – eu falei com seis – eles acabam dando uma única resposta. “É por causa da simplicidade do truque”, disse Mike Caveney, que está escrevendo uma história do truque. “Os mágicos dizem que um bom truque é o que pode ser descrito com poucas palavras, e ‘serrar uma senhora em duas’ são de fato poucas”, acrescentou.

Mas o segredo que existe em torno do mecanismo do truque obviamente também aumenta a curiosidade. Quase todo mundo acha que sabe como funciona. “Hoje, há talvez 20 métodos diferentes,” segundo Flom.

Na realidade, a maioria dos mágicos não quer que sejam revelados, como descobri pesquisando para este artigo. Inclusive, seria como “contar a história do Papai Noel, e depois afirmar no final: ‘Ele não existe’”, falou Caveney.

(Se vocês acreditam em mágica, não se preocupem – não irei revelar coisas demais.)

As imitações e as inovações do truque de Selbit começaram praticamente enquanto ele estava no palco. Em poucas semanas Horace Goldin – um mágico dos Estados Unidos – começou a apresentar a própria versão. Ele declarava ter inventado totalmente o truque, anos antes, e seu obituário no jornal “The New York Times”, de 1939, lhe dá o crédito.

Ilustração deNolan Pelletier/The New York Times 

A versão de Goldin era mais parecida com a que conhecemos hoje, com a cabeça, as mãos e os pés da assistente aparecendo fora da caixa. Quando Goldin acabava de serrar a assistente ao meio, ele separava as duas partes da caixa, e em seguida as montava de novo, como por milagre. (Na sua primeira exibição pública, ele usou um mensageiro do hotel, não uma mulher).

Goldin não só excursionou com o truque, ele o patenteou, o licenciou para outros mágicos e processou quem o realizava sem a sua permissão, ou quem revelasse como funcionava.

Mas no prazo de alguns anos, o truque havia se tornado clichê, e os mágicos começaram a aplicar a própria imaginação. Reduziram o tamanho da caixa. Dispensaram totalmente o uso da caixa. Passaram a usar serras circulares e motosserras. On-line, é possível assistir a versões que confundem totalmente o espectador; e, às vezes, parecem verdadeiros assassinatos ao vivo.

“Serrar uma pessoa ao meio não é um truque”, disse Teller, da dupla de mágicos comediantes Penn & Teller. “Há muitas coisas diferentes que você pode expressar com os mesmos elementos fundamentais”. As variações de Penn & Teller sobre o truque em geral também contam para o público como elas são feitas, e depois atrapalham a explicação. Em uma delas, Georgia Bernasek, uma das assistentes, entra em uma caixa, e Penn & Teller executam o clássico corte ao meio. Mas depois explicam como é feito. A mesa sobre a qual a caixa é colocada, tem um buraco, diz Teller, então Georgia pode afundarfora do alcance da serra. Quando o público pensa que está tudo explicado e o truque acabou, os dois mágicos acidentalmente a cortam em pedaços, deixando o público perplexo mais uma vez.

A mensagem é óbvia, disse Teller: “Você acha que sabe como são feitos os truques de mágica. E talvez saiba, ou talvez não”.

De todos os mágicos que apresentaram o truque, David Copperfield é considerado por muitos o mestre, graças à sua versão de 1986, conhecida como “Serra da Morte’, que reinventa a ilusão como um espetáculo no estilo de Las Vegas, usando uma enorme lâmina rotativa que vem descendo.

Quando a serra circular cortou Copperfield em dois, duas assistentes puxam as seções e ele mexe o pé serrado, então, por alguma mágica, volta no tempo e cola suas duas partes novamente.

Levou dois anos para montá-la, explicou Copperfield em uma entrevista por telefone, e precisou de “muito papelão, espuma e fita em quartos de hotel”.

A versão de Copperfield do número clássico se distingue das outras, em parte porque o próprio mágico é cortado ao meio. Como na maioria dos truques um homem corta uma mulher em duas, o truque é considerado por alguns um símbolo de misoginia.

Flom foi o único mágico com o qual eu falei que ficou feliz em explicar como funcionava o seu truque. Custou aproximadamente US$ 15 mil, ele contou, na maior parte gastos com um espelho especial, e vários outros elementos que não revelarei. (Certa ajuda da avó foi gratuita.)

Teller disse que não tinha nenhum problema moral em revelar o seu, apenas um problema artístico: isto acabaria com a graça de tentar adivinhar, ele disse. Tudo o que nós precisamos saber a respeito de como cortar uma pessoa em duas partes, afirmou Teller, é que, na realidade, ninguém é cortado ao meio. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

LONDRES – No dia 17 de janeiro de 1921, o mágico P.T.Selbit se apresentou no palco no Finsbury Park Empire, em Londres, acompanhado por Betty Baker, sua assistente, que ele logo fez entrar em uma caixa de madeira de pé.

Selbit – cujo nome verdadeiro era Percy Tibbles – amarrou pulsos, tornozelos e o pescoço de Betty e puxou as cordas pelos buracos da caixa. Depois chamou alguns espectadores ao palco e pediu que as puxassem bem, para que Betty não pudesse se mexer de modo algum.

Ilustração de Nolan Pelletier/The New York Times 

Fechou a caixa com um cadeado e a deitou com ajuda de assistentes; em seguida, começou a trabalhar.

Primeiramente, empurrou folhas de vidro através umas fendas para parecer que elas cortavam a jovem e saíam do outro lado. Depois, como se isto não bastasse, pegou uma serra e cortou a caixa ao meio, espalhando serragem por toda parte.

Segundo os especialistas em mágica, era a primeira vez que um artista cortava ao meio uma pessoa – um truque que se tornou um ícone da mágica, superado apenas pelo coelho tirado da cartola. Causou sensação. Logo, Selbit se exibia com o seu número em todo Reino Unido, usando como marketing alguns abracadabra para avivar o interesse. Antes de cada espetáculo, os ajudantes espalhavam um balde de sangue falso fora do teatro como se tivesse ocorrido um terrível acidente.

Selbit tinha consciência de ter criado algo sensacional, mas não podia saber que havia criado uma sensação que os mágicos procurariam reinventar pelos 100 anos seguintes.

No YouTube, hoje,  pode-se assistir a dezenas de ilusionistas cortando pessoas ao meio, das maneiras mais variadas. Alguns serram suas assistentes da cabeça aos pés, em lugar de cortar a cintura. Outros cortam duas pessoas ao meio e depois  trocam as pernas delas.

Até uma criança foi fatiada. Em 2017, Justin Flom, um mágico muito famoso com 7 milhões de seguidores no Facebook, provocou uma tempestade on-line exibindo um vídeo que viralizou no qual ele fazia o truque com a filha de 4 meses, usando dois livros em vez de uma serra.

Por que este truque sobreviveu, enquanto tantos outros não conseguiram? Perguntando aos mágicos – eu falei com seis – eles acabam dando uma única resposta. “É por causa da simplicidade do truque”, disse Mike Caveney, que está escrevendo uma história do truque. “Os mágicos dizem que um bom truque é o que pode ser descrito com poucas palavras, e ‘serrar uma senhora em duas’ são de fato poucas”, acrescentou.

Mas o segredo que existe em torno do mecanismo do truque obviamente também aumenta a curiosidade. Quase todo mundo acha que sabe como funciona. “Hoje, há talvez 20 métodos diferentes,” segundo Flom.

Na realidade, a maioria dos mágicos não quer que sejam revelados, como descobri pesquisando para este artigo. Inclusive, seria como “contar a história do Papai Noel, e depois afirmar no final: ‘Ele não existe’”, falou Caveney.

(Se vocês acreditam em mágica, não se preocupem – não irei revelar coisas demais.)

As imitações e as inovações do truque de Selbit começaram praticamente enquanto ele estava no palco. Em poucas semanas Horace Goldin – um mágico dos Estados Unidos – começou a apresentar a própria versão. Ele declarava ter inventado totalmente o truque, anos antes, e seu obituário no jornal “The New York Times”, de 1939, lhe dá o crédito.

Ilustração deNolan Pelletier/The New York Times 

A versão de Goldin era mais parecida com a que conhecemos hoje, com a cabeça, as mãos e os pés da assistente aparecendo fora da caixa. Quando Goldin acabava de serrar a assistente ao meio, ele separava as duas partes da caixa, e em seguida as montava de novo, como por milagre. (Na sua primeira exibição pública, ele usou um mensageiro do hotel, não uma mulher).

Goldin não só excursionou com o truque, ele o patenteou, o licenciou para outros mágicos e processou quem o realizava sem a sua permissão, ou quem revelasse como funcionava.

Mas no prazo de alguns anos, o truque havia se tornado clichê, e os mágicos começaram a aplicar a própria imaginação. Reduziram o tamanho da caixa. Dispensaram totalmente o uso da caixa. Passaram a usar serras circulares e motosserras. On-line, é possível assistir a versões que confundem totalmente o espectador; e, às vezes, parecem verdadeiros assassinatos ao vivo.

“Serrar uma pessoa ao meio não é um truque”, disse Teller, da dupla de mágicos comediantes Penn & Teller. “Há muitas coisas diferentes que você pode expressar com os mesmos elementos fundamentais”. As variações de Penn & Teller sobre o truque em geral também contam para o público como elas são feitas, e depois atrapalham a explicação. Em uma delas, Georgia Bernasek, uma das assistentes, entra em uma caixa, e Penn & Teller executam o clássico corte ao meio. Mas depois explicam como é feito. A mesa sobre a qual a caixa é colocada, tem um buraco, diz Teller, então Georgia pode afundarfora do alcance da serra. Quando o público pensa que está tudo explicado e o truque acabou, os dois mágicos acidentalmente a cortam em pedaços, deixando o público perplexo mais uma vez.

A mensagem é óbvia, disse Teller: “Você acha que sabe como são feitos os truques de mágica. E talvez saiba, ou talvez não”.

De todos os mágicos que apresentaram o truque, David Copperfield é considerado por muitos o mestre, graças à sua versão de 1986, conhecida como “Serra da Morte’, que reinventa a ilusão como um espetáculo no estilo de Las Vegas, usando uma enorme lâmina rotativa que vem descendo.

Quando a serra circular cortou Copperfield em dois, duas assistentes puxam as seções e ele mexe o pé serrado, então, por alguma mágica, volta no tempo e cola suas duas partes novamente.

Levou dois anos para montá-la, explicou Copperfield em uma entrevista por telefone, e precisou de “muito papelão, espuma e fita em quartos de hotel”.

A versão de Copperfield do número clássico se distingue das outras, em parte porque o próprio mágico é cortado ao meio. Como na maioria dos truques um homem corta uma mulher em duas, o truque é considerado por alguns um símbolo de misoginia.

Flom foi o único mágico com o qual eu falei que ficou feliz em explicar como funcionava o seu truque. Custou aproximadamente US$ 15 mil, ele contou, na maior parte gastos com um espelho especial, e vários outros elementos que não revelarei. (Certa ajuda da avó foi gratuita.)

Teller disse que não tinha nenhum problema moral em revelar o seu, apenas um problema artístico: isto acabaria com a graça de tentar adivinhar, ele disse. Tudo o que nós precisamos saber a respeito de como cortar uma pessoa em duas partes, afirmou Teller, é que, na realidade, ninguém é cortado ao meio. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA

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