Cientistas que estudavam uma amostra de crosta oceânica retirada do leito do Oceano Pacífico a cerca de 1.500 metros de profundidade descobriram traços de um um raro isótopo de plutônio, o mortífero elemento químico crucial na Era Atômica.
Eles afirmam que esse plutônio foi produzido pela colisão de estrelas e depois entrou na atmosfera terrestre como poeira cósmica, milhões de anos atrás. A análise abre uma nova janela ao cosmos.
“É impressionante como uns poucos átomos que caíram na Terra nos ajudam a aprender como metade de todos os elementos mais pesados do nosso universo é sintetizada”, afirmou Anton Wallner, físico nuclear e principal autor do estudo. Wallner trabalha na Universidade Nacional Australiana e no Centro Helmholtz, em Dresden, Alemanha.
Wallner e seus colegas publicaram as descobertas em maio na revista Science.
O plutônio tem uma péssima reputação - e bem merecida.
O elemento radioativo foi o combustível do primeiro teste de explosão nuclear do mundo e também da bomba que arrasou a cidade japonesa de Nagasaki durante a Segunda Guerra Mundial. Depois da guerra, cientistas descobriram que o plutônio causa sérios danos à saúde, particularmente mortíferos. Se inalado ou ingerido em minúsculas quantidades, pode resultar em cânceres fatais. Pequenas quantidades também possuem maior poder de destruição do que outros combustíveis nucleares, uma qualidade que ajuda na fabricação das compactas e devastadoras ogivas que as potências nucleares instalam na ponta de seus mísseis balísticos intercontinentais.
O plutônio é, com frequência, considerado um elemento artificial, porque muito dificilmente é encontrado fora de criações humanas. Na tabela periódica, é o último dos 94 átomos caracterizados como de ocorrência natural. Traços do elemento podem ser encontrados em minérios de urânio. Há muito tempo, astrofísicos sabem que o plutônio também ocorre espontaneamente em outras partes do universo. Mas eles tinham problemas em determinar os lugares exatos para suas origens.
O que torna um oceano profundo um bom lugar para colher pistas vindas do espaço sideral é seu extremo isolamento em relação às alterações que ocorrem na superfície do planeta. O fundo do mar é um santuário, onde as coisas que estão lá não sofrem perturbações por milhões de anos. Nesse caso, os cientistas tiveram sorte por ter a chance de estudar material colhido por uma expedição japonesa que explorou o leito equatorial do Oceano Pacífico.
Em seus núcleos, as estrelas transformam elementos leves em elementos mais pesados, criando elementos com peso no máximo igual ao do ferro. A nova descoberta revela contribuições relativas a duas diferentes maneiras pelas quais o universo, segundo as hipóteses, cria todos os elementos mais pesados que o ferro, incluindo muitos que são utilizados na vida cotidiana, como cobre e zinco, mercúrio e iodo.
As explosivas estrelas conhecidas como supernovas há muito tempo são vistas como sua principal fonte. O súbito colapso gravitacional de uma estrela maciça transforma grande parte de sua matéria em metais pesados, que ricocheteiam para o espaço sideral quando o astro é sacudido por uma explosão colossal. Esses elementos em movimento finalmente se misturam a átomos mais comuns e se tornam a matéria-prima de novas estrelas e planetas, ou até mesmo da vida, no caso dos humanos.
O segundo caminho é uma variação do primeiro. Uma supernova deixa como rastro um núcleo denso e compacto, conhecido como estrela de nêutrons, que comporta a mesma quantidade de massa que o sol, em uma área similar à de Manhattan. Considera-se também que a fusão entre um par orbital de estrelas de nêutrons possa produzir uma torrente de metais pesados, incluindo ouro e prata. Em 2017, pela primeira vez, astrônomos que buscavam ondas gravitacionais encontraram prova de duas estrelas de nêutrons se chocando, o que deu à teoria cósmica um significativo incentivo.
Agora, cientistas relataram ter encontrado raros isótopos de ferro e plutônio que sugerem que a origem do plutônio tem menos probabilidade de ter ocorrido em uma supernova do que numa fusão de estrelas de nêutrons.
“Em escalas de tempo cósmico”, afirmou Wallner, “essas características parecem muito de ocorrências recentes de explosões”. Os cientistas estimaram que esses átomos específicos de plutônio chegaram à Terra nos últimos 10 milhões de anos.
Isótopos são variedades de um mesmo elemento, cujos núcleos possuem diferentes números de partículas subatômicas, conhecidas como nêutrons. A maior parte do plutônio encontrado na Terra, produzido em reatores atômicos, é plutônio 239. Seu núcleo contém 145 nêutrons, e é o material usado usado normalmente para detonar a força explosiva da bomba de hidrogênio.
Grande parte do leito marítimo global é rica em crostas rochosas de metais terrestres, depositados ao longo de milhões de anos. A amostra coletada tinha cerca de 2,5 centímetros de grossura e 45 centímetros de área. Os cientistas procuraram pelo plutônio extraterrestre nas camadas mais profundas, usando um instrumento de detecção extremamente sensível, otimizado para a descoberta de minúsculos traços de plutônio. O equipamento detectou dezenas de ocorrências de átomos cósmicos. E não de plutônio 239, mas do raro isótopo 244, que possui 150 nêutrons.
Os cientistas descobriram que os raros isótopos de ferro e plutônio na amostra submarina tinham uma proporção “inferior à necessária” caso a fonte principal do plutônio fosse uma supernova. Os autores concluíram que outros eventos astrofísicos, como fusões de estrelas de nêutrons, devem ter contribuído para sua criação.
Países que possuem armamento nuclear realizaram experimentos com variados isótopos de plutônio desde o início da Era Atômica, mas encontraram pouco plutônio 244 na Terra. Wallner afirma que ele e seus colegas estão seguindo de perto o rastro cósmico. “Já passamos para outra amostra significativamente maior”, notou Wallner, acrescentando que está ávido por aprender mais. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL
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