Sinagoga histórica de Londres luta para não ficar nas sombras


Arranha-céus estão sendo construídos ou esperando autorização no bairro onde templo judaico está há mais de 300 anos

Por Mark Landler

LONDRES – O rabino Shalom Morris passou por um andaime que os trabalhadores da construção estavam ruidosamente desmontando enquanto mostrava sua sinagoga de 320 anos, a Bevis Marks, a um visitante. Quando a reforma estiver concluída, haverá um novo centro de visitantes no pátio aconchegante ao lado do prédio.

Mas Morris estava menos preocupado com o próprio projeto de construção do que com dois outros ao lado, para os quais as construtoras estão buscando aprovação. Ambos são prédios de escritórios – um de 20 e outro de 48 andares – e, segundo ele, se forem construídos, vão deixar uma das casas de adoração mais veneráveis de Londres em uma sombra quase permanente. "Se fosse ao lado da Catedral de São Paulo, isso não aconteceria. Eles estão dispostos, na melhor das hipóteses, a arriscar e, na pior, a fazer um mal duradouro", disse Morris, de 41 anos, ex-morador de Nova York que supervisiona a sinagoga, a mais antiga da Grã-Bretanha, há seis anos.

A sinagoga de mais de 300 anos sobrevive em um bairro que assiste a arranha-céus se erguendo. Foto: Andrew Testa/The New York Times
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Não é que o rabino se oponha a todos os arranha-céus. A Bevis Marks já está localizada em uma floresta de vidro e aço de grandes prédios, muitos com apelidos bobos – o Gherkin, o Walkie Talkie, o Cheesegrater –, que transformaram o distrito financeiro de Londres, conhecido como City, em uma espécie de versão Lego de Chicago.

Morris afirma, porém, que essas últimas torres, a leste e ao sul da Bevis Marks, seriam uma mudança radical, bloqueando a já preciosa luz solar de Londres, que hoje entra por suas janelas em arco desde a manhã até a tarde. O status de marco da sinagoga impede que esta aumente o uso de luz artificial, que é fornecida por arandelas da década de 1920 afixadas em seus pilares de sustentação. "Há uma serenidade incrível no pátio que o prepara para entrar na sinagoga, mas, quando há 50 andares olhando para você, colocando você nas sombras, essa experiência se perde", garantiu Morris.

Essa afirmação está aberta ao debate: as construtoras encomendaram estudos que dizem mostrar que haveria pouca perda de luz solar. A sinagoga tem estudos concorrentes que mostram que haveria muita perda. Mas não há dúvida de que a Bevis Marks vem sendo cercada pelo mundo comercial que cresceu ao seu redor – e os dois possíveis prédios aumentariam a sensação de sufocamento.

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Agora cercada por edifícios de escritórios mais baixos e com sua entrada em um arco de pedra que passa despercebido, a sinagoga de tijolos avermelhados foi construída em 1701 para se misturar com seus arredores, em um estilo clássico influenciado por Christopher Wren, o arquiteto da Catedral de São Paulo.

Seus primeiros frequentadores foram judeus de Portugal e da Espanha que fugiram da Inquisição e foram autorizados por Oliver Cromwell em 1657 a praticar sua fé na Inglaterra. A congregação de hoje é uma mistura de descendentes daqueles judeus sefarditas e de alguns funcionários de escritório que passam por aqui para as orações matinais.

As tensões sobre edifícios altos, bem conhecidas dos nova-iorquinos que se opõem a arranha-céus de luxo ao sul do Central Park, não são novidade em Londres. Isso é particularmente verdade na City, que data das origens romanas de Londres e tem dezenas de edifícios historicamente significativos, do Guildhall ao Banco da Inglaterra.

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Rabino Shalom Morris, que congregava em Nova York, na sinagoga Bevis Marks, em Londres. Foto: Andrew Testa/The New York Times

O simbolismo profundo da Bevis Marks para a comunidade judaica de Londres, no entanto, faz da situação algo mais do que uma simples confusão entre as construtoras e os guardiões de um local que é um marco histórico.

"Os edifícios religiosos precisam ser tratados com cuidado particular. A luz é uma parte essencial da experiência espiritual. Se é impensável que uma catedral seja confrontada com esse tipo de desafio, por que uma sinagoga deveria?", disse Stephen Graham, professor de cidades e sociedade na Universidade de Newcastle.

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Os dois prédios em questão são bastante modestos para os padrões extravagantes de alguns arranha-céus da cidade. Estão em diferentes estágios de um longo processo de análise, mas ambos poderiam ser aprovados até o fim do ano.

O Welput, fundo imobiliário que está desenvolvendo o mais alto, em 31 Bury Street, não quis comentar como seu edifício afetaria a sinagoga porque estava em um período de consulta pública. A Merchant Land, desenvolvedora do outro, em 33 Creechurch Lane, garantiu que estudos mostraram que seu edifício não teria impacto negativo significativo e que trabalhava com a sinagoga desde 2017 para tentar resolver suas preocupações com a luz do dia. "A Merchant Land reconhece que nem todas as objeções da sinagoga foram resolvidas satisfatoriamente para ela", afirmou em um comunicado, acrescentando que estava "empenhada em construir uma relação positiva baseada em acomodar as necessidades uns dos outros".

Morris reuniu suas centenas de congregantes para apresentar objeções aos projetos. Com o antissemitismo crescendo na Europa e nos Estados Unidos – e infectando o discurso político britânico, particularmente nas fileiras do Partido Trabalhista –, ele e os outros apoiadores da Bevis Marks argumentam que os planejadores da cidade devem se esforçar mais para protegê-la.

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"Isso torna a preservação deste lugar ainda mais importante. O que temos aqui é uma vítima de um processo de planejamento falho", declarou Sir Michael Bear, ex-prefeito de Londres que é judeu e cuja filha se casou na Bevis Marks.

Bear, engenheiro e desenvolvedor que construiu o amplo mercado de Spitalfields no leste de Londres, disse acreditar que havia uma boa chance de que um dos projetos fosse aprovado, ou mesmo ambos. Segundo ele, houve um tremendo incentivo para aprovar novos prédios de escritórios visando demonstrar que a cidade havia se recuperado depois do Brexit e da pandemia do coronavírus. O paradoxo é que a pandemia levantou questões persistentes sobre o futuro do local de trabalho e sobre quem ocupará esses edifícios gigantescos.

Mesmo agora, com grande parte de Londres voltando à vida normal, a cidade permanece tranquila, muitos de seus prédios ainda quase desertos. No entanto, o barulho de bate-estacas e martelos ecoa pelas ruas, à medida que mais arranha-céus vão sendo erguidos.

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Operários trabalham na reforma da sinagoga Bevis Marks. Foto: Andrew Testa/The New York Times

A Bevis Marks irritou alguns de seus congregantes em 2018, quando pediu que se opusessem a uma terceira torre proposta nas proximidades no mesmo terreno, mas depois abandonou abruptamente sua oposição quando a construtora concordou em doar um valor não revelado em dinheiro para ajudar a construir o centro de visitantes. Morris agora diz que a decisão de fazer um acordo foi um erro.

A torre em forma de cunha de 56 andares, apelidada de Cheesegrater 2, foi aprovada, mas ainda não foi construída. A sinagoga acabou financiando o centro de visitantes a partir de outras fontes, incluindo uma doação de 2,8 milhões de libras, ou US$ 3,8 milhões, do Fundo Nacional do Patrimônio da Loteria, que desembolsa recursos arrecadados por meio da loteria para projetos que preservam o patrimônio da nação.

O príncipe Charles é um patrono do centro, que vai exibir relíquias da coleção da sinagoga, incluindo prata cerimonial e vestes, informou o rabino. Charles sempre se manifestou em questões de desenvolvimento em Londres (uma vez ele descreveu uma extensão modernista proposta para a Galeria Nacional como um "carbúnculo monstruoso no rosto de um amigo muito amado e elegante"), mas ainda não se envolveu nessa disputa.

A City of London Corp., que decidirá sobre os novos prédios, não quis comentar, assim como o prefeito de Londres, Sadiq Khan. Este tem usado periodicamente seus poderes para tentar bloquear projetos, incluindo a Tulip, torre de observação que ficaria ao lado do Gherkin.

Graham, cujo livro Vertical explora o impulso de construir para cima, disse que a pressão para aprovar prédios em Londres persistiria por causa da crença equivocada de que, "para ser uma cidade global, você precisa ter um horizonte no estilo de Nova York". Segundo ele, isso levou a um fascínio por "prédios identificáveis, semelhantes a brinquedos", que contrastam fortemente com a estética clássica de Wren, como a da sinagoga Bevis Marks.

"Reconhecemos que a cidade quer se desenvolver de alguma forma, mas há certa surdez para as implicações disso", disse Morris, enquanto passeava em frente ao Gherkin, olhando para cima.

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Time

LONDRES – O rabino Shalom Morris passou por um andaime que os trabalhadores da construção estavam ruidosamente desmontando enquanto mostrava sua sinagoga de 320 anos, a Bevis Marks, a um visitante. Quando a reforma estiver concluída, haverá um novo centro de visitantes no pátio aconchegante ao lado do prédio.

Mas Morris estava menos preocupado com o próprio projeto de construção do que com dois outros ao lado, para os quais as construtoras estão buscando aprovação. Ambos são prédios de escritórios – um de 20 e outro de 48 andares – e, segundo ele, se forem construídos, vão deixar uma das casas de adoração mais veneráveis de Londres em uma sombra quase permanente. "Se fosse ao lado da Catedral de São Paulo, isso não aconteceria. Eles estão dispostos, na melhor das hipóteses, a arriscar e, na pior, a fazer um mal duradouro", disse Morris, de 41 anos, ex-morador de Nova York que supervisiona a sinagoga, a mais antiga da Grã-Bretanha, há seis anos.

A sinagoga de mais de 300 anos sobrevive em um bairro que assiste a arranha-céus se erguendo. Foto: Andrew Testa/The New York Times

Não é que o rabino se oponha a todos os arranha-céus. A Bevis Marks já está localizada em uma floresta de vidro e aço de grandes prédios, muitos com apelidos bobos – o Gherkin, o Walkie Talkie, o Cheesegrater –, que transformaram o distrito financeiro de Londres, conhecido como City, em uma espécie de versão Lego de Chicago.

Morris afirma, porém, que essas últimas torres, a leste e ao sul da Bevis Marks, seriam uma mudança radical, bloqueando a já preciosa luz solar de Londres, que hoje entra por suas janelas em arco desde a manhã até a tarde. O status de marco da sinagoga impede que esta aumente o uso de luz artificial, que é fornecida por arandelas da década de 1920 afixadas em seus pilares de sustentação. "Há uma serenidade incrível no pátio que o prepara para entrar na sinagoga, mas, quando há 50 andares olhando para você, colocando você nas sombras, essa experiência se perde", garantiu Morris.

Essa afirmação está aberta ao debate: as construtoras encomendaram estudos que dizem mostrar que haveria pouca perda de luz solar. A sinagoga tem estudos concorrentes que mostram que haveria muita perda. Mas não há dúvida de que a Bevis Marks vem sendo cercada pelo mundo comercial que cresceu ao seu redor – e os dois possíveis prédios aumentariam a sensação de sufocamento.

Agora cercada por edifícios de escritórios mais baixos e com sua entrada em um arco de pedra que passa despercebido, a sinagoga de tijolos avermelhados foi construída em 1701 para se misturar com seus arredores, em um estilo clássico influenciado por Christopher Wren, o arquiteto da Catedral de São Paulo.

Seus primeiros frequentadores foram judeus de Portugal e da Espanha que fugiram da Inquisição e foram autorizados por Oliver Cromwell em 1657 a praticar sua fé na Inglaterra. A congregação de hoje é uma mistura de descendentes daqueles judeus sefarditas e de alguns funcionários de escritório que passam por aqui para as orações matinais.

As tensões sobre edifícios altos, bem conhecidas dos nova-iorquinos que se opõem a arranha-céus de luxo ao sul do Central Park, não são novidade em Londres. Isso é particularmente verdade na City, que data das origens romanas de Londres e tem dezenas de edifícios historicamente significativos, do Guildhall ao Banco da Inglaterra.

Rabino Shalom Morris, que congregava em Nova York, na sinagoga Bevis Marks, em Londres. Foto: Andrew Testa/The New York Times

O simbolismo profundo da Bevis Marks para a comunidade judaica de Londres, no entanto, faz da situação algo mais do que uma simples confusão entre as construtoras e os guardiões de um local que é um marco histórico.

"Os edifícios religiosos precisam ser tratados com cuidado particular. A luz é uma parte essencial da experiência espiritual. Se é impensável que uma catedral seja confrontada com esse tipo de desafio, por que uma sinagoga deveria?", disse Stephen Graham, professor de cidades e sociedade na Universidade de Newcastle.

Os dois prédios em questão são bastante modestos para os padrões extravagantes de alguns arranha-céus da cidade. Estão em diferentes estágios de um longo processo de análise, mas ambos poderiam ser aprovados até o fim do ano.

O Welput, fundo imobiliário que está desenvolvendo o mais alto, em 31 Bury Street, não quis comentar como seu edifício afetaria a sinagoga porque estava em um período de consulta pública. A Merchant Land, desenvolvedora do outro, em 33 Creechurch Lane, garantiu que estudos mostraram que seu edifício não teria impacto negativo significativo e que trabalhava com a sinagoga desde 2017 para tentar resolver suas preocupações com a luz do dia. "A Merchant Land reconhece que nem todas as objeções da sinagoga foram resolvidas satisfatoriamente para ela", afirmou em um comunicado, acrescentando que estava "empenhada em construir uma relação positiva baseada em acomodar as necessidades uns dos outros".

Morris reuniu suas centenas de congregantes para apresentar objeções aos projetos. Com o antissemitismo crescendo na Europa e nos Estados Unidos – e infectando o discurso político britânico, particularmente nas fileiras do Partido Trabalhista –, ele e os outros apoiadores da Bevis Marks argumentam que os planejadores da cidade devem se esforçar mais para protegê-la.

"Isso torna a preservação deste lugar ainda mais importante. O que temos aqui é uma vítima de um processo de planejamento falho", declarou Sir Michael Bear, ex-prefeito de Londres que é judeu e cuja filha se casou na Bevis Marks.

Bear, engenheiro e desenvolvedor que construiu o amplo mercado de Spitalfields no leste de Londres, disse acreditar que havia uma boa chance de que um dos projetos fosse aprovado, ou mesmo ambos. Segundo ele, houve um tremendo incentivo para aprovar novos prédios de escritórios visando demonstrar que a cidade havia se recuperado depois do Brexit e da pandemia do coronavírus. O paradoxo é que a pandemia levantou questões persistentes sobre o futuro do local de trabalho e sobre quem ocupará esses edifícios gigantescos.

Mesmo agora, com grande parte de Londres voltando à vida normal, a cidade permanece tranquila, muitos de seus prédios ainda quase desertos. No entanto, o barulho de bate-estacas e martelos ecoa pelas ruas, à medida que mais arranha-céus vão sendo erguidos.

Operários trabalham na reforma da sinagoga Bevis Marks. Foto: Andrew Testa/The New York Times

A Bevis Marks irritou alguns de seus congregantes em 2018, quando pediu que se opusessem a uma terceira torre proposta nas proximidades no mesmo terreno, mas depois abandonou abruptamente sua oposição quando a construtora concordou em doar um valor não revelado em dinheiro para ajudar a construir o centro de visitantes. Morris agora diz que a decisão de fazer um acordo foi um erro.

A torre em forma de cunha de 56 andares, apelidada de Cheesegrater 2, foi aprovada, mas ainda não foi construída. A sinagoga acabou financiando o centro de visitantes a partir de outras fontes, incluindo uma doação de 2,8 milhões de libras, ou US$ 3,8 milhões, do Fundo Nacional do Patrimônio da Loteria, que desembolsa recursos arrecadados por meio da loteria para projetos que preservam o patrimônio da nação.

O príncipe Charles é um patrono do centro, que vai exibir relíquias da coleção da sinagoga, incluindo prata cerimonial e vestes, informou o rabino. Charles sempre se manifestou em questões de desenvolvimento em Londres (uma vez ele descreveu uma extensão modernista proposta para a Galeria Nacional como um "carbúnculo monstruoso no rosto de um amigo muito amado e elegante"), mas ainda não se envolveu nessa disputa.

A City of London Corp., que decidirá sobre os novos prédios, não quis comentar, assim como o prefeito de Londres, Sadiq Khan. Este tem usado periodicamente seus poderes para tentar bloquear projetos, incluindo a Tulip, torre de observação que ficaria ao lado do Gherkin.

Graham, cujo livro Vertical explora o impulso de construir para cima, disse que a pressão para aprovar prédios em Londres persistiria por causa da crença equivocada de que, "para ser uma cidade global, você precisa ter um horizonte no estilo de Nova York". Segundo ele, isso levou a um fascínio por "prédios identificáveis, semelhantes a brinquedos", que contrastam fortemente com a estética clássica de Wren, como a da sinagoga Bevis Marks.

"Reconhecemos que a cidade quer se desenvolver de alguma forma, mas há certa surdez para as implicações disso", disse Morris, enquanto passeava em frente ao Gherkin, olhando para cima.

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Time

LONDRES – O rabino Shalom Morris passou por um andaime que os trabalhadores da construção estavam ruidosamente desmontando enquanto mostrava sua sinagoga de 320 anos, a Bevis Marks, a um visitante. Quando a reforma estiver concluída, haverá um novo centro de visitantes no pátio aconchegante ao lado do prédio.

Mas Morris estava menos preocupado com o próprio projeto de construção do que com dois outros ao lado, para os quais as construtoras estão buscando aprovação. Ambos são prédios de escritórios – um de 20 e outro de 48 andares – e, segundo ele, se forem construídos, vão deixar uma das casas de adoração mais veneráveis de Londres em uma sombra quase permanente. "Se fosse ao lado da Catedral de São Paulo, isso não aconteceria. Eles estão dispostos, na melhor das hipóteses, a arriscar e, na pior, a fazer um mal duradouro", disse Morris, de 41 anos, ex-morador de Nova York que supervisiona a sinagoga, a mais antiga da Grã-Bretanha, há seis anos.

A sinagoga de mais de 300 anos sobrevive em um bairro que assiste a arranha-céus se erguendo. Foto: Andrew Testa/The New York Times

Não é que o rabino se oponha a todos os arranha-céus. A Bevis Marks já está localizada em uma floresta de vidro e aço de grandes prédios, muitos com apelidos bobos – o Gherkin, o Walkie Talkie, o Cheesegrater –, que transformaram o distrito financeiro de Londres, conhecido como City, em uma espécie de versão Lego de Chicago.

Morris afirma, porém, que essas últimas torres, a leste e ao sul da Bevis Marks, seriam uma mudança radical, bloqueando a já preciosa luz solar de Londres, que hoje entra por suas janelas em arco desde a manhã até a tarde. O status de marco da sinagoga impede que esta aumente o uso de luz artificial, que é fornecida por arandelas da década de 1920 afixadas em seus pilares de sustentação. "Há uma serenidade incrível no pátio que o prepara para entrar na sinagoga, mas, quando há 50 andares olhando para você, colocando você nas sombras, essa experiência se perde", garantiu Morris.

Essa afirmação está aberta ao debate: as construtoras encomendaram estudos que dizem mostrar que haveria pouca perda de luz solar. A sinagoga tem estudos concorrentes que mostram que haveria muita perda. Mas não há dúvida de que a Bevis Marks vem sendo cercada pelo mundo comercial que cresceu ao seu redor – e os dois possíveis prédios aumentariam a sensação de sufocamento.

Agora cercada por edifícios de escritórios mais baixos e com sua entrada em um arco de pedra que passa despercebido, a sinagoga de tijolos avermelhados foi construída em 1701 para se misturar com seus arredores, em um estilo clássico influenciado por Christopher Wren, o arquiteto da Catedral de São Paulo.

Seus primeiros frequentadores foram judeus de Portugal e da Espanha que fugiram da Inquisição e foram autorizados por Oliver Cromwell em 1657 a praticar sua fé na Inglaterra. A congregação de hoje é uma mistura de descendentes daqueles judeus sefarditas e de alguns funcionários de escritório que passam por aqui para as orações matinais.

As tensões sobre edifícios altos, bem conhecidas dos nova-iorquinos que se opõem a arranha-céus de luxo ao sul do Central Park, não são novidade em Londres. Isso é particularmente verdade na City, que data das origens romanas de Londres e tem dezenas de edifícios historicamente significativos, do Guildhall ao Banco da Inglaterra.

Rabino Shalom Morris, que congregava em Nova York, na sinagoga Bevis Marks, em Londres. Foto: Andrew Testa/The New York Times

O simbolismo profundo da Bevis Marks para a comunidade judaica de Londres, no entanto, faz da situação algo mais do que uma simples confusão entre as construtoras e os guardiões de um local que é um marco histórico.

"Os edifícios religiosos precisam ser tratados com cuidado particular. A luz é uma parte essencial da experiência espiritual. Se é impensável que uma catedral seja confrontada com esse tipo de desafio, por que uma sinagoga deveria?", disse Stephen Graham, professor de cidades e sociedade na Universidade de Newcastle.

Os dois prédios em questão são bastante modestos para os padrões extravagantes de alguns arranha-céus da cidade. Estão em diferentes estágios de um longo processo de análise, mas ambos poderiam ser aprovados até o fim do ano.

O Welput, fundo imobiliário que está desenvolvendo o mais alto, em 31 Bury Street, não quis comentar como seu edifício afetaria a sinagoga porque estava em um período de consulta pública. A Merchant Land, desenvolvedora do outro, em 33 Creechurch Lane, garantiu que estudos mostraram que seu edifício não teria impacto negativo significativo e que trabalhava com a sinagoga desde 2017 para tentar resolver suas preocupações com a luz do dia. "A Merchant Land reconhece que nem todas as objeções da sinagoga foram resolvidas satisfatoriamente para ela", afirmou em um comunicado, acrescentando que estava "empenhada em construir uma relação positiva baseada em acomodar as necessidades uns dos outros".

Morris reuniu suas centenas de congregantes para apresentar objeções aos projetos. Com o antissemitismo crescendo na Europa e nos Estados Unidos – e infectando o discurso político britânico, particularmente nas fileiras do Partido Trabalhista –, ele e os outros apoiadores da Bevis Marks argumentam que os planejadores da cidade devem se esforçar mais para protegê-la.

"Isso torna a preservação deste lugar ainda mais importante. O que temos aqui é uma vítima de um processo de planejamento falho", declarou Sir Michael Bear, ex-prefeito de Londres que é judeu e cuja filha se casou na Bevis Marks.

Bear, engenheiro e desenvolvedor que construiu o amplo mercado de Spitalfields no leste de Londres, disse acreditar que havia uma boa chance de que um dos projetos fosse aprovado, ou mesmo ambos. Segundo ele, houve um tremendo incentivo para aprovar novos prédios de escritórios visando demonstrar que a cidade havia se recuperado depois do Brexit e da pandemia do coronavírus. O paradoxo é que a pandemia levantou questões persistentes sobre o futuro do local de trabalho e sobre quem ocupará esses edifícios gigantescos.

Mesmo agora, com grande parte de Londres voltando à vida normal, a cidade permanece tranquila, muitos de seus prédios ainda quase desertos. No entanto, o barulho de bate-estacas e martelos ecoa pelas ruas, à medida que mais arranha-céus vão sendo erguidos.

Operários trabalham na reforma da sinagoga Bevis Marks. Foto: Andrew Testa/The New York Times

A Bevis Marks irritou alguns de seus congregantes em 2018, quando pediu que se opusessem a uma terceira torre proposta nas proximidades no mesmo terreno, mas depois abandonou abruptamente sua oposição quando a construtora concordou em doar um valor não revelado em dinheiro para ajudar a construir o centro de visitantes. Morris agora diz que a decisão de fazer um acordo foi um erro.

A torre em forma de cunha de 56 andares, apelidada de Cheesegrater 2, foi aprovada, mas ainda não foi construída. A sinagoga acabou financiando o centro de visitantes a partir de outras fontes, incluindo uma doação de 2,8 milhões de libras, ou US$ 3,8 milhões, do Fundo Nacional do Patrimônio da Loteria, que desembolsa recursos arrecadados por meio da loteria para projetos que preservam o patrimônio da nação.

O príncipe Charles é um patrono do centro, que vai exibir relíquias da coleção da sinagoga, incluindo prata cerimonial e vestes, informou o rabino. Charles sempre se manifestou em questões de desenvolvimento em Londres (uma vez ele descreveu uma extensão modernista proposta para a Galeria Nacional como um "carbúnculo monstruoso no rosto de um amigo muito amado e elegante"), mas ainda não se envolveu nessa disputa.

A City of London Corp., que decidirá sobre os novos prédios, não quis comentar, assim como o prefeito de Londres, Sadiq Khan. Este tem usado periodicamente seus poderes para tentar bloquear projetos, incluindo a Tulip, torre de observação que ficaria ao lado do Gherkin.

Graham, cujo livro Vertical explora o impulso de construir para cima, disse que a pressão para aprovar prédios em Londres persistiria por causa da crença equivocada de que, "para ser uma cidade global, você precisa ter um horizonte no estilo de Nova York". Segundo ele, isso levou a um fascínio por "prédios identificáveis, semelhantes a brinquedos", que contrastam fortemente com a estética clássica de Wren, como a da sinagoga Bevis Marks.

"Reconhecemos que a cidade quer se desenvolver de alguma forma, mas há certa surdez para as implicações disso", disse Morris, enquanto passeava em frente ao Gherkin, olhando para cima.

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Time

LONDRES – O rabino Shalom Morris passou por um andaime que os trabalhadores da construção estavam ruidosamente desmontando enquanto mostrava sua sinagoga de 320 anos, a Bevis Marks, a um visitante. Quando a reforma estiver concluída, haverá um novo centro de visitantes no pátio aconchegante ao lado do prédio.

Mas Morris estava menos preocupado com o próprio projeto de construção do que com dois outros ao lado, para os quais as construtoras estão buscando aprovação. Ambos são prédios de escritórios – um de 20 e outro de 48 andares – e, segundo ele, se forem construídos, vão deixar uma das casas de adoração mais veneráveis de Londres em uma sombra quase permanente. "Se fosse ao lado da Catedral de São Paulo, isso não aconteceria. Eles estão dispostos, na melhor das hipóteses, a arriscar e, na pior, a fazer um mal duradouro", disse Morris, de 41 anos, ex-morador de Nova York que supervisiona a sinagoga, a mais antiga da Grã-Bretanha, há seis anos.

A sinagoga de mais de 300 anos sobrevive em um bairro que assiste a arranha-céus se erguendo. Foto: Andrew Testa/The New York Times

Não é que o rabino se oponha a todos os arranha-céus. A Bevis Marks já está localizada em uma floresta de vidro e aço de grandes prédios, muitos com apelidos bobos – o Gherkin, o Walkie Talkie, o Cheesegrater –, que transformaram o distrito financeiro de Londres, conhecido como City, em uma espécie de versão Lego de Chicago.

Morris afirma, porém, que essas últimas torres, a leste e ao sul da Bevis Marks, seriam uma mudança radical, bloqueando a já preciosa luz solar de Londres, que hoje entra por suas janelas em arco desde a manhã até a tarde. O status de marco da sinagoga impede que esta aumente o uso de luz artificial, que é fornecida por arandelas da década de 1920 afixadas em seus pilares de sustentação. "Há uma serenidade incrível no pátio que o prepara para entrar na sinagoga, mas, quando há 50 andares olhando para você, colocando você nas sombras, essa experiência se perde", garantiu Morris.

Essa afirmação está aberta ao debate: as construtoras encomendaram estudos que dizem mostrar que haveria pouca perda de luz solar. A sinagoga tem estudos concorrentes que mostram que haveria muita perda. Mas não há dúvida de que a Bevis Marks vem sendo cercada pelo mundo comercial que cresceu ao seu redor – e os dois possíveis prédios aumentariam a sensação de sufocamento.

Agora cercada por edifícios de escritórios mais baixos e com sua entrada em um arco de pedra que passa despercebido, a sinagoga de tijolos avermelhados foi construída em 1701 para se misturar com seus arredores, em um estilo clássico influenciado por Christopher Wren, o arquiteto da Catedral de São Paulo.

Seus primeiros frequentadores foram judeus de Portugal e da Espanha que fugiram da Inquisição e foram autorizados por Oliver Cromwell em 1657 a praticar sua fé na Inglaterra. A congregação de hoje é uma mistura de descendentes daqueles judeus sefarditas e de alguns funcionários de escritório que passam por aqui para as orações matinais.

As tensões sobre edifícios altos, bem conhecidas dos nova-iorquinos que se opõem a arranha-céus de luxo ao sul do Central Park, não são novidade em Londres. Isso é particularmente verdade na City, que data das origens romanas de Londres e tem dezenas de edifícios historicamente significativos, do Guildhall ao Banco da Inglaterra.

Rabino Shalom Morris, que congregava em Nova York, na sinagoga Bevis Marks, em Londres. Foto: Andrew Testa/The New York Times

O simbolismo profundo da Bevis Marks para a comunidade judaica de Londres, no entanto, faz da situação algo mais do que uma simples confusão entre as construtoras e os guardiões de um local que é um marco histórico.

"Os edifícios religiosos precisam ser tratados com cuidado particular. A luz é uma parte essencial da experiência espiritual. Se é impensável que uma catedral seja confrontada com esse tipo de desafio, por que uma sinagoga deveria?", disse Stephen Graham, professor de cidades e sociedade na Universidade de Newcastle.

Os dois prédios em questão são bastante modestos para os padrões extravagantes de alguns arranha-céus da cidade. Estão em diferentes estágios de um longo processo de análise, mas ambos poderiam ser aprovados até o fim do ano.

O Welput, fundo imobiliário que está desenvolvendo o mais alto, em 31 Bury Street, não quis comentar como seu edifício afetaria a sinagoga porque estava em um período de consulta pública. A Merchant Land, desenvolvedora do outro, em 33 Creechurch Lane, garantiu que estudos mostraram que seu edifício não teria impacto negativo significativo e que trabalhava com a sinagoga desde 2017 para tentar resolver suas preocupações com a luz do dia. "A Merchant Land reconhece que nem todas as objeções da sinagoga foram resolvidas satisfatoriamente para ela", afirmou em um comunicado, acrescentando que estava "empenhada em construir uma relação positiva baseada em acomodar as necessidades uns dos outros".

Morris reuniu suas centenas de congregantes para apresentar objeções aos projetos. Com o antissemitismo crescendo na Europa e nos Estados Unidos – e infectando o discurso político britânico, particularmente nas fileiras do Partido Trabalhista –, ele e os outros apoiadores da Bevis Marks argumentam que os planejadores da cidade devem se esforçar mais para protegê-la.

"Isso torna a preservação deste lugar ainda mais importante. O que temos aqui é uma vítima de um processo de planejamento falho", declarou Sir Michael Bear, ex-prefeito de Londres que é judeu e cuja filha se casou na Bevis Marks.

Bear, engenheiro e desenvolvedor que construiu o amplo mercado de Spitalfields no leste de Londres, disse acreditar que havia uma boa chance de que um dos projetos fosse aprovado, ou mesmo ambos. Segundo ele, houve um tremendo incentivo para aprovar novos prédios de escritórios visando demonstrar que a cidade havia se recuperado depois do Brexit e da pandemia do coronavírus. O paradoxo é que a pandemia levantou questões persistentes sobre o futuro do local de trabalho e sobre quem ocupará esses edifícios gigantescos.

Mesmo agora, com grande parte de Londres voltando à vida normal, a cidade permanece tranquila, muitos de seus prédios ainda quase desertos. No entanto, o barulho de bate-estacas e martelos ecoa pelas ruas, à medida que mais arranha-céus vão sendo erguidos.

Operários trabalham na reforma da sinagoga Bevis Marks. Foto: Andrew Testa/The New York Times

A Bevis Marks irritou alguns de seus congregantes em 2018, quando pediu que se opusessem a uma terceira torre proposta nas proximidades no mesmo terreno, mas depois abandonou abruptamente sua oposição quando a construtora concordou em doar um valor não revelado em dinheiro para ajudar a construir o centro de visitantes. Morris agora diz que a decisão de fazer um acordo foi um erro.

A torre em forma de cunha de 56 andares, apelidada de Cheesegrater 2, foi aprovada, mas ainda não foi construída. A sinagoga acabou financiando o centro de visitantes a partir de outras fontes, incluindo uma doação de 2,8 milhões de libras, ou US$ 3,8 milhões, do Fundo Nacional do Patrimônio da Loteria, que desembolsa recursos arrecadados por meio da loteria para projetos que preservam o patrimônio da nação.

O príncipe Charles é um patrono do centro, que vai exibir relíquias da coleção da sinagoga, incluindo prata cerimonial e vestes, informou o rabino. Charles sempre se manifestou em questões de desenvolvimento em Londres (uma vez ele descreveu uma extensão modernista proposta para a Galeria Nacional como um "carbúnculo monstruoso no rosto de um amigo muito amado e elegante"), mas ainda não se envolveu nessa disputa.

A City of London Corp., que decidirá sobre os novos prédios, não quis comentar, assim como o prefeito de Londres, Sadiq Khan. Este tem usado periodicamente seus poderes para tentar bloquear projetos, incluindo a Tulip, torre de observação que ficaria ao lado do Gherkin.

Graham, cujo livro Vertical explora o impulso de construir para cima, disse que a pressão para aprovar prédios em Londres persistiria por causa da crença equivocada de que, "para ser uma cidade global, você precisa ter um horizonte no estilo de Nova York". Segundo ele, isso levou a um fascínio por "prédios identificáveis, semelhantes a brinquedos", que contrastam fortemente com a estética clássica de Wren, como a da sinagoga Bevis Marks.

"Reconhecemos que a cidade quer se desenvolver de alguma forma, mas há certa surdez para as implicações disso", disse Morris, enquanto passeava em frente ao Gherkin, olhando para cima.

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