DALIAN, China - Em abril, o primeiro porta-aviões construído pela própria China deixou o estaleiro na cidade portuária de Dalian, preso a rebocadores que o levaram para um teste de navegação.
“O primeiro porta-aviões caseiro da China acaba de se mover um pouco, e Estados Unidos, Japão e Índia se contorceram de medo", disse um site de notícias militares, referindo-se aos três países que a China enxerga como seus principais rivais.
Pouco tempo atrás, declarações do tipo seriam vistas como bravatas de um exército de segunda linha.
Mas as coisas mudaram.
Um programa de modernização concentrado em mísseis e forças navais alterou o equilíbrio de forças no Pacífico de formas que os EUA e seus aliados estão apenas começando a perceber.
Ainda que a China tenha dificuldades para projetar seu poder de fogo pelo mapa, o país pode questionar a supremacia americana nos pontos que considera mais importantes: as águas em torno de Taiwan e no disputado Mar do Sul da China.
Isso significa que uma parte cada vez maior do Oceano Pacífico - onde forças americanas operam livremente desde a 2ª Guerra Mundial - volta a ser um território em disputa, com aeronaves e navios de combate chineses envolvidos em constantes encontros com aqueles pertencentes aos EUA e seus aliados.
Analistas e funcionários do governo dizem que, para prevalecer nessas águas, a China não precisa de um exército capaz de derrotar os EUA diretamente, e sim uma força capaz de tornar o custo de uma intervenção demasiadamente alto para que Washington pense nessa possibilidade. Para muitos, Pequim já alcançou esse objetivo.
Para tanto, o país desenvolveu capacidades de “impedimento ao acesso” empregando radar, satélites e mísseis para neutralizar a vantagem decisiva da qual desfrutavam os poderosos grupos de combate formados pelos porta-aviões americanos. O país está também ampliando rapidamente suas forças navais com o objetivo de formar uma “marinha de águas profundas” capaz de defender seus crescentes interesses além das águas costeiras.
“A China pode agora controlar o Mar do Sul da China em todas as projeções que excluem uma guerra com os EUA", disse o almirante Philip S. Davidson, novo comandante do Comando Indo-Pacífico dos EUA, em comentários enviados por escrito ao senado americano em março.
Ele disse que a China tinha alcançado os EUA sem buscar uma paridade de armamentos, e sim apostando em “capacidades assimétricas”, usando mísseis contra navios e investindo na guerra submarina. “Nada garante que os EUA sairiam vitoriosos de um futuro conflito com a China", concluiu ele.
No ano passado, a marinha chinesa se tornou a maior do mundo, superando os EUA em navios de combate e submarinos, e o país segue construindo navios num ritmo impressionante. O porta-aviões levado para testes em abril era o segundo do tipo; o Liaoning, primeiro porta-aviões chinês, é um navio soviético reaproveitado. Há um terceiro em construção.
“A tarefa de construir uma poderosa marinha nunca foi mais urgente do que é hoje", declarou em abril o presidente Xi Jinping.
Aviões e navios de guerra chineses intensificaram suas operações perto do Japão, de Taiwan e das ilhas, bancos de areia e recifes reivindicados pelo país no Mar do Sul da China, apesar da objeção do Vietnã e das Filipinas.
Quando dois navios de guerra americanos - o destroier Higgins e o cruzador Antietam - navegaram perto de ilhas disputadas do arquipélago Paracelso, em maio, embarcações chinesas vieram ao encontro daquilo que Pequim descreveria posteriormente como “provocação". A China fez o mesmo com três navios australianos no Mar do Sul da China em abril.
Faz apenas três anos que Xi esteve ao lado do presidente Barack Obama em Washington, prometendo evitar a militarização das ilhas artificiais construídas mais ao sul no arquipélago das Ilhas Spratlys. As autoridades chinesas já admitiram a instalação de mísseis ali, dizendo que a medida é uma defesa necessária contra as “incursões" americanas.
A expansão naval chinesa teve início em 2000, mas se acelerou depois que Xi assumiu o comando em 2013. Ele transferiu o foco das forças armadas para as forças navais, aéreas e as divisões de foguetes estratégicos, ao mesmo tempo promovendo um expurgo de comandantes acusados de corrupção e reduzindo as forças terrestres.
Em 2017, a China abriu sua primeira base militar no exterior no Djibouti, no Chifre da África, alegando que a instalação será usada em suporte a operações multinacionais de combate à pirataria no litoral da Somália.
Parece agora que os chineses estão obtendo acesso a portos e bases em todo o Oceano Índico. Ainda que ostensivamente comerciais, esses projetos abriram caminho para uma rede de reabastecimento que “facilitará as operações navais de longo alcance de Pequim", de acordo com o grupo de pesquisas C4ADS, de Washington.
“Eles logo poderão enviar um esquadrão para alguma parte da África, por exemplo, com todas as capacidades necessárias para uma aterrissagem ou desembarque maciço para proteger interesses chineses", disse Vassily Kashin, especialista da Academia Russa de Ciências, em Moscou.
“Os chineses estarão mais presentes", acrescentou Kashin, “e todos terão que se acostumar a isso".