Odiada por soldados, 'comida de guerra' encontra base de fãs


Muitas vezes ridicularizadas como 'refeições raramente comestíveis', as comidas conhecidas pela sigla em inglês MRE ficaram (um pouco) melhor e se tornaram objetos de fascínio para milhões de civis

Por Priya Krishna

Kathleen Ehl sempre pensou em seu negócio como um caso de nicho - uma loja on-line chamada North Georgia Outdoors Supply que ela e o marido administram de casa, em Gainesville, e onde vendem MRE (Meals, Ready-to-Eat), que quer dizer refeições prontas para comer.

As MREs são embalagens resistentes com comida de longa duração criadas para as Forças Armadas dos Estados Unidos. Elas não são particularmente elegantes ou apetitosas e, tecnicamente, não podem ser comercializadas se forem feitas a pedido do governo, como a maioria é. Kathleen e seu marido, Oliver Walker, vasculham leilões on-line e lojas que vendem comidas que por alguma razão não podem ser vendidas no mercado de varejo regular em busca dessas refeições e vendem a maioria delas para colecionadores e sobreviventes.

O youtuber Steven Thomas experimenta MREs de vários países e épocas em seus vídeos. Foto: Octavio Jones/The New York Times
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Mas em fevereiro do ano passado, quando o pânico provocado pela pandemia fez com que as compras aumentassem, seus pedidos saltaram de 100 por semana para 100 por dia. “Houve algumas noites em que meu marido e eu embalamos os produtos, depois de colocarmos as crianças para dormir, até as duas horas da manhã”, disse Kathleen, 37 anos.

O início de 2020 foi um período de aumento nas vendas para os distribuidores de MRE em todo os EUA, desde os principais fornecedores militares até as lojas de excedentes do Exército. Até hoje, enquanto as compras de outras obsessões da pandemia diminuíram, o fascínio civil pelas refeições continuou - motivado pela cautela (estocando para a próxima pandemia em potencial ou desastre natural) e pela curiosidade.

Embora os números das vendas de MREs sejam difíceis de calcular, dada a legalidade questionável de algumas comercializações, o número de pessoas na internet que fala sobre essas refeições e prova o gosto delas cresceu para milhões. As pessoas que nunca pensaram que comprariam uma MRE agora as mantêm em seu estoque.

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Ninguém está mais intrigado ou perplexo com o fenômeno do que os cientistas e engenheiros que pesquisam e desenvolvem as refeições na Divisão de Alimentação de Combate do Departamento de Defesa. Na sede da Divisão em Natick, Massachusetts, a equipe passa anos aperfeiçoando cada detalhe de uma MRE antes de ela ser enviada aos fabricantes: este ravioli de carne é o mais nutritivo possível e durável por até três anos? Ele pode sobreviver a uma queda de um helicóptero ou às altas temperaturas do deserto?

As MREs são produzidas com o único objetivo de alimentar integrantes das Forças Armadas em operações distantes de um refeitório ou cozinha de campo. No entanto, muitos civis há tempos se interessam pelo que os soldados comem. Os museus da época das guerras exibem o insosso e nada macio biscoito que alimentou os combatentes da Guerra Civil (americana) e as carnes, os pães e as frutas enlatadas da Segunda Guerra Mundial.

Comidas desidratadas. Foto: Kayana Szymczak/The New York Times
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Na década de 1990, depois de reclamações de soldados servindo na Guerra do Golfo, o foco do desenvolvimento dessa "comida de guerra" mudou para a criação de refeições mais saborosas e mais diversificadas. Os integrantes das Forças Armadas foram convidados a enviar sugestões para o menu, que aumentou de 12 para 24 opções, com opções vegetarianas, halal e kosher entre elas.

Todos os anos, as MREs menos populares são retiradas de circulação e novas são adicionadas; comidas favoritas permanentes, como espaguete com molho de carne ou ravioli de carne, são complementados com pratos como arroz e feijão mexicano. Em 2018, foi lançada a tão esperada pizza MRE, possibilitada pela tecnologia que cria barreiras ao crescimento de micro-organismos entre as camadas de molho, queijo e massa.

Cada MRE contém uma refeição completa – prato principal, aperitivos, sobremesa e bebidas - com uma média de cerca de 1.200 calorias e uma variedade de vitaminas e minerais, alguns deles adicionados. Cada ingrediente está ali por uma razão - o charque é enriquecido com cafeína e a compota de maçã contém maltodextrina, que fornece um aumento de energia.

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Essas escolhas alimentares têm um papel fundamental no campo de batalha, disse Stephen Moody, chefe da Divisão de Alimentação de Combate. “A alimentação certa pode nos dar uma vantagem”, aumentando o estado de alerta de um soldado ou as capacidades de tomada de decisão, disse ele.

Mas por que um civil iria querer comer uma dessas refeições?

Muitas porções são colocadas em tubos pela praticidade, como este molho de espaguete com carne. Foto: Kayana Szymczak/The New York Times
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“Não sei”, disse Julie Smith, técnica de alimentos da Divisão. O novo interesse, acrescentou, parece antitético ao movimento crescente para se comprar produtos frescos e preparar refeições menos processadas.

Alguns veteranos das Forças Armadas também estão confusos. “Isso me faz morrer de rir”, disse Emmanuella Franco, 27 anos, uma especialista da Guarda Nacional do Exército entre 2013 e 2019 e que agora trabalha como técnica de microbiologia em Keeno, Califórnia. “Você quer comer esse pedaço de plástico que não derrete? Isso é por sua conta e risco, cara".

Tratar com desprezo as MREs é uma longa tradição nas Forças Armadas, onde elas ganharam apelidos como “refeições rejeitadas por todos” ou “refeições raramente comestíveis”.

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Mas em plataformas como YouTube e TikTok, um grupo crescente de “testadores de MRE” (a maioria deles não militares) está fascinado. Eles abrem e examinam cada componente, incluindo aperitivos como a sempre procurada pasta de queijo jalapeño e sobremesas populares como a torta de cereja e mirtilo, assim como um pacote de acessórios que geralmente contém papel higiênico, um lenço umedecido, goma de mascar e sal. As MREs mais antigas podiam incluir cigarros, enquanto as não americanas podiam ter até bebidas alcoólicas.

Um dos avaliadores mais conhecidos de MREs do YouTube é Steven Thomas.

Os 1,8 milhão de assinantes de seu canal, o Steve1989MREInfo, assistiram a ele comer sem medo, e até mesmo com entusiasmo, carne de porco enlatada e ovos que datam de 1945, ou um pão de frango e presunto de 1984. Em abril deste ano, as visualizações de seus vídeos aumentaram para 9 milhões, um recorde do canal.

Depois de provar uma MRE pela primeira vez aos 8 anos - seu pai comprou uma para ele em uma loja de suprimentos do Exército em Lakewood, Flórida, onde Thomas ainda vive - ele ficou obcecado em localizar esse tipo de refeição de vários países e épocas. Em 2015, ele começou a degustá-las diante das câmeras.

Essas comidas são “a coisa mais próxima de uma viagem no tempo”, disse Thomas, 32 anos. “Quando você abre algo que nem o ar tocou há 50 ou 100 anos e está do mesmo jeito de sempre, é incrível”.

Principalmente durante a pandemia, a compra desse tipo de comida ajudou as pessoas a "lidar com um mundo caótico e imprevisível", disse Anastacia Marx de Salcedo, autora do livro Combat-Ready Kitchen: How the U.S. Military Shapes the Way You Eat (Cozinha pronta para combate: Como as Forças Armadas dos EUA moldam a forma como você come, em tradução livre). “Elas são uma comida reconfortante para a coragem”.

O desenvolvimento das MREs modernas começou em 1970, durante a Guerra do Vietnã. As versões atuais contêm duas inovações importantes: embalagens flexíveis e hermeticamente fechadas, que podem suportar o calor da esterilização, proporcionando estabilidade na conservação de alimentos enlatados sem volume; e o aquecedor de comida sem uso de chama, que usa uma reação química para aquecer um prato principal com apenas um pouco de água.

A Divisão de Alimentação de Combate está constantemente experimentando maneiras para melhorar a nutrição. O centro de Massachusetts tem um laboratório de alimentos que poderia ser confundido com qualquer cozinha industrial - não fosse pelas caixas de macarrão com queijo trufado em uma bisnaga (para pilotos da Força Aérea dos EUA) e os retratos de soldados enfileirados nas paredes.

Recentemente, Ann Barrett, engenheira química, e Michelle Richardson, técnica de alimentos, estavam fazendo omeletes de vegetais de vários volumes e conteúdo de gordura para ver como um soldado poderia ficar mais saciado com a menor embalagem.

Lauren Oleksyk, que lidera a equipe de engenharia e análise de alimentos, buscava entender como os soldados poderiam usar sensores que detectam os nutrientes de que precisam e, com uma impressora 3D, produzir alimentos nutricionalmente adequados para serem entregues por drone. Tom Yang, outro técnico de alimentos, estava experimentando o que é basicamente um microondas gigante para transformar pratos como macarrão com queijo e frango picante em refeições do tamanho de uma barra de granola que caberiam no bolso.

“Sabemos que isso não é comida gourmet”, disse David Accetta, chefe de relações públicas da organização de pesquisa e desenvolvimento do Exército que supervisiona as refeições.

MREs são refeições prontas para comer utilizadas por Forças Armadas do mundo e que viraram 'moda' na pandemia. Foto: Rinne Allen/The New York Times

Então, mais uma vez, pense no grande número de requisitos que a refeição tem que cumprir, ou as condições terríveis em que um soldado frequentemente está comendo uma delas.

“Boa ou não, ela vai mantê-lo vivo”, disse Joe Guerrero, 20 anos, operador de transporte motorizado do Exército aquartelado em Fort Bliss, Texas.

Muitos vendedores de MRE esperam capitalizar esse aumento na conscientização para fazer os civis pensarem nessas refeições não apenas no contexto militar, mas também associá-las com acampamentos, trilhas ou situações de emergência.

Tom Miller, diretor comercial da Wornick Foods em Cincinnati, um dos três fabricantes que produzem a maioria das MREs, disse que sua empresa está cada vez mais focada na produção para bancos de alimentos e outras organizações humanitárias que entram em ação durante desastres naturais. (A Agência Federal de Gestão de Emergências dos EUA também mantém um estoque dessas refeições.)

Quando uma tempestade deixou milhões de texanos sem água ou eletricidade em fevereiro, Shoshana Krieger e Mincho Jacob, que trabalham para a organização sem fins lucrativos de habitação, Basta, disseram que as MREs eram muito mais fáceis de se carregar e transportar em grande quantidade para os necessitados do que as refeições quentes. Se as mudanças climáticas continuarem a amplificar o impacto dos desastres naturais, essas necessidades talvez aumentem.

Ainda assim, as MREs estão longe do gosto popular. Vendê-las às vezes exige operar de um jeito que é difícil dizer se é certo ou errado legalmente. Kathleen, da North Georgia Outdoors Supply, disse que ouviu falar de vendedores roubando bases militares.

“Há muito estigma em torno da própria MRE”, disse Steven Cyros, fundador da MRE Depot e da MRE Wholesalers em San Clemente, Califórnia, e Tucson, Arizona. E “comparando o valor pago pelas calorias ingeridas, é uma opção cara” em comparação com outros alimentos pré-preparados. (Uma única MRE normalmente é vendida por cerca de US$ 10). Cyros teve pouco sucesso com anúncios em revistas de atividades ao ar livre - as refeições provavelmente são pesadas demais para os que fazem trilhas, disse ele.

Entretanto, as pessoas talvez já estejam comendo como os integrantes das Forças Armadas sem perceber. Muitos alimentos do dia a dia - da carne enlatada às barras energéticas - surgiram como MREs. Atualmente, até mesmo as embalagens produzidas para embalar as MREs são utilizadas para acondicionar comida para bebês e atum.

“As Forças Armadas surgem com essas inovações”, disse Anastacia. “E quando elas são oferecidas aos soldados, parecem um tipo estranho de comida.” Mas, em algum momento, afirmou, elas se tornam comida reconfortante para os americanos.  / TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times.  

Kathleen Ehl sempre pensou em seu negócio como um caso de nicho - uma loja on-line chamada North Georgia Outdoors Supply que ela e o marido administram de casa, em Gainesville, e onde vendem MRE (Meals, Ready-to-Eat), que quer dizer refeições prontas para comer.

As MREs são embalagens resistentes com comida de longa duração criadas para as Forças Armadas dos Estados Unidos. Elas não são particularmente elegantes ou apetitosas e, tecnicamente, não podem ser comercializadas se forem feitas a pedido do governo, como a maioria é. Kathleen e seu marido, Oliver Walker, vasculham leilões on-line e lojas que vendem comidas que por alguma razão não podem ser vendidas no mercado de varejo regular em busca dessas refeições e vendem a maioria delas para colecionadores e sobreviventes.

O youtuber Steven Thomas experimenta MREs de vários países e épocas em seus vídeos. Foto: Octavio Jones/The New York Times

Mas em fevereiro do ano passado, quando o pânico provocado pela pandemia fez com que as compras aumentassem, seus pedidos saltaram de 100 por semana para 100 por dia. “Houve algumas noites em que meu marido e eu embalamos os produtos, depois de colocarmos as crianças para dormir, até as duas horas da manhã”, disse Kathleen, 37 anos.

O início de 2020 foi um período de aumento nas vendas para os distribuidores de MRE em todo os EUA, desde os principais fornecedores militares até as lojas de excedentes do Exército. Até hoje, enquanto as compras de outras obsessões da pandemia diminuíram, o fascínio civil pelas refeições continuou - motivado pela cautela (estocando para a próxima pandemia em potencial ou desastre natural) e pela curiosidade.

Embora os números das vendas de MREs sejam difíceis de calcular, dada a legalidade questionável de algumas comercializações, o número de pessoas na internet que fala sobre essas refeições e prova o gosto delas cresceu para milhões. As pessoas que nunca pensaram que comprariam uma MRE agora as mantêm em seu estoque.

Ninguém está mais intrigado ou perplexo com o fenômeno do que os cientistas e engenheiros que pesquisam e desenvolvem as refeições na Divisão de Alimentação de Combate do Departamento de Defesa. Na sede da Divisão em Natick, Massachusetts, a equipe passa anos aperfeiçoando cada detalhe de uma MRE antes de ela ser enviada aos fabricantes: este ravioli de carne é o mais nutritivo possível e durável por até três anos? Ele pode sobreviver a uma queda de um helicóptero ou às altas temperaturas do deserto?

As MREs são produzidas com o único objetivo de alimentar integrantes das Forças Armadas em operações distantes de um refeitório ou cozinha de campo. No entanto, muitos civis há tempos se interessam pelo que os soldados comem. Os museus da época das guerras exibem o insosso e nada macio biscoito que alimentou os combatentes da Guerra Civil (americana) e as carnes, os pães e as frutas enlatadas da Segunda Guerra Mundial.

Comidas desidratadas. Foto: Kayana Szymczak/The New York Times

Na década de 1990, depois de reclamações de soldados servindo na Guerra do Golfo, o foco do desenvolvimento dessa "comida de guerra" mudou para a criação de refeições mais saborosas e mais diversificadas. Os integrantes das Forças Armadas foram convidados a enviar sugestões para o menu, que aumentou de 12 para 24 opções, com opções vegetarianas, halal e kosher entre elas.

Todos os anos, as MREs menos populares são retiradas de circulação e novas são adicionadas; comidas favoritas permanentes, como espaguete com molho de carne ou ravioli de carne, são complementados com pratos como arroz e feijão mexicano. Em 2018, foi lançada a tão esperada pizza MRE, possibilitada pela tecnologia que cria barreiras ao crescimento de micro-organismos entre as camadas de molho, queijo e massa.

Cada MRE contém uma refeição completa – prato principal, aperitivos, sobremesa e bebidas - com uma média de cerca de 1.200 calorias e uma variedade de vitaminas e minerais, alguns deles adicionados. Cada ingrediente está ali por uma razão - o charque é enriquecido com cafeína e a compota de maçã contém maltodextrina, que fornece um aumento de energia.

Essas escolhas alimentares têm um papel fundamental no campo de batalha, disse Stephen Moody, chefe da Divisão de Alimentação de Combate. “A alimentação certa pode nos dar uma vantagem”, aumentando o estado de alerta de um soldado ou as capacidades de tomada de decisão, disse ele.

Mas por que um civil iria querer comer uma dessas refeições?

Muitas porções são colocadas em tubos pela praticidade, como este molho de espaguete com carne. Foto: Kayana Szymczak/The New York Times

“Não sei”, disse Julie Smith, técnica de alimentos da Divisão. O novo interesse, acrescentou, parece antitético ao movimento crescente para se comprar produtos frescos e preparar refeições menos processadas.

Alguns veteranos das Forças Armadas também estão confusos. “Isso me faz morrer de rir”, disse Emmanuella Franco, 27 anos, uma especialista da Guarda Nacional do Exército entre 2013 e 2019 e que agora trabalha como técnica de microbiologia em Keeno, Califórnia. “Você quer comer esse pedaço de plástico que não derrete? Isso é por sua conta e risco, cara".

Tratar com desprezo as MREs é uma longa tradição nas Forças Armadas, onde elas ganharam apelidos como “refeições rejeitadas por todos” ou “refeições raramente comestíveis”.

Mas em plataformas como YouTube e TikTok, um grupo crescente de “testadores de MRE” (a maioria deles não militares) está fascinado. Eles abrem e examinam cada componente, incluindo aperitivos como a sempre procurada pasta de queijo jalapeño e sobremesas populares como a torta de cereja e mirtilo, assim como um pacote de acessórios que geralmente contém papel higiênico, um lenço umedecido, goma de mascar e sal. As MREs mais antigas podiam incluir cigarros, enquanto as não americanas podiam ter até bebidas alcoólicas.

Um dos avaliadores mais conhecidos de MREs do YouTube é Steven Thomas.

Os 1,8 milhão de assinantes de seu canal, o Steve1989MREInfo, assistiram a ele comer sem medo, e até mesmo com entusiasmo, carne de porco enlatada e ovos que datam de 1945, ou um pão de frango e presunto de 1984. Em abril deste ano, as visualizações de seus vídeos aumentaram para 9 milhões, um recorde do canal.

Depois de provar uma MRE pela primeira vez aos 8 anos - seu pai comprou uma para ele em uma loja de suprimentos do Exército em Lakewood, Flórida, onde Thomas ainda vive - ele ficou obcecado em localizar esse tipo de refeição de vários países e épocas. Em 2015, ele começou a degustá-las diante das câmeras.

Essas comidas são “a coisa mais próxima de uma viagem no tempo”, disse Thomas, 32 anos. “Quando você abre algo que nem o ar tocou há 50 ou 100 anos e está do mesmo jeito de sempre, é incrível”.

Principalmente durante a pandemia, a compra desse tipo de comida ajudou as pessoas a "lidar com um mundo caótico e imprevisível", disse Anastacia Marx de Salcedo, autora do livro Combat-Ready Kitchen: How the U.S. Military Shapes the Way You Eat (Cozinha pronta para combate: Como as Forças Armadas dos EUA moldam a forma como você come, em tradução livre). “Elas são uma comida reconfortante para a coragem”.

O desenvolvimento das MREs modernas começou em 1970, durante a Guerra do Vietnã. As versões atuais contêm duas inovações importantes: embalagens flexíveis e hermeticamente fechadas, que podem suportar o calor da esterilização, proporcionando estabilidade na conservação de alimentos enlatados sem volume; e o aquecedor de comida sem uso de chama, que usa uma reação química para aquecer um prato principal com apenas um pouco de água.

A Divisão de Alimentação de Combate está constantemente experimentando maneiras para melhorar a nutrição. O centro de Massachusetts tem um laboratório de alimentos que poderia ser confundido com qualquer cozinha industrial - não fosse pelas caixas de macarrão com queijo trufado em uma bisnaga (para pilotos da Força Aérea dos EUA) e os retratos de soldados enfileirados nas paredes.

Recentemente, Ann Barrett, engenheira química, e Michelle Richardson, técnica de alimentos, estavam fazendo omeletes de vegetais de vários volumes e conteúdo de gordura para ver como um soldado poderia ficar mais saciado com a menor embalagem.

Lauren Oleksyk, que lidera a equipe de engenharia e análise de alimentos, buscava entender como os soldados poderiam usar sensores que detectam os nutrientes de que precisam e, com uma impressora 3D, produzir alimentos nutricionalmente adequados para serem entregues por drone. Tom Yang, outro técnico de alimentos, estava experimentando o que é basicamente um microondas gigante para transformar pratos como macarrão com queijo e frango picante em refeições do tamanho de uma barra de granola que caberiam no bolso.

“Sabemos que isso não é comida gourmet”, disse David Accetta, chefe de relações públicas da organização de pesquisa e desenvolvimento do Exército que supervisiona as refeições.

MREs são refeições prontas para comer utilizadas por Forças Armadas do mundo e que viraram 'moda' na pandemia. Foto: Rinne Allen/The New York Times

Então, mais uma vez, pense no grande número de requisitos que a refeição tem que cumprir, ou as condições terríveis em que um soldado frequentemente está comendo uma delas.

“Boa ou não, ela vai mantê-lo vivo”, disse Joe Guerrero, 20 anos, operador de transporte motorizado do Exército aquartelado em Fort Bliss, Texas.

Muitos vendedores de MRE esperam capitalizar esse aumento na conscientização para fazer os civis pensarem nessas refeições não apenas no contexto militar, mas também associá-las com acampamentos, trilhas ou situações de emergência.

Tom Miller, diretor comercial da Wornick Foods em Cincinnati, um dos três fabricantes que produzem a maioria das MREs, disse que sua empresa está cada vez mais focada na produção para bancos de alimentos e outras organizações humanitárias que entram em ação durante desastres naturais. (A Agência Federal de Gestão de Emergências dos EUA também mantém um estoque dessas refeições.)

Quando uma tempestade deixou milhões de texanos sem água ou eletricidade em fevereiro, Shoshana Krieger e Mincho Jacob, que trabalham para a organização sem fins lucrativos de habitação, Basta, disseram que as MREs eram muito mais fáceis de se carregar e transportar em grande quantidade para os necessitados do que as refeições quentes. Se as mudanças climáticas continuarem a amplificar o impacto dos desastres naturais, essas necessidades talvez aumentem.

Ainda assim, as MREs estão longe do gosto popular. Vendê-las às vezes exige operar de um jeito que é difícil dizer se é certo ou errado legalmente. Kathleen, da North Georgia Outdoors Supply, disse que ouviu falar de vendedores roubando bases militares.

“Há muito estigma em torno da própria MRE”, disse Steven Cyros, fundador da MRE Depot e da MRE Wholesalers em San Clemente, Califórnia, e Tucson, Arizona. E “comparando o valor pago pelas calorias ingeridas, é uma opção cara” em comparação com outros alimentos pré-preparados. (Uma única MRE normalmente é vendida por cerca de US$ 10). Cyros teve pouco sucesso com anúncios em revistas de atividades ao ar livre - as refeições provavelmente são pesadas demais para os que fazem trilhas, disse ele.

Entretanto, as pessoas talvez já estejam comendo como os integrantes das Forças Armadas sem perceber. Muitos alimentos do dia a dia - da carne enlatada às barras energéticas - surgiram como MREs. Atualmente, até mesmo as embalagens produzidas para embalar as MREs são utilizadas para acondicionar comida para bebês e atum.

“As Forças Armadas surgem com essas inovações”, disse Anastacia. “E quando elas são oferecidas aos soldados, parecem um tipo estranho de comida.” Mas, em algum momento, afirmou, elas se tornam comida reconfortante para os americanos.  / TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times.  

Kathleen Ehl sempre pensou em seu negócio como um caso de nicho - uma loja on-line chamada North Georgia Outdoors Supply que ela e o marido administram de casa, em Gainesville, e onde vendem MRE (Meals, Ready-to-Eat), que quer dizer refeições prontas para comer.

As MREs são embalagens resistentes com comida de longa duração criadas para as Forças Armadas dos Estados Unidos. Elas não são particularmente elegantes ou apetitosas e, tecnicamente, não podem ser comercializadas se forem feitas a pedido do governo, como a maioria é. Kathleen e seu marido, Oliver Walker, vasculham leilões on-line e lojas que vendem comidas que por alguma razão não podem ser vendidas no mercado de varejo regular em busca dessas refeições e vendem a maioria delas para colecionadores e sobreviventes.

O youtuber Steven Thomas experimenta MREs de vários países e épocas em seus vídeos. Foto: Octavio Jones/The New York Times

Mas em fevereiro do ano passado, quando o pânico provocado pela pandemia fez com que as compras aumentassem, seus pedidos saltaram de 100 por semana para 100 por dia. “Houve algumas noites em que meu marido e eu embalamos os produtos, depois de colocarmos as crianças para dormir, até as duas horas da manhã”, disse Kathleen, 37 anos.

O início de 2020 foi um período de aumento nas vendas para os distribuidores de MRE em todo os EUA, desde os principais fornecedores militares até as lojas de excedentes do Exército. Até hoje, enquanto as compras de outras obsessões da pandemia diminuíram, o fascínio civil pelas refeições continuou - motivado pela cautela (estocando para a próxima pandemia em potencial ou desastre natural) e pela curiosidade.

Embora os números das vendas de MREs sejam difíceis de calcular, dada a legalidade questionável de algumas comercializações, o número de pessoas na internet que fala sobre essas refeições e prova o gosto delas cresceu para milhões. As pessoas que nunca pensaram que comprariam uma MRE agora as mantêm em seu estoque.

Ninguém está mais intrigado ou perplexo com o fenômeno do que os cientistas e engenheiros que pesquisam e desenvolvem as refeições na Divisão de Alimentação de Combate do Departamento de Defesa. Na sede da Divisão em Natick, Massachusetts, a equipe passa anos aperfeiçoando cada detalhe de uma MRE antes de ela ser enviada aos fabricantes: este ravioli de carne é o mais nutritivo possível e durável por até três anos? Ele pode sobreviver a uma queda de um helicóptero ou às altas temperaturas do deserto?

As MREs são produzidas com o único objetivo de alimentar integrantes das Forças Armadas em operações distantes de um refeitório ou cozinha de campo. No entanto, muitos civis há tempos se interessam pelo que os soldados comem. Os museus da época das guerras exibem o insosso e nada macio biscoito que alimentou os combatentes da Guerra Civil (americana) e as carnes, os pães e as frutas enlatadas da Segunda Guerra Mundial.

Comidas desidratadas. Foto: Kayana Szymczak/The New York Times

Na década de 1990, depois de reclamações de soldados servindo na Guerra do Golfo, o foco do desenvolvimento dessa "comida de guerra" mudou para a criação de refeições mais saborosas e mais diversificadas. Os integrantes das Forças Armadas foram convidados a enviar sugestões para o menu, que aumentou de 12 para 24 opções, com opções vegetarianas, halal e kosher entre elas.

Todos os anos, as MREs menos populares são retiradas de circulação e novas são adicionadas; comidas favoritas permanentes, como espaguete com molho de carne ou ravioli de carne, são complementados com pratos como arroz e feijão mexicano. Em 2018, foi lançada a tão esperada pizza MRE, possibilitada pela tecnologia que cria barreiras ao crescimento de micro-organismos entre as camadas de molho, queijo e massa.

Cada MRE contém uma refeição completa – prato principal, aperitivos, sobremesa e bebidas - com uma média de cerca de 1.200 calorias e uma variedade de vitaminas e minerais, alguns deles adicionados. Cada ingrediente está ali por uma razão - o charque é enriquecido com cafeína e a compota de maçã contém maltodextrina, que fornece um aumento de energia.

Essas escolhas alimentares têm um papel fundamental no campo de batalha, disse Stephen Moody, chefe da Divisão de Alimentação de Combate. “A alimentação certa pode nos dar uma vantagem”, aumentando o estado de alerta de um soldado ou as capacidades de tomada de decisão, disse ele.

Mas por que um civil iria querer comer uma dessas refeições?

Muitas porções são colocadas em tubos pela praticidade, como este molho de espaguete com carne. Foto: Kayana Szymczak/The New York Times

“Não sei”, disse Julie Smith, técnica de alimentos da Divisão. O novo interesse, acrescentou, parece antitético ao movimento crescente para se comprar produtos frescos e preparar refeições menos processadas.

Alguns veteranos das Forças Armadas também estão confusos. “Isso me faz morrer de rir”, disse Emmanuella Franco, 27 anos, uma especialista da Guarda Nacional do Exército entre 2013 e 2019 e que agora trabalha como técnica de microbiologia em Keeno, Califórnia. “Você quer comer esse pedaço de plástico que não derrete? Isso é por sua conta e risco, cara".

Tratar com desprezo as MREs é uma longa tradição nas Forças Armadas, onde elas ganharam apelidos como “refeições rejeitadas por todos” ou “refeições raramente comestíveis”.

Mas em plataformas como YouTube e TikTok, um grupo crescente de “testadores de MRE” (a maioria deles não militares) está fascinado. Eles abrem e examinam cada componente, incluindo aperitivos como a sempre procurada pasta de queijo jalapeño e sobremesas populares como a torta de cereja e mirtilo, assim como um pacote de acessórios que geralmente contém papel higiênico, um lenço umedecido, goma de mascar e sal. As MREs mais antigas podiam incluir cigarros, enquanto as não americanas podiam ter até bebidas alcoólicas.

Um dos avaliadores mais conhecidos de MREs do YouTube é Steven Thomas.

Os 1,8 milhão de assinantes de seu canal, o Steve1989MREInfo, assistiram a ele comer sem medo, e até mesmo com entusiasmo, carne de porco enlatada e ovos que datam de 1945, ou um pão de frango e presunto de 1984. Em abril deste ano, as visualizações de seus vídeos aumentaram para 9 milhões, um recorde do canal.

Depois de provar uma MRE pela primeira vez aos 8 anos - seu pai comprou uma para ele em uma loja de suprimentos do Exército em Lakewood, Flórida, onde Thomas ainda vive - ele ficou obcecado em localizar esse tipo de refeição de vários países e épocas. Em 2015, ele começou a degustá-las diante das câmeras.

Essas comidas são “a coisa mais próxima de uma viagem no tempo”, disse Thomas, 32 anos. “Quando você abre algo que nem o ar tocou há 50 ou 100 anos e está do mesmo jeito de sempre, é incrível”.

Principalmente durante a pandemia, a compra desse tipo de comida ajudou as pessoas a "lidar com um mundo caótico e imprevisível", disse Anastacia Marx de Salcedo, autora do livro Combat-Ready Kitchen: How the U.S. Military Shapes the Way You Eat (Cozinha pronta para combate: Como as Forças Armadas dos EUA moldam a forma como você come, em tradução livre). “Elas são uma comida reconfortante para a coragem”.

O desenvolvimento das MREs modernas começou em 1970, durante a Guerra do Vietnã. As versões atuais contêm duas inovações importantes: embalagens flexíveis e hermeticamente fechadas, que podem suportar o calor da esterilização, proporcionando estabilidade na conservação de alimentos enlatados sem volume; e o aquecedor de comida sem uso de chama, que usa uma reação química para aquecer um prato principal com apenas um pouco de água.

A Divisão de Alimentação de Combate está constantemente experimentando maneiras para melhorar a nutrição. O centro de Massachusetts tem um laboratório de alimentos que poderia ser confundido com qualquer cozinha industrial - não fosse pelas caixas de macarrão com queijo trufado em uma bisnaga (para pilotos da Força Aérea dos EUA) e os retratos de soldados enfileirados nas paredes.

Recentemente, Ann Barrett, engenheira química, e Michelle Richardson, técnica de alimentos, estavam fazendo omeletes de vegetais de vários volumes e conteúdo de gordura para ver como um soldado poderia ficar mais saciado com a menor embalagem.

Lauren Oleksyk, que lidera a equipe de engenharia e análise de alimentos, buscava entender como os soldados poderiam usar sensores que detectam os nutrientes de que precisam e, com uma impressora 3D, produzir alimentos nutricionalmente adequados para serem entregues por drone. Tom Yang, outro técnico de alimentos, estava experimentando o que é basicamente um microondas gigante para transformar pratos como macarrão com queijo e frango picante em refeições do tamanho de uma barra de granola que caberiam no bolso.

“Sabemos que isso não é comida gourmet”, disse David Accetta, chefe de relações públicas da organização de pesquisa e desenvolvimento do Exército que supervisiona as refeições.

MREs são refeições prontas para comer utilizadas por Forças Armadas do mundo e que viraram 'moda' na pandemia. Foto: Rinne Allen/The New York Times

Então, mais uma vez, pense no grande número de requisitos que a refeição tem que cumprir, ou as condições terríveis em que um soldado frequentemente está comendo uma delas.

“Boa ou não, ela vai mantê-lo vivo”, disse Joe Guerrero, 20 anos, operador de transporte motorizado do Exército aquartelado em Fort Bliss, Texas.

Muitos vendedores de MRE esperam capitalizar esse aumento na conscientização para fazer os civis pensarem nessas refeições não apenas no contexto militar, mas também associá-las com acampamentos, trilhas ou situações de emergência.

Tom Miller, diretor comercial da Wornick Foods em Cincinnati, um dos três fabricantes que produzem a maioria das MREs, disse que sua empresa está cada vez mais focada na produção para bancos de alimentos e outras organizações humanitárias que entram em ação durante desastres naturais. (A Agência Federal de Gestão de Emergências dos EUA também mantém um estoque dessas refeições.)

Quando uma tempestade deixou milhões de texanos sem água ou eletricidade em fevereiro, Shoshana Krieger e Mincho Jacob, que trabalham para a organização sem fins lucrativos de habitação, Basta, disseram que as MREs eram muito mais fáceis de se carregar e transportar em grande quantidade para os necessitados do que as refeições quentes. Se as mudanças climáticas continuarem a amplificar o impacto dos desastres naturais, essas necessidades talvez aumentem.

Ainda assim, as MREs estão longe do gosto popular. Vendê-las às vezes exige operar de um jeito que é difícil dizer se é certo ou errado legalmente. Kathleen, da North Georgia Outdoors Supply, disse que ouviu falar de vendedores roubando bases militares.

“Há muito estigma em torno da própria MRE”, disse Steven Cyros, fundador da MRE Depot e da MRE Wholesalers em San Clemente, Califórnia, e Tucson, Arizona. E “comparando o valor pago pelas calorias ingeridas, é uma opção cara” em comparação com outros alimentos pré-preparados. (Uma única MRE normalmente é vendida por cerca de US$ 10). Cyros teve pouco sucesso com anúncios em revistas de atividades ao ar livre - as refeições provavelmente são pesadas demais para os que fazem trilhas, disse ele.

Entretanto, as pessoas talvez já estejam comendo como os integrantes das Forças Armadas sem perceber. Muitos alimentos do dia a dia - da carne enlatada às barras energéticas - surgiram como MREs. Atualmente, até mesmo as embalagens produzidas para embalar as MREs são utilizadas para acondicionar comida para bebês e atum.

“As Forças Armadas surgem com essas inovações”, disse Anastacia. “E quando elas são oferecidas aos soldados, parecem um tipo estranho de comida.” Mas, em algum momento, afirmou, elas se tornam comida reconfortante para os americanos.  / TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times.  

Kathleen Ehl sempre pensou em seu negócio como um caso de nicho - uma loja on-line chamada North Georgia Outdoors Supply que ela e o marido administram de casa, em Gainesville, e onde vendem MRE (Meals, Ready-to-Eat), que quer dizer refeições prontas para comer.

As MREs são embalagens resistentes com comida de longa duração criadas para as Forças Armadas dos Estados Unidos. Elas não são particularmente elegantes ou apetitosas e, tecnicamente, não podem ser comercializadas se forem feitas a pedido do governo, como a maioria é. Kathleen e seu marido, Oliver Walker, vasculham leilões on-line e lojas que vendem comidas que por alguma razão não podem ser vendidas no mercado de varejo regular em busca dessas refeições e vendem a maioria delas para colecionadores e sobreviventes.

O youtuber Steven Thomas experimenta MREs de vários países e épocas em seus vídeos. Foto: Octavio Jones/The New York Times

Mas em fevereiro do ano passado, quando o pânico provocado pela pandemia fez com que as compras aumentassem, seus pedidos saltaram de 100 por semana para 100 por dia. “Houve algumas noites em que meu marido e eu embalamos os produtos, depois de colocarmos as crianças para dormir, até as duas horas da manhã”, disse Kathleen, 37 anos.

O início de 2020 foi um período de aumento nas vendas para os distribuidores de MRE em todo os EUA, desde os principais fornecedores militares até as lojas de excedentes do Exército. Até hoje, enquanto as compras de outras obsessões da pandemia diminuíram, o fascínio civil pelas refeições continuou - motivado pela cautela (estocando para a próxima pandemia em potencial ou desastre natural) e pela curiosidade.

Embora os números das vendas de MREs sejam difíceis de calcular, dada a legalidade questionável de algumas comercializações, o número de pessoas na internet que fala sobre essas refeições e prova o gosto delas cresceu para milhões. As pessoas que nunca pensaram que comprariam uma MRE agora as mantêm em seu estoque.

Ninguém está mais intrigado ou perplexo com o fenômeno do que os cientistas e engenheiros que pesquisam e desenvolvem as refeições na Divisão de Alimentação de Combate do Departamento de Defesa. Na sede da Divisão em Natick, Massachusetts, a equipe passa anos aperfeiçoando cada detalhe de uma MRE antes de ela ser enviada aos fabricantes: este ravioli de carne é o mais nutritivo possível e durável por até três anos? Ele pode sobreviver a uma queda de um helicóptero ou às altas temperaturas do deserto?

As MREs são produzidas com o único objetivo de alimentar integrantes das Forças Armadas em operações distantes de um refeitório ou cozinha de campo. No entanto, muitos civis há tempos se interessam pelo que os soldados comem. Os museus da época das guerras exibem o insosso e nada macio biscoito que alimentou os combatentes da Guerra Civil (americana) e as carnes, os pães e as frutas enlatadas da Segunda Guerra Mundial.

Comidas desidratadas. Foto: Kayana Szymczak/The New York Times

Na década de 1990, depois de reclamações de soldados servindo na Guerra do Golfo, o foco do desenvolvimento dessa "comida de guerra" mudou para a criação de refeições mais saborosas e mais diversificadas. Os integrantes das Forças Armadas foram convidados a enviar sugestões para o menu, que aumentou de 12 para 24 opções, com opções vegetarianas, halal e kosher entre elas.

Todos os anos, as MREs menos populares são retiradas de circulação e novas são adicionadas; comidas favoritas permanentes, como espaguete com molho de carne ou ravioli de carne, são complementados com pratos como arroz e feijão mexicano. Em 2018, foi lançada a tão esperada pizza MRE, possibilitada pela tecnologia que cria barreiras ao crescimento de micro-organismos entre as camadas de molho, queijo e massa.

Cada MRE contém uma refeição completa – prato principal, aperitivos, sobremesa e bebidas - com uma média de cerca de 1.200 calorias e uma variedade de vitaminas e minerais, alguns deles adicionados. Cada ingrediente está ali por uma razão - o charque é enriquecido com cafeína e a compota de maçã contém maltodextrina, que fornece um aumento de energia.

Essas escolhas alimentares têm um papel fundamental no campo de batalha, disse Stephen Moody, chefe da Divisão de Alimentação de Combate. “A alimentação certa pode nos dar uma vantagem”, aumentando o estado de alerta de um soldado ou as capacidades de tomada de decisão, disse ele.

Mas por que um civil iria querer comer uma dessas refeições?

Muitas porções são colocadas em tubos pela praticidade, como este molho de espaguete com carne. Foto: Kayana Szymczak/The New York Times

“Não sei”, disse Julie Smith, técnica de alimentos da Divisão. O novo interesse, acrescentou, parece antitético ao movimento crescente para se comprar produtos frescos e preparar refeições menos processadas.

Alguns veteranos das Forças Armadas também estão confusos. “Isso me faz morrer de rir”, disse Emmanuella Franco, 27 anos, uma especialista da Guarda Nacional do Exército entre 2013 e 2019 e que agora trabalha como técnica de microbiologia em Keeno, Califórnia. “Você quer comer esse pedaço de plástico que não derrete? Isso é por sua conta e risco, cara".

Tratar com desprezo as MREs é uma longa tradição nas Forças Armadas, onde elas ganharam apelidos como “refeições rejeitadas por todos” ou “refeições raramente comestíveis”.

Mas em plataformas como YouTube e TikTok, um grupo crescente de “testadores de MRE” (a maioria deles não militares) está fascinado. Eles abrem e examinam cada componente, incluindo aperitivos como a sempre procurada pasta de queijo jalapeño e sobremesas populares como a torta de cereja e mirtilo, assim como um pacote de acessórios que geralmente contém papel higiênico, um lenço umedecido, goma de mascar e sal. As MREs mais antigas podiam incluir cigarros, enquanto as não americanas podiam ter até bebidas alcoólicas.

Um dos avaliadores mais conhecidos de MREs do YouTube é Steven Thomas.

Os 1,8 milhão de assinantes de seu canal, o Steve1989MREInfo, assistiram a ele comer sem medo, e até mesmo com entusiasmo, carne de porco enlatada e ovos que datam de 1945, ou um pão de frango e presunto de 1984. Em abril deste ano, as visualizações de seus vídeos aumentaram para 9 milhões, um recorde do canal.

Depois de provar uma MRE pela primeira vez aos 8 anos - seu pai comprou uma para ele em uma loja de suprimentos do Exército em Lakewood, Flórida, onde Thomas ainda vive - ele ficou obcecado em localizar esse tipo de refeição de vários países e épocas. Em 2015, ele começou a degustá-las diante das câmeras.

Essas comidas são “a coisa mais próxima de uma viagem no tempo”, disse Thomas, 32 anos. “Quando você abre algo que nem o ar tocou há 50 ou 100 anos e está do mesmo jeito de sempre, é incrível”.

Principalmente durante a pandemia, a compra desse tipo de comida ajudou as pessoas a "lidar com um mundo caótico e imprevisível", disse Anastacia Marx de Salcedo, autora do livro Combat-Ready Kitchen: How the U.S. Military Shapes the Way You Eat (Cozinha pronta para combate: Como as Forças Armadas dos EUA moldam a forma como você come, em tradução livre). “Elas são uma comida reconfortante para a coragem”.

O desenvolvimento das MREs modernas começou em 1970, durante a Guerra do Vietnã. As versões atuais contêm duas inovações importantes: embalagens flexíveis e hermeticamente fechadas, que podem suportar o calor da esterilização, proporcionando estabilidade na conservação de alimentos enlatados sem volume; e o aquecedor de comida sem uso de chama, que usa uma reação química para aquecer um prato principal com apenas um pouco de água.

A Divisão de Alimentação de Combate está constantemente experimentando maneiras para melhorar a nutrição. O centro de Massachusetts tem um laboratório de alimentos que poderia ser confundido com qualquer cozinha industrial - não fosse pelas caixas de macarrão com queijo trufado em uma bisnaga (para pilotos da Força Aérea dos EUA) e os retratos de soldados enfileirados nas paredes.

Recentemente, Ann Barrett, engenheira química, e Michelle Richardson, técnica de alimentos, estavam fazendo omeletes de vegetais de vários volumes e conteúdo de gordura para ver como um soldado poderia ficar mais saciado com a menor embalagem.

Lauren Oleksyk, que lidera a equipe de engenharia e análise de alimentos, buscava entender como os soldados poderiam usar sensores que detectam os nutrientes de que precisam e, com uma impressora 3D, produzir alimentos nutricionalmente adequados para serem entregues por drone. Tom Yang, outro técnico de alimentos, estava experimentando o que é basicamente um microondas gigante para transformar pratos como macarrão com queijo e frango picante em refeições do tamanho de uma barra de granola que caberiam no bolso.

“Sabemos que isso não é comida gourmet”, disse David Accetta, chefe de relações públicas da organização de pesquisa e desenvolvimento do Exército que supervisiona as refeições.

MREs são refeições prontas para comer utilizadas por Forças Armadas do mundo e que viraram 'moda' na pandemia. Foto: Rinne Allen/The New York Times

Então, mais uma vez, pense no grande número de requisitos que a refeição tem que cumprir, ou as condições terríveis em que um soldado frequentemente está comendo uma delas.

“Boa ou não, ela vai mantê-lo vivo”, disse Joe Guerrero, 20 anos, operador de transporte motorizado do Exército aquartelado em Fort Bliss, Texas.

Muitos vendedores de MRE esperam capitalizar esse aumento na conscientização para fazer os civis pensarem nessas refeições não apenas no contexto militar, mas também associá-las com acampamentos, trilhas ou situações de emergência.

Tom Miller, diretor comercial da Wornick Foods em Cincinnati, um dos três fabricantes que produzem a maioria das MREs, disse que sua empresa está cada vez mais focada na produção para bancos de alimentos e outras organizações humanitárias que entram em ação durante desastres naturais. (A Agência Federal de Gestão de Emergências dos EUA também mantém um estoque dessas refeições.)

Quando uma tempestade deixou milhões de texanos sem água ou eletricidade em fevereiro, Shoshana Krieger e Mincho Jacob, que trabalham para a organização sem fins lucrativos de habitação, Basta, disseram que as MREs eram muito mais fáceis de se carregar e transportar em grande quantidade para os necessitados do que as refeições quentes. Se as mudanças climáticas continuarem a amplificar o impacto dos desastres naturais, essas necessidades talvez aumentem.

Ainda assim, as MREs estão longe do gosto popular. Vendê-las às vezes exige operar de um jeito que é difícil dizer se é certo ou errado legalmente. Kathleen, da North Georgia Outdoors Supply, disse que ouviu falar de vendedores roubando bases militares.

“Há muito estigma em torno da própria MRE”, disse Steven Cyros, fundador da MRE Depot e da MRE Wholesalers em San Clemente, Califórnia, e Tucson, Arizona. E “comparando o valor pago pelas calorias ingeridas, é uma opção cara” em comparação com outros alimentos pré-preparados. (Uma única MRE normalmente é vendida por cerca de US$ 10). Cyros teve pouco sucesso com anúncios em revistas de atividades ao ar livre - as refeições provavelmente são pesadas demais para os que fazem trilhas, disse ele.

Entretanto, as pessoas talvez já estejam comendo como os integrantes das Forças Armadas sem perceber. Muitos alimentos do dia a dia - da carne enlatada às barras energéticas - surgiram como MREs. Atualmente, até mesmo as embalagens produzidas para embalar as MREs são utilizadas para acondicionar comida para bebês e atum.

“As Forças Armadas surgem com essas inovações”, disse Anastacia. “E quando elas são oferecidas aos soldados, parecem um tipo estranho de comida.” Mas, em algum momento, afirmou, elas se tornam comida reconfortante para os americanos.  / TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times.  

Kathleen Ehl sempre pensou em seu negócio como um caso de nicho - uma loja on-line chamada North Georgia Outdoors Supply que ela e o marido administram de casa, em Gainesville, e onde vendem MRE (Meals, Ready-to-Eat), que quer dizer refeições prontas para comer.

As MREs são embalagens resistentes com comida de longa duração criadas para as Forças Armadas dos Estados Unidos. Elas não são particularmente elegantes ou apetitosas e, tecnicamente, não podem ser comercializadas se forem feitas a pedido do governo, como a maioria é. Kathleen e seu marido, Oliver Walker, vasculham leilões on-line e lojas que vendem comidas que por alguma razão não podem ser vendidas no mercado de varejo regular em busca dessas refeições e vendem a maioria delas para colecionadores e sobreviventes.

O youtuber Steven Thomas experimenta MREs de vários países e épocas em seus vídeos. Foto: Octavio Jones/The New York Times

Mas em fevereiro do ano passado, quando o pânico provocado pela pandemia fez com que as compras aumentassem, seus pedidos saltaram de 100 por semana para 100 por dia. “Houve algumas noites em que meu marido e eu embalamos os produtos, depois de colocarmos as crianças para dormir, até as duas horas da manhã”, disse Kathleen, 37 anos.

O início de 2020 foi um período de aumento nas vendas para os distribuidores de MRE em todo os EUA, desde os principais fornecedores militares até as lojas de excedentes do Exército. Até hoje, enquanto as compras de outras obsessões da pandemia diminuíram, o fascínio civil pelas refeições continuou - motivado pela cautela (estocando para a próxima pandemia em potencial ou desastre natural) e pela curiosidade.

Embora os números das vendas de MREs sejam difíceis de calcular, dada a legalidade questionável de algumas comercializações, o número de pessoas na internet que fala sobre essas refeições e prova o gosto delas cresceu para milhões. As pessoas que nunca pensaram que comprariam uma MRE agora as mantêm em seu estoque.

Ninguém está mais intrigado ou perplexo com o fenômeno do que os cientistas e engenheiros que pesquisam e desenvolvem as refeições na Divisão de Alimentação de Combate do Departamento de Defesa. Na sede da Divisão em Natick, Massachusetts, a equipe passa anos aperfeiçoando cada detalhe de uma MRE antes de ela ser enviada aos fabricantes: este ravioli de carne é o mais nutritivo possível e durável por até três anos? Ele pode sobreviver a uma queda de um helicóptero ou às altas temperaturas do deserto?

As MREs são produzidas com o único objetivo de alimentar integrantes das Forças Armadas em operações distantes de um refeitório ou cozinha de campo. No entanto, muitos civis há tempos se interessam pelo que os soldados comem. Os museus da época das guerras exibem o insosso e nada macio biscoito que alimentou os combatentes da Guerra Civil (americana) e as carnes, os pães e as frutas enlatadas da Segunda Guerra Mundial.

Comidas desidratadas. Foto: Kayana Szymczak/The New York Times

Na década de 1990, depois de reclamações de soldados servindo na Guerra do Golfo, o foco do desenvolvimento dessa "comida de guerra" mudou para a criação de refeições mais saborosas e mais diversificadas. Os integrantes das Forças Armadas foram convidados a enviar sugestões para o menu, que aumentou de 12 para 24 opções, com opções vegetarianas, halal e kosher entre elas.

Todos os anos, as MREs menos populares são retiradas de circulação e novas são adicionadas; comidas favoritas permanentes, como espaguete com molho de carne ou ravioli de carne, são complementados com pratos como arroz e feijão mexicano. Em 2018, foi lançada a tão esperada pizza MRE, possibilitada pela tecnologia que cria barreiras ao crescimento de micro-organismos entre as camadas de molho, queijo e massa.

Cada MRE contém uma refeição completa – prato principal, aperitivos, sobremesa e bebidas - com uma média de cerca de 1.200 calorias e uma variedade de vitaminas e minerais, alguns deles adicionados. Cada ingrediente está ali por uma razão - o charque é enriquecido com cafeína e a compota de maçã contém maltodextrina, que fornece um aumento de energia.

Essas escolhas alimentares têm um papel fundamental no campo de batalha, disse Stephen Moody, chefe da Divisão de Alimentação de Combate. “A alimentação certa pode nos dar uma vantagem”, aumentando o estado de alerta de um soldado ou as capacidades de tomada de decisão, disse ele.

Mas por que um civil iria querer comer uma dessas refeições?

Muitas porções são colocadas em tubos pela praticidade, como este molho de espaguete com carne. Foto: Kayana Szymczak/The New York Times

“Não sei”, disse Julie Smith, técnica de alimentos da Divisão. O novo interesse, acrescentou, parece antitético ao movimento crescente para se comprar produtos frescos e preparar refeições menos processadas.

Alguns veteranos das Forças Armadas também estão confusos. “Isso me faz morrer de rir”, disse Emmanuella Franco, 27 anos, uma especialista da Guarda Nacional do Exército entre 2013 e 2019 e que agora trabalha como técnica de microbiologia em Keeno, Califórnia. “Você quer comer esse pedaço de plástico que não derrete? Isso é por sua conta e risco, cara".

Tratar com desprezo as MREs é uma longa tradição nas Forças Armadas, onde elas ganharam apelidos como “refeições rejeitadas por todos” ou “refeições raramente comestíveis”.

Mas em plataformas como YouTube e TikTok, um grupo crescente de “testadores de MRE” (a maioria deles não militares) está fascinado. Eles abrem e examinam cada componente, incluindo aperitivos como a sempre procurada pasta de queijo jalapeño e sobremesas populares como a torta de cereja e mirtilo, assim como um pacote de acessórios que geralmente contém papel higiênico, um lenço umedecido, goma de mascar e sal. As MREs mais antigas podiam incluir cigarros, enquanto as não americanas podiam ter até bebidas alcoólicas.

Um dos avaliadores mais conhecidos de MREs do YouTube é Steven Thomas.

Os 1,8 milhão de assinantes de seu canal, o Steve1989MREInfo, assistiram a ele comer sem medo, e até mesmo com entusiasmo, carne de porco enlatada e ovos que datam de 1945, ou um pão de frango e presunto de 1984. Em abril deste ano, as visualizações de seus vídeos aumentaram para 9 milhões, um recorde do canal.

Depois de provar uma MRE pela primeira vez aos 8 anos - seu pai comprou uma para ele em uma loja de suprimentos do Exército em Lakewood, Flórida, onde Thomas ainda vive - ele ficou obcecado em localizar esse tipo de refeição de vários países e épocas. Em 2015, ele começou a degustá-las diante das câmeras.

Essas comidas são “a coisa mais próxima de uma viagem no tempo”, disse Thomas, 32 anos. “Quando você abre algo que nem o ar tocou há 50 ou 100 anos e está do mesmo jeito de sempre, é incrível”.

Principalmente durante a pandemia, a compra desse tipo de comida ajudou as pessoas a "lidar com um mundo caótico e imprevisível", disse Anastacia Marx de Salcedo, autora do livro Combat-Ready Kitchen: How the U.S. Military Shapes the Way You Eat (Cozinha pronta para combate: Como as Forças Armadas dos EUA moldam a forma como você come, em tradução livre). “Elas são uma comida reconfortante para a coragem”.

O desenvolvimento das MREs modernas começou em 1970, durante a Guerra do Vietnã. As versões atuais contêm duas inovações importantes: embalagens flexíveis e hermeticamente fechadas, que podem suportar o calor da esterilização, proporcionando estabilidade na conservação de alimentos enlatados sem volume; e o aquecedor de comida sem uso de chama, que usa uma reação química para aquecer um prato principal com apenas um pouco de água.

A Divisão de Alimentação de Combate está constantemente experimentando maneiras para melhorar a nutrição. O centro de Massachusetts tem um laboratório de alimentos que poderia ser confundido com qualquer cozinha industrial - não fosse pelas caixas de macarrão com queijo trufado em uma bisnaga (para pilotos da Força Aérea dos EUA) e os retratos de soldados enfileirados nas paredes.

Recentemente, Ann Barrett, engenheira química, e Michelle Richardson, técnica de alimentos, estavam fazendo omeletes de vegetais de vários volumes e conteúdo de gordura para ver como um soldado poderia ficar mais saciado com a menor embalagem.

Lauren Oleksyk, que lidera a equipe de engenharia e análise de alimentos, buscava entender como os soldados poderiam usar sensores que detectam os nutrientes de que precisam e, com uma impressora 3D, produzir alimentos nutricionalmente adequados para serem entregues por drone. Tom Yang, outro técnico de alimentos, estava experimentando o que é basicamente um microondas gigante para transformar pratos como macarrão com queijo e frango picante em refeições do tamanho de uma barra de granola que caberiam no bolso.

“Sabemos que isso não é comida gourmet”, disse David Accetta, chefe de relações públicas da organização de pesquisa e desenvolvimento do Exército que supervisiona as refeições.

MREs são refeições prontas para comer utilizadas por Forças Armadas do mundo e que viraram 'moda' na pandemia. Foto: Rinne Allen/The New York Times

Então, mais uma vez, pense no grande número de requisitos que a refeição tem que cumprir, ou as condições terríveis em que um soldado frequentemente está comendo uma delas.

“Boa ou não, ela vai mantê-lo vivo”, disse Joe Guerrero, 20 anos, operador de transporte motorizado do Exército aquartelado em Fort Bliss, Texas.

Muitos vendedores de MRE esperam capitalizar esse aumento na conscientização para fazer os civis pensarem nessas refeições não apenas no contexto militar, mas também associá-las com acampamentos, trilhas ou situações de emergência.

Tom Miller, diretor comercial da Wornick Foods em Cincinnati, um dos três fabricantes que produzem a maioria das MREs, disse que sua empresa está cada vez mais focada na produção para bancos de alimentos e outras organizações humanitárias que entram em ação durante desastres naturais. (A Agência Federal de Gestão de Emergências dos EUA também mantém um estoque dessas refeições.)

Quando uma tempestade deixou milhões de texanos sem água ou eletricidade em fevereiro, Shoshana Krieger e Mincho Jacob, que trabalham para a organização sem fins lucrativos de habitação, Basta, disseram que as MREs eram muito mais fáceis de se carregar e transportar em grande quantidade para os necessitados do que as refeições quentes. Se as mudanças climáticas continuarem a amplificar o impacto dos desastres naturais, essas necessidades talvez aumentem.

Ainda assim, as MREs estão longe do gosto popular. Vendê-las às vezes exige operar de um jeito que é difícil dizer se é certo ou errado legalmente. Kathleen, da North Georgia Outdoors Supply, disse que ouviu falar de vendedores roubando bases militares.

“Há muito estigma em torno da própria MRE”, disse Steven Cyros, fundador da MRE Depot e da MRE Wholesalers em San Clemente, Califórnia, e Tucson, Arizona. E “comparando o valor pago pelas calorias ingeridas, é uma opção cara” em comparação com outros alimentos pré-preparados. (Uma única MRE normalmente é vendida por cerca de US$ 10). Cyros teve pouco sucesso com anúncios em revistas de atividades ao ar livre - as refeições provavelmente são pesadas demais para os que fazem trilhas, disse ele.

Entretanto, as pessoas talvez já estejam comendo como os integrantes das Forças Armadas sem perceber. Muitos alimentos do dia a dia - da carne enlatada às barras energéticas - surgiram como MREs. Atualmente, até mesmo as embalagens produzidas para embalar as MREs são utilizadas para acondicionar comida para bebês e atum.

“As Forças Armadas surgem com essas inovações”, disse Anastacia. “E quando elas são oferecidas aos soldados, parecem um tipo estranho de comida.” Mas, em algum momento, afirmou, elas se tornam comida reconfortante para os americanos.  / TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

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