Conheça a história do youtuber que perdeu o casamento, os seguidores e uma Lamborghini


Ben Armstrong, mais conhecido como BitBoy, já foi o YouTuber de criptomoeda mais popular do mundo. Agora seu império entrou em colapso

Por David Yaffe-Bellany

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Nada menos que US$ 350 mil em metais aerodinâmicos e estofamento leve, embalados em uma carroceria firme e poderosa. Com suas curvas aerodinâmicas e seu sistema de som que brilha no escuro, o Lamborghini Huracán Performante prateado era a fantasia do adolescente Ben Armstrong. Ele adorava essa máquina.

Ben Armstrong, mais conhecido como BitBoy, já foi o YouTuber das criptomoedas mais influente do mundo, mas seu império entrou em colapso.  Foto: Bridget Bennett/The New York Times

Quando, finalmente, decidiu comprar o carro, Armstrong – divulgador de criptomoedas com mais de um milhão de assinantes no YouTube – ficou preocupado com a possibilidade de passar meses procurando. “Acho que tenho que ir à Itália para conseguir o Lambo que quero. Não pretendo fazer concessões”, ele escreveu ao parceiro de negócios. Mas o destino lhe sorriu. No outono setentrional de 2021, uma concessionária de automóveis em Charlotte, na Carolina do Norte, despachou o Huracán para o estúdio de produção de Armstrong, em um subúrbio de Atlanta.

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Enquanto o Lamborghini descia do caminhão de entrega, Armstrong, mais conhecido pelo nome de seu personagem do mundo cripto, BitBoy, deu uma gargalhada. “E acho que derramei uma lágrima”, disse na ocasião.

Dois anos depois, Armstrong, de 41 anos, perdeu sua produtora e grande parte de sua riqueza. Os amigos se voltaram contra ele e a esposa pediu o divórcio. Nos últimos cinco meses, em inúmeras postagens e vídeos nas redes sociais, Armstrong afirmou ser vítima de uma “conspiração criminosa” perpetrada por “terroristas” que assumiram o controle de seu canal no YouTube. “BitBoy está morto”, declarou recentemente.

O problema começou em agosto do ano passado, quando um grupo de amigos e parceiros de negócios o expulsou sem cerimônia de sua empresa, a HIT Network. Desde então, o cisma gerou um escândalo de grandes proporções nos tribunais e nas redes sociais. Os vários personagens antagonistas trocaram acusações de extorsão, roubo, assédio sexual e violência no local de trabalho. Um caso extraconjugal deu margem a recriminações muito acaloradas. E o Lamborghini se foi.

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Um Lamborghini Huracán Performante sendo entregue a Ben Armstrong, o influenciador de criptografia conhecido como BitBoy. Foto: HIT Network via The New York Times

Um argumento de venda cuidadosamente aprimorado

Como qualquer vendedor carismático, Armstrong tem um discurso cuidadosamente aprimorado. Gosta de dizer que costumava ser apenas um cara normal, até que a criptomoeda mudou sua vida. Depois de passar por tratamento para dependência de metanfetamina, no início dos anos 2000, frequentou uma faculdade cristã e acabou se casando com sua conselheira de admissão. Durante alguns anos, envolveu-se em vários negócios antes de se estabelecer nos voláteis mercados de criptomoedas.

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Em 2017, começou a fazer vídeos. Nessa época, eram monólogos tecnicamente mal-acabados, com notícias do mundo das criptomoedas. Seu canal só decolou três anos depois, quando um boom nos preços atraiu milhões de traders amadores em busca de conselhos. Durante a pandemia, Armstrong mudou as gravações para um estúdio profissional e contratou uma pequena equipe para produzir vídeos elegantes e editados profissionalmente.

No pico do mercado, chegou a possuir cerca de US$ 40 milhões em criptomoedas. Mas a linha entre suas finanças pessoais e as contas corporativas era confusa: a maioria dos ativos pertencia tecnicamente à BJ Investment Holdings, empresa que possuía com T.J. Shedd, colega entusiasta da criptomoeda que gerenciava o negócio de produção.

Se a criptomoeda é o Velho Oeste das finanças, os influenciadores de criptomoedas moram na parte mais selvagem da fronteira. Os principais youtubers desse segmento produzem vídeos que oscilam entre monólogos sérios sobre os cortes de taxas do Federal Reserve (o Banco Central norte-americano) e endossos apaixonados de moedas com nome de bichinhos de desenhos animados. Eles comandam grandes audiências e dominam os day traders que operam obsessivamente no ambiente on-line. Em 2021, impulsionaram amplamente o frenesi que surgiu em torno das ações-memes (ação-meme é a ação de uma empresa que aumenta rapidamente de preço em razão do ganho de popularidade nas redes sociais).

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Na primavera passada, enquanto o mercado cripto lutava para se recuperar, Armstrong começou a promover uma nova criptomoeda, a BEN Coin, que ele mesmo desenvolvera com Cassandra Wolfe, contratada da HIT Network conhecida nas redes sociais como a Duquesa de DeFi. Wolfe, de 34 anos, ajudara a garantir o lucrativo patrocínio da plataforma de apostas Stake, mas a equipe de Armstrong achou que a BEN Coin era uma má ideia. Temia que fosse uma forma obviamente cínica de ganhar dinheiro e não queria que Armstrong promovesse o empreendimento no canal BitBoy, no YouTube.

Sr. Armstrong, à direita, no carro de US$ 350 mil com seu parceiro de negócios na época, TJ Shedd. Foto: HIT Network via The New York Times

Ao mesmo tempo, Shedd começava a ouvir histórias preocupantes sobre o parceiro de negócios. Em um processo, em setembro, ele acusou Armstrong de “direcionar e desviar ilegalmente” até US$ 50 mil por mês para Wolfe, com quem estava tendo um caso extraconjugal. Armstrong também foi acusado de roubar dezenas de milhares de dólares em criptomoedas da empresa. Shedd acionou uma cláusula existente no acordo operacional da holding que lhe permitiu comprar a participação majoritária de Armstrong.

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Veio então o golpe final. Em setembro, um investidor em criptomoedas chamado Carlos Diaz, que frequentava os mesmos círculos sociais dos executivos da HIT Network, pediu a Armstrong que transferisse para ele o título da Lamborghini. Diaz, que era um superfã de BitBoy, disse em uma entrevista: “Havia uma conexão espiritual entre nós. Eu realmente sentia que Deus falava comigo por intermédio dele.”

Como exatamente Diaz pediu ao seu ‘guia espiritual’ um carro esporte de US$ 350 mil continua sendo objeto de uma considerável disputa legal. Diaz afirmou que perdera dinheiro em um grande investimento na BEN Coin e queria vender o carro para recuperar os fundos. Armstrong insiste que Diaz se apresentou como um agente da HIT Network que ajudava a empresa a arrecadar dinheiro. De qualquer forma, Armstrong também disse que se sentia fisicamente ameaçado e preferia chegar a um acordo.

Os dois anos em que BitBoy foi proprietário do Lamborghini terminaram em um estacionamento do Walmart, onde se encontrou com Diaz para preencher a papelada de transferência.

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‘O duque e a duquesa’

No mundo volátil da criptomoeda, as ações de um youtuber podem subir e descer tão erraticamente quanto qualquer moeda meme inspirada em desenhos animados. Em dezembro, Armstrong estava tentando um retorno. Ao lado de Wolfe, foi a Las Vegas anunciar sua participação no “clube de luta dos influenciadores” – evento de boxe com temática inspirada nas criptomoedas, agendado para esse mês na Cidade do México.

Certa noite, Armstrong se juntou a Wolfe e a alguns outros influenciadores de criptos no pátio do Gold Spike, bar no centro da cidade onde ele estava promovendo o evento. Queria falar sobre a Lambo desaparecida. “Ela está em um showroom em Fort Lauderdale, na Flórida. Tenho fotos”, explicou aos amigos, entre eles um youtuber conhecido como Crypto Keeper.

Armstrong chegou às criptomoedas após outras tentativas de empreendedorismo e recuperação do vício em metanfetaminas. Foto: Bridget Bennett/The New York Times

À medida que a conversa se voltava para assuntos menos emocionantes, Armstrong puxou Wolfe para perto e acariciou o cabelo dela. Crypto Keeper se inclinou e sussurrou ao ouvido de Armstrong: “O duque e a duquesa.” Este sorriu e depois repetiu: “Sim, o duque e a duquesa.”

Depois da exposição de seu caso, Armstrong divulgou um vídeo no qual ele e a esposa, com quem têm três filhos pequenos, se comprometem a superar a crise e manter a família unida. Por algum tempo, Armstrong pensou que as duas mulheres o apoiariam: em uma audiência inicial de seu processo contra a HIT Network, sentou-se no tribunal com Wolfe de um lado e a esposa, Bethany, do outro. Mas, em outubro, a esposa pediu o divórcio.

Quando estavam em Las Vegas, em dezembro, Armstrong e Wolfe fizeram tatuagens iguais com o desenho do logotipo da BEN Coin – uma série de setas que se cruzam ilustrando o slogan da moeda: “Esteja em todos os lugares agora.” Wolfe disse que a BEN Coin era um empreendimento sério, uma forma de encorajar pessoas a se envolver com criptomoedas. Ela e Armstrong estão trabalhando em um acordo para oferecer a moeda em caixas eletrônicos especializados, repletos de fotos do BitBoy com os dentes cerrados, erguendo o punho em um sinal de desafio.

‘Ele roubou meu Lamborghini’

Uma semana depois, o duque e a duquesa voltariam à corte. Armstrong começara o dia com uma série de postagens acusando outro influenciador proeminente de ter se associado a uma “rede de pedofilia” na Tailândia. Ao pararem em um Starbucks perto do tribunal da cidade de Marietta, na Geórgia, Wolfe postou: “Ben está em paz esta manhã.”

Armstrong processou meia dúzia de seus antigos colegas. Mas a batalha mais pessoal envolve seu Lamborghini. Em processos judiciais na Geórgia, argumentou que foi intimidado e extorquido para transferir o título do carro para Diaz.

Em setembro, Armstrong dirigiu até a casa de Diaz, nos arredores de Atlanta, portando uma arma. Ficou na rua e começou a transmitir ao vivo um discurso eloquente sobre o veículo desaparecido. “Este homem está me extorquindo. Roubou minha Lamborghini”, disse à polícia depois que os guardas chegaram para intervir.Agora, estava se preparando para defender o caso no tribunal do condado de Cobb.

Depois de aproximadamente duas horas, a juíza Jana Edmondson-Cooper decidiu a favor de Diaz. Um caso de extorsão exige a apropriação indébita da propriedade de alguém, e a juíza concluiu que Armstrong não conseguiu provar que o veículo “não era um carro da empresa”.

O Lamborghini dos sonhos de BitBoy parecia nunca ter pertencido a ele. Armstrong bateu com a mão na mesa. “O juiz é corrupto”, vociferou, enquanto entrava no elevador. Dois membros de sua equipe jurídica trocaram olhares; o cliente tinha um histórico de postagens destemperadas. “Pegue o telefone dele”, pediu um deles a Wolfe.

BitBoy estava ferido. Não conseguira pegar o carro de volta. As capturas de tela do vídeo da prisão se converteram em muitas memes. O novo canal definhava com apenas 90 mil assinantes, pequena fração dos mais de 1 milhão e meio que tinham seguido BitBoy no auge. “Nunca houve vitória para mim”, Armstrong esbravejou quando saiu furioso do tribunal.

Mas o velho estilo de soltar bravatas logo retornou. Depois de alguns dias, BitBoy já mirava a próxima grande oportunidade, o dia em que os preços subiriam novamente. “Sou uma pessoa muito complexa e incompreendida. Vou ficar rico outra vez. Todo mundo meio que entende isso. É só uma questão de como e quando”, declarou.

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Nada menos que US$ 350 mil em metais aerodinâmicos e estofamento leve, embalados em uma carroceria firme e poderosa. Com suas curvas aerodinâmicas e seu sistema de som que brilha no escuro, o Lamborghini Huracán Performante prateado era a fantasia do adolescente Ben Armstrong. Ele adorava essa máquina.

Ben Armstrong, mais conhecido como BitBoy, já foi o YouTuber das criptomoedas mais influente do mundo, mas seu império entrou em colapso.  Foto: Bridget Bennett/The New York Times

Quando, finalmente, decidiu comprar o carro, Armstrong – divulgador de criptomoedas com mais de um milhão de assinantes no YouTube – ficou preocupado com a possibilidade de passar meses procurando. “Acho que tenho que ir à Itália para conseguir o Lambo que quero. Não pretendo fazer concessões”, ele escreveu ao parceiro de negócios. Mas o destino lhe sorriu. No outono setentrional de 2021, uma concessionária de automóveis em Charlotte, na Carolina do Norte, despachou o Huracán para o estúdio de produção de Armstrong, em um subúrbio de Atlanta.

Enquanto o Lamborghini descia do caminhão de entrega, Armstrong, mais conhecido pelo nome de seu personagem do mundo cripto, BitBoy, deu uma gargalhada. “E acho que derramei uma lágrima”, disse na ocasião.

Dois anos depois, Armstrong, de 41 anos, perdeu sua produtora e grande parte de sua riqueza. Os amigos se voltaram contra ele e a esposa pediu o divórcio. Nos últimos cinco meses, em inúmeras postagens e vídeos nas redes sociais, Armstrong afirmou ser vítima de uma “conspiração criminosa” perpetrada por “terroristas” que assumiram o controle de seu canal no YouTube. “BitBoy está morto”, declarou recentemente.

O problema começou em agosto do ano passado, quando um grupo de amigos e parceiros de negócios o expulsou sem cerimônia de sua empresa, a HIT Network. Desde então, o cisma gerou um escândalo de grandes proporções nos tribunais e nas redes sociais. Os vários personagens antagonistas trocaram acusações de extorsão, roubo, assédio sexual e violência no local de trabalho. Um caso extraconjugal deu margem a recriminações muito acaloradas. E o Lamborghini se foi.

Um Lamborghini Huracán Performante sendo entregue a Ben Armstrong, o influenciador de criptografia conhecido como BitBoy. Foto: HIT Network via The New York Times

Um argumento de venda cuidadosamente aprimorado

Como qualquer vendedor carismático, Armstrong tem um discurso cuidadosamente aprimorado. Gosta de dizer que costumava ser apenas um cara normal, até que a criptomoeda mudou sua vida. Depois de passar por tratamento para dependência de metanfetamina, no início dos anos 2000, frequentou uma faculdade cristã e acabou se casando com sua conselheira de admissão. Durante alguns anos, envolveu-se em vários negócios antes de se estabelecer nos voláteis mercados de criptomoedas.

Em 2017, começou a fazer vídeos. Nessa época, eram monólogos tecnicamente mal-acabados, com notícias do mundo das criptomoedas. Seu canal só decolou três anos depois, quando um boom nos preços atraiu milhões de traders amadores em busca de conselhos. Durante a pandemia, Armstrong mudou as gravações para um estúdio profissional e contratou uma pequena equipe para produzir vídeos elegantes e editados profissionalmente.

No pico do mercado, chegou a possuir cerca de US$ 40 milhões em criptomoedas. Mas a linha entre suas finanças pessoais e as contas corporativas era confusa: a maioria dos ativos pertencia tecnicamente à BJ Investment Holdings, empresa que possuía com T.J. Shedd, colega entusiasta da criptomoeda que gerenciava o negócio de produção.

Se a criptomoeda é o Velho Oeste das finanças, os influenciadores de criptomoedas moram na parte mais selvagem da fronteira. Os principais youtubers desse segmento produzem vídeos que oscilam entre monólogos sérios sobre os cortes de taxas do Federal Reserve (o Banco Central norte-americano) e endossos apaixonados de moedas com nome de bichinhos de desenhos animados. Eles comandam grandes audiências e dominam os day traders que operam obsessivamente no ambiente on-line. Em 2021, impulsionaram amplamente o frenesi que surgiu em torno das ações-memes (ação-meme é a ação de uma empresa que aumenta rapidamente de preço em razão do ganho de popularidade nas redes sociais).

Na primavera passada, enquanto o mercado cripto lutava para se recuperar, Armstrong começou a promover uma nova criptomoeda, a BEN Coin, que ele mesmo desenvolvera com Cassandra Wolfe, contratada da HIT Network conhecida nas redes sociais como a Duquesa de DeFi. Wolfe, de 34 anos, ajudara a garantir o lucrativo patrocínio da plataforma de apostas Stake, mas a equipe de Armstrong achou que a BEN Coin era uma má ideia. Temia que fosse uma forma obviamente cínica de ganhar dinheiro e não queria que Armstrong promovesse o empreendimento no canal BitBoy, no YouTube.

Sr. Armstrong, à direita, no carro de US$ 350 mil com seu parceiro de negócios na época, TJ Shedd. Foto: HIT Network via The New York Times

Ao mesmo tempo, Shedd começava a ouvir histórias preocupantes sobre o parceiro de negócios. Em um processo, em setembro, ele acusou Armstrong de “direcionar e desviar ilegalmente” até US$ 50 mil por mês para Wolfe, com quem estava tendo um caso extraconjugal. Armstrong também foi acusado de roubar dezenas de milhares de dólares em criptomoedas da empresa. Shedd acionou uma cláusula existente no acordo operacional da holding que lhe permitiu comprar a participação majoritária de Armstrong.

Veio então o golpe final. Em setembro, um investidor em criptomoedas chamado Carlos Diaz, que frequentava os mesmos círculos sociais dos executivos da HIT Network, pediu a Armstrong que transferisse para ele o título da Lamborghini. Diaz, que era um superfã de BitBoy, disse em uma entrevista: “Havia uma conexão espiritual entre nós. Eu realmente sentia que Deus falava comigo por intermédio dele.”

Como exatamente Diaz pediu ao seu ‘guia espiritual’ um carro esporte de US$ 350 mil continua sendo objeto de uma considerável disputa legal. Diaz afirmou que perdera dinheiro em um grande investimento na BEN Coin e queria vender o carro para recuperar os fundos. Armstrong insiste que Diaz se apresentou como um agente da HIT Network que ajudava a empresa a arrecadar dinheiro. De qualquer forma, Armstrong também disse que se sentia fisicamente ameaçado e preferia chegar a um acordo.

Os dois anos em que BitBoy foi proprietário do Lamborghini terminaram em um estacionamento do Walmart, onde se encontrou com Diaz para preencher a papelada de transferência.

‘O duque e a duquesa’

No mundo volátil da criptomoeda, as ações de um youtuber podem subir e descer tão erraticamente quanto qualquer moeda meme inspirada em desenhos animados. Em dezembro, Armstrong estava tentando um retorno. Ao lado de Wolfe, foi a Las Vegas anunciar sua participação no “clube de luta dos influenciadores” – evento de boxe com temática inspirada nas criptomoedas, agendado para esse mês na Cidade do México.

Certa noite, Armstrong se juntou a Wolfe e a alguns outros influenciadores de criptos no pátio do Gold Spike, bar no centro da cidade onde ele estava promovendo o evento. Queria falar sobre a Lambo desaparecida. “Ela está em um showroom em Fort Lauderdale, na Flórida. Tenho fotos”, explicou aos amigos, entre eles um youtuber conhecido como Crypto Keeper.

Armstrong chegou às criptomoedas após outras tentativas de empreendedorismo e recuperação do vício em metanfetaminas. Foto: Bridget Bennett/The New York Times

À medida que a conversa se voltava para assuntos menos emocionantes, Armstrong puxou Wolfe para perto e acariciou o cabelo dela. Crypto Keeper se inclinou e sussurrou ao ouvido de Armstrong: “O duque e a duquesa.” Este sorriu e depois repetiu: “Sim, o duque e a duquesa.”

Depois da exposição de seu caso, Armstrong divulgou um vídeo no qual ele e a esposa, com quem têm três filhos pequenos, se comprometem a superar a crise e manter a família unida. Por algum tempo, Armstrong pensou que as duas mulheres o apoiariam: em uma audiência inicial de seu processo contra a HIT Network, sentou-se no tribunal com Wolfe de um lado e a esposa, Bethany, do outro. Mas, em outubro, a esposa pediu o divórcio.

Quando estavam em Las Vegas, em dezembro, Armstrong e Wolfe fizeram tatuagens iguais com o desenho do logotipo da BEN Coin – uma série de setas que se cruzam ilustrando o slogan da moeda: “Esteja em todos os lugares agora.” Wolfe disse que a BEN Coin era um empreendimento sério, uma forma de encorajar pessoas a se envolver com criptomoedas. Ela e Armstrong estão trabalhando em um acordo para oferecer a moeda em caixas eletrônicos especializados, repletos de fotos do BitBoy com os dentes cerrados, erguendo o punho em um sinal de desafio.

‘Ele roubou meu Lamborghini’

Uma semana depois, o duque e a duquesa voltariam à corte. Armstrong começara o dia com uma série de postagens acusando outro influenciador proeminente de ter se associado a uma “rede de pedofilia” na Tailândia. Ao pararem em um Starbucks perto do tribunal da cidade de Marietta, na Geórgia, Wolfe postou: “Ben está em paz esta manhã.”

Armstrong processou meia dúzia de seus antigos colegas. Mas a batalha mais pessoal envolve seu Lamborghini. Em processos judiciais na Geórgia, argumentou que foi intimidado e extorquido para transferir o título do carro para Diaz.

Em setembro, Armstrong dirigiu até a casa de Diaz, nos arredores de Atlanta, portando uma arma. Ficou na rua e começou a transmitir ao vivo um discurso eloquente sobre o veículo desaparecido. “Este homem está me extorquindo. Roubou minha Lamborghini”, disse à polícia depois que os guardas chegaram para intervir.Agora, estava se preparando para defender o caso no tribunal do condado de Cobb.

Depois de aproximadamente duas horas, a juíza Jana Edmondson-Cooper decidiu a favor de Diaz. Um caso de extorsão exige a apropriação indébita da propriedade de alguém, e a juíza concluiu que Armstrong não conseguiu provar que o veículo “não era um carro da empresa”.

O Lamborghini dos sonhos de BitBoy parecia nunca ter pertencido a ele. Armstrong bateu com a mão na mesa. “O juiz é corrupto”, vociferou, enquanto entrava no elevador. Dois membros de sua equipe jurídica trocaram olhares; o cliente tinha um histórico de postagens destemperadas. “Pegue o telefone dele”, pediu um deles a Wolfe.

BitBoy estava ferido. Não conseguira pegar o carro de volta. As capturas de tela do vídeo da prisão se converteram em muitas memes. O novo canal definhava com apenas 90 mil assinantes, pequena fração dos mais de 1 milhão e meio que tinham seguido BitBoy no auge. “Nunca houve vitória para mim”, Armstrong esbravejou quando saiu furioso do tribunal.

Mas o velho estilo de soltar bravatas logo retornou. Depois de alguns dias, BitBoy já mirava a próxima grande oportunidade, o dia em que os preços subiriam novamente. “Sou uma pessoa muito complexa e incompreendida. Vou ficar rico outra vez. Todo mundo meio que entende isso. É só uma questão de como e quando”, declarou.

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Nada menos que US$ 350 mil em metais aerodinâmicos e estofamento leve, embalados em uma carroceria firme e poderosa. Com suas curvas aerodinâmicas e seu sistema de som que brilha no escuro, o Lamborghini Huracán Performante prateado era a fantasia do adolescente Ben Armstrong. Ele adorava essa máquina.

Ben Armstrong, mais conhecido como BitBoy, já foi o YouTuber das criptomoedas mais influente do mundo, mas seu império entrou em colapso.  Foto: Bridget Bennett/The New York Times

Quando, finalmente, decidiu comprar o carro, Armstrong – divulgador de criptomoedas com mais de um milhão de assinantes no YouTube – ficou preocupado com a possibilidade de passar meses procurando. “Acho que tenho que ir à Itália para conseguir o Lambo que quero. Não pretendo fazer concessões”, ele escreveu ao parceiro de negócios. Mas o destino lhe sorriu. No outono setentrional de 2021, uma concessionária de automóveis em Charlotte, na Carolina do Norte, despachou o Huracán para o estúdio de produção de Armstrong, em um subúrbio de Atlanta.

Enquanto o Lamborghini descia do caminhão de entrega, Armstrong, mais conhecido pelo nome de seu personagem do mundo cripto, BitBoy, deu uma gargalhada. “E acho que derramei uma lágrima”, disse na ocasião.

Dois anos depois, Armstrong, de 41 anos, perdeu sua produtora e grande parte de sua riqueza. Os amigos se voltaram contra ele e a esposa pediu o divórcio. Nos últimos cinco meses, em inúmeras postagens e vídeos nas redes sociais, Armstrong afirmou ser vítima de uma “conspiração criminosa” perpetrada por “terroristas” que assumiram o controle de seu canal no YouTube. “BitBoy está morto”, declarou recentemente.

O problema começou em agosto do ano passado, quando um grupo de amigos e parceiros de negócios o expulsou sem cerimônia de sua empresa, a HIT Network. Desde então, o cisma gerou um escândalo de grandes proporções nos tribunais e nas redes sociais. Os vários personagens antagonistas trocaram acusações de extorsão, roubo, assédio sexual e violência no local de trabalho. Um caso extraconjugal deu margem a recriminações muito acaloradas. E o Lamborghini se foi.

Um Lamborghini Huracán Performante sendo entregue a Ben Armstrong, o influenciador de criptografia conhecido como BitBoy. Foto: HIT Network via The New York Times

Um argumento de venda cuidadosamente aprimorado

Como qualquer vendedor carismático, Armstrong tem um discurso cuidadosamente aprimorado. Gosta de dizer que costumava ser apenas um cara normal, até que a criptomoeda mudou sua vida. Depois de passar por tratamento para dependência de metanfetamina, no início dos anos 2000, frequentou uma faculdade cristã e acabou se casando com sua conselheira de admissão. Durante alguns anos, envolveu-se em vários negócios antes de se estabelecer nos voláteis mercados de criptomoedas.

Em 2017, começou a fazer vídeos. Nessa época, eram monólogos tecnicamente mal-acabados, com notícias do mundo das criptomoedas. Seu canal só decolou três anos depois, quando um boom nos preços atraiu milhões de traders amadores em busca de conselhos. Durante a pandemia, Armstrong mudou as gravações para um estúdio profissional e contratou uma pequena equipe para produzir vídeos elegantes e editados profissionalmente.

No pico do mercado, chegou a possuir cerca de US$ 40 milhões em criptomoedas. Mas a linha entre suas finanças pessoais e as contas corporativas era confusa: a maioria dos ativos pertencia tecnicamente à BJ Investment Holdings, empresa que possuía com T.J. Shedd, colega entusiasta da criptomoeda que gerenciava o negócio de produção.

Se a criptomoeda é o Velho Oeste das finanças, os influenciadores de criptomoedas moram na parte mais selvagem da fronteira. Os principais youtubers desse segmento produzem vídeos que oscilam entre monólogos sérios sobre os cortes de taxas do Federal Reserve (o Banco Central norte-americano) e endossos apaixonados de moedas com nome de bichinhos de desenhos animados. Eles comandam grandes audiências e dominam os day traders que operam obsessivamente no ambiente on-line. Em 2021, impulsionaram amplamente o frenesi que surgiu em torno das ações-memes (ação-meme é a ação de uma empresa que aumenta rapidamente de preço em razão do ganho de popularidade nas redes sociais).

Na primavera passada, enquanto o mercado cripto lutava para se recuperar, Armstrong começou a promover uma nova criptomoeda, a BEN Coin, que ele mesmo desenvolvera com Cassandra Wolfe, contratada da HIT Network conhecida nas redes sociais como a Duquesa de DeFi. Wolfe, de 34 anos, ajudara a garantir o lucrativo patrocínio da plataforma de apostas Stake, mas a equipe de Armstrong achou que a BEN Coin era uma má ideia. Temia que fosse uma forma obviamente cínica de ganhar dinheiro e não queria que Armstrong promovesse o empreendimento no canal BitBoy, no YouTube.

Sr. Armstrong, à direita, no carro de US$ 350 mil com seu parceiro de negócios na época, TJ Shedd. Foto: HIT Network via The New York Times

Ao mesmo tempo, Shedd começava a ouvir histórias preocupantes sobre o parceiro de negócios. Em um processo, em setembro, ele acusou Armstrong de “direcionar e desviar ilegalmente” até US$ 50 mil por mês para Wolfe, com quem estava tendo um caso extraconjugal. Armstrong também foi acusado de roubar dezenas de milhares de dólares em criptomoedas da empresa. Shedd acionou uma cláusula existente no acordo operacional da holding que lhe permitiu comprar a participação majoritária de Armstrong.

Veio então o golpe final. Em setembro, um investidor em criptomoedas chamado Carlos Diaz, que frequentava os mesmos círculos sociais dos executivos da HIT Network, pediu a Armstrong que transferisse para ele o título da Lamborghini. Diaz, que era um superfã de BitBoy, disse em uma entrevista: “Havia uma conexão espiritual entre nós. Eu realmente sentia que Deus falava comigo por intermédio dele.”

Como exatamente Diaz pediu ao seu ‘guia espiritual’ um carro esporte de US$ 350 mil continua sendo objeto de uma considerável disputa legal. Diaz afirmou que perdera dinheiro em um grande investimento na BEN Coin e queria vender o carro para recuperar os fundos. Armstrong insiste que Diaz se apresentou como um agente da HIT Network que ajudava a empresa a arrecadar dinheiro. De qualquer forma, Armstrong também disse que se sentia fisicamente ameaçado e preferia chegar a um acordo.

Os dois anos em que BitBoy foi proprietário do Lamborghini terminaram em um estacionamento do Walmart, onde se encontrou com Diaz para preencher a papelada de transferência.

‘O duque e a duquesa’

No mundo volátil da criptomoeda, as ações de um youtuber podem subir e descer tão erraticamente quanto qualquer moeda meme inspirada em desenhos animados. Em dezembro, Armstrong estava tentando um retorno. Ao lado de Wolfe, foi a Las Vegas anunciar sua participação no “clube de luta dos influenciadores” – evento de boxe com temática inspirada nas criptomoedas, agendado para esse mês na Cidade do México.

Certa noite, Armstrong se juntou a Wolfe e a alguns outros influenciadores de criptos no pátio do Gold Spike, bar no centro da cidade onde ele estava promovendo o evento. Queria falar sobre a Lambo desaparecida. “Ela está em um showroom em Fort Lauderdale, na Flórida. Tenho fotos”, explicou aos amigos, entre eles um youtuber conhecido como Crypto Keeper.

Armstrong chegou às criptomoedas após outras tentativas de empreendedorismo e recuperação do vício em metanfetaminas. Foto: Bridget Bennett/The New York Times

À medida que a conversa se voltava para assuntos menos emocionantes, Armstrong puxou Wolfe para perto e acariciou o cabelo dela. Crypto Keeper se inclinou e sussurrou ao ouvido de Armstrong: “O duque e a duquesa.” Este sorriu e depois repetiu: “Sim, o duque e a duquesa.”

Depois da exposição de seu caso, Armstrong divulgou um vídeo no qual ele e a esposa, com quem têm três filhos pequenos, se comprometem a superar a crise e manter a família unida. Por algum tempo, Armstrong pensou que as duas mulheres o apoiariam: em uma audiência inicial de seu processo contra a HIT Network, sentou-se no tribunal com Wolfe de um lado e a esposa, Bethany, do outro. Mas, em outubro, a esposa pediu o divórcio.

Quando estavam em Las Vegas, em dezembro, Armstrong e Wolfe fizeram tatuagens iguais com o desenho do logotipo da BEN Coin – uma série de setas que se cruzam ilustrando o slogan da moeda: “Esteja em todos os lugares agora.” Wolfe disse que a BEN Coin era um empreendimento sério, uma forma de encorajar pessoas a se envolver com criptomoedas. Ela e Armstrong estão trabalhando em um acordo para oferecer a moeda em caixas eletrônicos especializados, repletos de fotos do BitBoy com os dentes cerrados, erguendo o punho em um sinal de desafio.

‘Ele roubou meu Lamborghini’

Uma semana depois, o duque e a duquesa voltariam à corte. Armstrong começara o dia com uma série de postagens acusando outro influenciador proeminente de ter se associado a uma “rede de pedofilia” na Tailândia. Ao pararem em um Starbucks perto do tribunal da cidade de Marietta, na Geórgia, Wolfe postou: “Ben está em paz esta manhã.”

Armstrong processou meia dúzia de seus antigos colegas. Mas a batalha mais pessoal envolve seu Lamborghini. Em processos judiciais na Geórgia, argumentou que foi intimidado e extorquido para transferir o título do carro para Diaz.

Em setembro, Armstrong dirigiu até a casa de Diaz, nos arredores de Atlanta, portando uma arma. Ficou na rua e começou a transmitir ao vivo um discurso eloquente sobre o veículo desaparecido. “Este homem está me extorquindo. Roubou minha Lamborghini”, disse à polícia depois que os guardas chegaram para intervir.Agora, estava se preparando para defender o caso no tribunal do condado de Cobb.

Depois de aproximadamente duas horas, a juíza Jana Edmondson-Cooper decidiu a favor de Diaz. Um caso de extorsão exige a apropriação indébita da propriedade de alguém, e a juíza concluiu que Armstrong não conseguiu provar que o veículo “não era um carro da empresa”.

O Lamborghini dos sonhos de BitBoy parecia nunca ter pertencido a ele. Armstrong bateu com a mão na mesa. “O juiz é corrupto”, vociferou, enquanto entrava no elevador. Dois membros de sua equipe jurídica trocaram olhares; o cliente tinha um histórico de postagens destemperadas. “Pegue o telefone dele”, pediu um deles a Wolfe.

BitBoy estava ferido. Não conseguira pegar o carro de volta. As capturas de tela do vídeo da prisão se converteram em muitas memes. O novo canal definhava com apenas 90 mil assinantes, pequena fração dos mais de 1 milhão e meio que tinham seguido BitBoy no auge. “Nunca houve vitória para mim”, Armstrong esbravejou quando saiu furioso do tribunal.

Mas o velho estilo de soltar bravatas logo retornou. Depois de alguns dias, BitBoy já mirava a próxima grande oportunidade, o dia em que os preços subiriam novamente. “Sou uma pessoa muito complexa e incompreendida. Vou ficar rico outra vez. Todo mundo meio que entende isso. É só uma questão de como e quando”, declarou.

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Nada menos que US$ 350 mil em metais aerodinâmicos e estofamento leve, embalados em uma carroceria firme e poderosa. Com suas curvas aerodinâmicas e seu sistema de som que brilha no escuro, o Lamborghini Huracán Performante prateado era a fantasia do adolescente Ben Armstrong. Ele adorava essa máquina.

Ben Armstrong, mais conhecido como BitBoy, já foi o YouTuber das criptomoedas mais influente do mundo, mas seu império entrou em colapso.  Foto: Bridget Bennett/The New York Times

Quando, finalmente, decidiu comprar o carro, Armstrong – divulgador de criptomoedas com mais de um milhão de assinantes no YouTube – ficou preocupado com a possibilidade de passar meses procurando. “Acho que tenho que ir à Itália para conseguir o Lambo que quero. Não pretendo fazer concessões”, ele escreveu ao parceiro de negócios. Mas o destino lhe sorriu. No outono setentrional de 2021, uma concessionária de automóveis em Charlotte, na Carolina do Norte, despachou o Huracán para o estúdio de produção de Armstrong, em um subúrbio de Atlanta.

Enquanto o Lamborghini descia do caminhão de entrega, Armstrong, mais conhecido pelo nome de seu personagem do mundo cripto, BitBoy, deu uma gargalhada. “E acho que derramei uma lágrima”, disse na ocasião.

Dois anos depois, Armstrong, de 41 anos, perdeu sua produtora e grande parte de sua riqueza. Os amigos se voltaram contra ele e a esposa pediu o divórcio. Nos últimos cinco meses, em inúmeras postagens e vídeos nas redes sociais, Armstrong afirmou ser vítima de uma “conspiração criminosa” perpetrada por “terroristas” que assumiram o controle de seu canal no YouTube. “BitBoy está morto”, declarou recentemente.

O problema começou em agosto do ano passado, quando um grupo de amigos e parceiros de negócios o expulsou sem cerimônia de sua empresa, a HIT Network. Desde então, o cisma gerou um escândalo de grandes proporções nos tribunais e nas redes sociais. Os vários personagens antagonistas trocaram acusações de extorsão, roubo, assédio sexual e violência no local de trabalho. Um caso extraconjugal deu margem a recriminações muito acaloradas. E o Lamborghini se foi.

Um Lamborghini Huracán Performante sendo entregue a Ben Armstrong, o influenciador de criptografia conhecido como BitBoy. Foto: HIT Network via The New York Times

Um argumento de venda cuidadosamente aprimorado

Como qualquer vendedor carismático, Armstrong tem um discurso cuidadosamente aprimorado. Gosta de dizer que costumava ser apenas um cara normal, até que a criptomoeda mudou sua vida. Depois de passar por tratamento para dependência de metanfetamina, no início dos anos 2000, frequentou uma faculdade cristã e acabou se casando com sua conselheira de admissão. Durante alguns anos, envolveu-se em vários negócios antes de se estabelecer nos voláteis mercados de criptomoedas.

Em 2017, começou a fazer vídeos. Nessa época, eram monólogos tecnicamente mal-acabados, com notícias do mundo das criptomoedas. Seu canal só decolou três anos depois, quando um boom nos preços atraiu milhões de traders amadores em busca de conselhos. Durante a pandemia, Armstrong mudou as gravações para um estúdio profissional e contratou uma pequena equipe para produzir vídeos elegantes e editados profissionalmente.

No pico do mercado, chegou a possuir cerca de US$ 40 milhões em criptomoedas. Mas a linha entre suas finanças pessoais e as contas corporativas era confusa: a maioria dos ativos pertencia tecnicamente à BJ Investment Holdings, empresa que possuía com T.J. Shedd, colega entusiasta da criptomoeda que gerenciava o negócio de produção.

Se a criptomoeda é o Velho Oeste das finanças, os influenciadores de criptomoedas moram na parte mais selvagem da fronteira. Os principais youtubers desse segmento produzem vídeos que oscilam entre monólogos sérios sobre os cortes de taxas do Federal Reserve (o Banco Central norte-americano) e endossos apaixonados de moedas com nome de bichinhos de desenhos animados. Eles comandam grandes audiências e dominam os day traders que operam obsessivamente no ambiente on-line. Em 2021, impulsionaram amplamente o frenesi que surgiu em torno das ações-memes (ação-meme é a ação de uma empresa que aumenta rapidamente de preço em razão do ganho de popularidade nas redes sociais).

Na primavera passada, enquanto o mercado cripto lutava para se recuperar, Armstrong começou a promover uma nova criptomoeda, a BEN Coin, que ele mesmo desenvolvera com Cassandra Wolfe, contratada da HIT Network conhecida nas redes sociais como a Duquesa de DeFi. Wolfe, de 34 anos, ajudara a garantir o lucrativo patrocínio da plataforma de apostas Stake, mas a equipe de Armstrong achou que a BEN Coin era uma má ideia. Temia que fosse uma forma obviamente cínica de ganhar dinheiro e não queria que Armstrong promovesse o empreendimento no canal BitBoy, no YouTube.

Sr. Armstrong, à direita, no carro de US$ 350 mil com seu parceiro de negócios na época, TJ Shedd. Foto: HIT Network via The New York Times

Ao mesmo tempo, Shedd começava a ouvir histórias preocupantes sobre o parceiro de negócios. Em um processo, em setembro, ele acusou Armstrong de “direcionar e desviar ilegalmente” até US$ 50 mil por mês para Wolfe, com quem estava tendo um caso extraconjugal. Armstrong também foi acusado de roubar dezenas de milhares de dólares em criptomoedas da empresa. Shedd acionou uma cláusula existente no acordo operacional da holding que lhe permitiu comprar a participação majoritária de Armstrong.

Veio então o golpe final. Em setembro, um investidor em criptomoedas chamado Carlos Diaz, que frequentava os mesmos círculos sociais dos executivos da HIT Network, pediu a Armstrong que transferisse para ele o título da Lamborghini. Diaz, que era um superfã de BitBoy, disse em uma entrevista: “Havia uma conexão espiritual entre nós. Eu realmente sentia que Deus falava comigo por intermédio dele.”

Como exatamente Diaz pediu ao seu ‘guia espiritual’ um carro esporte de US$ 350 mil continua sendo objeto de uma considerável disputa legal. Diaz afirmou que perdera dinheiro em um grande investimento na BEN Coin e queria vender o carro para recuperar os fundos. Armstrong insiste que Diaz se apresentou como um agente da HIT Network que ajudava a empresa a arrecadar dinheiro. De qualquer forma, Armstrong também disse que se sentia fisicamente ameaçado e preferia chegar a um acordo.

Os dois anos em que BitBoy foi proprietário do Lamborghini terminaram em um estacionamento do Walmart, onde se encontrou com Diaz para preencher a papelada de transferência.

‘O duque e a duquesa’

No mundo volátil da criptomoeda, as ações de um youtuber podem subir e descer tão erraticamente quanto qualquer moeda meme inspirada em desenhos animados. Em dezembro, Armstrong estava tentando um retorno. Ao lado de Wolfe, foi a Las Vegas anunciar sua participação no “clube de luta dos influenciadores” – evento de boxe com temática inspirada nas criptomoedas, agendado para esse mês na Cidade do México.

Certa noite, Armstrong se juntou a Wolfe e a alguns outros influenciadores de criptos no pátio do Gold Spike, bar no centro da cidade onde ele estava promovendo o evento. Queria falar sobre a Lambo desaparecida. “Ela está em um showroom em Fort Lauderdale, na Flórida. Tenho fotos”, explicou aos amigos, entre eles um youtuber conhecido como Crypto Keeper.

Armstrong chegou às criptomoedas após outras tentativas de empreendedorismo e recuperação do vício em metanfetaminas. Foto: Bridget Bennett/The New York Times

À medida que a conversa se voltava para assuntos menos emocionantes, Armstrong puxou Wolfe para perto e acariciou o cabelo dela. Crypto Keeper se inclinou e sussurrou ao ouvido de Armstrong: “O duque e a duquesa.” Este sorriu e depois repetiu: “Sim, o duque e a duquesa.”

Depois da exposição de seu caso, Armstrong divulgou um vídeo no qual ele e a esposa, com quem têm três filhos pequenos, se comprometem a superar a crise e manter a família unida. Por algum tempo, Armstrong pensou que as duas mulheres o apoiariam: em uma audiência inicial de seu processo contra a HIT Network, sentou-se no tribunal com Wolfe de um lado e a esposa, Bethany, do outro. Mas, em outubro, a esposa pediu o divórcio.

Quando estavam em Las Vegas, em dezembro, Armstrong e Wolfe fizeram tatuagens iguais com o desenho do logotipo da BEN Coin – uma série de setas que se cruzam ilustrando o slogan da moeda: “Esteja em todos os lugares agora.” Wolfe disse que a BEN Coin era um empreendimento sério, uma forma de encorajar pessoas a se envolver com criptomoedas. Ela e Armstrong estão trabalhando em um acordo para oferecer a moeda em caixas eletrônicos especializados, repletos de fotos do BitBoy com os dentes cerrados, erguendo o punho em um sinal de desafio.

‘Ele roubou meu Lamborghini’

Uma semana depois, o duque e a duquesa voltariam à corte. Armstrong começara o dia com uma série de postagens acusando outro influenciador proeminente de ter se associado a uma “rede de pedofilia” na Tailândia. Ao pararem em um Starbucks perto do tribunal da cidade de Marietta, na Geórgia, Wolfe postou: “Ben está em paz esta manhã.”

Armstrong processou meia dúzia de seus antigos colegas. Mas a batalha mais pessoal envolve seu Lamborghini. Em processos judiciais na Geórgia, argumentou que foi intimidado e extorquido para transferir o título do carro para Diaz.

Em setembro, Armstrong dirigiu até a casa de Diaz, nos arredores de Atlanta, portando uma arma. Ficou na rua e começou a transmitir ao vivo um discurso eloquente sobre o veículo desaparecido. “Este homem está me extorquindo. Roubou minha Lamborghini”, disse à polícia depois que os guardas chegaram para intervir.Agora, estava se preparando para defender o caso no tribunal do condado de Cobb.

Depois de aproximadamente duas horas, a juíza Jana Edmondson-Cooper decidiu a favor de Diaz. Um caso de extorsão exige a apropriação indébita da propriedade de alguém, e a juíza concluiu que Armstrong não conseguiu provar que o veículo “não era um carro da empresa”.

O Lamborghini dos sonhos de BitBoy parecia nunca ter pertencido a ele. Armstrong bateu com a mão na mesa. “O juiz é corrupto”, vociferou, enquanto entrava no elevador. Dois membros de sua equipe jurídica trocaram olhares; o cliente tinha um histórico de postagens destemperadas. “Pegue o telefone dele”, pediu um deles a Wolfe.

BitBoy estava ferido. Não conseguira pegar o carro de volta. As capturas de tela do vídeo da prisão se converteram em muitas memes. O novo canal definhava com apenas 90 mil assinantes, pequena fração dos mais de 1 milhão e meio que tinham seguido BitBoy no auge. “Nunca houve vitória para mim”, Armstrong esbravejou quando saiu furioso do tribunal.

Mas o velho estilo de soltar bravatas logo retornou. Depois de alguns dias, BitBoy já mirava a próxima grande oportunidade, o dia em que os preços subiriam novamente. “Sou uma pessoa muito complexa e incompreendida. Vou ficar rico outra vez. Todo mundo meio que entende isso. É só uma questão de como e quando”, declarou.

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