O primeiro orgasmo chega na metade do episódio piloto de Emily em Paris, a nova série de Darren Star na Netflix. Emily (interpretada por Lily Collins), gênio do marketing do Centro-Oeste dos Estados Unidos, recém-chegada à França, entra em uma boulangerie. Depois de confundir o gênero gramatical de um croissant de chocolate – é "un", e não "une" –, ela o compra e o morde. "Meu Deus do céu!", diz, enquanto seu rosto, emoldurado em close-up acima de um vestido amarelo banana, se dissolve em êxtase. Claro que sim.
Nas últimas três décadas, Star, escritor e produtor que ganhou muita experiência com seus dramas Barrados no Baile e Melrose Place antes de criar Sex and the City (Sexo e a Cidade, no Brasil) e Younger, especializou-se em permitir que os espectadores, especialmente as mulheres, vivam suas histórias indiretamente. Suas personagens realizam uma fantasia depois da outra – culinária, indumentária, erótica. Embora cercada por libertinos, Emily é mais sexualmente conservadora do que algumas heroínas recentes de Star, mas ainda assim consegue dormir com três homens em dez episódios.
Eu queria conversar com Star sobre suas visões escapistas da experiência feminina urbana. Que você pode alcançar uma vida amorosa extremamente variada, tendo sempre tempo para um brunch com as amigas (Sex and the City); que você pode de alguma forma refazer sua vida adulta (Younger); que você pode conseguir um emprego dos sonhos em uma cidade dos sonhos com um guarda-roupa dos sonhos para combinar (Emily em Paris).
No terceiro episódio, Emily educa seus colegas em relação ao olhar masculino, mas Star parece ter incorporado um olhar masculino próprio, tornando as mulheres heroínas de suas histórias atraentes e improváveis. "Elas vivem a vida de acordo com o que as move, e não necessariamente de acordo com o que outras pessoas pensam que deveria motivá-las como mulheres", comentou Collins sobre as personagens femininas de Star durante uma entrevista por telefone.
Mas, no decorrer de uma hora de conversa, em que Star permaneceu charmoso e equilibrado, embora raramente introspectivo, comecei a pensar que não o entendia. (Ou será que Star entendeu todos os seus programas de forma errada?) Ele diz não ter nenhum talento especial para criar personagens femininas; também não acha que suas mulheres são realmente diferentes de seus homens.
E o prazer visual dos trajes luxuosos, dos apartamentos e dos restaurantes que suas séries apresentam? São apenas a cereja no topo do bolo, afirmou Star. Sempre achei que seus programas eram praticamente apenas uma cereja. Ele discorda. Quando questionado sobre escrever personagens femininas, Star menosprezou seu talento.
"Gosto de dizer que penso nas mulheres como pessoas, não como mulheres." Ele observou que escreve sobre mulheres porque o gênero em que trabalha – comédia romântica – exige isso. (Sua única série centrada nos homens, The Street, foi um fracasso.) Além disso, as mulheres são úteis a um contador de histórias. "Elas expressam suas emoções. Falam. São verbais. Engraçadas. Posso me identificar com os sentimentos delas", disse Star. (E sejamos honestos: são muito divertidas ao se vestir.)
"Mas não tento pensar em como uma mulher pensaria em algo e como um homem pensaria no mesmo assunto", acrescentou. Isso poderia endossar certa crítica que perseguiu Sex and the City, de que suas protagonistas não eram realmente mulheres, mas homens gays disfarçados (e com muita competência). Star, que é homossexual, considera essa crítica injusta. "Acho que os críticos queriam dizer que elas não são mulheres. Essas não são as mulheres que conhecemos; não queremos que as mulheres sejam assim. Também humilham os homossexuais, estereotipando-os como obcecados por sexo", declarou.
Ainda assim, a vida das heroínas costuma refletir os próprios devaneios do autor. "Sinto que cada programa precisa ter um motivo para mim, como se eu tivesse de me conectar com o que estou escrevendo", explicou ele. Vejamos Emily em Paris, por exemplo. Star estudou francês na faculdade e costumava se imaginar morando em Paris.
Há alguns anos, ele se arriscou e alugou um apartamento no bairro do Marais, experimentando seu medíocre domínio do idioma. "Sei como os franceses me veem; quando olham para os americanos, posso ver alguns de seus preconceitos e consigo perceber alguns dos meus", contou. Portanto, não foi preciso muito esforço para se colocar no lugar de Emily, por mais alto que seja o salto dela.
A série de Star foi toda gravada na França, usando atores majoritariamente franceses e uma equipe exclusivamente francesa. "Foi o pessoal mais atraente com quem já trabalhei", disse. Felizmente, ele não teve de usar seu francês de estudante – todos falavam inglês. Juntos, criaram a visão de uma Paris de glacê, a cidade como uma variedade de macarons Ladurée.
Nada é chato, nada é feio, não falta estilo a nenhuma roupa nem a ninguém. Tensões de raça, de nacionalidade e de classe? Ausentes. Aqueles coletes amarelos que os manifestantes usam para protestar contra a desigualdade econômica? Faça-me o favor! Eles destoariam do conjunto.
Depois do lançamento do primeiro trailer, um jornalista da rádio francesa RTL escreveu um artigo breve e desdenhoso argumentando que, desde os episódios de Gossip Girl em Paris, nenhum programa apresentava uma visão da cidade tão rosa e tão clichê. Star rebateu – com razão! – que ninguém deve julgar um programa com base em um trailer, embora também tenha reconhecido que os dez episódios completos, vários dos quais se aproximam muito de Gossip Girl, podem não refutar essas acusações.
"Eu queria mostrar Paris de uma forma realmente maravilhosa, que encorajasse as pessoas a se apaixonar pela cidade como me apaixonei. Além disso, você aponta a câmera para qualquer lugar em Paris e fica ótimo", comentou Star. Isso é típico da televisão que ele faz. Ele observou que sua primeira série foi ambientada em Beverly Hills. A Manhattan de Sex and the City tem apenas uma semelhança passageira com o bairro real – o que faz parte do apelo.
Ele considera os vestidos, os apartamentos lindos de morrer e os restaurantes chiques como recipientes para cenas, caixas de porcelana Limoges para a televisão. "Esse é o revestimento superficial. Por baixo disso? Personagens com coração e alma. São interessantes ou loucas, no caso de Melrose Place. Em última análise, tudo está centrado nas personagens. O resto é diversão.
A fantasia sempre tem alguma conexão com algo que é real", afirmou. Mas o que há de tão errado com o entretenimento? Star tem o dom – do tipo que ninguém recusaria – de criar programas irresistíveis cujas ligações com a realidade são, na melhor das hipóteses, frágeis. Daphne Zuniga, atriz de Melrose Place e ex-colega de quarto de Star na faculdade, lembra como ele reformulou a série, partindo do coração e da alma nos primeiros episódios em direção a algo mais ultrajante, satisfazendo o desejo do público.
"Ele apenas conduziu a série direto para o que o público parecia desejar. Primeiro, um pouco. E, depois, muito mais", contou Zuniga. Emily em Paris oferece uma versão filtrada pelo Instagram da experiência do expatriado, uma procissão com curadoria precisa de taças de champanhe, de interesses amorosos barulhentos e de passeios à meia-noite por ruas de paralelepípedos.
Remover esses filtros significaria menos piadas e bustiês, menos fantasia. Também poderia exigir um diálogo mais refinado do que a primeira impressão que Emily tem de Paris: "Eu me sinto como Nicole Kidman em Moulin Rouge." Sempre assisti aos programas de Star principalmente por causa dessas fantasias, das bebidas, das ruas, que ele rejeita como "fachada".
O que significa que assisti errado, ou que Star subestima o apelo da decoração de vitrine. Há coisas piores do que o melhor agente de viagens da TV de escapismo glamoroso. "Graças a Deus, Darren não está fazendo documentários. Que desperdício", disse Zuniga. Ela está certa. E só para constar: o chambre de bonne de Emily tem cortinas muito bonitas.
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