Curandeiros dão toques modernos a uma prática ancestral


Elas dão continuidade a uma tradição há muito reverenciada na cultura hispânica do Texas

Por Edgar Sandoval

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Recentemente, em Edinburg, cidade na fronteira do Texas, Chriselda Hernandez ouviu uma batida à sua porta. Era uma estudante universitária que disse estar passando por uma maré de má sorte: um motorista bêbado tinha batido em seu carro e, em seguida, alguém invadira seu carro novo e roubara seu laptop. “Preciso de uma ‘limpia’”, ela implorou - uma limpeza espiritual.

Sasha García monitora as velas que acende para uma limpia, uma limpeza espiritual. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

Hernandez foi até o altar que fica na sala e que tem uma imagem da Virgem de Guadalupe. Devagar, misturou sálvia e palo santo, madeira nativa da América do Sul, e acendeu com um fósforo. Depois, espalhou a fumaça de cura sobre o corpo da moça. “Você está segurando alguma coisa. Deixe ir. Não tenha vergonha”, sussurrou para a visitante.

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Durante gerações, as comunidades hispânicas ao longo da fronteira sul recorreram a curandeiras tradicionais como Hernandez, vistas frequentemente no imaginário popular como mulheres idosas, com velas e ícones religiosos, que operam nas sombras da sociedade, em barracos sujos.

Mas a antiga arte da cura entrou na era do Instagram. Cada vez mais jovens estão adotando rituais que aprenderam com as avós e usando-os contra problemas do século XXI. Fazem “limpias” em praias públicas, compartilham receitas on-line para bloquear as “energias da inveja” e vendem velas artesanais com a imagem de Nossa Senhora de Guadalupe. Boa parte dos clientes tem formação universitária, como Clarissa Ochoa, a moça que procurou Hernandez em busca de ajuda.

“Acho uma honra ser curandera; é algo muito bonito, mas também muito limitante”, disse Chriselda Hernandez, realizando uma limpia atrás de uma amiga. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times
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“Acho uma honra ser curandeira; é muito bonito, mas também muito limitante. Acho que estamos quebrando esses limites - de que as curandeiras são só idosas que lidam com ervas. Meu chamado é curar quem eu puder”, disse Hernandez, de 42 anos.

Antes da chegada dos conquistadores espanhóis, existia uma cultura tradicional de cura na América Latina e no México. Com o tempo, os curandeiros começaram a mesclar rituais indígenas com elementos do catolicismo e influências das tradições folclóricas asiáticas e africanas.

A prática se consolidou no Vale do Rio Grande, no Texas, perto da fronteira mexicana, principalmente por necessidade. O condado de Hidalgo, onde se situa McAllen, que abriga uma população majoritariamente hispânica, tem uma das maiores taxas de pessoas sem plano de saúde do país, e muitas recorrem a curandeiros por falta de outras opções acessíveis, informou Servando Hinojosa, professor de antropologia que ministra um curso de medicina tradicional mexicano-americana na Universidade do Texas no Vale do Rio Grande.

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Sasha García, à esquerda, dá uma limpia para Jocelyn Acevedo. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

Ele acrescentou que muitos habitantes hispânicos também tendem a desconfiar da medicina ocidental dominante, sobretudo quando se trata de saúde mental. Um estudo recente do Centro de Controle e Prevenção de Doenças constatou que, embora o número de pessoas negras, asiáticas e brancas que procuraram tratamento de saúde mental tenha aumentado nos últimos anos, houve pouca mudança entre os latinos. O curandeirismo se tornou tão aceito no Vale do Rio Grande que frequentemente se veem placas de rua e comerciais de televisão anunciando serviços de cura tradicional.

Hernandez contou que suas bisavós eram parteiras. Descobriu, quando criança, que possuía dons; à medida que crescia, começou a interagir com uma entidade que acredita ser o anjo da morte, Azrael. Trabalha em um centro de atendimento telefônico e mora com uma amiga em uma casa moderna no subúrbio de Edinburg, cidade próxima à fronteira. “Você faz isso da sua maneira, como é certo para você. Não tem certo ou errado.”

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Danielle López, de 39 anos, outra curandeira tradicional e ao mesmo tempo moderna, ex-aluna de Hinojosa, também afirmou ter descoberto seu dom quando era criança e abraçou o título de curandeira millenial (pessoa que pertence à geração que nasceu entre 1980 e 1995). Combinou as antigas tradições que aprendeu com a avó que a criou, Consuelo López, e uma tia, Esperanza Rodriguez, com novos conhecimentos adquiridos em instituições de ensino superior.

Clara Cavazos, de preto, se prepara para fazer a leitura de um cartão para um cliente. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

Sua formação acadêmica inclui um mestrado em estudos interdisciplinares com foco em literatura mexicano-americana, antropologia médica e história da arte latina na Universidade do Texas no Vale do Rio Grande. Está concluindo um doutorado em inglês sobre literatura de fronteira na Universidade do Texas em San Antonio, onde também é professora. “Para mim, é uma continuidade. Quanto ao meu trabalho espiritual, acho que precisamos dele mais do que nunca.”

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Não é incomum que lhe peçam “trabajitos”, pequenos trabalhos, incluindo bênçãos, limpezas e remédios caseiros, quando ela não está imersa nos livros. Pouco tempo atrás, López recebeu um pedido para abençoar o novo negócio de uma amiga. Ao limpar o estabelecimento com um buquê de rosas, seis pétalas caíram, o que a fez alertar a amiga de que seis pessoas “não tinham boas intenções”. “Podem até dizer que estão felizes com o novo negócio dela, mas não é verdade.”

Às vezes, ela também dá conselhos mais científicos. Quando alguém lhe diz que está ansioso ou que não consegue dormir, ela recomenda reduzir o consumo de açúcar ou cafeína. Segundo ela, como o conselho vem de uma curandeira, as pessoas tendem a confiar que existe uma preocupação com seu bem-estar.

Estátuas incluindo São Judas, a Virgem de Guadalupe e La Santísima Muerte, uma versão latina do Grim Reaper, estão em exibição em uma empresa em Alamo, Texas. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times
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O conceito de curandeira é tão difundido entre os latinos que, em setembro, o Instituto de Diabetes do Texas, centro de última geração administrado pela Universidade Health no oeste de San Antonio, bairro histórico mexicano-americano, recolocou no saguão uma enorme pintura, “La Curandera”, do pintor chicano Jesus Treviño, que faleceu no início deste ano. A pintura tinha sido removida para restauração.

De acordo com Sasha García, de 39 anos, curandeira conhecida por seu cabelo intensamente vermelho, quando se trata de sorte e assuntos do coração, muita gente evita ajuda profissional e recorre às curandeiras, porque não há nada que se compare a esse tipo de tratamento.

García contou que, no norte do México, onde a cultura indígena não é tão difundida e a influência da Igreja Católica é mais forte, seus antepassados com frequência operavam na clandestinidade para evitar o estigma associado aos curandeiros tradicionais. E que, do lado americano da fronteira, ela não só se sente mais livre para trabalhar, como alguns padres católicos até lhe pedem conselhos.

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Recentemente, em Edinburg, cidade na fronteira do Texas, Chriselda Hernandez ouviu uma batida à sua porta. Era uma estudante universitária que disse estar passando por uma maré de má sorte: um motorista bêbado tinha batido em seu carro e, em seguida, alguém invadira seu carro novo e roubara seu laptop. “Preciso de uma ‘limpia’”, ela implorou - uma limpeza espiritual.

Sasha García monitora as velas que acende para uma limpia, uma limpeza espiritual. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

Hernandez foi até o altar que fica na sala e que tem uma imagem da Virgem de Guadalupe. Devagar, misturou sálvia e palo santo, madeira nativa da América do Sul, e acendeu com um fósforo. Depois, espalhou a fumaça de cura sobre o corpo da moça. “Você está segurando alguma coisa. Deixe ir. Não tenha vergonha”, sussurrou para a visitante.

Durante gerações, as comunidades hispânicas ao longo da fronteira sul recorreram a curandeiras tradicionais como Hernandez, vistas frequentemente no imaginário popular como mulheres idosas, com velas e ícones religiosos, que operam nas sombras da sociedade, em barracos sujos.

Mas a antiga arte da cura entrou na era do Instagram. Cada vez mais jovens estão adotando rituais que aprenderam com as avós e usando-os contra problemas do século XXI. Fazem “limpias” em praias públicas, compartilham receitas on-line para bloquear as “energias da inveja” e vendem velas artesanais com a imagem de Nossa Senhora de Guadalupe. Boa parte dos clientes tem formação universitária, como Clarissa Ochoa, a moça que procurou Hernandez em busca de ajuda.

“Acho uma honra ser curandera; é algo muito bonito, mas também muito limitante”, disse Chriselda Hernandez, realizando uma limpia atrás de uma amiga. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

“Acho uma honra ser curandeira; é muito bonito, mas também muito limitante. Acho que estamos quebrando esses limites - de que as curandeiras são só idosas que lidam com ervas. Meu chamado é curar quem eu puder”, disse Hernandez, de 42 anos.

Antes da chegada dos conquistadores espanhóis, existia uma cultura tradicional de cura na América Latina e no México. Com o tempo, os curandeiros começaram a mesclar rituais indígenas com elementos do catolicismo e influências das tradições folclóricas asiáticas e africanas.

A prática se consolidou no Vale do Rio Grande, no Texas, perto da fronteira mexicana, principalmente por necessidade. O condado de Hidalgo, onde se situa McAllen, que abriga uma população majoritariamente hispânica, tem uma das maiores taxas de pessoas sem plano de saúde do país, e muitas recorrem a curandeiros por falta de outras opções acessíveis, informou Servando Hinojosa, professor de antropologia que ministra um curso de medicina tradicional mexicano-americana na Universidade do Texas no Vale do Rio Grande.

Sasha García, à esquerda, dá uma limpia para Jocelyn Acevedo. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

Ele acrescentou que muitos habitantes hispânicos também tendem a desconfiar da medicina ocidental dominante, sobretudo quando se trata de saúde mental. Um estudo recente do Centro de Controle e Prevenção de Doenças constatou que, embora o número de pessoas negras, asiáticas e brancas que procuraram tratamento de saúde mental tenha aumentado nos últimos anos, houve pouca mudança entre os latinos. O curandeirismo se tornou tão aceito no Vale do Rio Grande que frequentemente se veem placas de rua e comerciais de televisão anunciando serviços de cura tradicional.

Hernandez contou que suas bisavós eram parteiras. Descobriu, quando criança, que possuía dons; à medida que crescia, começou a interagir com uma entidade que acredita ser o anjo da morte, Azrael. Trabalha em um centro de atendimento telefônico e mora com uma amiga em uma casa moderna no subúrbio de Edinburg, cidade próxima à fronteira. “Você faz isso da sua maneira, como é certo para você. Não tem certo ou errado.”

Danielle López, de 39 anos, outra curandeira tradicional e ao mesmo tempo moderna, ex-aluna de Hinojosa, também afirmou ter descoberto seu dom quando era criança e abraçou o título de curandeira millenial (pessoa que pertence à geração que nasceu entre 1980 e 1995). Combinou as antigas tradições que aprendeu com a avó que a criou, Consuelo López, e uma tia, Esperanza Rodriguez, com novos conhecimentos adquiridos em instituições de ensino superior.

Clara Cavazos, de preto, se prepara para fazer a leitura de um cartão para um cliente. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

Sua formação acadêmica inclui um mestrado em estudos interdisciplinares com foco em literatura mexicano-americana, antropologia médica e história da arte latina na Universidade do Texas no Vale do Rio Grande. Está concluindo um doutorado em inglês sobre literatura de fronteira na Universidade do Texas em San Antonio, onde também é professora. “Para mim, é uma continuidade. Quanto ao meu trabalho espiritual, acho que precisamos dele mais do que nunca.”

Não é incomum que lhe peçam “trabajitos”, pequenos trabalhos, incluindo bênçãos, limpezas e remédios caseiros, quando ela não está imersa nos livros. Pouco tempo atrás, López recebeu um pedido para abençoar o novo negócio de uma amiga. Ao limpar o estabelecimento com um buquê de rosas, seis pétalas caíram, o que a fez alertar a amiga de que seis pessoas “não tinham boas intenções”. “Podem até dizer que estão felizes com o novo negócio dela, mas não é verdade.”

Às vezes, ela também dá conselhos mais científicos. Quando alguém lhe diz que está ansioso ou que não consegue dormir, ela recomenda reduzir o consumo de açúcar ou cafeína. Segundo ela, como o conselho vem de uma curandeira, as pessoas tendem a confiar que existe uma preocupação com seu bem-estar.

Estátuas incluindo São Judas, a Virgem de Guadalupe e La Santísima Muerte, uma versão latina do Grim Reaper, estão em exibição em uma empresa em Alamo, Texas. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

O conceito de curandeira é tão difundido entre os latinos que, em setembro, o Instituto de Diabetes do Texas, centro de última geração administrado pela Universidade Health no oeste de San Antonio, bairro histórico mexicano-americano, recolocou no saguão uma enorme pintura, “La Curandera”, do pintor chicano Jesus Treviño, que faleceu no início deste ano. A pintura tinha sido removida para restauração.

De acordo com Sasha García, de 39 anos, curandeira conhecida por seu cabelo intensamente vermelho, quando se trata de sorte e assuntos do coração, muita gente evita ajuda profissional e recorre às curandeiras, porque não há nada que se compare a esse tipo de tratamento.

García contou que, no norte do México, onde a cultura indígena não é tão difundida e a influência da Igreja Católica é mais forte, seus antepassados com frequência operavam na clandestinidade para evitar o estigma associado aos curandeiros tradicionais. E que, do lado americano da fronteira, ela não só se sente mais livre para trabalhar, como alguns padres católicos até lhe pedem conselhos.

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Recentemente, em Edinburg, cidade na fronteira do Texas, Chriselda Hernandez ouviu uma batida à sua porta. Era uma estudante universitária que disse estar passando por uma maré de má sorte: um motorista bêbado tinha batido em seu carro e, em seguida, alguém invadira seu carro novo e roubara seu laptop. “Preciso de uma ‘limpia’”, ela implorou - uma limpeza espiritual.

Sasha García monitora as velas que acende para uma limpia, uma limpeza espiritual. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

Hernandez foi até o altar que fica na sala e que tem uma imagem da Virgem de Guadalupe. Devagar, misturou sálvia e palo santo, madeira nativa da América do Sul, e acendeu com um fósforo. Depois, espalhou a fumaça de cura sobre o corpo da moça. “Você está segurando alguma coisa. Deixe ir. Não tenha vergonha”, sussurrou para a visitante.

Durante gerações, as comunidades hispânicas ao longo da fronteira sul recorreram a curandeiras tradicionais como Hernandez, vistas frequentemente no imaginário popular como mulheres idosas, com velas e ícones religiosos, que operam nas sombras da sociedade, em barracos sujos.

Mas a antiga arte da cura entrou na era do Instagram. Cada vez mais jovens estão adotando rituais que aprenderam com as avós e usando-os contra problemas do século XXI. Fazem “limpias” em praias públicas, compartilham receitas on-line para bloquear as “energias da inveja” e vendem velas artesanais com a imagem de Nossa Senhora de Guadalupe. Boa parte dos clientes tem formação universitária, como Clarissa Ochoa, a moça que procurou Hernandez em busca de ajuda.

“Acho uma honra ser curandera; é algo muito bonito, mas também muito limitante”, disse Chriselda Hernandez, realizando uma limpia atrás de uma amiga. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

“Acho uma honra ser curandeira; é muito bonito, mas também muito limitante. Acho que estamos quebrando esses limites - de que as curandeiras são só idosas que lidam com ervas. Meu chamado é curar quem eu puder”, disse Hernandez, de 42 anos.

Antes da chegada dos conquistadores espanhóis, existia uma cultura tradicional de cura na América Latina e no México. Com o tempo, os curandeiros começaram a mesclar rituais indígenas com elementos do catolicismo e influências das tradições folclóricas asiáticas e africanas.

A prática se consolidou no Vale do Rio Grande, no Texas, perto da fronteira mexicana, principalmente por necessidade. O condado de Hidalgo, onde se situa McAllen, que abriga uma população majoritariamente hispânica, tem uma das maiores taxas de pessoas sem plano de saúde do país, e muitas recorrem a curandeiros por falta de outras opções acessíveis, informou Servando Hinojosa, professor de antropologia que ministra um curso de medicina tradicional mexicano-americana na Universidade do Texas no Vale do Rio Grande.

Sasha García, à esquerda, dá uma limpia para Jocelyn Acevedo. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

Ele acrescentou que muitos habitantes hispânicos também tendem a desconfiar da medicina ocidental dominante, sobretudo quando se trata de saúde mental. Um estudo recente do Centro de Controle e Prevenção de Doenças constatou que, embora o número de pessoas negras, asiáticas e brancas que procuraram tratamento de saúde mental tenha aumentado nos últimos anos, houve pouca mudança entre os latinos. O curandeirismo se tornou tão aceito no Vale do Rio Grande que frequentemente se veem placas de rua e comerciais de televisão anunciando serviços de cura tradicional.

Hernandez contou que suas bisavós eram parteiras. Descobriu, quando criança, que possuía dons; à medida que crescia, começou a interagir com uma entidade que acredita ser o anjo da morte, Azrael. Trabalha em um centro de atendimento telefônico e mora com uma amiga em uma casa moderna no subúrbio de Edinburg, cidade próxima à fronteira. “Você faz isso da sua maneira, como é certo para você. Não tem certo ou errado.”

Danielle López, de 39 anos, outra curandeira tradicional e ao mesmo tempo moderna, ex-aluna de Hinojosa, também afirmou ter descoberto seu dom quando era criança e abraçou o título de curandeira millenial (pessoa que pertence à geração que nasceu entre 1980 e 1995). Combinou as antigas tradições que aprendeu com a avó que a criou, Consuelo López, e uma tia, Esperanza Rodriguez, com novos conhecimentos adquiridos em instituições de ensino superior.

Clara Cavazos, de preto, se prepara para fazer a leitura de um cartão para um cliente. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

Sua formação acadêmica inclui um mestrado em estudos interdisciplinares com foco em literatura mexicano-americana, antropologia médica e história da arte latina na Universidade do Texas no Vale do Rio Grande. Está concluindo um doutorado em inglês sobre literatura de fronteira na Universidade do Texas em San Antonio, onde também é professora. “Para mim, é uma continuidade. Quanto ao meu trabalho espiritual, acho que precisamos dele mais do que nunca.”

Não é incomum que lhe peçam “trabajitos”, pequenos trabalhos, incluindo bênçãos, limpezas e remédios caseiros, quando ela não está imersa nos livros. Pouco tempo atrás, López recebeu um pedido para abençoar o novo negócio de uma amiga. Ao limpar o estabelecimento com um buquê de rosas, seis pétalas caíram, o que a fez alertar a amiga de que seis pessoas “não tinham boas intenções”. “Podem até dizer que estão felizes com o novo negócio dela, mas não é verdade.”

Às vezes, ela também dá conselhos mais científicos. Quando alguém lhe diz que está ansioso ou que não consegue dormir, ela recomenda reduzir o consumo de açúcar ou cafeína. Segundo ela, como o conselho vem de uma curandeira, as pessoas tendem a confiar que existe uma preocupação com seu bem-estar.

Estátuas incluindo São Judas, a Virgem de Guadalupe e La Santísima Muerte, uma versão latina do Grim Reaper, estão em exibição em uma empresa em Alamo, Texas. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

O conceito de curandeira é tão difundido entre os latinos que, em setembro, o Instituto de Diabetes do Texas, centro de última geração administrado pela Universidade Health no oeste de San Antonio, bairro histórico mexicano-americano, recolocou no saguão uma enorme pintura, “La Curandera”, do pintor chicano Jesus Treviño, que faleceu no início deste ano. A pintura tinha sido removida para restauração.

De acordo com Sasha García, de 39 anos, curandeira conhecida por seu cabelo intensamente vermelho, quando se trata de sorte e assuntos do coração, muita gente evita ajuda profissional e recorre às curandeiras, porque não há nada que se compare a esse tipo de tratamento.

García contou que, no norte do México, onde a cultura indígena não é tão difundida e a influência da Igreja Católica é mais forte, seus antepassados com frequência operavam na clandestinidade para evitar o estigma associado aos curandeiros tradicionais. E que, do lado americano da fronteira, ela não só se sente mais livre para trabalhar, como alguns padres católicos até lhe pedem conselhos.

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Recentemente, em Edinburg, cidade na fronteira do Texas, Chriselda Hernandez ouviu uma batida à sua porta. Era uma estudante universitária que disse estar passando por uma maré de má sorte: um motorista bêbado tinha batido em seu carro e, em seguida, alguém invadira seu carro novo e roubara seu laptop. “Preciso de uma ‘limpia’”, ela implorou - uma limpeza espiritual.

Sasha García monitora as velas que acende para uma limpia, uma limpeza espiritual. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

Hernandez foi até o altar que fica na sala e que tem uma imagem da Virgem de Guadalupe. Devagar, misturou sálvia e palo santo, madeira nativa da América do Sul, e acendeu com um fósforo. Depois, espalhou a fumaça de cura sobre o corpo da moça. “Você está segurando alguma coisa. Deixe ir. Não tenha vergonha”, sussurrou para a visitante.

Durante gerações, as comunidades hispânicas ao longo da fronteira sul recorreram a curandeiras tradicionais como Hernandez, vistas frequentemente no imaginário popular como mulheres idosas, com velas e ícones religiosos, que operam nas sombras da sociedade, em barracos sujos.

Mas a antiga arte da cura entrou na era do Instagram. Cada vez mais jovens estão adotando rituais que aprenderam com as avós e usando-os contra problemas do século XXI. Fazem “limpias” em praias públicas, compartilham receitas on-line para bloquear as “energias da inveja” e vendem velas artesanais com a imagem de Nossa Senhora de Guadalupe. Boa parte dos clientes tem formação universitária, como Clarissa Ochoa, a moça que procurou Hernandez em busca de ajuda.

“Acho uma honra ser curandera; é algo muito bonito, mas também muito limitante”, disse Chriselda Hernandez, realizando uma limpia atrás de uma amiga. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

“Acho uma honra ser curandeira; é muito bonito, mas também muito limitante. Acho que estamos quebrando esses limites - de que as curandeiras são só idosas que lidam com ervas. Meu chamado é curar quem eu puder”, disse Hernandez, de 42 anos.

Antes da chegada dos conquistadores espanhóis, existia uma cultura tradicional de cura na América Latina e no México. Com o tempo, os curandeiros começaram a mesclar rituais indígenas com elementos do catolicismo e influências das tradições folclóricas asiáticas e africanas.

A prática se consolidou no Vale do Rio Grande, no Texas, perto da fronteira mexicana, principalmente por necessidade. O condado de Hidalgo, onde se situa McAllen, que abriga uma população majoritariamente hispânica, tem uma das maiores taxas de pessoas sem plano de saúde do país, e muitas recorrem a curandeiros por falta de outras opções acessíveis, informou Servando Hinojosa, professor de antropologia que ministra um curso de medicina tradicional mexicano-americana na Universidade do Texas no Vale do Rio Grande.

Sasha García, à esquerda, dá uma limpia para Jocelyn Acevedo. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

Ele acrescentou que muitos habitantes hispânicos também tendem a desconfiar da medicina ocidental dominante, sobretudo quando se trata de saúde mental. Um estudo recente do Centro de Controle e Prevenção de Doenças constatou que, embora o número de pessoas negras, asiáticas e brancas que procuraram tratamento de saúde mental tenha aumentado nos últimos anos, houve pouca mudança entre os latinos. O curandeirismo se tornou tão aceito no Vale do Rio Grande que frequentemente se veem placas de rua e comerciais de televisão anunciando serviços de cura tradicional.

Hernandez contou que suas bisavós eram parteiras. Descobriu, quando criança, que possuía dons; à medida que crescia, começou a interagir com uma entidade que acredita ser o anjo da morte, Azrael. Trabalha em um centro de atendimento telefônico e mora com uma amiga em uma casa moderna no subúrbio de Edinburg, cidade próxima à fronteira. “Você faz isso da sua maneira, como é certo para você. Não tem certo ou errado.”

Danielle López, de 39 anos, outra curandeira tradicional e ao mesmo tempo moderna, ex-aluna de Hinojosa, também afirmou ter descoberto seu dom quando era criança e abraçou o título de curandeira millenial (pessoa que pertence à geração que nasceu entre 1980 e 1995). Combinou as antigas tradições que aprendeu com a avó que a criou, Consuelo López, e uma tia, Esperanza Rodriguez, com novos conhecimentos adquiridos em instituições de ensino superior.

Clara Cavazos, de preto, se prepara para fazer a leitura de um cartão para um cliente. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

Sua formação acadêmica inclui um mestrado em estudos interdisciplinares com foco em literatura mexicano-americana, antropologia médica e história da arte latina na Universidade do Texas no Vale do Rio Grande. Está concluindo um doutorado em inglês sobre literatura de fronteira na Universidade do Texas em San Antonio, onde também é professora. “Para mim, é uma continuidade. Quanto ao meu trabalho espiritual, acho que precisamos dele mais do que nunca.”

Não é incomum que lhe peçam “trabajitos”, pequenos trabalhos, incluindo bênçãos, limpezas e remédios caseiros, quando ela não está imersa nos livros. Pouco tempo atrás, López recebeu um pedido para abençoar o novo negócio de uma amiga. Ao limpar o estabelecimento com um buquê de rosas, seis pétalas caíram, o que a fez alertar a amiga de que seis pessoas “não tinham boas intenções”. “Podem até dizer que estão felizes com o novo negócio dela, mas não é verdade.”

Às vezes, ela também dá conselhos mais científicos. Quando alguém lhe diz que está ansioso ou que não consegue dormir, ela recomenda reduzir o consumo de açúcar ou cafeína. Segundo ela, como o conselho vem de uma curandeira, as pessoas tendem a confiar que existe uma preocupação com seu bem-estar.

Estátuas incluindo São Judas, a Virgem de Guadalupe e La Santísima Muerte, uma versão latina do Grim Reaper, estão em exibição em uma empresa em Alamo, Texas. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

O conceito de curandeira é tão difundido entre os latinos que, em setembro, o Instituto de Diabetes do Texas, centro de última geração administrado pela Universidade Health no oeste de San Antonio, bairro histórico mexicano-americano, recolocou no saguão uma enorme pintura, “La Curandera”, do pintor chicano Jesus Treviño, que faleceu no início deste ano. A pintura tinha sido removida para restauração.

De acordo com Sasha García, de 39 anos, curandeira conhecida por seu cabelo intensamente vermelho, quando se trata de sorte e assuntos do coração, muita gente evita ajuda profissional e recorre às curandeiras, porque não há nada que se compare a esse tipo de tratamento.

García contou que, no norte do México, onde a cultura indígena não é tão difundida e a influência da Igreja Católica é mais forte, seus antepassados com frequência operavam na clandestinidade para evitar o estigma associado aos curandeiros tradicionais. E que, do lado americano da fronteira, ela não só se sente mais livre para trabalhar, como alguns padres católicos até lhe pedem conselhos.

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Recentemente, em Edinburg, cidade na fronteira do Texas, Chriselda Hernandez ouviu uma batida à sua porta. Era uma estudante universitária que disse estar passando por uma maré de má sorte: um motorista bêbado tinha batido em seu carro e, em seguida, alguém invadira seu carro novo e roubara seu laptop. “Preciso de uma ‘limpia’”, ela implorou - uma limpeza espiritual.

Sasha García monitora as velas que acende para uma limpia, uma limpeza espiritual. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

Hernandez foi até o altar que fica na sala e que tem uma imagem da Virgem de Guadalupe. Devagar, misturou sálvia e palo santo, madeira nativa da América do Sul, e acendeu com um fósforo. Depois, espalhou a fumaça de cura sobre o corpo da moça. “Você está segurando alguma coisa. Deixe ir. Não tenha vergonha”, sussurrou para a visitante.

Durante gerações, as comunidades hispânicas ao longo da fronteira sul recorreram a curandeiras tradicionais como Hernandez, vistas frequentemente no imaginário popular como mulheres idosas, com velas e ícones religiosos, que operam nas sombras da sociedade, em barracos sujos.

Mas a antiga arte da cura entrou na era do Instagram. Cada vez mais jovens estão adotando rituais que aprenderam com as avós e usando-os contra problemas do século XXI. Fazem “limpias” em praias públicas, compartilham receitas on-line para bloquear as “energias da inveja” e vendem velas artesanais com a imagem de Nossa Senhora de Guadalupe. Boa parte dos clientes tem formação universitária, como Clarissa Ochoa, a moça que procurou Hernandez em busca de ajuda.

“Acho uma honra ser curandera; é algo muito bonito, mas também muito limitante”, disse Chriselda Hernandez, realizando uma limpia atrás de uma amiga. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

“Acho uma honra ser curandeira; é muito bonito, mas também muito limitante. Acho que estamos quebrando esses limites - de que as curandeiras são só idosas que lidam com ervas. Meu chamado é curar quem eu puder”, disse Hernandez, de 42 anos.

Antes da chegada dos conquistadores espanhóis, existia uma cultura tradicional de cura na América Latina e no México. Com o tempo, os curandeiros começaram a mesclar rituais indígenas com elementos do catolicismo e influências das tradições folclóricas asiáticas e africanas.

A prática se consolidou no Vale do Rio Grande, no Texas, perto da fronteira mexicana, principalmente por necessidade. O condado de Hidalgo, onde se situa McAllen, que abriga uma população majoritariamente hispânica, tem uma das maiores taxas de pessoas sem plano de saúde do país, e muitas recorrem a curandeiros por falta de outras opções acessíveis, informou Servando Hinojosa, professor de antropologia que ministra um curso de medicina tradicional mexicano-americana na Universidade do Texas no Vale do Rio Grande.

Sasha García, à esquerda, dá uma limpia para Jocelyn Acevedo. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

Ele acrescentou que muitos habitantes hispânicos também tendem a desconfiar da medicina ocidental dominante, sobretudo quando se trata de saúde mental. Um estudo recente do Centro de Controle e Prevenção de Doenças constatou que, embora o número de pessoas negras, asiáticas e brancas que procuraram tratamento de saúde mental tenha aumentado nos últimos anos, houve pouca mudança entre os latinos. O curandeirismo se tornou tão aceito no Vale do Rio Grande que frequentemente se veem placas de rua e comerciais de televisão anunciando serviços de cura tradicional.

Hernandez contou que suas bisavós eram parteiras. Descobriu, quando criança, que possuía dons; à medida que crescia, começou a interagir com uma entidade que acredita ser o anjo da morte, Azrael. Trabalha em um centro de atendimento telefônico e mora com uma amiga em uma casa moderna no subúrbio de Edinburg, cidade próxima à fronteira. “Você faz isso da sua maneira, como é certo para você. Não tem certo ou errado.”

Danielle López, de 39 anos, outra curandeira tradicional e ao mesmo tempo moderna, ex-aluna de Hinojosa, também afirmou ter descoberto seu dom quando era criança e abraçou o título de curandeira millenial (pessoa que pertence à geração que nasceu entre 1980 e 1995). Combinou as antigas tradições que aprendeu com a avó que a criou, Consuelo López, e uma tia, Esperanza Rodriguez, com novos conhecimentos adquiridos em instituições de ensino superior.

Clara Cavazos, de preto, se prepara para fazer a leitura de um cartão para um cliente. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

Sua formação acadêmica inclui um mestrado em estudos interdisciplinares com foco em literatura mexicano-americana, antropologia médica e história da arte latina na Universidade do Texas no Vale do Rio Grande. Está concluindo um doutorado em inglês sobre literatura de fronteira na Universidade do Texas em San Antonio, onde também é professora. “Para mim, é uma continuidade. Quanto ao meu trabalho espiritual, acho que precisamos dele mais do que nunca.”

Não é incomum que lhe peçam “trabajitos”, pequenos trabalhos, incluindo bênçãos, limpezas e remédios caseiros, quando ela não está imersa nos livros. Pouco tempo atrás, López recebeu um pedido para abençoar o novo negócio de uma amiga. Ao limpar o estabelecimento com um buquê de rosas, seis pétalas caíram, o que a fez alertar a amiga de que seis pessoas “não tinham boas intenções”. “Podem até dizer que estão felizes com o novo negócio dela, mas não é verdade.”

Às vezes, ela também dá conselhos mais científicos. Quando alguém lhe diz que está ansioso ou que não consegue dormir, ela recomenda reduzir o consumo de açúcar ou cafeína. Segundo ela, como o conselho vem de uma curandeira, as pessoas tendem a confiar que existe uma preocupação com seu bem-estar.

Estátuas incluindo São Judas, a Virgem de Guadalupe e La Santísima Muerte, uma versão latina do Grim Reaper, estão em exibição em uma empresa em Alamo, Texas. Foto: Verónica Gabriela Cárdenas/The New York Times

O conceito de curandeira é tão difundido entre os latinos que, em setembro, o Instituto de Diabetes do Texas, centro de última geração administrado pela Universidade Health no oeste de San Antonio, bairro histórico mexicano-americano, recolocou no saguão uma enorme pintura, “La Curandera”, do pintor chicano Jesus Treviño, que faleceu no início deste ano. A pintura tinha sido removida para restauração.

De acordo com Sasha García, de 39 anos, curandeira conhecida por seu cabelo intensamente vermelho, quando se trata de sorte e assuntos do coração, muita gente evita ajuda profissional e recorre às curandeiras, porque não há nada que se compare a esse tipo de tratamento.

García contou que, no norte do México, onde a cultura indígena não é tão difundida e a influência da Igreja Católica é mais forte, seus antepassados com frequência operavam na clandestinidade para evitar o estigma associado aos curandeiros tradicionais. E que, do lado americano da fronteira, ela não só se sente mais livre para trabalhar, como alguns padres católicos até lhe pedem conselhos.

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