Hormônios influenciam pouco no comportamento de fêmeas de mamíferos, dizem cientistas


Um novo estudo descobriu que camundongos machos são mais imprevisíveis, desafiando suposições centenárias usadas para excluir as fêmeas de pesquisas por causa de seus hormônios

Por Azeen Ghoraysh

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Por décadas, camundongos machos têm sido o padrão em experimentos científicos que testam novos medicamentos ou examinam as conexões do cérebro. A razão? Camundongos fêmeas, que experimentam um ciclo de quatro a cinco dias de hormônios ovarianos flutuantes, eram consideradas muito complicadas. Contabilizar as mudanças hormonais era visto como algo muito difícil e muito caro.

Mas o ciclo estral (série de mudanças fisiológicas induzidas por hormônios reprodutivos) tem pouco a ver com o comportamento de camundongos fêmeas, de acordo com um novo estudo que usou software de aprendizado de máquina para rastrear o comportamento segundo a segundo de animais explorando um espaço aberto. Camundongos machos exibiram um comportamento mais errático do que as fêmeas.

O estudo, publicado na revista Current Biology, desafia os estereótipos centenários que mantinham as fêmeas fora da pesquisa de laboratório - e, até a década de 1990, proibiam as mulheres de participar de ensaios clínicos.

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De acordo com uma pesquisa, ciclo estral (mudanças provocadas por hormônios) não são tão importantes para avaliar o comportamento das fêmeas. Foto: Epitacio Pessoa/Estadão

A nova pesquisa está “derrubando todas essas suposições sobre diferenças sexuais e a influência dos hormônios em suas cabeças”, disse Rebecca Shansky, neurocientista comportamental da Northeastern University e coautora do novo estudo.

O custo de excluir as fêmeas - sejam elas humanas ou animais - da pesquisa científica é alto. As mulheres são quase duas vezes mais propensas que os homens a experimentar efeitos colaterais graves de medicamentos, a maioria das quais tem dosagens baseadas nos testes iniciais feitos em homens. As mulheres também podem não obter os mesmos benefícios dos medicamentos.

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As mulheres “capazes de engravidar”, como disse o governo federal, foram amplamente excluídas dos ensaios clínicos de medicamentos até 1993, quando uma nova lei exigiu que pesquisadores financiados pelos National Institutes of Health (Institutos Nacionais de Saúde) incluíssem mulheres e grupos minoritários. Nas décadas seguintes, as mulheres representaram quase metade dos participantes de pesquisas clínicas, embora ainda fiquem para trás nos estudos de certos medicamentos, como aqueles usados para tratar doenças cardiovasculares e distúrbios psiquiátricos.

Mas uma grande lacuna entre os sexos persistiu na pesquisa científica básica usando animais de laboratório, estudos que abrem caminho para avanços médicos. Em neurociência, de acordo com uma análise publicada em 2010, os estudos de animais de laboratório do sexo masculino superam os femininos em cinco vezes.

“Essa desconexão entre o que estava no laboratório e o que estava na clínica era preocupante”, disse a Dra. Janine Clayton, diretora do Escritório de Pesquisa em Saúde da Mulher do NIH. “Muitos estudos empregavam apenas camundongos machos, sem justificativa científica.”

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A agência de financiamento de US$ 33 bilhões procurou fechar essa lacuna em 2016, exigindo que qualquer laboratório que recebesse financiamento considerasse o sexo biológico em suas pesquisas. Com poucas exceções, os pesquisadores foram obrigados a usar machos e fêmeas em estudos de vertebrados e analisar os dados por sexo.

Essa mudança de política levou a um “rebuliço” entre alguns cientistas, disse Shansky. “As pessoas achavam que o uso de fêmeas tornaria seus dados confusos”, disse ela.

Embora estudos anteriores tenham desafiado a ideia de que camundongos fêmeas eram mais erráticos que os machos, os testes comportamentais usados às vezes eram grosseiros e davam resultados mistos.

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O novo estudo utilizou uma ferramenta de ponta chamada sequenciamento de movimento, desenvolvida em 2015. Câmeras sofisticadas mapearam os movimentos dos animais em três dimensões, registrando 30 quadros por segundo. Em seguida, a inteligência artificial identificou breves - normalmente 300 milissegundos de duração - comportamentos repetidos, como correr e se limpar.

As câmeras rodaram enquanto 16 camundongos machos e 16 fêmeas exploravam um espaço aberto - um grande balde - 20 minutos por vez durante 15 dias. O ciclo estral das fêmeas mostrou um efeito muito fraco em seu comportamento, descobriram os pesquisadores.

“Você realmente precisa espremer os dados para ver qualquer efeito do estro”, disse o Dr. Sandeep Robert Datta, neurobiólogo da Harvard Medical School, coautor do estudo e cujo laboratório desenvolveu a ferramenta de sequenciamento de movimento. “Do ponto de vista prático, é insignificante.”

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Camundongos machos exibiram um comportamento mais imprevisível do que as fêmeas. Os hormônios nos homens também flutuam, geralmente mudando ao longo do dia. E camundongos machos alojados juntos estabelecem uma hierarquia de dominância, com machos alfa expressando mais de 10 vezes mais testosterona do que os submissos.

Portanto, pode ser que, na verdade, por 100 anos, tenhamos feito exatamente o contrário - é realmente a variação nos hormônios masculinos que está afetando o comportamento mais fortemente do que os hormônios femininos”, disse Datta. “Essa é uma hipótese, mas vamos testá-la.”

O novo relatório é o mais recente de vários estudos para fazer os cientistas questionarem as suposições de longa data sobre os impactos dos hormônios nas fêmeas de animais de laboratório.

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“O fato de eles não terem encontrado um efeito do ciclo estral, e outros pesquisadores também não terem visto esse efeito, é muito reconfortante”, disse a Dra. Aditi Bhargava, que estuda as diferenças sexuais e a biologia do estresse na Universidade da Califórnia, São Francisco.

No entanto, ela observou, os impactos da mudança de política do NIH em 2016 foram lentos. Embora tenha aumentado a proporção de estudos que incluem animais machos e fêmeas, o número de estudos que analisam os dados por sexo diminuiu, exceto em farmacologia.

“É preciso mais trabalho”, disse Clayton do NIH. “É do interesse do público que os resultados específicos por sexo sejam publicados.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Por décadas, camundongos machos têm sido o padrão em experimentos científicos que testam novos medicamentos ou examinam as conexões do cérebro. A razão? Camundongos fêmeas, que experimentam um ciclo de quatro a cinco dias de hormônios ovarianos flutuantes, eram consideradas muito complicadas. Contabilizar as mudanças hormonais era visto como algo muito difícil e muito caro.

Mas o ciclo estral (série de mudanças fisiológicas induzidas por hormônios reprodutivos) tem pouco a ver com o comportamento de camundongos fêmeas, de acordo com um novo estudo que usou software de aprendizado de máquina para rastrear o comportamento segundo a segundo de animais explorando um espaço aberto. Camundongos machos exibiram um comportamento mais errático do que as fêmeas.

O estudo, publicado na revista Current Biology, desafia os estereótipos centenários que mantinham as fêmeas fora da pesquisa de laboratório - e, até a década de 1990, proibiam as mulheres de participar de ensaios clínicos.

De acordo com uma pesquisa, ciclo estral (mudanças provocadas por hormônios) não são tão importantes para avaliar o comportamento das fêmeas. Foto: Epitacio Pessoa/Estadão

A nova pesquisa está “derrubando todas essas suposições sobre diferenças sexuais e a influência dos hormônios em suas cabeças”, disse Rebecca Shansky, neurocientista comportamental da Northeastern University e coautora do novo estudo.

O custo de excluir as fêmeas - sejam elas humanas ou animais - da pesquisa científica é alto. As mulheres são quase duas vezes mais propensas que os homens a experimentar efeitos colaterais graves de medicamentos, a maioria das quais tem dosagens baseadas nos testes iniciais feitos em homens. As mulheres também podem não obter os mesmos benefícios dos medicamentos.

As mulheres “capazes de engravidar”, como disse o governo federal, foram amplamente excluídas dos ensaios clínicos de medicamentos até 1993, quando uma nova lei exigiu que pesquisadores financiados pelos National Institutes of Health (Institutos Nacionais de Saúde) incluíssem mulheres e grupos minoritários. Nas décadas seguintes, as mulheres representaram quase metade dos participantes de pesquisas clínicas, embora ainda fiquem para trás nos estudos de certos medicamentos, como aqueles usados para tratar doenças cardiovasculares e distúrbios psiquiátricos.

Mas uma grande lacuna entre os sexos persistiu na pesquisa científica básica usando animais de laboratório, estudos que abrem caminho para avanços médicos. Em neurociência, de acordo com uma análise publicada em 2010, os estudos de animais de laboratório do sexo masculino superam os femininos em cinco vezes.

“Essa desconexão entre o que estava no laboratório e o que estava na clínica era preocupante”, disse a Dra. Janine Clayton, diretora do Escritório de Pesquisa em Saúde da Mulher do NIH. “Muitos estudos empregavam apenas camundongos machos, sem justificativa científica.”

A agência de financiamento de US$ 33 bilhões procurou fechar essa lacuna em 2016, exigindo que qualquer laboratório que recebesse financiamento considerasse o sexo biológico em suas pesquisas. Com poucas exceções, os pesquisadores foram obrigados a usar machos e fêmeas em estudos de vertebrados e analisar os dados por sexo.

Essa mudança de política levou a um “rebuliço” entre alguns cientistas, disse Shansky. “As pessoas achavam que o uso de fêmeas tornaria seus dados confusos”, disse ela.

Embora estudos anteriores tenham desafiado a ideia de que camundongos fêmeas eram mais erráticos que os machos, os testes comportamentais usados às vezes eram grosseiros e davam resultados mistos.

O novo estudo utilizou uma ferramenta de ponta chamada sequenciamento de movimento, desenvolvida em 2015. Câmeras sofisticadas mapearam os movimentos dos animais em três dimensões, registrando 30 quadros por segundo. Em seguida, a inteligência artificial identificou breves - normalmente 300 milissegundos de duração - comportamentos repetidos, como correr e se limpar.

As câmeras rodaram enquanto 16 camundongos machos e 16 fêmeas exploravam um espaço aberto - um grande balde - 20 minutos por vez durante 15 dias. O ciclo estral das fêmeas mostrou um efeito muito fraco em seu comportamento, descobriram os pesquisadores.

“Você realmente precisa espremer os dados para ver qualquer efeito do estro”, disse o Dr. Sandeep Robert Datta, neurobiólogo da Harvard Medical School, coautor do estudo e cujo laboratório desenvolveu a ferramenta de sequenciamento de movimento. “Do ponto de vista prático, é insignificante.”

Camundongos machos exibiram um comportamento mais imprevisível do que as fêmeas. Os hormônios nos homens também flutuam, geralmente mudando ao longo do dia. E camundongos machos alojados juntos estabelecem uma hierarquia de dominância, com machos alfa expressando mais de 10 vezes mais testosterona do que os submissos.

Portanto, pode ser que, na verdade, por 100 anos, tenhamos feito exatamente o contrário - é realmente a variação nos hormônios masculinos que está afetando o comportamento mais fortemente do que os hormônios femininos”, disse Datta. “Essa é uma hipótese, mas vamos testá-la.”

O novo relatório é o mais recente de vários estudos para fazer os cientistas questionarem as suposições de longa data sobre os impactos dos hormônios nas fêmeas de animais de laboratório.

“O fato de eles não terem encontrado um efeito do ciclo estral, e outros pesquisadores também não terem visto esse efeito, é muito reconfortante”, disse a Dra. Aditi Bhargava, que estuda as diferenças sexuais e a biologia do estresse na Universidade da Califórnia, São Francisco.

No entanto, ela observou, os impactos da mudança de política do NIH em 2016 foram lentos. Embora tenha aumentado a proporção de estudos que incluem animais machos e fêmeas, o número de estudos que analisam os dados por sexo diminuiu, exceto em farmacologia.

“É preciso mais trabalho”, disse Clayton do NIH. “É do interesse do público que os resultados específicos por sexo sejam publicados.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

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THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Por décadas, camundongos machos têm sido o padrão em experimentos científicos que testam novos medicamentos ou examinam as conexões do cérebro. A razão? Camundongos fêmeas, que experimentam um ciclo de quatro a cinco dias de hormônios ovarianos flutuantes, eram consideradas muito complicadas. Contabilizar as mudanças hormonais era visto como algo muito difícil e muito caro.

Mas o ciclo estral (série de mudanças fisiológicas induzidas por hormônios reprodutivos) tem pouco a ver com o comportamento de camundongos fêmeas, de acordo com um novo estudo que usou software de aprendizado de máquina para rastrear o comportamento segundo a segundo de animais explorando um espaço aberto. Camundongos machos exibiram um comportamento mais errático do que as fêmeas.

O estudo, publicado na revista Current Biology, desafia os estereótipos centenários que mantinham as fêmeas fora da pesquisa de laboratório - e, até a década de 1990, proibiam as mulheres de participar de ensaios clínicos.

De acordo com uma pesquisa, ciclo estral (mudanças provocadas por hormônios) não são tão importantes para avaliar o comportamento das fêmeas. Foto: Epitacio Pessoa/Estadão

A nova pesquisa está “derrubando todas essas suposições sobre diferenças sexuais e a influência dos hormônios em suas cabeças”, disse Rebecca Shansky, neurocientista comportamental da Northeastern University e coautora do novo estudo.

O custo de excluir as fêmeas - sejam elas humanas ou animais - da pesquisa científica é alto. As mulheres são quase duas vezes mais propensas que os homens a experimentar efeitos colaterais graves de medicamentos, a maioria das quais tem dosagens baseadas nos testes iniciais feitos em homens. As mulheres também podem não obter os mesmos benefícios dos medicamentos.

As mulheres “capazes de engravidar”, como disse o governo federal, foram amplamente excluídas dos ensaios clínicos de medicamentos até 1993, quando uma nova lei exigiu que pesquisadores financiados pelos National Institutes of Health (Institutos Nacionais de Saúde) incluíssem mulheres e grupos minoritários. Nas décadas seguintes, as mulheres representaram quase metade dos participantes de pesquisas clínicas, embora ainda fiquem para trás nos estudos de certos medicamentos, como aqueles usados para tratar doenças cardiovasculares e distúrbios psiquiátricos.

Mas uma grande lacuna entre os sexos persistiu na pesquisa científica básica usando animais de laboratório, estudos que abrem caminho para avanços médicos. Em neurociência, de acordo com uma análise publicada em 2010, os estudos de animais de laboratório do sexo masculino superam os femininos em cinco vezes.

“Essa desconexão entre o que estava no laboratório e o que estava na clínica era preocupante”, disse a Dra. Janine Clayton, diretora do Escritório de Pesquisa em Saúde da Mulher do NIH. “Muitos estudos empregavam apenas camundongos machos, sem justificativa científica.”

A agência de financiamento de US$ 33 bilhões procurou fechar essa lacuna em 2016, exigindo que qualquer laboratório que recebesse financiamento considerasse o sexo biológico em suas pesquisas. Com poucas exceções, os pesquisadores foram obrigados a usar machos e fêmeas em estudos de vertebrados e analisar os dados por sexo.

Essa mudança de política levou a um “rebuliço” entre alguns cientistas, disse Shansky. “As pessoas achavam que o uso de fêmeas tornaria seus dados confusos”, disse ela.

Embora estudos anteriores tenham desafiado a ideia de que camundongos fêmeas eram mais erráticos que os machos, os testes comportamentais usados às vezes eram grosseiros e davam resultados mistos.

O novo estudo utilizou uma ferramenta de ponta chamada sequenciamento de movimento, desenvolvida em 2015. Câmeras sofisticadas mapearam os movimentos dos animais em três dimensões, registrando 30 quadros por segundo. Em seguida, a inteligência artificial identificou breves - normalmente 300 milissegundos de duração - comportamentos repetidos, como correr e se limpar.

As câmeras rodaram enquanto 16 camundongos machos e 16 fêmeas exploravam um espaço aberto - um grande balde - 20 minutos por vez durante 15 dias. O ciclo estral das fêmeas mostrou um efeito muito fraco em seu comportamento, descobriram os pesquisadores.

“Você realmente precisa espremer os dados para ver qualquer efeito do estro”, disse o Dr. Sandeep Robert Datta, neurobiólogo da Harvard Medical School, coautor do estudo e cujo laboratório desenvolveu a ferramenta de sequenciamento de movimento. “Do ponto de vista prático, é insignificante.”

Camundongos machos exibiram um comportamento mais imprevisível do que as fêmeas. Os hormônios nos homens também flutuam, geralmente mudando ao longo do dia. E camundongos machos alojados juntos estabelecem uma hierarquia de dominância, com machos alfa expressando mais de 10 vezes mais testosterona do que os submissos.

Portanto, pode ser que, na verdade, por 100 anos, tenhamos feito exatamente o contrário - é realmente a variação nos hormônios masculinos que está afetando o comportamento mais fortemente do que os hormônios femininos”, disse Datta. “Essa é uma hipótese, mas vamos testá-la.”

O novo relatório é o mais recente de vários estudos para fazer os cientistas questionarem as suposições de longa data sobre os impactos dos hormônios nas fêmeas de animais de laboratório.

“O fato de eles não terem encontrado um efeito do ciclo estral, e outros pesquisadores também não terem visto esse efeito, é muito reconfortante”, disse a Dra. Aditi Bhargava, que estuda as diferenças sexuais e a biologia do estresse na Universidade da Califórnia, São Francisco.

No entanto, ela observou, os impactos da mudança de política do NIH em 2016 foram lentos. Embora tenha aumentado a proporção de estudos que incluem animais machos e fêmeas, o número de estudos que analisam os dados por sexo diminuiu, exceto em farmacologia.

“É preciso mais trabalho”, disse Clayton do NIH. “É do interesse do público que os resultados específicos por sexo sejam publicados.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Por décadas, camundongos machos têm sido o padrão em experimentos científicos que testam novos medicamentos ou examinam as conexões do cérebro. A razão? Camundongos fêmeas, que experimentam um ciclo de quatro a cinco dias de hormônios ovarianos flutuantes, eram consideradas muito complicadas. Contabilizar as mudanças hormonais era visto como algo muito difícil e muito caro.

Mas o ciclo estral (série de mudanças fisiológicas induzidas por hormônios reprodutivos) tem pouco a ver com o comportamento de camundongos fêmeas, de acordo com um novo estudo que usou software de aprendizado de máquina para rastrear o comportamento segundo a segundo de animais explorando um espaço aberto. Camundongos machos exibiram um comportamento mais errático do que as fêmeas.

O estudo, publicado na revista Current Biology, desafia os estereótipos centenários que mantinham as fêmeas fora da pesquisa de laboratório - e, até a década de 1990, proibiam as mulheres de participar de ensaios clínicos.

De acordo com uma pesquisa, ciclo estral (mudanças provocadas por hormônios) não são tão importantes para avaliar o comportamento das fêmeas. Foto: Epitacio Pessoa/Estadão

A nova pesquisa está “derrubando todas essas suposições sobre diferenças sexuais e a influência dos hormônios em suas cabeças”, disse Rebecca Shansky, neurocientista comportamental da Northeastern University e coautora do novo estudo.

O custo de excluir as fêmeas - sejam elas humanas ou animais - da pesquisa científica é alto. As mulheres são quase duas vezes mais propensas que os homens a experimentar efeitos colaterais graves de medicamentos, a maioria das quais tem dosagens baseadas nos testes iniciais feitos em homens. As mulheres também podem não obter os mesmos benefícios dos medicamentos.

As mulheres “capazes de engravidar”, como disse o governo federal, foram amplamente excluídas dos ensaios clínicos de medicamentos até 1993, quando uma nova lei exigiu que pesquisadores financiados pelos National Institutes of Health (Institutos Nacionais de Saúde) incluíssem mulheres e grupos minoritários. Nas décadas seguintes, as mulheres representaram quase metade dos participantes de pesquisas clínicas, embora ainda fiquem para trás nos estudos de certos medicamentos, como aqueles usados para tratar doenças cardiovasculares e distúrbios psiquiátricos.

Mas uma grande lacuna entre os sexos persistiu na pesquisa científica básica usando animais de laboratório, estudos que abrem caminho para avanços médicos. Em neurociência, de acordo com uma análise publicada em 2010, os estudos de animais de laboratório do sexo masculino superam os femininos em cinco vezes.

“Essa desconexão entre o que estava no laboratório e o que estava na clínica era preocupante”, disse a Dra. Janine Clayton, diretora do Escritório de Pesquisa em Saúde da Mulher do NIH. “Muitos estudos empregavam apenas camundongos machos, sem justificativa científica.”

A agência de financiamento de US$ 33 bilhões procurou fechar essa lacuna em 2016, exigindo que qualquer laboratório que recebesse financiamento considerasse o sexo biológico em suas pesquisas. Com poucas exceções, os pesquisadores foram obrigados a usar machos e fêmeas em estudos de vertebrados e analisar os dados por sexo.

Essa mudança de política levou a um “rebuliço” entre alguns cientistas, disse Shansky. “As pessoas achavam que o uso de fêmeas tornaria seus dados confusos”, disse ela.

Embora estudos anteriores tenham desafiado a ideia de que camundongos fêmeas eram mais erráticos que os machos, os testes comportamentais usados às vezes eram grosseiros e davam resultados mistos.

O novo estudo utilizou uma ferramenta de ponta chamada sequenciamento de movimento, desenvolvida em 2015. Câmeras sofisticadas mapearam os movimentos dos animais em três dimensões, registrando 30 quadros por segundo. Em seguida, a inteligência artificial identificou breves - normalmente 300 milissegundos de duração - comportamentos repetidos, como correr e se limpar.

As câmeras rodaram enquanto 16 camundongos machos e 16 fêmeas exploravam um espaço aberto - um grande balde - 20 minutos por vez durante 15 dias. O ciclo estral das fêmeas mostrou um efeito muito fraco em seu comportamento, descobriram os pesquisadores.

“Você realmente precisa espremer os dados para ver qualquer efeito do estro”, disse o Dr. Sandeep Robert Datta, neurobiólogo da Harvard Medical School, coautor do estudo e cujo laboratório desenvolveu a ferramenta de sequenciamento de movimento. “Do ponto de vista prático, é insignificante.”

Camundongos machos exibiram um comportamento mais imprevisível do que as fêmeas. Os hormônios nos homens também flutuam, geralmente mudando ao longo do dia. E camundongos machos alojados juntos estabelecem uma hierarquia de dominância, com machos alfa expressando mais de 10 vezes mais testosterona do que os submissos.

Portanto, pode ser que, na verdade, por 100 anos, tenhamos feito exatamente o contrário - é realmente a variação nos hormônios masculinos que está afetando o comportamento mais fortemente do que os hormônios femininos”, disse Datta. “Essa é uma hipótese, mas vamos testá-la.”

O novo relatório é o mais recente de vários estudos para fazer os cientistas questionarem as suposições de longa data sobre os impactos dos hormônios nas fêmeas de animais de laboratório.

“O fato de eles não terem encontrado um efeito do ciclo estral, e outros pesquisadores também não terem visto esse efeito, é muito reconfortante”, disse a Dra. Aditi Bhargava, que estuda as diferenças sexuais e a biologia do estresse na Universidade da Califórnia, São Francisco.

No entanto, ela observou, os impactos da mudança de política do NIH em 2016 foram lentos. Embora tenha aumentado a proporção de estudos que incluem animais machos e fêmeas, o número de estudos que analisam os dados por sexo diminuiu, exceto em farmacologia.

“É preciso mais trabalho”, disse Clayton do NIH. “É do interesse do público que os resultados específicos por sexo sejam publicados.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

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