Sem documentos, sem empregos: os novos vendedores ambulantes do Queens


Inelegíveis para a maior parte da ajuda financeira, muitas pessoas da América Latina voltaram-se para o que faziam em seus países de origem: trabalhar como ambulantes

Por David Gonzalez e Juan Arredondo

NOVA YORK - O trecho da Avenida Roosevelt no Queens estava repleto de gente abrindo caminho entre carrinhos e barracas que oferecem de tudo, desde máscaras até milho torrado com aroma doce. O rugido regular do trem nº 7 muitas vezes abafava o som das ofertas.

Numa esquina, Cristina Sanchez parecia desamparada na barraquinha de produtos do campo. Ela não tinha vendido nada. Durante a pandemia de coronavírus, ela entrou numa corrida frenética para sobreviver: primeiro, ela perdeu o emprego; depois, o quarto alugado. Para Sanchez, 47 anos, o peso tem sido imenso. Seus olhos se encheram de lágrimas quando ela pensou na sua família no México. “Sempre mandava uns US$ 150 por semana”, disse ela. “Agora não consigo mandar nem US$ 20”.

Muitos imigrantes se voltam ao trabalho ambulante para tentar sobreviver à crise trazida pela pandemia. Foto: Juan Arredondo/The New York Times
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Ela está entre os mais de meio milhão de imigrantes ilegais da cidade cujas vidas foram afetadas pela pandemia, mas que não se enquadram nos critérios para receber a maior parte dos auxílios financeiros, entre eles empréstimos e dinheiro de estímulo à economia. Com poucos recursos, muitos imigrantes da América Latina – que já estavam entre os mais atingidos pelo vírus – recorreram ao que faziam na terra natal: trabalhar como vendedores ambulantes.

Mas, por décadas, Nova York limitou o número de licenças para vendedores de rua – atualmente 2.900 licenças para alimentos e 853 para vendedores de mercadorias em geral – criando um mercado paralelo e deixando os vendedores sujeitos a multas altas. Os ambulantes estão desapontados e sentem que aqui é criminalizada uma forma de ganhar a vida que em outras partes do mundo é digna.

No epicentro, sem trabalho nem documentos

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Jackson Heights foi o “epicentro do epicentro” da pandemia em Nova York. Os efeitos daqueles primeiros meses ainda repercutem entre os trabalhadores imigrantes que perderam seus empregos e adoeceram em taxas alarmantes. Sanchez chegou a Nova York em 2004. Ela trabalhou numa série de empregos até três anos atrás, quando encontrou trabalho dobrando roupas numa lavanderia a seco por US$ 700 por semana.

Foi o suficiente para ela se juntar à fila de imigrantes que serpenteava na porta da Western Union, esperando para mandar dinheiro para a família. “Estou só tentando seguir em frente e continuar ajudando na educação do meus filhos”, disse ela. “Mas, agora, com a pandemia, não consigo ajudar. Não tem trabalho”.

Ela perdeu o emprego em março. No final de junho, não tinha onde morar. Quando a covid-19 chegou a Nova York, ela estava pagando US$ 60 por semana para sublocar um quarto na Avenida Roosevelt. Ela pagou por quatro meses até que suas economias acabaram.

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O proprietário a despejou e, embora os amigos a tenham instado a lutar contra o despejo – uma moratória está em vigor até o final deste ano – ela se sentiu intimidada. Desesperada, perguntou a um amigo se poderia dormir no sofá da sala dele. E, como muitos outros imigrantes ilegais na cidade, ela recorreu à venda ambulante para sobreviver.

Ela começou a vender alimentos com a ajuda de Sabina Morales – uma vendedora experiente que oferecia produtos maduros. Seu antigo emprego lhe deu um pouco de trabalho recentemente, mas ela sabe que precisa encontrar outra fonte de renda, especialmente para quando o tempo esfriar. “Isso afetou muito meus filhos”, disse Sanchez, começando a chorar. “Tento dizer a eles que não tem trabalho fixo e que tudo o que eu faço quase não dá para eu sobreviver por um dia”.

Para cada vendedor de rua, há outros trabalhadores que se beneficiam de seu trabalho. É um ecossistema fluido, o que se evidencia pela inundação de recém-chegados como Gerardo Vital e daqueles que os ajudam.

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Vital estava tão orgulhoso de seu país de adoção que conseguia sobreviver mostrando aos turistas de língua espanhola os destaques de Manhattan e Washington, D.C. “Eu tinha reservas de passeios todos os dias de março a setembro”, disse ele. Sua renda foi suficiente para comprar dois carros e alugar um SUV para grupos de turistas. “Mas quando cancelaram voos e fecharam fronteiras, meu mundo acabou mais uma vez”.

Ele então resolveu vender tacos de alambre – feitos com bife, bacon e queijo – na rua. O dono de uma delicatessen local permitiu que ele usasse uma barraquinha na calçada à noite, gratuitamente. Durante o dia, vende smoothies. Ele trabalha das nove da noite às duas da manhã, vendendo para pessoas que voltam dos turnos da noite ou baladeiros com muita energia e apetite. Ele disse que trabalhar na rua é complicado.

“Eu conheço todos os vagabundos e delinquentes, todos eles”, disse ele. Vital esperava que seus tacos atraíssem os clientes que ansiavam por uma refeição que os lembrasse de casa. “É o tipo de resiliência criativa em que as comunidades de imigrantes sempre se engajaram”, disse Alyshia Gálvez, professora do Lehman College e diretora fundadora do Instituto de Estudos Mexicanos Jaime Lucero.

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Geraldo Vital prepara os tacos que vai vender numa barraquinha no Queens, Nova York. Foto: Juan Arredondo/The New York Times

As restrições deixam a vida mais difícil – e mais incerta

Como ambulante veterana que é, Morales tem um olhar estoico e realistas sobre a Avenida Roosevelt. Ao lado dela, um caminhão refrigerador – onde ela armazena seus produtos – desligado. Ela tem vendido produtos em Jackson Heights desde que veio para Nova York, há 15 anos. E, desde o início da pandemia, ajudou outras pessoas, como Sanchez, a estabelecer suas próprias barraquinhas. O afluxo de novos fornecedores, no entanto, deixou seu trabalho mais difícil. “Antes da pandemia, os negócios estavam muito melhores”, disse Morales, que veio à cidade para unir o neto de 5 anos com a mãe. “Agora tem mais vendedores do que clientes”.

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Uma vez por semana, ela se aventura em Hunts Point, em busca de atacadistas que oferecem produtos com desconto. Desde que o metrô encerrou o serviço noturno, ela está dormindo no carro de um amigo para esperar até o amanhecer antes de voltar para a Avenida Roosevelt.

Ao contrário da maioria dos vendedores que não têm licença nem dinheiro para alugar uma tenda, Morales tem a licença necessária para trabalhar na sua. Mas isso vem com um preço exorbitante: ela disse que paga US$ 22 mil a cada dois anos ao atual proprietário da licença, que pagou apenas US$ 300 à cidade.

Ela agora pertence a uma coalizão de vendedores ambulantes, defensores públicos e políticos que instam as autoridades a aprovar um projeto de lei que criaria um Fundo de Trabalhadores Excluídos, o qual tributaria os mais ricos da cidade para fornecer auxílio financeiro aos trabalhadores que vivem em Nova York sem permissão legal.

“Houve muito pouco alívio, então tivemos que resolver isso por conta própria”, disse Jessica Ramos, senadora estadual que apoia o projeto. Muitos representantes de comunidades com muitos imigrantes também estão pressionando para flexibilizar o limite de licenças, o que evitaria uma catástrofe ainda maior. Um projeto de lei pendente na Câmara Municipal acrescentaria mais 400 licenças de fornecedores ambulantes de alimentos por ano durante 10 anos. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

NOVA YORK - O trecho da Avenida Roosevelt no Queens estava repleto de gente abrindo caminho entre carrinhos e barracas que oferecem de tudo, desde máscaras até milho torrado com aroma doce. O rugido regular do trem nº 7 muitas vezes abafava o som das ofertas.

Numa esquina, Cristina Sanchez parecia desamparada na barraquinha de produtos do campo. Ela não tinha vendido nada. Durante a pandemia de coronavírus, ela entrou numa corrida frenética para sobreviver: primeiro, ela perdeu o emprego; depois, o quarto alugado. Para Sanchez, 47 anos, o peso tem sido imenso. Seus olhos se encheram de lágrimas quando ela pensou na sua família no México. “Sempre mandava uns US$ 150 por semana”, disse ela. “Agora não consigo mandar nem US$ 20”.

Muitos imigrantes se voltam ao trabalho ambulante para tentar sobreviver à crise trazida pela pandemia. Foto: Juan Arredondo/The New York Times

Ela está entre os mais de meio milhão de imigrantes ilegais da cidade cujas vidas foram afetadas pela pandemia, mas que não se enquadram nos critérios para receber a maior parte dos auxílios financeiros, entre eles empréstimos e dinheiro de estímulo à economia. Com poucos recursos, muitos imigrantes da América Latina – que já estavam entre os mais atingidos pelo vírus – recorreram ao que faziam na terra natal: trabalhar como vendedores ambulantes.

Mas, por décadas, Nova York limitou o número de licenças para vendedores de rua – atualmente 2.900 licenças para alimentos e 853 para vendedores de mercadorias em geral – criando um mercado paralelo e deixando os vendedores sujeitos a multas altas. Os ambulantes estão desapontados e sentem que aqui é criminalizada uma forma de ganhar a vida que em outras partes do mundo é digna.

No epicentro, sem trabalho nem documentos

Jackson Heights foi o “epicentro do epicentro” da pandemia em Nova York. Os efeitos daqueles primeiros meses ainda repercutem entre os trabalhadores imigrantes que perderam seus empregos e adoeceram em taxas alarmantes. Sanchez chegou a Nova York em 2004. Ela trabalhou numa série de empregos até três anos atrás, quando encontrou trabalho dobrando roupas numa lavanderia a seco por US$ 700 por semana.

Foi o suficiente para ela se juntar à fila de imigrantes que serpenteava na porta da Western Union, esperando para mandar dinheiro para a família. “Estou só tentando seguir em frente e continuar ajudando na educação do meus filhos”, disse ela. “Mas, agora, com a pandemia, não consigo ajudar. Não tem trabalho”.

Ela perdeu o emprego em março. No final de junho, não tinha onde morar. Quando a covid-19 chegou a Nova York, ela estava pagando US$ 60 por semana para sublocar um quarto na Avenida Roosevelt. Ela pagou por quatro meses até que suas economias acabaram.

O proprietário a despejou e, embora os amigos a tenham instado a lutar contra o despejo – uma moratória está em vigor até o final deste ano – ela se sentiu intimidada. Desesperada, perguntou a um amigo se poderia dormir no sofá da sala dele. E, como muitos outros imigrantes ilegais na cidade, ela recorreu à venda ambulante para sobreviver.

Ela começou a vender alimentos com a ajuda de Sabina Morales – uma vendedora experiente que oferecia produtos maduros. Seu antigo emprego lhe deu um pouco de trabalho recentemente, mas ela sabe que precisa encontrar outra fonte de renda, especialmente para quando o tempo esfriar. “Isso afetou muito meus filhos”, disse Sanchez, começando a chorar. “Tento dizer a eles que não tem trabalho fixo e que tudo o que eu faço quase não dá para eu sobreviver por um dia”.

Para cada vendedor de rua, há outros trabalhadores que se beneficiam de seu trabalho. É um ecossistema fluido, o que se evidencia pela inundação de recém-chegados como Gerardo Vital e daqueles que os ajudam.

Vital estava tão orgulhoso de seu país de adoção que conseguia sobreviver mostrando aos turistas de língua espanhola os destaques de Manhattan e Washington, D.C. “Eu tinha reservas de passeios todos os dias de março a setembro”, disse ele. Sua renda foi suficiente para comprar dois carros e alugar um SUV para grupos de turistas. “Mas quando cancelaram voos e fecharam fronteiras, meu mundo acabou mais uma vez”.

Ele então resolveu vender tacos de alambre – feitos com bife, bacon e queijo – na rua. O dono de uma delicatessen local permitiu que ele usasse uma barraquinha na calçada à noite, gratuitamente. Durante o dia, vende smoothies. Ele trabalha das nove da noite às duas da manhã, vendendo para pessoas que voltam dos turnos da noite ou baladeiros com muita energia e apetite. Ele disse que trabalhar na rua é complicado.

“Eu conheço todos os vagabundos e delinquentes, todos eles”, disse ele. Vital esperava que seus tacos atraíssem os clientes que ansiavam por uma refeição que os lembrasse de casa. “É o tipo de resiliência criativa em que as comunidades de imigrantes sempre se engajaram”, disse Alyshia Gálvez, professora do Lehman College e diretora fundadora do Instituto de Estudos Mexicanos Jaime Lucero.

Geraldo Vital prepara os tacos que vai vender numa barraquinha no Queens, Nova York. Foto: Juan Arredondo/The New York Times

As restrições deixam a vida mais difícil – e mais incerta

Como ambulante veterana que é, Morales tem um olhar estoico e realistas sobre a Avenida Roosevelt. Ao lado dela, um caminhão refrigerador – onde ela armazena seus produtos – desligado. Ela tem vendido produtos em Jackson Heights desde que veio para Nova York, há 15 anos. E, desde o início da pandemia, ajudou outras pessoas, como Sanchez, a estabelecer suas próprias barraquinhas. O afluxo de novos fornecedores, no entanto, deixou seu trabalho mais difícil. “Antes da pandemia, os negócios estavam muito melhores”, disse Morales, que veio à cidade para unir o neto de 5 anos com a mãe. “Agora tem mais vendedores do que clientes”.

Uma vez por semana, ela se aventura em Hunts Point, em busca de atacadistas que oferecem produtos com desconto. Desde que o metrô encerrou o serviço noturno, ela está dormindo no carro de um amigo para esperar até o amanhecer antes de voltar para a Avenida Roosevelt.

Ao contrário da maioria dos vendedores que não têm licença nem dinheiro para alugar uma tenda, Morales tem a licença necessária para trabalhar na sua. Mas isso vem com um preço exorbitante: ela disse que paga US$ 22 mil a cada dois anos ao atual proprietário da licença, que pagou apenas US$ 300 à cidade.

Ela agora pertence a uma coalizão de vendedores ambulantes, defensores públicos e políticos que instam as autoridades a aprovar um projeto de lei que criaria um Fundo de Trabalhadores Excluídos, o qual tributaria os mais ricos da cidade para fornecer auxílio financeiro aos trabalhadores que vivem em Nova York sem permissão legal.

“Houve muito pouco alívio, então tivemos que resolver isso por conta própria”, disse Jessica Ramos, senadora estadual que apoia o projeto. Muitos representantes de comunidades com muitos imigrantes também estão pressionando para flexibilizar o limite de licenças, o que evitaria uma catástrofe ainda maior. Um projeto de lei pendente na Câmara Municipal acrescentaria mais 400 licenças de fornecedores ambulantes de alimentos por ano durante 10 anos. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

NOVA YORK - O trecho da Avenida Roosevelt no Queens estava repleto de gente abrindo caminho entre carrinhos e barracas que oferecem de tudo, desde máscaras até milho torrado com aroma doce. O rugido regular do trem nº 7 muitas vezes abafava o som das ofertas.

Numa esquina, Cristina Sanchez parecia desamparada na barraquinha de produtos do campo. Ela não tinha vendido nada. Durante a pandemia de coronavírus, ela entrou numa corrida frenética para sobreviver: primeiro, ela perdeu o emprego; depois, o quarto alugado. Para Sanchez, 47 anos, o peso tem sido imenso. Seus olhos se encheram de lágrimas quando ela pensou na sua família no México. “Sempre mandava uns US$ 150 por semana”, disse ela. “Agora não consigo mandar nem US$ 20”.

Muitos imigrantes se voltam ao trabalho ambulante para tentar sobreviver à crise trazida pela pandemia. Foto: Juan Arredondo/The New York Times

Ela está entre os mais de meio milhão de imigrantes ilegais da cidade cujas vidas foram afetadas pela pandemia, mas que não se enquadram nos critérios para receber a maior parte dos auxílios financeiros, entre eles empréstimos e dinheiro de estímulo à economia. Com poucos recursos, muitos imigrantes da América Latina – que já estavam entre os mais atingidos pelo vírus – recorreram ao que faziam na terra natal: trabalhar como vendedores ambulantes.

Mas, por décadas, Nova York limitou o número de licenças para vendedores de rua – atualmente 2.900 licenças para alimentos e 853 para vendedores de mercadorias em geral – criando um mercado paralelo e deixando os vendedores sujeitos a multas altas. Os ambulantes estão desapontados e sentem que aqui é criminalizada uma forma de ganhar a vida que em outras partes do mundo é digna.

No epicentro, sem trabalho nem documentos

Jackson Heights foi o “epicentro do epicentro” da pandemia em Nova York. Os efeitos daqueles primeiros meses ainda repercutem entre os trabalhadores imigrantes que perderam seus empregos e adoeceram em taxas alarmantes. Sanchez chegou a Nova York em 2004. Ela trabalhou numa série de empregos até três anos atrás, quando encontrou trabalho dobrando roupas numa lavanderia a seco por US$ 700 por semana.

Foi o suficiente para ela se juntar à fila de imigrantes que serpenteava na porta da Western Union, esperando para mandar dinheiro para a família. “Estou só tentando seguir em frente e continuar ajudando na educação do meus filhos”, disse ela. “Mas, agora, com a pandemia, não consigo ajudar. Não tem trabalho”.

Ela perdeu o emprego em março. No final de junho, não tinha onde morar. Quando a covid-19 chegou a Nova York, ela estava pagando US$ 60 por semana para sublocar um quarto na Avenida Roosevelt. Ela pagou por quatro meses até que suas economias acabaram.

O proprietário a despejou e, embora os amigos a tenham instado a lutar contra o despejo – uma moratória está em vigor até o final deste ano – ela se sentiu intimidada. Desesperada, perguntou a um amigo se poderia dormir no sofá da sala dele. E, como muitos outros imigrantes ilegais na cidade, ela recorreu à venda ambulante para sobreviver.

Ela começou a vender alimentos com a ajuda de Sabina Morales – uma vendedora experiente que oferecia produtos maduros. Seu antigo emprego lhe deu um pouco de trabalho recentemente, mas ela sabe que precisa encontrar outra fonte de renda, especialmente para quando o tempo esfriar. “Isso afetou muito meus filhos”, disse Sanchez, começando a chorar. “Tento dizer a eles que não tem trabalho fixo e que tudo o que eu faço quase não dá para eu sobreviver por um dia”.

Para cada vendedor de rua, há outros trabalhadores que se beneficiam de seu trabalho. É um ecossistema fluido, o que se evidencia pela inundação de recém-chegados como Gerardo Vital e daqueles que os ajudam.

Vital estava tão orgulhoso de seu país de adoção que conseguia sobreviver mostrando aos turistas de língua espanhola os destaques de Manhattan e Washington, D.C. “Eu tinha reservas de passeios todos os dias de março a setembro”, disse ele. Sua renda foi suficiente para comprar dois carros e alugar um SUV para grupos de turistas. “Mas quando cancelaram voos e fecharam fronteiras, meu mundo acabou mais uma vez”.

Ele então resolveu vender tacos de alambre – feitos com bife, bacon e queijo – na rua. O dono de uma delicatessen local permitiu que ele usasse uma barraquinha na calçada à noite, gratuitamente. Durante o dia, vende smoothies. Ele trabalha das nove da noite às duas da manhã, vendendo para pessoas que voltam dos turnos da noite ou baladeiros com muita energia e apetite. Ele disse que trabalhar na rua é complicado.

“Eu conheço todos os vagabundos e delinquentes, todos eles”, disse ele. Vital esperava que seus tacos atraíssem os clientes que ansiavam por uma refeição que os lembrasse de casa. “É o tipo de resiliência criativa em que as comunidades de imigrantes sempre se engajaram”, disse Alyshia Gálvez, professora do Lehman College e diretora fundadora do Instituto de Estudos Mexicanos Jaime Lucero.

Geraldo Vital prepara os tacos que vai vender numa barraquinha no Queens, Nova York. Foto: Juan Arredondo/The New York Times

As restrições deixam a vida mais difícil – e mais incerta

Como ambulante veterana que é, Morales tem um olhar estoico e realistas sobre a Avenida Roosevelt. Ao lado dela, um caminhão refrigerador – onde ela armazena seus produtos – desligado. Ela tem vendido produtos em Jackson Heights desde que veio para Nova York, há 15 anos. E, desde o início da pandemia, ajudou outras pessoas, como Sanchez, a estabelecer suas próprias barraquinhas. O afluxo de novos fornecedores, no entanto, deixou seu trabalho mais difícil. “Antes da pandemia, os negócios estavam muito melhores”, disse Morales, que veio à cidade para unir o neto de 5 anos com a mãe. “Agora tem mais vendedores do que clientes”.

Uma vez por semana, ela se aventura em Hunts Point, em busca de atacadistas que oferecem produtos com desconto. Desde que o metrô encerrou o serviço noturno, ela está dormindo no carro de um amigo para esperar até o amanhecer antes de voltar para a Avenida Roosevelt.

Ao contrário da maioria dos vendedores que não têm licença nem dinheiro para alugar uma tenda, Morales tem a licença necessária para trabalhar na sua. Mas isso vem com um preço exorbitante: ela disse que paga US$ 22 mil a cada dois anos ao atual proprietário da licença, que pagou apenas US$ 300 à cidade.

Ela agora pertence a uma coalizão de vendedores ambulantes, defensores públicos e políticos que instam as autoridades a aprovar um projeto de lei que criaria um Fundo de Trabalhadores Excluídos, o qual tributaria os mais ricos da cidade para fornecer auxílio financeiro aos trabalhadores que vivem em Nova York sem permissão legal.

“Houve muito pouco alívio, então tivemos que resolver isso por conta própria”, disse Jessica Ramos, senadora estadual que apoia o projeto. Muitos representantes de comunidades com muitos imigrantes também estão pressionando para flexibilizar o limite de licenças, o que evitaria uma catástrofe ainda maior. Um projeto de lei pendente na Câmara Municipal acrescentaria mais 400 licenças de fornecedores ambulantes de alimentos por ano durante 10 anos. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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