Jogando uma luz sobre a arte (e a importância) da tradução


Jennifer Croft, que traduz a romancista polonesa vencedora do Prêmio Nobel Olga Tokarczuk, está liderando uma campanha para que seus colegas e seu trabalho recebam mais reconhecimento

Por Alexandra Alter

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Quando Jennifer Croft fala sobre a tradução do romance Flights (Voos) da romancista polonesa Olga Tokarczuk, ela às vezes se refere carinhosamente ao livro como “nosso filho do amor”. ”É da Olga, mas também tem todos esses elementos que são meus, esses elementos estilísticos e essas decisões que tomei”, ela disse em uma entrevista recente.

Flights foi um trabalho de amor para Croft, que passou uma década tentando encontrar uma editora para ele. Foi finalmente lançado pela Fitzcarraldo Editions na Grã-Bretanha em 2017 e pela Riverhead nos Estados Unidos em 2018, e foi celebrado como uma obra-prima. O romance ganhou o International Booker Prize e se tornou finalista do National Book Award de literatura traduzida, ajudando Tokarczuk, que mais tarde recebeu o Prêmio Nobel, a conquistar um público global muito maior.

A tradutora Jennifer Croft está liderando uma luta pelo reconhecimento dos seus colegas e seu trabalho por parte de editoras que não colocam seu nome na capa Foto: Magdalena Wosinska/The New York Times
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Mas Croft também sentiu uma pontada de decepção porque, depois de dedicar anos ao projeto, seu nome não estava na capa do livro. Ela decidiu fazer uma exigência ousada: “Não vou traduzir mais livros sem meu nome na capa”, ela escreveu no Twitter.

“Não só é desrespeitoso comigo, mas também é um desserviço ao leitor, que deveria saber quem escolheu as palavras que vai ler. ”Sua declaração atraiu amplo apoio no mundo literário. Croft publicou uma carta aberta com o romancista Mark Haddon, pedindo aos editores que creditassem os tradutores nas capas.

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A carta atraiu quase 2.600 assinaturas, incluindo de escritores como Lauren Groff, Katie Kitamura, Philip Pullman, Sigrid Nunez e Neil Gaiman, além de tradutores proeminentes, entre eles Robin Myers, Martin Aitken, Jen Calleja, Margaret Jull Costa e John Keene. Sua campanha levou algumas editoras, entre elas a Pan Macmillan na Grã-Bretanha e a editora independente europeia Lolli Editions, a começar a colocar todos os tradutores nas capas dos livros.

A última tradução publicada de Croft é The Books of Jacob (Os Livros de Jacob), de Tokarczuk, um romance histórico de mais de 900 páginas sobre o líder de um culto do Leste Europeu do século XVIII chamado Jacob Frank, cuja história se desenrola através de entradas de diário, poesia, cartas e profecias.

Os críticos elogiaram a interpretação ágil de Croft do épico extenso de Tokarczuk, chamando sua tradução de “efervescente” e “maravilhosa”. Em uma resenha no The New York Times, Dwight Garner escreveu que “a tradução sensível de Croft está em sintonia com os muitos registros da autora; ela até faz os jogos de palavras estalarem.

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”Desta vez, o nome de Croft aparece na capa. A Riverhead a adicionou depois que ela e Tokarczuk solicitaram. Croft também está recebendo os direitos autorais por The Books of Jacob, algo que não recebeu por Flights. (Os tradutores, que normalmente recebem uma taxa de tradução fixa e única, não recebem automaticamente uma parte dos direitos autorais da maioria das editoras.)

Tokarczuk apoiou entusiasticamente essas medidas. ”Ela é incrivelmente talentosa linguisticamente”, disse Tokarczuk em um e-mail. “Jenny não se concentra na linguagem, mas no que está por baixo da linguagem e no que a linguagem está tentando expressar. Assim, ela explica a intenção do autor, não apenas as palavras enfileiradas uma a uma. Há também muita empatia aqui, a capacidade de inserir todo o idioleto do escritor.”

Para Croft, a campanha para trazer maior reconhecimento aos tradutores não é apenas um pedido de atenção e crédito, embora seja em parte isso. Croft também acredita que destacar os nomes dos tradutores trará mais transparência ao processo e ajudará os leitores a avaliarem seu trabalho, da mesma forma que avaliariam uma narração de um audiolivro não apenas pelo conteúdo, mas pelo desempenho.

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A tradução não é apenas uma habilidade técnica, mas um ato criativo, ela argumenta. “Devemos receber crédito, mas também temos que assumir a responsabilidade pelo trabalho que fizemos”, ela disse. A campanha de Croft repercutiu em outros da área. A escritora Jhumpa Lahiri, que também traduz do italiano e traduziu seu próprio trabalho do italiano para o inglês, disse que colocar os nomes dos tradutores na capa dos livros deveria ser uma prática padrão e que os tradutores devem ser tratados como artistas.

”É hora de abordar essa omissão histórica”, disse Lahiri, que assinou a carta aberta. “Tradução requer criatividade, requer engenhosidade, requer imaginação. Muitas vezes, você precisa retrabalhar radicalmente o texto, e se isso não é obra da imaginação, não sei o que é.

”Esse trabalho geralmente envolve muito mais do que interpretar frases e sintaxe de uma linguagem para outra. Tradutores também se encontram no papel de olheiro literário, agente e publicitário. Muitos estão constantemente lendo nos idiomas em que são fluentes para encontrar novos autores e livros e depois lançá-los às editoras. Quando as versões em inglês são lançadas, os tradutores são frequentemente chamados para facilitar entrevistas e juntar-se aos autores em turnês de livros e gerenciar suas contas de mídia social em inglês.

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A literatura traduzida representa apenas uma fração dos títulos publicados nos Estados Unidos. Apesar do sucesso de livros de estrelas internacionais como Elena Ferrante, Haruki Murakami e Karl Ove Knausgaard, muitas editoras ainda se preocupam com o fato de os leitores norte-americanos serem desencorajados pelas traduções.

Ann Goldstein, que traduz Ferrante e outros escritores italianos, disse que as editoras americanas há muito assumem que os leitores desconfiam das traduções e, como resultado, muitas vezes minimizam o papel dos tradutores, às vezes deixando seus nomes totalmente fora dos livros. ”O que as pessoas sempre diziam no passado era que os americanos não comprariam um livro se soubessem que estava traduzido”, ela disse. Essa crença tornou-se uma espécie de profecia autorrealizável.

Desde 2010, menos de 9.000 traduções de ficção e poesia em inglês foram publicadas e, em 2021, apenas 413 traduções foram lançadas, de acordo com um banco de dados de traduções em inglês compilado e mantido por Chad W. Post, editor da Open Letter Books, e está disponível no site da Publishers Weekly. Por outro lado, as editoras dos EUA lançaram 586.060 títulos totais de ficção adulta em 2021, mostram os números do NPD BookScan.

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Croft se concentra em transmitir tom, estilo e significado mais do que a precisão palavra por palavra. Ela descreveu seu processo como “desmontar completamente um livro e depois reconstruí-lo completamente do zero”.

Quando não está traduzindo, Croft escreve. Ela escreveu um romance autobiográfico em espanhol, intitulado Serpientes y Escaleras, sobre seu amadurecimento e seu amor pelas complexidades da linguagem e da tradução. Ela inicialmente não planejava lançá-lo em inglês, mas começou a traduzir capítulos para compartilhá-los com sua irmã, cuja doença é um tema recorrente no livro. Ao reformulá-lo, Croft se viu completamente reescrevendo-o como não-ficção ilustrada, e a versão em inglês, Homesick, que a Unnamed Press lançou em 2019, foi publicada como um livro de memórias.

Croft, que mora entre Los Angeles e Tulsa, Oklahoma, está trabalhando em um romance sobre tradução, intitulado Amadou. A história se passa nas florestas primitivas da Polônia, onde um grupo de tradutores se reuniu para trabalhar juntos na mais recente obra de uma célebre romancista polonesa. Os tradutores ficam surpresos quando a autora sofre uma transformação sobrenatural e desaparece na floresta, deixando-os sozinhos para decifrar o que seu novo romance significa.

Croft também tem várias novas traduções saindo nos próximos anos, incluindo três romances traduzidos do espanhol e um do polonês. Embora ela não tenha poucos projetos, Croft às vezes se pergunta se sua campanha para creditar os tradutores nas capas custará oportunidades.

”Tenho certeza de que há vários editores que não querem trabalhar comigo”, ela disse. “Algumas pessoas realmente não ficaram felizes com a ideia, e eu tive algumas conversas difíceis com editores.

”Ainda assim, o debate que seu esforço desencadeou foi gratificante, ela disse: “As pessoas estão pelo menos prestando um pouco mais de atenção à linguagem em si, às linguagens e ao trabalho de tradução”. /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Quando Jennifer Croft fala sobre a tradução do romance Flights (Voos) da romancista polonesa Olga Tokarczuk, ela às vezes se refere carinhosamente ao livro como “nosso filho do amor”. ”É da Olga, mas também tem todos esses elementos que são meus, esses elementos estilísticos e essas decisões que tomei”, ela disse em uma entrevista recente.

Flights foi um trabalho de amor para Croft, que passou uma década tentando encontrar uma editora para ele. Foi finalmente lançado pela Fitzcarraldo Editions na Grã-Bretanha em 2017 e pela Riverhead nos Estados Unidos em 2018, e foi celebrado como uma obra-prima. O romance ganhou o International Booker Prize e se tornou finalista do National Book Award de literatura traduzida, ajudando Tokarczuk, que mais tarde recebeu o Prêmio Nobel, a conquistar um público global muito maior.

A tradutora Jennifer Croft está liderando uma luta pelo reconhecimento dos seus colegas e seu trabalho por parte de editoras que não colocam seu nome na capa Foto: Magdalena Wosinska/The New York Times

Mas Croft também sentiu uma pontada de decepção porque, depois de dedicar anos ao projeto, seu nome não estava na capa do livro. Ela decidiu fazer uma exigência ousada: “Não vou traduzir mais livros sem meu nome na capa”, ela escreveu no Twitter.

“Não só é desrespeitoso comigo, mas também é um desserviço ao leitor, que deveria saber quem escolheu as palavras que vai ler. ”Sua declaração atraiu amplo apoio no mundo literário. Croft publicou uma carta aberta com o romancista Mark Haddon, pedindo aos editores que creditassem os tradutores nas capas.

A carta atraiu quase 2.600 assinaturas, incluindo de escritores como Lauren Groff, Katie Kitamura, Philip Pullman, Sigrid Nunez e Neil Gaiman, além de tradutores proeminentes, entre eles Robin Myers, Martin Aitken, Jen Calleja, Margaret Jull Costa e John Keene. Sua campanha levou algumas editoras, entre elas a Pan Macmillan na Grã-Bretanha e a editora independente europeia Lolli Editions, a começar a colocar todos os tradutores nas capas dos livros.

A última tradução publicada de Croft é The Books of Jacob (Os Livros de Jacob), de Tokarczuk, um romance histórico de mais de 900 páginas sobre o líder de um culto do Leste Europeu do século XVIII chamado Jacob Frank, cuja história se desenrola através de entradas de diário, poesia, cartas e profecias.

Os críticos elogiaram a interpretação ágil de Croft do épico extenso de Tokarczuk, chamando sua tradução de “efervescente” e “maravilhosa”. Em uma resenha no The New York Times, Dwight Garner escreveu que “a tradução sensível de Croft está em sintonia com os muitos registros da autora; ela até faz os jogos de palavras estalarem.

”Desta vez, o nome de Croft aparece na capa. A Riverhead a adicionou depois que ela e Tokarczuk solicitaram. Croft também está recebendo os direitos autorais por The Books of Jacob, algo que não recebeu por Flights. (Os tradutores, que normalmente recebem uma taxa de tradução fixa e única, não recebem automaticamente uma parte dos direitos autorais da maioria das editoras.)

Tokarczuk apoiou entusiasticamente essas medidas. ”Ela é incrivelmente talentosa linguisticamente”, disse Tokarczuk em um e-mail. “Jenny não se concentra na linguagem, mas no que está por baixo da linguagem e no que a linguagem está tentando expressar. Assim, ela explica a intenção do autor, não apenas as palavras enfileiradas uma a uma. Há também muita empatia aqui, a capacidade de inserir todo o idioleto do escritor.”

Para Croft, a campanha para trazer maior reconhecimento aos tradutores não é apenas um pedido de atenção e crédito, embora seja em parte isso. Croft também acredita que destacar os nomes dos tradutores trará mais transparência ao processo e ajudará os leitores a avaliarem seu trabalho, da mesma forma que avaliariam uma narração de um audiolivro não apenas pelo conteúdo, mas pelo desempenho.

A tradução não é apenas uma habilidade técnica, mas um ato criativo, ela argumenta. “Devemos receber crédito, mas também temos que assumir a responsabilidade pelo trabalho que fizemos”, ela disse. A campanha de Croft repercutiu em outros da área. A escritora Jhumpa Lahiri, que também traduz do italiano e traduziu seu próprio trabalho do italiano para o inglês, disse que colocar os nomes dos tradutores na capa dos livros deveria ser uma prática padrão e que os tradutores devem ser tratados como artistas.

”É hora de abordar essa omissão histórica”, disse Lahiri, que assinou a carta aberta. “Tradução requer criatividade, requer engenhosidade, requer imaginação. Muitas vezes, você precisa retrabalhar radicalmente o texto, e se isso não é obra da imaginação, não sei o que é.

”Esse trabalho geralmente envolve muito mais do que interpretar frases e sintaxe de uma linguagem para outra. Tradutores também se encontram no papel de olheiro literário, agente e publicitário. Muitos estão constantemente lendo nos idiomas em que são fluentes para encontrar novos autores e livros e depois lançá-los às editoras. Quando as versões em inglês são lançadas, os tradutores são frequentemente chamados para facilitar entrevistas e juntar-se aos autores em turnês de livros e gerenciar suas contas de mídia social em inglês.

A literatura traduzida representa apenas uma fração dos títulos publicados nos Estados Unidos. Apesar do sucesso de livros de estrelas internacionais como Elena Ferrante, Haruki Murakami e Karl Ove Knausgaard, muitas editoras ainda se preocupam com o fato de os leitores norte-americanos serem desencorajados pelas traduções.

Ann Goldstein, que traduz Ferrante e outros escritores italianos, disse que as editoras americanas há muito assumem que os leitores desconfiam das traduções e, como resultado, muitas vezes minimizam o papel dos tradutores, às vezes deixando seus nomes totalmente fora dos livros. ”O que as pessoas sempre diziam no passado era que os americanos não comprariam um livro se soubessem que estava traduzido”, ela disse. Essa crença tornou-se uma espécie de profecia autorrealizável.

Desde 2010, menos de 9.000 traduções de ficção e poesia em inglês foram publicadas e, em 2021, apenas 413 traduções foram lançadas, de acordo com um banco de dados de traduções em inglês compilado e mantido por Chad W. Post, editor da Open Letter Books, e está disponível no site da Publishers Weekly. Por outro lado, as editoras dos EUA lançaram 586.060 títulos totais de ficção adulta em 2021, mostram os números do NPD BookScan.

Croft se concentra em transmitir tom, estilo e significado mais do que a precisão palavra por palavra. Ela descreveu seu processo como “desmontar completamente um livro e depois reconstruí-lo completamente do zero”.

Quando não está traduzindo, Croft escreve. Ela escreveu um romance autobiográfico em espanhol, intitulado Serpientes y Escaleras, sobre seu amadurecimento e seu amor pelas complexidades da linguagem e da tradução. Ela inicialmente não planejava lançá-lo em inglês, mas começou a traduzir capítulos para compartilhá-los com sua irmã, cuja doença é um tema recorrente no livro. Ao reformulá-lo, Croft se viu completamente reescrevendo-o como não-ficção ilustrada, e a versão em inglês, Homesick, que a Unnamed Press lançou em 2019, foi publicada como um livro de memórias.

Croft, que mora entre Los Angeles e Tulsa, Oklahoma, está trabalhando em um romance sobre tradução, intitulado Amadou. A história se passa nas florestas primitivas da Polônia, onde um grupo de tradutores se reuniu para trabalhar juntos na mais recente obra de uma célebre romancista polonesa. Os tradutores ficam surpresos quando a autora sofre uma transformação sobrenatural e desaparece na floresta, deixando-os sozinhos para decifrar o que seu novo romance significa.

Croft também tem várias novas traduções saindo nos próximos anos, incluindo três romances traduzidos do espanhol e um do polonês. Embora ela não tenha poucos projetos, Croft às vezes se pergunta se sua campanha para creditar os tradutores nas capas custará oportunidades.

”Tenho certeza de que há vários editores que não querem trabalhar comigo”, ela disse. “Algumas pessoas realmente não ficaram felizes com a ideia, e eu tive algumas conversas difíceis com editores.

”Ainda assim, o debate que seu esforço desencadeou foi gratificante, ela disse: “As pessoas estão pelo menos prestando um pouco mais de atenção à linguagem em si, às linguagens e ao trabalho de tradução”. /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Quando Jennifer Croft fala sobre a tradução do romance Flights (Voos) da romancista polonesa Olga Tokarczuk, ela às vezes se refere carinhosamente ao livro como “nosso filho do amor”. ”É da Olga, mas também tem todos esses elementos que são meus, esses elementos estilísticos e essas decisões que tomei”, ela disse em uma entrevista recente.

Flights foi um trabalho de amor para Croft, que passou uma década tentando encontrar uma editora para ele. Foi finalmente lançado pela Fitzcarraldo Editions na Grã-Bretanha em 2017 e pela Riverhead nos Estados Unidos em 2018, e foi celebrado como uma obra-prima. O romance ganhou o International Booker Prize e se tornou finalista do National Book Award de literatura traduzida, ajudando Tokarczuk, que mais tarde recebeu o Prêmio Nobel, a conquistar um público global muito maior.

A tradutora Jennifer Croft está liderando uma luta pelo reconhecimento dos seus colegas e seu trabalho por parte de editoras que não colocam seu nome na capa Foto: Magdalena Wosinska/The New York Times

Mas Croft também sentiu uma pontada de decepção porque, depois de dedicar anos ao projeto, seu nome não estava na capa do livro. Ela decidiu fazer uma exigência ousada: “Não vou traduzir mais livros sem meu nome na capa”, ela escreveu no Twitter.

“Não só é desrespeitoso comigo, mas também é um desserviço ao leitor, que deveria saber quem escolheu as palavras que vai ler. ”Sua declaração atraiu amplo apoio no mundo literário. Croft publicou uma carta aberta com o romancista Mark Haddon, pedindo aos editores que creditassem os tradutores nas capas.

A carta atraiu quase 2.600 assinaturas, incluindo de escritores como Lauren Groff, Katie Kitamura, Philip Pullman, Sigrid Nunez e Neil Gaiman, além de tradutores proeminentes, entre eles Robin Myers, Martin Aitken, Jen Calleja, Margaret Jull Costa e John Keene. Sua campanha levou algumas editoras, entre elas a Pan Macmillan na Grã-Bretanha e a editora independente europeia Lolli Editions, a começar a colocar todos os tradutores nas capas dos livros.

A última tradução publicada de Croft é The Books of Jacob (Os Livros de Jacob), de Tokarczuk, um romance histórico de mais de 900 páginas sobre o líder de um culto do Leste Europeu do século XVIII chamado Jacob Frank, cuja história se desenrola através de entradas de diário, poesia, cartas e profecias.

Os críticos elogiaram a interpretação ágil de Croft do épico extenso de Tokarczuk, chamando sua tradução de “efervescente” e “maravilhosa”. Em uma resenha no The New York Times, Dwight Garner escreveu que “a tradução sensível de Croft está em sintonia com os muitos registros da autora; ela até faz os jogos de palavras estalarem.

”Desta vez, o nome de Croft aparece na capa. A Riverhead a adicionou depois que ela e Tokarczuk solicitaram. Croft também está recebendo os direitos autorais por The Books of Jacob, algo que não recebeu por Flights. (Os tradutores, que normalmente recebem uma taxa de tradução fixa e única, não recebem automaticamente uma parte dos direitos autorais da maioria das editoras.)

Tokarczuk apoiou entusiasticamente essas medidas. ”Ela é incrivelmente talentosa linguisticamente”, disse Tokarczuk em um e-mail. “Jenny não se concentra na linguagem, mas no que está por baixo da linguagem e no que a linguagem está tentando expressar. Assim, ela explica a intenção do autor, não apenas as palavras enfileiradas uma a uma. Há também muita empatia aqui, a capacidade de inserir todo o idioleto do escritor.”

Para Croft, a campanha para trazer maior reconhecimento aos tradutores não é apenas um pedido de atenção e crédito, embora seja em parte isso. Croft também acredita que destacar os nomes dos tradutores trará mais transparência ao processo e ajudará os leitores a avaliarem seu trabalho, da mesma forma que avaliariam uma narração de um audiolivro não apenas pelo conteúdo, mas pelo desempenho.

A tradução não é apenas uma habilidade técnica, mas um ato criativo, ela argumenta. “Devemos receber crédito, mas também temos que assumir a responsabilidade pelo trabalho que fizemos”, ela disse. A campanha de Croft repercutiu em outros da área. A escritora Jhumpa Lahiri, que também traduz do italiano e traduziu seu próprio trabalho do italiano para o inglês, disse que colocar os nomes dos tradutores na capa dos livros deveria ser uma prática padrão e que os tradutores devem ser tratados como artistas.

”É hora de abordar essa omissão histórica”, disse Lahiri, que assinou a carta aberta. “Tradução requer criatividade, requer engenhosidade, requer imaginação. Muitas vezes, você precisa retrabalhar radicalmente o texto, e se isso não é obra da imaginação, não sei o que é.

”Esse trabalho geralmente envolve muito mais do que interpretar frases e sintaxe de uma linguagem para outra. Tradutores também se encontram no papel de olheiro literário, agente e publicitário. Muitos estão constantemente lendo nos idiomas em que são fluentes para encontrar novos autores e livros e depois lançá-los às editoras. Quando as versões em inglês são lançadas, os tradutores são frequentemente chamados para facilitar entrevistas e juntar-se aos autores em turnês de livros e gerenciar suas contas de mídia social em inglês.

A literatura traduzida representa apenas uma fração dos títulos publicados nos Estados Unidos. Apesar do sucesso de livros de estrelas internacionais como Elena Ferrante, Haruki Murakami e Karl Ove Knausgaard, muitas editoras ainda se preocupam com o fato de os leitores norte-americanos serem desencorajados pelas traduções.

Ann Goldstein, que traduz Ferrante e outros escritores italianos, disse que as editoras americanas há muito assumem que os leitores desconfiam das traduções e, como resultado, muitas vezes minimizam o papel dos tradutores, às vezes deixando seus nomes totalmente fora dos livros. ”O que as pessoas sempre diziam no passado era que os americanos não comprariam um livro se soubessem que estava traduzido”, ela disse. Essa crença tornou-se uma espécie de profecia autorrealizável.

Desde 2010, menos de 9.000 traduções de ficção e poesia em inglês foram publicadas e, em 2021, apenas 413 traduções foram lançadas, de acordo com um banco de dados de traduções em inglês compilado e mantido por Chad W. Post, editor da Open Letter Books, e está disponível no site da Publishers Weekly. Por outro lado, as editoras dos EUA lançaram 586.060 títulos totais de ficção adulta em 2021, mostram os números do NPD BookScan.

Croft se concentra em transmitir tom, estilo e significado mais do que a precisão palavra por palavra. Ela descreveu seu processo como “desmontar completamente um livro e depois reconstruí-lo completamente do zero”.

Quando não está traduzindo, Croft escreve. Ela escreveu um romance autobiográfico em espanhol, intitulado Serpientes y Escaleras, sobre seu amadurecimento e seu amor pelas complexidades da linguagem e da tradução. Ela inicialmente não planejava lançá-lo em inglês, mas começou a traduzir capítulos para compartilhá-los com sua irmã, cuja doença é um tema recorrente no livro. Ao reformulá-lo, Croft se viu completamente reescrevendo-o como não-ficção ilustrada, e a versão em inglês, Homesick, que a Unnamed Press lançou em 2019, foi publicada como um livro de memórias.

Croft, que mora entre Los Angeles e Tulsa, Oklahoma, está trabalhando em um romance sobre tradução, intitulado Amadou. A história se passa nas florestas primitivas da Polônia, onde um grupo de tradutores se reuniu para trabalhar juntos na mais recente obra de uma célebre romancista polonesa. Os tradutores ficam surpresos quando a autora sofre uma transformação sobrenatural e desaparece na floresta, deixando-os sozinhos para decifrar o que seu novo romance significa.

Croft também tem várias novas traduções saindo nos próximos anos, incluindo três romances traduzidos do espanhol e um do polonês. Embora ela não tenha poucos projetos, Croft às vezes se pergunta se sua campanha para creditar os tradutores nas capas custará oportunidades.

”Tenho certeza de que há vários editores que não querem trabalhar comigo”, ela disse. “Algumas pessoas realmente não ficaram felizes com a ideia, e eu tive algumas conversas difíceis com editores.

”Ainda assim, o debate que seu esforço desencadeou foi gratificante, ela disse: “As pessoas estão pelo menos prestando um pouco mais de atenção à linguagem em si, às linguagens e ao trabalho de tradução”. /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

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