Redefina seus limites na internet e fora dela


No ano que passou, muitos de nós desempenhamos nossos diferentes papéis a partir do mesmo espaço, o lar. Agora, estamos repensando o quanto desejamos compartilhar conforme retomamos à esfera pública

Por Redação

Em janeiro, Stephanie Creary, professora-assistente de administração na Faculdade Wharton, da Universidade da Pensilvânia, estava comandando uma oficina a respeito de diversidade, igualdade e práticas de inclusão diante de um público remoto de cirurgiões acadêmicos. Ela observou que o ambiente de trabalho deles seria habitualmente formal, mas a conversa acontecia nas casas dos médicos, com ela sentada na sua sala de estar na Filadélfia, com um vaso de flores na mesa ao fundo e uma pintura de uma garrafa de vinho e uma taça na parede.

“Me pareceu que, se vamos tratar desse tema, é melhor quebrar logo todas as regras”, disse Creary, que trabalha com questões de identidade e diversidade no ambiente de trabalho. “Acho que as pessoas se sentiram mais à vontade com esse conteúdo porque a formalidade era posta de lado.”

Ao longo do ano passado, muitos de nós desempenhamos nossos diferentes papéis, todos no mesmo espaço, em casa - agora, estamos reavaliando o quanto compartilhar à medida que voltamos àesfera pública. Foto: Jan Buchczik/The New York Times
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Ao longo do ano passado, muitos de nossos espaços pessoais acumularam funções adicionais servindo de escritórios, salas de aula, academias e até salas do psiquiatra ou estúdios de música. “Todos vimos em primeira mão os lares dos outros e suas salas de estar", disse Creary. E, ao mesmo tempo, muitos de nós tiveram que alternar entre papéis diferentes, como profissionais, pais e estudantes, tudo a partir do mesmo espaço. Naturalmente, os limites foram borrados: as crianças acabaram invadindo a tela do Zoom nas reuniões; roupas de academia serviram de figurino para situações no escritório remoto.

Agora começamos a voltar à esfera pública, e embora as redes sociais e os aplicativos de videoconferência devam continuar a fazer parte de como as pessoas acessam a internet para o trabalho e o lazer, tal mudança pode levar alguns a pensar: será hora de reavaliar e criar novas barreiras entre nossas existências dentro e fora da rede? Eis aqui algumas ideias.

Leve mais de sua personalidade individual para o trabalho

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Antes da pandemia, conversas pessoais e casuais no trabalho talvez fizessem parte das suas relações no escritório — mas dificilmente tínhamos o tipo de transparência e comunicação com os colegas que desenvolvemos com repetidas chamadas de vídeo feitas de casa. A simples abertura de uma janela para o ambiente doméstico dos outros pode ter aprofundado seus elos. “Tradicionalmente, a fronteira entre pessoal e profissional sempre foi um obstáculo considerável", disse Adam Smiley Poswolsky, autor e palestrante que se concentra nas relações dentro do ambiente de trabalho. “Acho que, como legado da pandemia, isso não será mais aceitável para a grande maioria dos trabalhadores.”

Se a mudança foi positiva para você, tente imitar elementos dela de maneira mais intencional quando voltar a ver os colegas pessoalmente. Poswolsky sugeriu separar algum tempo no começo das reuniões pessoais para ter o tipo de conversa pessoal que resultaria da observação de um detalhe pessoal (que tipo de chá você está bebendo? É um parente ali atrás?) no canto da imagem capturada pela câmera.

Durante alguns dos piores meses da pandemia, Corinna Nicolaou, professora de redação de ensaios acadêmicos em Pullman, Washington, quase nunca via o rosto dos alunos — eles raramente ligavam a câmera durante a aula. “Me parecia que os estudantes estavam reagindo a toda essa intimidade forçada", disse ela. “Acho que as aulas online os deixaram cansados”.

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Independentemente disso, ela ligou sua câmera em todas as aulas, permitindo que os estudantes a vissem em uma ambientação mais relaxada — às vezes ela aparecia usando roupas mais confortáveis, ou mesmo na cama. Isso introduziu uma nova vulnerabilidade e facilidade no relacionamento entre eles que, de acordo com ela, serviu de exemplo para os alunos: eles também poderiam se abrir, ao menos nos textos que escreviam. “Os ensaios que os estudantes escreveram nesse semestre foram mais reveladores e profundos", disse ela.

Agora ela espera levar esse aprendizado de volta para a sala de aula física. “Nos semestres mais recentes, os professores tiveram que ser mais vulneráveis e flexíveis em vez de ter todas as respostas", disse Corinna. “Depois de passar por isso, nós mudamos.”

Leve em consideração o quanto você se sente à vontade

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Algumas pessoas preferiram deixar a vida pessoal fora das telas. “A sensação de exposição tem desafiado pessoas que não se sentem à vontade mostrando o ambiente que as cerca a quem quer que esteja do outro lado da chamada", disse Munmun De Choudhury, professora-assistente do Instituto de Tecnologia da Geórgia, que estuda saúde e bem-estar online. Talvez os estudantes de perfil social menos favorecido, que não dispõem de um ambiente de trabalho especial, prefiram não compartilhar sua ambientação com os colegas, disse ela.

Como atriz em Nova York, Anna Suzuki participou de um número considerável de chamadas de trabalho por vídeo no ano passado — conversas com diretores, leituras de diálogos para séries de TV e muitas outras reuniões pelo Zoom. Ela também divide um apartamento de um quarto com o marido.

“Sou uma pessoa que gosta de privacidade", disse Anna, “e tive que descobrir uma maneira de fazer com que vissem apenas uma parede em branco atrás de mim".

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A solução foi criar uma área limpa em meio aos armários do apartamento da mãe, convenientemente localizado logo abaixo do dela. O espaço profissional “público” dela — uma mesa cor de carvalho e uma cadeira de escritório preta — ofereceu alguma separação entre a vida pessoal e o trabalho, permitindo a ela que ativasse o “cérebro de performer", como ela descreveu. Não foi sempre fácil. “Preciso muito criar compartimentos para as coisas", disse ela. “Ainda tive que criar uma personalidade pública em casa.” Mas ela disse que também descobriu o conforto de ser capaz de criar uma barreira tão clara entre público e privado.

Outras pessoas também se sentem pouco inclinadas a compartilhar tanto de sua vida, e tudo bem. “Cada um conhece melhor as próprias necessidades", disse Poswolsky. “É legítimo criar obstáculos para impedir a entrada de alguém no seu espaço de vulnerabilidade.’”

E pense em dar a si o tempo necessário para aceitar melhor situações que provocam hesitação. Creary disse ter observado duas fontes de preocupação entre aqueles que gostavam das barreiras claras que formaram ao trabalhar de casa e agora se viam diante de um retorno ao ambiente de trabalho: a mudança de local pode piorar a produtividade porque aumentarão as distrações, e também resultar em uma maior exposição a ambientes sociais não saudáveis. Ela indicou duas estratégias possíveis para reestabelecer as fronteiras: pense na sua hora do dia mais produtiva e tente marcar as reuniões e demais obrigações de acordo com isso, disse ela, e pense em quais compromissos sociais (jantares, happy hour e afins) são essenciais e quais você pode recusar.

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“É tudo questão de respeitar o próprio ritmo", disse Creary.

Não deixe de lado as conversas a respeito de temas difíceis

De acordo com Natalie Bazarova, professora-assistente de comunicação da Universidade Cornell que estuda intimidade pública, as informações pessoais compartilhadas pelos usuários das redes sociais eram principalmente positivas antes da pandemia. Mas, no decorrer dos 15 meses passados, houve uma mudança. “Divulgações mais negativas passaram a ser mais aceitas", disse ela, citando pesquisas que publicou este ano. “Estamos todos passando por circunstâncias comuns, e isso molda nossa percepção daquilo que é apropriado ou não.”

O que isso significa? Alguns usuários das redes sociais têm publicado mais frequentemente a respeito dos efeitos da pandemia na sua saúde mental, disse De Choudhury. E publicações ligadas à justiça social e relatando experiências de racismo se espalharam pelo Instagram em meados do ano passado quando as pessoas buscaram algum engajamento online com as manifestações que se seguiram ao assassinato de George Floyd.

De acordo com um artigo publicado em 2020 na International Journal of Information Management, os usuários das redes sociais também publicaram com mais regularidade a respeito da sua saúde mental, destacando em particular as condições que as tornam vulneráveis à covid-19 — em parte na tentativa de incentivar os demais a levar a sério a pandemia do coronavírus.

Esse tipo de conversa tem como efeito a reversão de estigmas, tornando mais aceitável a sinceridade ao comentar os desafios que indivíduos e grupos enfrentaram no ano passado (ou por mais tempo; muitas das desigualdades estruturais expostas pela pandemia a antecedem). Caso se sinta à vontade participando do debate, continue a fazer isso na internet e fora dela — mas preste atenção para não compartilhar demais. “Temos que ter consciência das informações que publicamos diante de todos", disse Bazarova.

Repense aquilo que publica, e a quem esse conteúdo se destina

Ao mesmo tempo, talvez você tenha evitado compartilhar certos acontecimentos pessoais por pensar que pudessem receber reações negativas — algum feito no trabalho que talvez parecesse fora de sintonia com o momento, ou uma viagem que poderia ser criticada por contrariar recomendações de saúde pública. “Quem pode dizer quantas vezes as pessoas deixaram de compartilhar algo positivo?”, disse De Choudhury. E mesmo que publiquemos uma foto de uma ocasião social, talvez tenhamos a necessidade de explicar que todos foram vacinados para evitar críticas.

Parte dessa contenção pode ser produtiva; pensar melhor naquilo que compartilhamos online é boa ideia, assim como uma reflexão a respeito do nosso público e das nossas motivações.

Pergunte a si mesmo: quem vai receber isso? Qual é o contexto — quer dizer, o que mais as pessoas estão publicando ou debatendo no momento? Por que desejo compartilhar isso? É para meu benefício, ou para os outros? Mas as interações nas redes sociais não deveriam produzir ansiedade; se elas forem uma fonte de estresse, pense em criar barreiras mais claras em torno das suas contas tornando-as privadas, ou limitando-as aos amigos próximos. Lembre-se, também, que as fronteiras que você define em relação à divulgação de informações pessoais podem ser diferentes das de outras pessoas e podem seguir mudando conforme a pandemia cede.

Reflexões desse tipo vão poupar você de reações negativas, e também podem ser valiosas para aqueles que leem suas publicações. “A ideia de uma orientação social comunal é uma mudança bem-vinda", disse Bazarova. “Todos nós temos responsabilidade social pelo que acontece online”. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times.

Em janeiro, Stephanie Creary, professora-assistente de administração na Faculdade Wharton, da Universidade da Pensilvânia, estava comandando uma oficina a respeito de diversidade, igualdade e práticas de inclusão diante de um público remoto de cirurgiões acadêmicos. Ela observou que o ambiente de trabalho deles seria habitualmente formal, mas a conversa acontecia nas casas dos médicos, com ela sentada na sua sala de estar na Filadélfia, com um vaso de flores na mesa ao fundo e uma pintura de uma garrafa de vinho e uma taça na parede.

“Me pareceu que, se vamos tratar desse tema, é melhor quebrar logo todas as regras”, disse Creary, que trabalha com questões de identidade e diversidade no ambiente de trabalho. “Acho que as pessoas se sentiram mais à vontade com esse conteúdo porque a formalidade era posta de lado.”

Ao longo do ano passado, muitos de nós desempenhamos nossos diferentes papéis, todos no mesmo espaço, em casa - agora, estamos reavaliando o quanto compartilhar à medida que voltamos àesfera pública. Foto: Jan Buchczik/The New York Times

Ao longo do ano passado, muitos de nossos espaços pessoais acumularam funções adicionais servindo de escritórios, salas de aula, academias e até salas do psiquiatra ou estúdios de música. “Todos vimos em primeira mão os lares dos outros e suas salas de estar", disse Creary. E, ao mesmo tempo, muitos de nós tiveram que alternar entre papéis diferentes, como profissionais, pais e estudantes, tudo a partir do mesmo espaço. Naturalmente, os limites foram borrados: as crianças acabaram invadindo a tela do Zoom nas reuniões; roupas de academia serviram de figurino para situações no escritório remoto.

Agora começamos a voltar à esfera pública, e embora as redes sociais e os aplicativos de videoconferência devam continuar a fazer parte de como as pessoas acessam a internet para o trabalho e o lazer, tal mudança pode levar alguns a pensar: será hora de reavaliar e criar novas barreiras entre nossas existências dentro e fora da rede? Eis aqui algumas ideias.

Leve mais de sua personalidade individual para o trabalho

Antes da pandemia, conversas pessoais e casuais no trabalho talvez fizessem parte das suas relações no escritório — mas dificilmente tínhamos o tipo de transparência e comunicação com os colegas que desenvolvemos com repetidas chamadas de vídeo feitas de casa. A simples abertura de uma janela para o ambiente doméstico dos outros pode ter aprofundado seus elos. “Tradicionalmente, a fronteira entre pessoal e profissional sempre foi um obstáculo considerável", disse Adam Smiley Poswolsky, autor e palestrante que se concentra nas relações dentro do ambiente de trabalho. “Acho que, como legado da pandemia, isso não será mais aceitável para a grande maioria dos trabalhadores.”

Se a mudança foi positiva para você, tente imitar elementos dela de maneira mais intencional quando voltar a ver os colegas pessoalmente. Poswolsky sugeriu separar algum tempo no começo das reuniões pessoais para ter o tipo de conversa pessoal que resultaria da observação de um detalhe pessoal (que tipo de chá você está bebendo? É um parente ali atrás?) no canto da imagem capturada pela câmera.

Durante alguns dos piores meses da pandemia, Corinna Nicolaou, professora de redação de ensaios acadêmicos em Pullman, Washington, quase nunca via o rosto dos alunos — eles raramente ligavam a câmera durante a aula. “Me parecia que os estudantes estavam reagindo a toda essa intimidade forçada", disse ela. “Acho que as aulas online os deixaram cansados”.

Independentemente disso, ela ligou sua câmera em todas as aulas, permitindo que os estudantes a vissem em uma ambientação mais relaxada — às vezes ela aparecia usando roupas mais confortáveis, ou mesmo na cama. Isso introduziu uma nova vulnerabilidade e facilidade no relacionamento entre eles que, de acordo com ela, serviu de exemplo para os alunos: eles também poderiam se abrir, ao menos nos textos que escreviam. “Os ensaios que os estudantes escreveram nesse semestre foram mais reveladores e profundos", disse ela.

Agora ela espera levar esse aprendizado de volta para a sala de aula física. “Nos semestres mais recentes, os professores tiveram que ser mais vulneráveis e flexíveis em vez de ter todas as respostas", disse Corinna. “Depois de passar por isso, nós mudamos.”

Leve em consideração o quanto você se sente à vontade

Algumas pessoas preferiram deixar a vida pessoal fora das telas. “A sensação de exposição tem desafiado pessoas que não se sentem à vontade mostrando o ambiente que as cerca a quem quer que esteja do outro lado da chamada", disse Munmun De Choudhury, professora-assistente do Instituto de Tecnologia da Geórgia, que estuda saúde e bem-estar online. Talvez os estudantes de perfil social menos favorecido, que não dispõem de um ambiente de trabalho especial, prefiram não compartilhar sua ambientação com os colegas, disse ela.

Como atriz em Nova York, Anna Suzuki participou de um número considerável de chamadas de trabalho por vídeo no ano passado — conversas com diretores, leituras de diálogos para séries de TV e muitas outras reuniões pelo Zoom. Ela também divide um apartamento de um quarto com o marido.

“Sou uma pessoa que gosta de privacidade", disse Anna, “e tive que descobrir uma maneira de fazer com que vissem apenas uma parede em branco atrás de mim".

A solução foi criar uma área limpa em meio aos armários do apartamento da mãe, convenientemente localizado logo abaixo do dela. O espaço profissional “público” dela — uma mesa cor de carvalho e uma cadeira de escritório preta — ofereceu alguma separação entre a vida pessoal e o trabalho, permitindo a ela que ativasse o “cérebro de performer", como ela descreveu. Não foi sempre fácil. “Preciso muito criar compartimentos para as coisas", disse ela. “Ainda tive que criar uma personalidade pública em casa.” Mas ela disse que também descobriu o conforto de ser capaz de criar uma barreira tão clara entre público e privado.

Outras pessoas também se sentem pouco inclinadas a compartilhar tanto de sua vida, e tudo bem. “Cada um conhece melhor as próprias necessidades", disse Poswolsky. “É legítimo criar obstáculos para impedir a entrada de alguém no seu espaço de vulnerabilidade.’”

E pense em dar a si o tempo necessário para aceitar melhor situações que provocam hesitação. Creary disse ter observado duas fontes de preocupação entre aqueles que gostavam das barreiras claras que formaram ao trabalhar de casa e agora se viam diante de um retorno ao ambiente de trabalho: a mudança de local pode piorar a produtividade porque aumentarão as distrações, e também resultar em uma maior exposição a ambientes sociais não saudáveis. Ela indicou duas estratégias possíveis para reestabelecer as fronteiras: pense na sua hora do dia mais produtiva e tente marcar as reuniões e demais obrigações de acordo com isso, disse ela, e pense em quais compromissos sociais (jantares, happy hour e afins) são essenciais e quais você pode recusar.

“É tudo questão de respeitar o próprio ritmo", disse Creary.

Não deixe de lado as conversas a respeito de temas difíceis

De acordo com Natalie Bazarova, professora-assistente de comunicação da Universidade Cornell que estuda intimidade pública, as informações pessoais compartilhadas pelos usuários das redes sociais eram principalmente positivas antes da pandemia. Mas, no decorrer dos 15 meses passados, houve uma mudança. “Divulgações mais negativas passaram a ser mais aceitas", disse ela, citando pesquisas que publicou este ano. “Estamos todos passando por circunstâncias comuns, e isso molda nossa percepção daquilo que é apropriado ou não.”

O que isso significa? Alguns usuários das redes sociais têm publicado mais frequentemente a respeito dos efeitos da pandemia na sua saúde mental, disse De Choudhury. E publicações ligadas à justiça social e relatando experiências de racismo se espalharam pelo Instagram em meados do ano passado quando as pessoas buscaram algum engajamento online com as manifestações que se seguiram ao assassinato de George Floyd.

De acordo com um artigo publicado em 2020 na International Journal of Information Management, os usuários das redes sociais também publicaram com mais regularidade a respeito da sua saúde mental, destacando em particular as condições que as tornam vulneráveis à covid-19 — em parte na tentativa de incentivar os demais a levar a sério a pandemia do coronavírus.

Esse tipo de conversa tem como efeito a reversão de estigmas, tornando mais aceitável a sinceridade ao comentar os desafios que indivíduos e grupos enfrentaram no ano passado (ou por mais tempo; muitas das desigualdades estruturais expostas pela pandemia a antecedem). Caso se sinta à vontade participando do debate, continue a fazer isso na internet e fora dela — mas preste atenção para não compartilhar demais. “Temos que ter consciência das informações que publicamos diante de todos", disse Bazarova.

Repense aquilo que publica, e a quem esse conteúdo se destina

Ao mesmo tempo, talvez você tenha evitado compartilhar certos acontecimentos pessoais por pensar que pudessem receber reações negativas — algum feito no trabalho que talvez parecesse fora de sintonia com o momento, ou uma viagem que poderia ser criticada por contrariar recomendações de saúde pública. “Quem pode dizer quantas vezes as pessoas deixaram de compartilhar algo positivo?”, disse De Choudhury. E mesmo que publiquemos uma foto de uma ocasião social, talvez tenhamos a necessidade de explicar que todos foram vacinados para evitar críticas.

Parte dessa contenção pode ser produtiva; pensar melhor naquilo que compartilhamos online é boa ideia, assim como uma reflexão a respeito do nosso público e das nossas motivações.

Pergunte a si mesmo: quem vai receber isso? Qual é o contexto — quer dizer, o que mais as pessoas estão publicando ou debatendo no momento? Por que desejo compartilhar isso? É para meu benefício, ou para os outros? Mas as interações nas redes sociais não deveriam produzir ansiedade; se elas forem uma fonte de estresse, pense em criar barreiras mais claras em torno das suas contas tornando-as privadas, ou limitando-as aos amigos próximos. Lembre-se, também, que as fronteiras que você define em relação à divulgação de informações pessoais podem ser diferentes das de outras pessoas e podem seguir mudando conforme a pandemia cede.

Reflexões desse tipo vão poupar você de reações negativas, e também podem ser valiosas para aqueles que leem suas publicações. “A ideia de uma orientação social comunal é uma mudança bem-vinda", disse Bazarova. “Todos nós temos responsabilidade social pelo que acontece online”. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times.

Em janeiro, Stephanie Creary, professora-assistente de administração na Faculdade Wharton, da Universidade da Pensilvânia, estava comandando uma oficina a respeito de diversidade, igualdade e práticas de inclusão diante de um público remoto de cirurgiões acadêmicos. Ela observou que o ambiente de trabalho deles seria habitualmente formal, mas a conversa acontecia nas casas dos médicos, com ela sentada na sua sala de estar na Filadélfia, com um vaso de flores na mesa ao fundo e uma pintura de uma garrafa de vinho e uma taça na parede.

“Me pareceu que, se vamos tratar desse tema, é melhor quebrar logo todas as regras”, disse Creary, que trabalha com questões de identidade e diversidade no ambiente de trabalho. “Acho que as pessoas se sentiram mais à vontade com esse conteúdo porque a formalidade era posta de lado.”

Ao longo do ano passado, muitos de nós desempenhamos nossos diferentes papéis, todos no mesmo espaço, em casa - agora, estamos reavaliando o quanto compartilhar à medida que voltamos àesfera pública. Foto: Jan Buchczik/The New York Times

Ao longo do ano passado, muitos de nossos espaços pessoais acumularam funções adicionais servindo de escritórios, salas de aula, academias e até salas do psiquiatra ou estúdios de música. “Todos vimos em primeira mão os lares dos outros e suas salas de estar", disse Creary. E, ao mesmo tempo, muitos de nós tiveram que alternar entre papéis diferentes, como profissionais, pais e estudantes, tudo a partir do mesmo espaço. Naturalmente, os limites foram borrados: as crianças acabaram invadindo a tela do Zoom nas reuniões; roupas de academia serviram de figurino para situações no escritório remoto.

Agora começamos a voltar à esfera pública, e embora as redes sociais e os aplicativos de videoconferência devam continuar a fazer parte de como as pessoas acessam a internet para o trabalho e o lazer, tal mudança pode levar alguns a pensar: será hora de reavaliar e criar novas barreiras entre nossas existências dentro e fora da rede? Eis aqui algumas ideias.

Leve mais de sua personalidade individual para o trabalho

Antes da pandemia, conversas pessoais e casuais no trabalho talvez fizessem parte das suas relações no escritório — mas dificilmente tínhamos o tipo de transparência e comunicação com os colegas que desenvolvemos com repetidas chamadas de vídeo feitas de casa. A simples abertura de uma janela para o ambiente doméstico dos outros pode ter aprofundado seus elos. “Tradicionalmente, a fronteira entre pessoal e profissional sempre foi um obstáculo considerável", disse Adam Smiley Poswolsky, autor e palestrante que se concentra nas relações dentro do ambiente de trabalho. “Acho que, como legado da pandemia, isso não será mais aceitável para a grande maioria dos trabalhadores.”

Se a mudança foi positiva para você, tente imitar elementos dela de maneira mais intencional quando voltar a ver os colegas pessoalmente. Poswolsky sugeriu separar algum tempo no começo das reuniões pessoais para ter o tipo de conversa pessoal que resultaria da observação de um detalhe pessoal (que tipo de chá você está bebendo? É um parente ali atrás?) no canto da imagem capturada pela câmera.

Durante alguns dos piores meses da pandemia, Corinna Nicolaou, professora de redação de ensaios acadêmicos em Pullman, Washington, quase nunca via o rosto dos alunos — eles raramente ligavam a câmera durante a aula. “Me parecia que os estudantes estavam reagindo a toda essa intimidade forçada", disse ela. “Acho que as aulas online os deixaram cansados”.

Independentemente disso, ela ligou sua câmera em todas as aulas, permitindo que os estudantes a vissem em uma ambientação mais relaxada — às vezes ela aparecia usando roupas mais confortáveis, ou mesmo na cama. Isso introduziu uma nova vulnerabilidade e facilidade no relacionamento entre eles que, de acordo com ela, serviu de exemplo para os alunos: eles também poderiam se abrir, ao menos nos textos que escreviam. “Os ensaios que os estudantes escreveram nesse semestre foram mais reveladores e profundos", disse ela.

Agora ela espera levar esse aprendizado de volta para a sala de aula física. “Nos semestres mais recentes, os professores tiveram que ser mais vulneráveis e flexíveis em vez de ter todas as respostas", disse Corinna. “Depois de passar por isso, nós mudamos.”

Leve em consideração o quanto você se sente à vontade

Algumas pessoas preferiram deixar a vida pessoal fora das telas. “A sensação de exposição tem desafiado pessoas que não se sentem à vontade mostrando o ambiente que as cerca a quem quer que esteja do outro lado da chamada", disse Munmun De Choudhury, professora-assistente do Instituto de Tecnologia da Geórgia, que estuda saúde e bem-estar online. Talvez os estudantes de perfil social menos favorecido, que não dispõem de um ambiente de trabalho especial, prefiram não compartilhar sua ambientação com os colegas, disse ela.

Como atriz em Nova York, Anna Suzuki participou de um número considerável de chamadas de trabalho por vídeo no ano passado — conversas com diretores, leituras de diálogos para séries de TV e muitas outras reuniões pelo Zoom. Ela também divide um apartamento de um quarto com o marido.

“Sou uma pessoa que gosta de privacidade", disse Anna, “e tive que descobrir uma maneira de fazer com que vissem apenas uma parede em branco atrás de mim".

A solução foi criar uma área limpa em meio aos armários do apartamento da mãe, convenientemente localizado logo abaixo do dela. O espaço profissional “público” dela — uma mesa cor de carvalho e uma cadeira de escritório preta — ofereceu alguma separação entre a vida pessoal e o trabalho, permitindo a ela que ativasse o “cérebro de performer", como ela descreveu. Não foi sempre fácil. “Preciso muito criar compartimentos para as coisas", disse ela. “Ainda tive que criar uma personalidade pública em casa.” Mas ela disse que também descobriu o conforto de ser capaz de criar uma barreira tão clara entre público e privado.

Outras pessoas também se sentem pouco inclinadas a compartilhar tanto de sua vida, e tudo bem. “Cada um conhece melhor as próprias necessidades", disse Poswolsky. “É legítimo criar obstáculos para impedir a entrada de alguém no seu espaço de vulnerabilidade.’”

E pense em dar a si o tempo necessário para aceitar melhor situações que provocam hesitação. Creary disse ter observado duas fontes de preocupação entre aqueles que gostavam das barreiras claras que formaram ao trabalhar de casa e agora se viam diante de um retorno ao ambiente de trabalho: a mudança de local pode piorar a produtividade porque aumentarão as distrações, e também resultar em uma maior exposição a ambientes sociais não saudáveis. Ela indicou duas estratégias possíveis para reestabelecer as fronteiras: pense na sua hora do dia mais produtiva e tente marcar as reuniões e demais obrigações de acordo com isso, disse ela, e pense em quais compromissos sociais (jantares, happy hour e afins) são essenciais e quais você pode recusar.

“É tudo questão de respeitar o próprio ritmo", disse Creary.

Não deixe de lado as conversas a respeito de temas difíceis

De acordo com Natalie Bazarova, professora-assistente de comunicação da Universidade Cornell que estuda intimidade pública, as informações pessoais compartilhadas pelos usuários das redes sociais eram principalmente positivas antes da pandemia. Mas, no decorrer dos 15 meses passados, houve uma mudança. “Divulgações mais negativas passaram a ser mais aceitas", disse ela, citando pesquisas que publicou este ano. “Estamos todos passando por circunstâncias comuns, e isso molda nossa percepção daquilo que é apropriado ou não.”

O que isso significa? Alguns usuários das redes sociais têm publicado mais frequentemente a respeito dos efeitos da pandemia na sua saúde mental, disse De Choudhury. E publicações ligadas à justiça social e relatando experiências de racismo se espalharam pelo Instagram em meados do ano passado quando as pessoas buscaram algum engajamento online com as manifestações que se seguiram ao assassinato de George Floyd.

De acordo com um artigo publicado em 2020 na International Journal of Information Management, os usuários das redes sociais também publicaram com mais regularidade a respeito da sua saúde mental, destacando em particular as condições que as tornam vulneráveis à covid-19 — em parte na tentativa de incentivar os demais a levar a sério a pandemia do coronavírus.

Esse tipo de conversa tem como efeito a reversão de estigmas, tornando mais aceitável a sinceridade ao comentar os desafios que indivíduos e grupos enfrentaram no ano passado (ou por mais tempo; muitas das desigualdades estruturais expostas pela pandemia a antecedem). Caso se sinta à vontade participando do debate, continue a fazer isso na internet e fora dela — mas preste atenção para não compartilhar demais. “Temos que ter consciência das informações que publicamos diante de todos", disse Bazarova.

Repense aquilo que publica, e a quem esse conteúdo se destina

Ao mesmo tempo, talvez você tenha evitado compartilhar certos acontecimentos pessoais por pensar que pudessem receber reações negativas — algum feito no trabalho que talvez parecesse fora de sintonia com o momento, ou uma viagem que poderia ser criticada por contrariar recomendações de saúde pública. “Quem pode dizer quantas vezes as pessoas deixaram de compartilhar algo positivo?”, disse De Choudhury. E mesmo que publiquemos uma foto de uma ocasião social, talvez tenhamos a necessidade de explicar que todos foram vacinados para evitar críticas.

Parte dessa contenção pode ser produtiva; pensar melhor naquilo que compartilhamos online é boa ideia, assim como uma reflexão a respeito do nosso público e das nossas motivações.

Pergunte a si mesmo: quem vai receber isso? Qual é o contexto — quer dizer, o que mais as pessoas estão publicando ou debatendo no momento? Por que desejo compartilhar isso? É para meu benefício, ou para os outros? Mas as interações nas redes sociais não deveriam produzir ansiedade; se elas forem uma fonte de estresse, pense em criar barreiras mais claras em torno das suas contas tornando-as privadas, ou limitando-as aos amigos próximos. Lembre-se, também, que as fronteiras que você define em relação à divulgação de informações pessoais podem ser diferentes das de outras pessoas e podem seguir mudando conforme a pandemia cede.

Reflexões desse tipo vão poupar você de reações negativas, e também podem ser valiosas para aqueles que leem suas publicações. “A ideia de uma orientação social comunal é uma mudança bem-vinda", disse Bazarova. “Todos nós temos responsabilidade social pelo que acontece online”. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times.

Em janeiro, Stephanie Creary, professora-assistente de administração na Faculdade Wharton, da Universidade da Pensilvânia, estava comandando uma oficina a respeito de diversidade, igualdade e práticas de inclusão diante de um público remoto de cirurgiões acadêmicos. Ela observou que o ambiente de trabalho deles seria habitualmente formal, mas a conversa acontecia nas casas dos médicos, com ela sentada na sua sala de estar na Filadélfia, com um vaso de flores na mesa ao fundo e uma pintura de uma garrafa de vinho e uma taça na parede.

“Me pareceu que, se vamos tratar desse tema, é melhor quebrar logo todas as regras”, disse Creary, que trabalha com questões de identidade e diversidade no ambiente de trabalho. “Acho que as pessoas se sentiram mais à vontade com esse conteúdo porque a formalidade era posta de lado.”

Ao longo do ano passado, muitos de nós desempenhamos nossos diferentes papéis, todos no mesmo espaço, em casa - agora, estamos reavaliando o quanto compartilhar à medida que voltamos àesfera pública. Foto: Jan Buchczik/The New York Times

Ao longo do ano passado, muitos de nossos espaços pessoais acumularam funções adicionais servindo de escritórios, salas de aula, academias e até salas do psiquiatra ou estúdios de música. “Todos vimos em primeira mão os lares dos outros e suas salas de estar", disse Creary. E, ao mesmo tempo, muitos de nós tiveram que alternar entre papéis diferentes, como profissionais, pais e estudantes, tudo a partir do mesmo espaço. Naturalmente, os limites foram borrados: as crianças acabaram invadindo a tela do Zoom nas reuniões; roupas de academia serviram de figurino para situações no escritório remoto.

Agora começamos a voltar à esfera pública, e embora as redes sociais e os aplicativos de videoconferência devam continuar a fazer parte de como as pessoas acessam a internet para o trabalho e o lazer, tal mudança pode levar alguns a pensar: será hora de reavaliar e criar novas barreiras entre nossas existências dentro e fora da rede? Eis aqui algumas ideias.

Leve mais de sua personalidade individual para o trabalho

Antes da pandemia, conversas pessoais e casuais no trabalho talvez fizessem parte das suas relações no escritório — mas dificilmente tínhamos o tipo de transparência e comunicação com os colegas que desenvolvemos com repetidas chamadas de vídeo feitas de casa. A simples abertura de uma janela para o ambiente doméstico dos outros pode ter aprofundado seus elos. “Tradicionalmente, a fronteira entre pessoal e profissional sempre foi um obstáculo considerável", disse Adam Smiley Poswolsky, autor e palestrante que se concentra nas relações dentro do ambiente de trabalho. “Acho que, como legado da pandemia, isso não será mais aceitável para a grande maioria dos trabalhadores.”

Se a mudança foi positiva para você, tente imitar elementos dela de maneira mais intencional quando voltar a ver os colegas pessoalmente. Poswolsky sugeriu separar algum tempo no começo das reuniões pessoais para ter o tipo de conversa pessoal que resultaria da observação de um detalhe pessoal (que tipo de chá você está bebendo? É um parente ali atrás?) no canto da imagem capturada pela câmera.

Durante alguns dos piores meses da pandemia, Corinna Nicolaou, professora de redação de ensaios acadêmicos em Pullman, Washington, quase nunca via o rosto dos alunos — eles raramente ligavam a câmera durante a aula. “Me parecia que os estudantes estavam reagindo a toda essa intimidade forçada", disse ela. “Acho que as aulas online os deixaram cansados”.

Independentemente disso, ela ligou sua câmera em todas as aulas, permitindo que os estudantes a vissem em uma ambientação mais relaxada — às vezes ela aparecia usando roupas mais confortáveis, ou mesmo na cama. Isso introduziu uma nova vulnerabilidade e facilidade no relacionamento entre eles que, de acordo com ela, serviu de exemplo para os alunos: eles também poderiam se abrir, ao menos nos textos que escreviam. “Os ensaios que os estudantes escreveram nesse semestre foram mais reveladores e profundos", disse ela.

Agora ela espera levar esse aprendizado de volta para a sala de aula física. “Nos semestres mais recentes, os professores tiveram que ser mais vulneráveis e flexíveis em vez de ter todas as respostas", disse Corinna. “Depois de passar por isso, nós mudamos.”

Leve em consideração o quanto você se sente à vontade

Algumas pessoas preferiram deixar a vida pessoal fora das telas. “A sensação de exposição tem desafiado pessoas que não se sentem à vontade mostrando o ambiente que as cerca a quem quer que esteja do outro lado da chamada", disse Munmun De Choudhury, professora-assistente do Instituto de Tecnologia da Geórgia, que estuda saúde e bem-estar online. Talvez os estudantes de perfil social menos favorecido, que não dispõem de um ambiente de trabalho especial, prefiram não compartilhar sua ambientação com os colegas, disse ela.

Como atriz em Nova York, Anna Suzuki participou de um número considerável de chamadas de trabalho por vídeo no ano passado — conversas com diretores, leituras de diálogos para séries de TV e muitas outras reuniões pelo Zoom. Ela também divide um apartamento de um quarto com o marido.

“Sou uma pessoa que gosta de privacidade", disse Anna, “e tive que descobrir uma maneira de fazer com que vissem apenas uma parede em branco atrás de mim".

A solução foi criar uma área limpa em meio aos armários do apartamento da mãe, convenientemente localizado logo abaixo do dela. O espaço profissional “público” dela — uma mesa cor de carvalho e uma cadeira de escritório preta — ofereceu alguma separação entre a vida pessoal e o trabalho, permitindo a ela que ativasse o “cérebro de performer", como ela descreveu. Não foi sempre fácil. “Preciso muito criar compartimentos para as coisas", disse ela. “Ainda tive que criar uma personalidade pública em casa.” Mas ela disse que também descobriu o conforto de ser capaz de criar uma barreira tão clara entre público e privado.

Outras pessoas também se sentem pouco inclinadas a compartilhar tanto de sua vida, e tudo bem. “Cada um conhece melhor as próprias necessidades", disse Poswolsky. “É legítimo criar obstáculos para impedir a entrada de alguém no seu espaço de vulnerabilidade.’”

E pense em dar a si o tempo necessário para aceitar melhor situações que provocam hesitação. Creary disse ter observado duas fontes de preocupação entre aqueles que gostavam das barreiras claras que formaram ao trabalhar de casa e agora se viam diante de um retorno ao ambiente de trabalho: a mudança de local pode piorar a produtividade porque aumentarão as distrações, e também resultar em uma maior exposição a ambientes sociais não saudáveis. Ela indicou duas estratégias possíveis para reestabelecer as fronteiras: pense na sua hora do dia mais produtiva e tente marcar as reuniões e demais obrigações de acordo com isso, disse ela, e pense em quais compromissos sociais (jantares, happy hour e afins) são essenciais e quais você pode recusar.

“É tudo questão de respeitar o próprio ritmo", disse Creary.

Não deixe de lado as conversas a respeito de temas difíceis

De acordo com Natalie Bazarova, professora-assistente de comunicação da Universidade Cornell que estuda intimidade pública, as informações pessoais compartilhadas pelos usuários das redes sociais eram principalmente positivas antes da pandemia. Mas, no decorrer dos 15 meses passados, houve uma mudança. “Divulgações mais negativas passaram a ser mais aceitas", disse ela, citando pesquisas que publicou este ano. “Estamos todos passando por circunstâncias comuns, e isso molda nossa percepção daquilo que é apropriado ou não.”

O que isso significa? Alguns usuários das redes sociais têm publicado mais frequentemente a respeito dos efeitos da pandemia na sua saúde mental, disse De Choudhury. E publicações ligadas à justiça social e relatando experiências de racismo se espalharam pelo Instagram em meados do ano passado quando as pessoas buscaram algum engajamento online com as manifestações que se seguiram ao assassinato de George Floyd.

De acordo com um artigo publicado em 2020 na International Journal of Information Management, os usuários das redes sociais também publicaram com mais regularidade a respeito da sua saúde mental, destacando em particular as condições que as tornam vulneráveis à covid-19 — em parte na tentativa de incentivar os demais a levar a sério a pandemia do coronavírus.

Esse tipo de conversa tem como efeito a reversão de estigmas, tornando mais aceitável a sinceridade ao comentar os desafios que indivíduos e grupos enfrentaram no ano passado (ou por mais tempo; muitas das desigualdades estruturais expostas pela pandemia a antecedem). Caso se sinta à vontade participando do debate, continue a fazer isso na internet e fora dela — mas preste atenção para não compartilhar demais. “Temos que ter consciência das informações que publicamos diante de todos", disse Bazarova.

Repense aquilo que publica, e a quem esse conteúdo se destina

Ao mesmo tempo, talvez você tenha evitado compartilhar certos acontecimentos pessoais por pensar que pudessem receber reações negativas — algum feito no trabalho que talvez parecesse fora de sintonia com o momento, ou uma viagem que poderia ser criticada por contrariar recomendações de saúde pública. “Quem pode dizer quantas vezes as pessoas deixaram de compartilhar algo positivo?”, disse De Choudhury. E mesmo que publiquemos uma foto de uma ocasião social, talvez tenhamos a necessidade de explicar que todos foram vacinados para evitar críticas.

Parte dessa contenção pode ser produtiva; pensar melhor naquilo que compartilhamos online é boa ideia, assim como uma reflexão a respeito do nosso público e das nossas motivações.

Pergunte a si mesmo: quem vai receber isso? Qual é o contexto — quer dizer, o que mais as pessoas estão publicando ou debatendo no momento? Por que desejo compartilhar isso? É para meu benefício, ou para os outros? Mas as interações nas redes sociais não deveriam produzir ansiedade; se elas forem uma fonte de estresse, pense em criar barreiras mais claras em torno das suas contas tornando-as privadas, ou limitando-as aos amigos próximos. Lembre-se, também, que as fronteiras que você define em relação à divulgação de informações pessoais podem ser diferentes das de outras pessoas e podem seguir mudando conforme a pandemia cede.

Reflexões desse tipo vão poupar você de reações negativas, e também podem ser valiosas para aqueles que leem suas publicações. “A ideia de uma orientação social comunal é uma mudança bem-vinda", disse Bazarova. “Todos nós temos responsabilidade social pelo que acontece online”. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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