THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Quando o namorado terminou com ela no ano passado, Maira Khan queria desesperadamente tê-lo de volta. “Eu sabia que ele estava saindo com outra pessoa, mas não se era um relacionamento sério. Só queria que ela sumisse”, contou a influenciadora de Toronto.
Diante da perda, Khan, de 28 anos, decidiu recorrer ao ocultismo. “O primeiro feitiço que comprei foi um de corte de laços, o que para mim significava a remoção da terceira pessoa.” No TikTok, encontrou uma bruxa que só precisava do nome do casal para fazer o ritual: amarrar um barbante em volta de duas velas e deixá-las queimar até que o barbante se partisse com as chamas. “Ela disse que tudo correu bem.”
É uma boa hora para ser bruxa. Quem lida com essa “arte” se inclui no campo mais vasto dos serviços psíquicos – que movimenta US$ 2,3 bilhões –, no qual estão também a quiromancia (leitura de mãos), a cartomancia (leitura de cartas de tarô) e a astrologia.
Como os profissionais do sobrenatural estão no TikTok e na Etsy, hoje ninguém mais precisa procurar médiuns na lista telefônica ou bater à porta dos fundos de lojas místicas para saber como será seu destino. Na Etsy, existem cerca de 36 mil pessoas oferecendo “leitura psíquica”, entre outros serviços e produtos, como velas encantadas, kits de boticário, óleos para rituais e bonecos de vodu.
A comercialização da feitiçaria é quase tão antiga quanto a prática. “Na Europa, do período elizabetano até o século XVIII, a feitiçaria forneceu às mulheres uma maneira boa e lucrativa de garantir seu sustento”, afirmou Marion Gibson, professora de literatura renascentista e mágica na Universidade de Exeter, na Inglaterra, que escreveu “Witchcraft: A History in Thirteen Trials”.
Em tempos de doença ou em um ano de colheita ruim, os pobres costumavam consultar bruxas e mágicos, como videntes e feiticeiros. Isso era caro, mas, ainda assim, saía mais em conta do que ir ao médico ou obter remédios.
Essas tradições também foram crescendo a partir de forças históricas. O hudu, por exemplo – prática espiritual que mistura crenças regionais africanas, costumes indígenas e cristianismo –, foi introduzido por afro-americanos escravizados no sul dos Estados Unidos.
“Sou do Alabama, bem próximo à Flórida, por isso o hudu do povo gullah geechee da Carolina do Sul é um pouco diferente”, disse Eve Hardy, de Atlanta, médium e praticante do hudu. Ela começou a oferecer serviços no TikTok e no Instagram em fevereiro, como os rituais de “abertura de caminhos”, que removem os obstáculos da vida, o que fez com que sua clientela aumentasse. No entanto, Hardy, de 26 anos, não se intitula uma bruxa, pois considera o hudu um subconjunto das religiões tradicionais africanas que podem incorporar práticas sobrenaturais. “É um estilo de vida e uma religião”, definiu ela, esclarecendo que pode ser chamada de “boo hag” (criatura mítica do folclore da cultura gullah) ou sacerdotisa, mas não de bruxa.
A evolução da magia prática como força econômica acompanha um mundo em constante transformação. “Antes, as pessoas ofereciam feitiços por correspondência: você escrevia para alguém que mandava de volta as instruções e às vezes algum amuleto”, explicou Hardy. Mas, assim como o comércio, a atividade sobrenatural foi migrando para a internet.
As bruxas também acabam exercendo uma dupla função: ocultistas e confidentes dos clientes, como Lavender Grey, de 39 anos, que opera o Grey’s Witch Emporium de sua casa em Knowlton, na Inglaterra. “Os feitiços são uma parte, mas a outra metade é estar presente. Ofereço conselhos e orientação, porque, se a pessoa fizer alguma besteira depois do lançamento de um feitiço, ele não vai funcionar.”
Gray vende encantamentos como o “Fiery Wall Protection” por US$ 27,89, que, de acordo com ela, “protege a aura e o espírito de qualquer negatividade, animosidade e outros feitiços”. Abriu uma loja na Etsy em 2019, mas não aceita qualquer cliente: “Fico longe de gente que quer se relacionar com alguém que já está namorando.” Embora esses feitiços amorosos quase nunca funcionem, ela garante ter uma taxa alta de sucesso em outros casos.
As complexidades não se limitam a destinos cruzados. Maldições e feitiços podem ser mercadorias especiais. O cliente costuma participar do ritual, no qual é necessário fornecer detalhes que são normalmente ouvidos na terapia.
Rhiannon Headrick, de 35 anos, proprietário do All About Intentions em Rolla, no Missouri, disse que muitos pedidos parecem ser o último recurso de pessoas – sobretudo mulheres – que não têm mais opção ou esperança. “Agora, minha esposa lê a maioria das mensagens, porque oito meses atrás cheguei a um ponto em que elas partiram meu coração”, comentou Headrick, que usa os pronomes elu/delu (usados quando uma pessoa não se identifica com os padrões de gênero, ou seja, é não binária). E acrescentou: “Já tivemos centenas de casos legais, como divórcios e disputas de custódia, em que um dos parceiros controla os recursos e tem maior acesso a eles. Mas é impossível verificar se os feitiços são eficazes. Recentemente, conseguimos fazer um homem admitir que agrediu o filho da nossa cliente e agora ele está preso.”
O feitiço “vencer questões jurídicas” custa US$ 75,55 na loja de Headrick, enquanto o “ritual de corte de cordas em grupo”, cujo objetivo é facilitar a harmonia entre os pais, sai por US$ 45,55. Lançar uma maldição sobre o réu ou o autor do processo durante um caso de tribunal de família não é ilegal. Mesmo assim, a Etsy proibiu os “serviços metafísicos” que garantem resultados desde 2015, o que causou alvoroço na comunidade bruxa. Por isso, agora muitos serviços no site são classificados como “somente para entretenimento”.
Infelizmente para Khan, o feitiço que ela comprou na Etsy não trouxe seu ex-namorado de volta. Mas nem por isso ela deixou de acreditar no sobrenatural ou vai deixar de recorrer ao serviço on-line. “As coisas não deram certo e eu só queria que ele sentisse a dor que me causou. Por isso procurei um feitiço de vingança.”
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