Mais pessoas estão tomando microdoses de psicodélicos para a saúde mental. Mas funciona?


Cientistas estão divididos sobre se os benefícios que alguns microdosadores experimentam são um efeito placebo ou algo mais

Por Dana G. Smith
Atualização:

THE NEW YORK TIMES LIFE/STYLE - Joseph começou a tomar microdoses de psicodélicos há cinco anos para tentar melhorar sua saúde mental. “Eu estava meio que nessa depressão, nessa rotina”, ele disse. “Eu estava infeliz, irritado e agitado o tempo todo, e isso ia contra a maneira como eu me via.”

Depressão e ansiedade são comuns na família de Joseph, e ele tomou Prozac quando criança. Mas quando os sintomas da depressão retornaram aos 30 e poucos anos, ele não quis voltar para um medicamento prescrito.

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Joseph, um designer de Austin (ele pediu para omitir seu nome completo, citando preocupações com a privacidade em torno de questões de saúde mental e uso de drogas ilegais), se deparou com pesquisas da Universidade Johns Hopkins sobre psilocibina, o ingrediente ativo em cogumelos alucinógenos ou “mágicos”.

Em um pequeno estudo, doses completas da droga ajudaram pacientes com câncer a lidar com a depressão e a ansiedade. Depois ele leu histórias de influenciadores do Vale do Silício alegando aumento de energia ao tomar pequenas doses de psicodélicos. Então ele decidiu começar as microdoses algumas vezes por semana, comendo um “pequeno petisco” – cerca de 1,3 cm – de cogumelos para ver se isso melhoraria seu humor.

Ele começou a ver um benefício quase imediatamente. “Isso meio que aumentou minha moral”, ele disse. “Eu estava com um humor um pouco melhor. Eu tinha um pouco mais de ânimo. Eu estava me divertindo um pouco mais, me sentindo um pouco mais animado com as coisas.”

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A microdosagem é tipicamente definida por especialistas como tomar de 5% a 10% de uma dose completa de um psicodélico, geralmente LSD ou psilocibina, como forma de obter os supostos benefícios da droga à saúde mental sem o efeito alucinógeno. Por exemplo, em um ambiente clínico, um homem de 70 Kg pode tomar 20 miligramas de psilocibina para uma experiência psicodélica completa. Para uma microdose, ele tomaria apenas de um a dois miligramas. Nesse nível, tomado várias vezes por semana, alguns afirmam que as drogas melhoram seu humor, aumentam sua criatividade e dão ao mundo uma qualidade mais brilhante, como se ele estivesse em alta definição.

“É como andar lá fora quando o sol de repente aparece”, disse Erin Royal, de 30 anos, uma garçonete de Seattle que toma uma ou duas microdoses por semana de cogumelos que ela colhe nas florestas próximas. “Você se lembra que é uma pessoa que pode sentir coisas positivas e notar coisas que são bonitas.”

Na prática, apenas cerca de um terço das pessoas que tomam microdoses medem cuidadosamente a quantidade do psicodélico que estão tomando; a maioria toma apenas o suficiente para começar a sentir alguns efeitos, que geralmente começam depois de uma hora e duram de quatro a seis horas. Isso requer algumas tentativas e erros – principalmente ao comer cogumelos, que podem variar na concentração de psilocibina. (O efeito colateral negativo mais comumente relatado da microdosagem é tomar acidentalmente demais, o que não é perigoso, mas pode ser inconveniente se você estiver no escritório. Os pesquisadores também dizem que doses repetidas e frequentes de um psicodélico podem, teoricamente, estressar o coração.)

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Um dos maiores problemas com a pesquisa de microdosagem é que é difícil bloquear o efeito placebo em estudos de uma substância psicoativa Foto: Pixabay

A pesquisa sobre os benefícios para a saúde mental de doses completas de psicodélicos é promissora, e um estudo em fase inicial descobriu que a psilocibina, em altas doses, pode ser tão eficaz quanto um inibidor seletivo da recaptação de serotonina no tratamento da depressão. Doses completas de psicodélicos ajudam o cérebro a desenvolver novas conexões celulares, um processo chamado neuroplasticidade, e há algumas evidências de que microdoses produzem mudanças semelhantes.

Muitos dos cientistas pioneiros na pesquisa com doses completas de psicodélicos começaram a estudar se uma microdose também pode ser benéfica. Mas as evidências são limitadas e os especialistas estão divididos sobre como a microdosagem ajuda as pessoas – ou se realmente ajuda.

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Grande parte da pesquisa inicial sobre microdosagem foi anedótica, consistindo em respostas entusiásticas de usuários que experimentaram um aprimoramento na atenção e cognição, sentimentos de bem-estar e alívio da ansiedade e depressão. Estudos de laboratório com microdoses de psilocibina e LSD tendem a apoiar essas alegações, mostrando melhorias no humor, atenção e criatividade. Mas esses estudos geralmente foram pequenos e não compararam uma microdose a um placebo.

“Você provavelmente só participa neste momento de um teste de microdosagem se realmente acredita que isso pode ajudá-lo”, disse David Erritzoe, diretor clínico do Centro de Pesquisa Psicodélica do Imperial College London. E quando as pessoas esperam se beneficiar de um medicamento, elas normalmente conseguem.

Os dois maiores testes controlados por placebo de microdosagem foram publicados no ano passado e ambos sugerem que os benefícios que as pessoas experimentam são do efeito placebo. Nos estudos, os voluntários usaram seus próprios medicamentos para participar e, sem que soubessem, receberam doses ativas ou placebo embalados em cápsulas idênticas. Ao final de várias semanas, o humor e o bem-estar de quase todos melhoraram, independentemente do que haviam tomado.

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“Fiquei inicialmente surpreso, mas também um pouco desapontado com os resultados, porque quando montamos o estudo estávamos bastante otimistas de que a microdosagem poderia ter um efeito para além de um placebo”, disse Michiel van Elk, professor assistente de psicologia cognitiva da Universidade de Leiden, na Holanda, que liderou um dos testes.

Erritzoe, que dirigiu o outro estudo, descobriu que a eficácia da droga estava ligada às expectativas dos usuários. Se eles tomaram um placebo, mas pensaram que era uma microdose, eles se sentiram melhor, e se eles tomaram uma dose ativa, mas erroneamente acharam que era um placebo, eles não se sentiram melhor.

Um terceiro estudo controlado por placebo, publicado no início de fevereiro pela Universidade de Chicago, tentou contornar as expectativas dos usuários dando aos participantes quatro microdoses de LSD ao longo de duas semanas, mas sem lhes dizer o objetivo do estudo ou mesmo o que estavam tomando. Mais uma vez, não houve diferença entre os grupos que tomaram LSD e placebo.

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Ainda assim, alguns cientistas apontam evidências mostrando que a microdosagem tem um impacto direto no cérebro para argumentar que seus benefícios são reais. Usando a tecnologia de neuroimagem, os pesquisadores mostraram mudanças na atividade cerebral e na conectividade após pequenas doses únicas de LSD que são semelhantes ao que é visto com quantidades maiores da droga. E um estudo na Dinamarca descobriu que uma microdose de psilocibina ativou quase metade do tipo específico de receptores de serotonina nos quais os psicodélicos atuam para produzir seus efeitos alucinógenos.

“Eu não diria que é tudo placebo. Claramente, é uma droga ativa”, disse Harriet de Wit, professora de psiquiatria e neurociência comportamental da Universidade de Chicago, que liderou vários dos estudos. “Vemos mudanças cerebrais que são um pouco como o efeito da alta dose”, o que sugere que as doses menores estão agindo nos mesmos sistemas.

Alguns pesquisadores de microdosagem, como de Wit e van Elk, permanecem otimistas de que pequenas quantidades de drogas alucinógenas acabarão sendo benéficas para a saúde mental e a cognição. Eles dizem que o desenho dos testes controlados por placebo pode ser o culpado pela falta de resultados significativos. Os estudos podem não ter durado o suficiente, ou os testes e questionários usados durante os estudos podem não capturar totalmente os benefícios que algumas pessoas experimentam com a microdosagem.

Por outro lado, Erritzoe disse que só porque uma droga tem um impacto no cérebro não significa que tenha qualquer valor terapêutico. “Se você não consegue ver em um teste adequado que funciona para os sintomas, para coisas que as pessoas podem realmente detectar, sentir e experimentar em suas vidas, então não é tão interessante”, ele disse.

“Não estou tentando derrubar a microdosagem”, acrescentou. “Estou apenas sendo cauteloso e dizendo que, no momento, não parece particularmente otimista.”

Um dos maiores problemas com a pesquisa de microdosagem é que é difícil bloquear o efeito placebo em estudos de uma substância psicoativa. No teste de Erritzoe, 72% das pessoas adivinharam corretamente o que haviam tomado, o que significa que não é mais um estudo cego. Para os estudos que mostram efeitos no cérebro, as maiores mudanças ocorreram na extremidade superior do espectro de microdosagem – 20 a 26 microgramas de LSD e 3 miligramas de psilocibina – uma quantidade em que as pessoas geralmente começam a perceber os efeitos da droga.

Fora do laboratório, a maioria dos usuários se automedica visando uma percepção sutil semelhante de que eles tomaram algo. Nesse nível, a microdose pode estar mais próxima da meia dose, ou suas expectativas podem aumentar os benefícios do medicamento porque eles podem sentir que está tendo algum efeito.

Como resultado dessas dificuldades e da falta de resultados conclusivos, van Elk abandonou a pesquisa de microdosagem para voltar a estudar grandes doses das drogas. Erritzoe disse que quando seu próximo estudo terminar, ele provavelmente fará o mesmo.

Tanto Joseph quanto Royal estão cientes de que os benefícios da microdosagem podem ser um efeito placebo. Mas para eles, o modo de funcionamento importa menos do que o fato de ter ajudado. Atualmente, Joseph disse que sua depressão melhorou graças a uma prática regular de meditação, embora ele ainda tome microdoses ocasionalmente quando começa a se sentir para baixo.

Após vários anos de microdosagem, ele disse que a maior mudança que experimentou é uma mudança geral em sua mentalidade – algo que é mais difícil para os cientistas medirem. “Comecei porque li que ajuda com a depressão”, ele disse. “Mas à medida que segui em frente, ajudou muito mais com o crescimento mental e pessoal e a perspectiva da vida – como você quer viver e sua existência no mundo.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES LIFE/STYLE - Joseph começou a tomar microdoses de psicodélicos há cinco anos para tentar melhorar sua saúde mental. “Eu estava meio que nessa depressão, nessa rotina”, ele disse. “Eu estava infeliz, irritado e agitado o tempo todo, e isso ia contra a maneira como eu me via.”

Depressão e ansiedade são comuns na família de Joseph, e ele tomou Prozac quando criança. Mas quando os sintomas da depressão retornaram aos 30 e poucos anos, ele não quis voltar para um medicamento prescrito.

Joseph, um designer de Austin (ele pediu para omitir seu nome completo, citando preocupações com a privacidade em torno de questões de saúde mental e uso de drogas ilegais), se deparou com pesquisas da Universidade Johns Hopkins sobre psilocibina, o ingrediente ativo em cogumelos alucinógenos ou “mágicos”.

Em um pequeno estudo, doses completas da droga ajudaram pacientes com câncer a lidar com a depressão e a ansiedade. Depois ele leu histórias de influenciadores do Vale do Silício alegando aumento de energia ao tomar pequenas doses de psicodélicos. Então ele decidiu começar as microdoses algumas vezes por semana, comendo um “pequeno petisco” – cerca de 1,3 cm – de cogumelos para ver se isso melhoraria seu humor.

Ele começou a ver um benefício quase imediatamente. “Isso meio que aumentou minha moral”, ele disse. “Eu estava com um humor um pouco melhor. Eu tinha um pouco mais de ânimo. Eu estava me divertindo um pouco mais, me sentindo um pouco mais animado com as coisas.”

A microdosagem é tipicamente definida por especialistas como tomar de 5% a 10% de uma dose completa de um psicodélico, geralmente LSD ou psilocibina, como forma de obter os supostos benefícios da droga à saúde mental sem o efeito alucinógeno. Por exemplo, em um ambiente clínico, um homem de 70 Kg pode tomar 20 miligramas de psilocibina para uma experiência psicodélica completa. Para uma microdose, ele tomaria apenas de um a dois miligramas. Nesse nível, tomado várias vezes por semana, alguns afirmam que as drogas melhoram seu humor, aumentam sua criatividade e dão ao mundo uma qualidade mais brilhante, como se ele estivesse em alta definição.

“É como andar lá fora quando o sol de repente aparece”, disse Erin Royal, de 30 anos, uma garçonete de Seattle que toma uma ou duas microdoses por semana de cogumelos que ela colhe nas florestas próximas. “Você se lembra que é uma pessoa que pode sentir coisas positivas e notar coisas que são bonitas.”

Na prática, apenas cerca de um terço das pessoas que tomam microdoses medem cuidadosamente a quantidade do psicodélico que estão tomando; a maioria toma apenas o suficiente para começar a sentir alguns efeitos, que geralmente começam depois de uma hora e duram de quatro a seis horas. Isso requer algumas tentativas e erros – principalmente ao comer cogumelos, que podem variar na concentração de psilocibina. (O efeito colateral negativo mais comumente relatado da microdosagem é tomar acidentalmente demais, o que não é perigoso, mas pode ser inconveniente se você estiver no escritório. Os pesquisadores também dizem que doses repetidas e frequentes de um psicodélico podem, teoricamente, estressar o coração.)

Um dos maiores problemas com a pesquisa de microdosagem é que é difícil bloquear o efeito placebo em estudos de uma substância psicoativa Foto: Pixabay

A pesquisa sobre os benefícios para a saúde mental de doses completas de psicodélicos é promissora, e um estudo em fase inicial descobriu que a psilocibina, em altas doses, pode ser tão eficaz quanto um inibidor seletivo da recaptação de serotonina no tratamento da depressão. Doses completas de psicodélicos ajudam o cérebro a desenvolver novas conexões celulares, um processo chamado neuroplasticidade, e há algumas evidências de que microdoses produzem mudanças semelhantes.

Muitos dos cientistas pioneiros na pesquisa com doses completas de psicodélicos começaram a estudar se uma microdose também pode ser benéfica. Mas as evidências são limitadas e os especialistas estão divididos sobre como a microdosagem ajuda as pessoas – ou se realmente ajuda.

Grande parte da pesquisa inicial sobre microdosagem foi anedótica, consistindo em respostas entusiásticas de usuários que experimentaram um aprimoramento na atenção e cognição, sentimentos de bem-estar e alívio da ansiedade e depressão. Estudos de laboratório com microdoses de psilocibina e LSD tendem a apoiar essas alegações, mostrando melhorias no humor, atenção e criatividade. Mas esses estudos geralmente foram pequenos e não compararam uma microdose a um placebo.

“Você provavelmente só participa neste momento de um teste de microdosagem se realmente acredita que isso pode ajudá-lo”, disse David Erritzoe, diretor clínico do Centro de Pesquisa Psicodélica do Imperial College London. E quando as pessoas esperam se beneficiar de um medicamento, elas normalmente conseguem.

Os dois maiores testes controlados por placebo de microdosagem foram publicados no ano passado e ambos sugerem que os benefícios que as pessoas experimentam são do efeito placebo. Nos estudos, os voluntários usaram seus próprios medicamentos para participar e, sem que soubessem, receberam doses ativas ou placebo embalados em cápsulas idênticas. Ao final de várias semanas, o humor e o bem-estar de quase todos melhoraram, independentemente do que haviam tomado.

“Fiquei inicialmente surpreso, mas também um pouco desapontado com os resultados, porque quando montamos o estudo estávamos bastante otimistas de que a microdosagem poderia ter um efeito para além de um placebo”, disse Michiel van Elk, professor assistente de psicologia cognitiva da Universidade de Leiden, na Holanda, que liderou um dos testes.

Erritzoe, que dirigiu o outro estudo, descobriu que a eficácia da droga estava ligada às expectativas dos usuários. Se eles tomaram um placebo, mas pensaram que era uma microdose, eles se sentiram melhor, e se eles tomaram uma dose ativa, mas erroneamente acharam que era um placebo, eles não se sentiram melhor.

Um terceiro estudo controlado por placebo, publicado no início de fevereiro pela Universidade de Chicago, tentou contornar as expectativas dos usuários dando aos participantes quatro microdoses de LSD ao longo de duas semanas, mas sem lhes dizer o objetivo do estudo ou mesmo o que estavam tomando. Mais uma vez, não houve diferença entre os grupos que tomaram LSD e placebo.

Ainda assim, alguns cientistas apontam evidências mostrando que a microdosagem tem um impacto direto no cérebro para argumentar que seus benefícios são reais. Usando a tecnologia de neuroimagem, os pesquisadores mostraram mudanças na atividade cerebral e na conectividade após pequenas doses únicas de LSD que são semelhantes ao que é visto com quantidades maiores da droga. E um estudo na Dinamarca descobriu que uma microdose de psilocibina ativou quase metade do tipo específico de receptores de serotonina nos quais os psicodélicos atuam para produzir seus efeitos alucinógenos.

“Eu não diria que é tudo placebo. Claramente, é uma droga ativa”, disse Harriet de Wit, professora de psiquiatria e neurociência comportamental da Universidade de Chicago, que liderou vários dos estudos. “Vemos mudanças cerebrais que são um pouco como o efeito da alta dose”, o que sugere que as doses menores estão agindo nos mesmos sistemas.

Alguns pesquisadores de microdosagem, como de Wit e van Elk, permanecem otimistas de que pequenas quantidades de drogas alucinógenas acabarão sendo benéficas para a saúde mental e a cognição. Eles dizem que o desenho dos testes controlados por placebo pode ser o culpado pela falta de resultados significativos. Os estudos podem não ter durado o suficiente, ou os testes e questionários usados durante os estudos podem não capturar totalmente os benefícios que algumas pessoas experimentam com a microdosagem.

Por outro lado, Erritzoe disse que só porque uma droga tem um impacto no cérebro não significa que tenha qualquer valor terapêutico. “Se você não consegue ver em um teste adequado que funciona para os sintomas, para coisas que as pessoas podem realmente detectar, sentir e experimentar em suas vidas, então não é tão interessante”, ele disse.

“Não estou tentando derrubar a microdosagem”, acrescentou. “Estou apenas sendo cauteloso e dizendo que, no momento, não parece particularmente otimista.”

Um dos maiores problemas com a pesquisa de microdosagem é que é difícil bloquear o efeito placebo em estudos de uma substância psicoativa. No teste de Erritzoe, 72% das pessoas adivinharam corretamente o que haviam tomado, o que significa que não é mais um estudo cego. Para os estudos que mostram efeitos no cérebro, as maiores mudanças ocorreram na extremidade superior do espectro de microdosagem – 20 a 26 microgramas de LSD e 3 miligramas de psilocibina – uma quantidade em que as pessoas geralmente começam a perceber os efeitos da droga.

Fora do laboratório, a maioria dos usuários se automedica visando uma percepção sutil semelhante de que eles tomaram algo. Nesse nível, a microdose pode estar mais próxima da meia dose, ou suas expectativas podem aumentar os benefícios do medicamento porque eles podem sentir que está tendo algum efeito.

Como resultado dessas dificuldades e da falta de resultados conclusivos, van Elk abandonou a pesquisa de microdosagem para voltar a estudar grandes doses das drogas. Erritzoe disse que quando seu próximo estudo terminar, ele provavelmente fará o mesmo.

Tanto Joseph quanto Royal estão cientes de que os benefícios da microdosagem podem ser um efeito placebo. Mas para eles, o modo de funcionamento importa menos do que o fato de ter ajudado. Atualmente, Joseph disse que sua depressão melhorou graças a uma prática regular de meditação, embora ele ainda tome microdoses ocasionalmente quando começa a se sentir para baixo.

Após vários anos de microdosagem, ele disse que a maior mudança que experimentou é uma mudança geral em sua mentalidade – algo que é mais difícil para os cientistas medirem. “Comecei porque li que ajuda com a depressão”, ele disse. “Mas à medida que segui em frente, ajudou muito mais com o crescimento mental e pessoal e a perspectiva da vida – como você quer viver e sua existência no mundo.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

The New York Times Licensing Group - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times

THE NEW YORK TIMES LIFE/STYLE - Joseph começou a tomar microdoses de psicodélicos há cinco anos para tentar melhorar sua saúde mental. “Eu estava meio que nessa depressão, nessa rotina”, ele disse. “Eu estava infeliz, irritado e agitado o tempo todo, e isso ia contra a maneira como eu me via.”

Depressão e ansiedade são comuns na família de Joseph, e ele tomou Prozac quando criança. Mas quando os sintomas da depressão retornaram aos 30 e poucos anos, ele não quis voltar para um medicamento prescrito.

Joseph, um designer de Austin (ele pediu para omitir seu nome completo, citando preocupações com a privacidade em torno de questões de saúde mental e uso de drogas ilegais), se deparou com pesquisas da Universidade Johns Hopkins sobre psilocibina, o ingrediente ativo em cogumelos alucinógenos ou “mágicos”.

Em um pequeno estudo, doses completas da droga ajudaram pacientes com câncer a lidar com a depressão e a ansiedade. Depois ele leu histórias de influenciadores do Vale do Silício alegando aumento de energia ao tomar pequenas doses de psicodélicos. Então ele decidiu começar as microdoses algumas vezes por semana, comendo um “pequeno petisco” – cerca de 1,3 cm – de cogumelos para ver se isso melhoraria seu humor.

Ele começou a ver um benefício quase imediatamente. “Isso meio que aumentou minha moral”, ele disse. “Eu estava com um humor um pouco melhor. Eu tinha um pouco mais de ânimo. Eu estava me divertindo um pouco mais, me sentindo um pouco mais animado com as coisas.”

A microdosagem é tipicamente definida por especialistas como tomar de 5% a 10% de uma dose completa de um psicodélico, geralmente LSD ou psilocibina, como forma de obter os supostos benefícios da droga à saúde mental sem o efeito alucinógeno. Por exemplo, em um ambiente clínico, um homem de 70 Kg pode tomar 20 miligramas de psilocibina para uma experiência psicodélica completa. Para uma microdose, ele tomaria apenas de um a dois miligramas. Nesse nível, tomado várias vezes por semana, alguns afirmam que as drogas melhoram seu humor, aumentam sua criatividade e dão ao mundo uma qualidade mais brilhante, como se ele estivesse em alta definição.

“É como andar lá fora quando o sol de repente aparece”, disse Erin Royal, de 30 anos, uma garçonete de Seattle que toma uma ou duas microdoses por semana de cogumelos que ela colhe nas florestas próximas. “Você se lembra que é uma pessoa que pode sentir coisas positivas e notar coisas que são bonitas.”

Na prática, apenas cerca de um terço das pessoas que tomam microdoses medem cuidadosamente a quantidade do psicodélico que estão tomando; a maioria toma apenas o suficiente para começar a sentir alguns efeitos, que geralmente começam depois de uma hora e duram de quatro a seis horas. Isso requer algumas tentativas e erros – principalmente ao comer cogumelos, que podem variar na concentração de psilocibina. (O efeito colateral negativo mais comumente relatado da microdosagem é tomar acidentalmente demais, o que não é perigoso, mas pode ser inconveniente se você estiver no escritório. Os pesquisadores também dizem que doses repetidas e frequentes de um psicodélico podem, teoricamente, estressar o coração.)

Um dos maiores problemas com a pesquisa de microdosagem é que é difícil bloquear o efeito placebo em estudos de uma substância psicoativa Foto: Pixabay

A pesquisa sobre os benefícios para a saúde mental de doses completas de psicodélicos é promissora, e um estudo em fase inicial descobriu que a psilocibina, em altas doses, pode ser tão eficaz quanto um inibidor seletivo da recaptação de serotonina no tratamento da depressão. Doses completas de psicodélicos ajudam o cérebro a desenvolver novas conexões celulares, um processo chamado neuroplasticidade, e há algumas evidências de que microdoses produzem mudanças semelhantes.

Muitos dos cientistas pioneiros na pesquisa com doses completas de psicodélicos começaram a estudar se uma microdose também pode ser benéfica. Mas as evidências são limitadas e os especialistas estão divididos sobre como a microdosagem ajuda as pessoas – ou se realmente ajuda.

Grande parte da pesquisa inicial sobre microdosagem foi anedótica, consistindo em respostas entusiásticas de usuários que experimentaram um aprimoramento na atenção e cognição, sentimentos de bem-estar e alívio da ansiedade e depressão. Estudos de laboratório com microdoses de psilocibina e LSD tendem a apoiar essas alegações, mostrando melhorias no humor, atenção e criatividade. Mas esses estudos geralmente foram pequenos e não compararam uma microdose a um placebo.

“Você provavelmente só participa neste momento de um teste de microdosagem se realmente acredita que isso pode ajudá-lo”, disse David Erritzoe, diretor clínico do Centro de Pesquisa Psicodélica do Imperial College London. E quando as pessoas esperam se beneficiar de um medicamento, elas normalmente conseguem.

Os dois maiores testes controlados por placebo de microdosagem foram publicados no ano passado e ambos sugerem que os benefícios que as pessoas experimentam são do efeito placebo. Nos estudos, os voluntários usaram seus próprios medicamentos para participar e, sem que soubessem, receberam doses ativas ou placebo embalados em cápsulas idênticas. Ao final de várias semanas, o humor e o bem-estar de quase todos melhoraram, independentemente do que haviam tomado.

“Fiquei inicialmente surpreso, mas também um pouco desapontado com os resultados, porque quando montamos o estudo estávamos bastante otimistas de que a microdosagem poderia ter um efeito para além de um placebo”, disse Michiel van Elk, professor assistente de psicologia cognitiva da Universidade de Leiden, na Holanda, que liderou um dos testes.

Erritzoe, que dirigiu o outro estudo, descobriu que a eficácia da droga estava ligada às expectativas dos usuários. Se eles tomaram um placebo, mas pensaram que era uma microdose, eles se sentiram melhor, e se eles tomaram uma dose ativa, mas erroneamente acharam que era um placebo, eles não se sentiram melhor.

Um terceiro estudo controlado por placebo, publicado no início de fevereiro pela Universidade de Chicago, tentou contornar as expectativas dos usuários dando aos participantes quatro microdoses de LSD ao longo de duas semanas, mas sem lhes dizer o objetivo do estudo ou mesmo o que estavam tomando. Mais uma vez, não houve diferença entre os grupos que tomaram LSD e placebo.

Ainda assim, alguns cientistas apontam evidências mostrando que a microdosagem tem um impacto direto no cérebro para argumentar que seus benefícios são reais. Usando a tecnologia de neuroimagem, os pesquisadores mostraram mudanças na atividade cerebral e na conectividade após pequenas doses únicas de LSD que são semelhantes ao que é visto com quantidades maiores da droga. E um estudo na Dinamarca descobriu que uma microdose de psilocibina ativou quase metade do tipo específico de receptores de serotonina nos quais os psicodélicos atuam para produzir seus efeitos alucinógenos.

“Eu não diria que é tudo placebo. Claramente, é uma droga ativa”, disse Harriet de Wit, professora de psiquiatria e neurociência comportamental da Universidade de Chicago, que liderou vários dos estudos. “Vemos mudanças cerebrais que são um pouco como o efeito da alta dose”, o que sugere que as doses menores estão agindo nos mesmos sistemas.

Alguns pesquisadores de microdosagem, como de Wit e van Elk, permanecem otimistas de que pequenas quantidades de drogas alucinógenas acabarão sendo benéficas para a saúde mental e a cognição. Eles dizem que o desenho dos testes controlados por placebo pode ser o culpado pela falta de resultados significativos. Os estudos podem não ter durado o suficiente, ou os testes e questionários usados durante os estudos podem não capturar totalmente os benefícios que algumas pessoas experimentam com a microdosagem.

Por outro lado, Erritzoe disse que só porque uma droga tem um impacto no cérebro não significa que tenha qualquer valor terapêutico. “Se você não consegue ver em um teste adequado que funciona para os sintomas, para coisas que as pessoas podem realmente detectar, sentir e experimentar em suas vidas, então não é tão interessante”, ele disse.

“Não estou tentando derrubar a microdosagem”, acrescentou. “Estou apenas sendo cauteloso e dizendo que, no momento, não parece particularmente otimista.”

Um dos maiores problemas com a pesquisa de microdosagem é que é difícil bloquear o efeito placebo em estudos de uma substância psicoativa. No teste de Erritzoe, 72% das pessoas adivinharam corretamente o que haviam tomado, o que significa que não é mais um estudo cego. Para os estudos que mostram efeitos no cérebro, as maiores mudanças ocorreram na extremidade superior do espectro de microdosagem – 20 a 26 microgramas de LSD e 3 miligramas de psilocibina – uma quantidade em que as pessoas geralmente começam a perceber os efeitos da droga.

Fora do laboratório, a maioria dos usuários se automedica visando uma percepção sutil semelhante de que eles tomaram algo. Nesse nível, a microdose pode estar mais próxima da meia dose, ou suas expectativas podem aumentar os benefícios do medicamento porque eles podem sentir que está tendo algum efeito.

Como resultado dessas dificuldades e da falta de resultados conclusivos, van Elk abandonou a pesquisa de microdosagem para voltar a estudar grandes doses das drogas. Erritzoe disse que quando seu próximo estudo terminar, ele provavelmente fará o mesmo.

Tanto Joseph quanto Royal estão cientes de que os benefícios da microdosagem podem ser um efeito placebo. Mas para eles, o modo de funcionamento importa menos do que o fato de ter ajudado. Atualmente, Joseph disse que sua depressão melhorou graças a uma prática regular de meditação, embora ele ainda tome microdoses ocasionalmente quando começa a se sentir para baixo.

Após vários anos de microdosagem, ele disse que a maior mudança que experimentou é uma mudança geral em sua mentalidade – algo que é mais difícil para os cientistas medirem. “Comecei porque li que ajuda com a depressão”, ele disse. “Mas à medida que segui em frente, ajudou muito mais com o crescimento mental e pessoal e a perspectiva da vida – como você quer viver e sua existência no mundo.” /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

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