A mais nova marca de moda em Los Angeles é mais um projeto de arte pessoal


Apesar do nome, Gallery Dept. não é uma galeria ou uma loja de departamentos, mas uma marca de roupas híbridas

Por Nathan Taylor Pemberton

Conforme o número de lojas abandonadas e pontos comerciais fechados não para de aumentar, a atividade anteriormente corriqueira de comprar em uma loja física pode dar a sensação de que alguma coisa está fora do eixo – como se se tratasse de ficção científica. À medida que esse sombrio novo normal se torna, afinal, a norma, outros sinais de vida podem ser igualmente desconcertantes. Um bom exemplo disso são duas vitrines na Beverly Boulevard, em West Hollywood, na Califórnia.

Há pouco tempo, elas nos faziam lembrar de uma loja de móveis de luxo, agora fechada. Então, em agosto, as vitrines começaram a exibir uma série de objetos aparentemente desconexos: calças jeans empilhadas em uma montanha de mais de um metro de altura, uma espreguiçadeira estofada em jeans, um manequim de macacão com um enorme olho no lugar da cabeça em meio a um oceano de panos de chão sujos de tinta.

Josué Thomas, o fundador do Gallery Dept., em seu novo empório em Los Angeles. Foto: Maggie Shannon/The New York Times
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Cartazes pintados à mão na outra vitrine revelavam que essa loja de 557 metros quadrados, cheia de produtos estranhos e que só atende "com hora marcada", é o domínio da Gallery Dept. Apesar do nome, a Gallery Dept. não é galeria nem loja de departamentos, mas uma marca híbrida que, no diagrama de Venn, ficaria em algum lugar entre marca de streetwear, ateliê de jeans, oficina de costura de bairro e brechó.

Em outras palavras, você poderia dizer que a Gallery Dept. é o projeto de arte pessoal de seu fundador, Josue Thomas, designer cujos anseios criativos são igualmente desconexos e cheios de camadas. Com tantas marcas pequenas vivendo um processo de retração este ano, a de Thomas não apenas resistiu a essas condições esmagadoras como cresceu.

Em menos de dois anos, a Gallery Dept. saiu de uma oficina lotada, a algumas quadras da Beverly Boulevard, para o novo espaço, em parte graças às jaquetas com capuz, às camisetas com logos, aos anoraques e aos jeans de corte largo – todos criados e pintados à mão por Thomas a partir de roupas usadas ou de ponta de estoque –, que se tornaram improváveis objetos de arte no mercado saturado do streetwear.

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Esse nicho da indústria da moda está saturado e, nos últimos anos, muitas colaborações e edições limitadas foram lançadas em ritmo industrial. A Gallery Dept., por outro lado, oferece algo sob medida: conceitos básicos do streetwear agraciados pelo toque singular de um artista (Thomas, no caso).

Thomas começou a cortar jeans e a confeccionar camisetas de silk-screen de uma hora para a outra, em 2017, e, desde então, a Gallery Dept. passou de uma pequena marca cultuada entre os colecionadores a uma marca influente, usada por Kendall Jenner, LeBron James, Kendrick Lamar e dois dos três Migos (Offset e Quavo).

Em toda a loja iluminada pelo sol, pinturas abstratas e textos assinados por Thomas ocupam os espaços entre os mostruários de roupa e as prateleiras de latão brilhante repletas de agasalhos com capuz e de moletons da marca. Thomas disse, durante um passeio pela loja, que o novo espaço da Gallery Dept. foi financiado com o dinheiro proveniente das vendas on-line , e não com a ajuda de capitalistas de risco ou de investidores externos.

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Essa liberdade permite que ele e a marca, que emprega 12 pessoas, funcionem de acordo com os próprios termos. Nos provadores da loja, não há espelhos para ver o caimento. ("A gente vai te dizer se ficou bom ou não", explicou). As roupas também não têm etiqueta de preço. "Se a primeira coisa que você olha é o preço, isso muda sua percepção da peça. Prefiro que as pessoas se envolvam primeiro com a roupa", explicou.

Usando calças de carpinteiro cortadas e uma camiseta branca, ambas salpicadas de tinta colorida, Thomas se parecia com um artista arrancado de seu fluxo criativo, com as mãos sujas de tinta e cada unha pintada de uma cor.

"Eu gostava das roupas dos meus pais quando era criança. Na adolescência, consegui usar a jaqueta de couro do meu pai. A aparência envelhecida que ela tinha era perfeita e percebi que aquilo era um estilo pessoal. Era algo que não se podia comprar em uma loja", afirmou. Thomas, de 36 anos, nunca estudou moda ou modelagem e não sabe usar uma máquina de costura. Mas esse filho de imigrantes da Venezuela e de Trinidad viu os pais usarem suas habilidades imaginativas para criar uma vida em Los Angeles.

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Agora, ele usa esses mesmos talentos como artista e designer: pintando cartazes à mão ou fazendo tie-dye e silk-screen. Durante um breve período, seu pai, Stefan Gilbert, chegou até a montar uma pequena marca de roupas femininas. Da mesma maneira, quando tinha 20 e poucos anos, Thomas trabalhou na Ralph Lauren. Como um dos poucos negros que ocupavam funções criativas em uma empresa predominantemente branca, ele logo percebeu que a única maneira de sobreviver na indústria da moda teria de ser com o desenvolvimento de um projeto próprio.

reference

"Eu era o cara negro descolado, mas não havia lugar para mim. No melhor dos casos, eu seria responsável por escolher os botões das roupas femininas ou algo do gênero", disse. A Gallery Dept. foi criada espontaneamente em 2016, quando Thomas vendeu um poncho jeans costurado à mão para o estilista de Johnny Depp.

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Na época, Thomas estava concentrado em fazer beats e ser DJ, mas, depois de vender todas as peças que desenhou para um pequeno desfile em Chateau Marmont, ele percebeu que havia encontrado um novo caminho criativo. O projeto tinha menos a ver com os ponchos, que não apareceram nas coleções seguintes, e mais com um remix de roupas antigas feito no calor do impulso artístico, com o mínimo possível de reflexão.

Com a ajuda do alfaiate veterano Jesse Jones, Thomas começou a fazer uma série de peças sob medida para clientes que, em muitos casos, não faziam ideia do que os esperava. "Estávamos criando as peças enquanto as vendíamos", contou. Trabalhando com camisas antigas, casacos com capuz, bonés de caminhoneiro, jaquetas bomber e com o que mais estivesse à mão, Thomas frequentemente pintava o logo da marca com silk-screen e acrescentava tinta e outros adornos de acordo com sua disposição no momento.

Agora, a linha também inclui camisetas de manga longa, calças de moletom e meias. Além disso, Thomas começou a abrir um pouco a silhueta das calças Levi's 501 e das calças de trabalho Carhartt para deixar as bocas ligeiramente mais largas, acrescentou alguns patches e reforçou a costura, o que resultou em uma releitura streetware dos clássicos jeans boot-cut. Thomas batizou seu estilo de jeans de "LA Flare".

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Embora o jeans tenha, historicamente, sucumbido às categorias de "masculino" e "feminino", o LA Flare está antenado com o espírito de nossa época e seus modelos são "unissex". As peças da marca têm preço de itens de luxo. A versão básica começa em US$ 395, mas ajustes sob medida e toques adicionais feitos por Thomas podem elevar o preço a até US$ 1.200. Um fã dos jeans, Virgil Abloh, vê as "edições" feitas por Thomas como o próximo capítulo na história desse clássico.

Abloh acredita que o que Thomas faz para a moda equivale à arte "ready-made", e lista Shayne Oliver, da Hood by Air, como um contemporâneo distante. Para ele, Oliver e Thomas vêm de uma linhagem de estilistas negros que ainda estão passando pelo processo de autodefinição.

"Josue é o exemplo perfeito de alguém que cria o próprio caminho a partir de uma comunidade que, tradicionalmente, não participava do mundo da moda. Acredito que ele esteja criando um cânone próprio e mostrando do que o design negro é capaz", disse Abloh. Thomas não contrariou essa afirmação. Mas também estava preocupado demais com o que fazia naquele momento para se perder em pensamentos.

Afinal, o futuro da marca depende de sua capacidade de se manter na crista da onda. "As pessoas querem coisas que não sejam artificiais", afirmou, mostrando a própria camiseta para comprovar seu argumento. "Esta tinta veio do meu trabalho. Eu queria recriar essa sensação. Mas, quando a coisa é artificial, você consegue perceber imediatamente, e então acabou. Só se pode explicar até certo ponto." 

The New York Times Licensing Group – Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times.

Conforme o número de lojas abandonadas e pontos comerciais fechados não para de aumentar, a atividade anteriormente corriqueira de comprar em uma loja física pode dar a sensação de que alguma coisa está fora do eixo – como se se tratasse de ficção científica. À medida que esse sombrio novo normal se torna, afinal, a norma, outros sinais de vida podem ser igualmente desconcertantes. Um bom exemplo disso são duas vitrines na Beverly Boulevard, em West Hollywood, na Califórnia.

Há pouco tempo, elas nos faziam lembrar de uma loja de móveis de luxo, agora fechada. Então, em agosto, as vitrines começaram a exibir uma série de objetos aparentemente desconexos: calças jeans empilhadas em uma montanha de mais de um metro de altura, uma espreguiçadeira estofada em jeans, um manequim de macacão com um enorme olho no lugar da cabeça em meio a um oceano de panos de chão sujos de tinta.

Josué Thomas, o fundador do Gallery Dept., em seu novo empório em Los Angeles. Foto: Maggie Shannon/The New York Times

Cartazes pintados à mão na outra vitrine revelavam que essa loja de 557 metros quadrados, cheia de produtos estranhos e que só atende "com hora marcada", é o domínio da Gallery Dept. Apesar do nome, a Gallery Dept. não é galeria nem loja de departamentos, mas uma marca híbrida que, no diagrama de Venn, ficaria em algum lugar entre marca de streetwear, ateliê de jeans, oficina de costura de bairro e brechó.

Em outras palavras, você poderia dizer que a Gallery Dept. é o projeto de arte pessoal de seu fundador, Josue Thomas, designer cujos anseios criativos são igualmente desconexos e cheios de camadas. Com tantas marcas pequenas vivendo um processo de retração este ano, a de Thomas não apenas resistiu a essas condições esmagadoras como cresceu.

Em menos de dois anos, a Gallery Dept. saiu de uma oficina lotada, a algumas quadras da Beverly Boulevard, para o novo espaço, em parte graças às jaquetas com capuz, às camisetas com logos, aos anoraques e aos jeans de corte largo – todos criados e pintados à mão por Thomas a partir de roupas usadas ou de ponta de estoque –, que se tornaram improváveis objetos de arte no mercado saturado do streetwear.

Esse nicho da indústria da moda está saturado e, nos últimos anos, muitas colaborações e edições limitadas foram lançadas em ritmo industrial. A Gallery Dept., por outro lado, oferece algo sob medida: conceitos básicos do streetwear agraciados pelo toque singular de um artista (Thomas, no caso).

Thomas começou a cortar jeans e a confeccionar camisetas de silk-screen de uma hora para a outra, em 2017, e, desde então, a Gallery Dept. passou de uma pequena marca cultuada entre os colecionadores a uma marca influente, usada por Kendall Jenner, LeBron James, Kendrick Lamar e dois dos três Migos (Offset e Quavo).

Em toda a loja iluminada pelo sol, pinturas abstratas e textos assinados por Thomas ocupam os espaços entre os mostruários de roupa e as prateleiras de latão brilhante repletas de agasalhos com capuz e de moletons da marca. Thomas disse, durante um passeio pela loja, que o novo espaço da Gallery Dept. foi financiado com o dinheiro proveniente das vendas on-line , e não com a ajuda de capitalistas de risco ou de investidores externos.

Essa liberdade permite que ele e a marca, que emprega 12 pessoas, funcionem de acordo com os próprios termos. Nos provadores da loja, não há espelhos para ver o caimento. ("A gente vai te dizer se ficou bom ou não", explicou). As roupas também não têm etiqueta de preço. "Se a primeira coisa que você olha é o preço, isso muda sua percepção da peça. Prefiro que as pessoas se envolvam primeiro com a roupa", explicou.

Usando calças de carpinteiro cortadas e uma camiseta branca, ambas salpicadas de tinta colorida, Thomas se parecia com um artista arrancado de seu fluxo criativo, com as mãos sujas de tinta e cada unha pintada de uma cor.

"Eu gostava das roupas dos meus pais quando era criança. Na adolescência, consegui usar a jaqueta de couro do meu pai. A aparência envelhecida que ela tinha era perfeita e percebi que aquilo era um estilo pessoal. Era algo que não se podia comprar em uma loja", afirmou. Thomas, de 36 anos, nunca estudou moda ou modelagem e não sabe usar uma máquina de costura. Mas esse filho de imigrantes da Venezuela e de Trinidad viu os pais usarem suas habilidades imaginativas para criar uma vida em Los Angeles.

Agora, ele usa esses mesmos talentos como artista e designer: pintando cartazes à mão ou fazendo tie-dye e silk-screen. Durante um breve período, seu pai, Stefan Gilbert, chegou até a montar uma pequena marca de roupas femininas. Da mesma maneira, quando tinha 20 e poucos anos, Thomas trabalhou na Ralph Lauren. Como um dos poucos negros que ocupavam funções criativas em uma empresa predominantemente branca, ele logo percebeu que a única maneira de sobreviver na indústria da moda teria de ser com o desenvolvimento de um projeto próprio.

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"Eu era o cara negro descolado, mas não havia lugar para mim. No melhor dos casos, eu seria responsável por escolher os botões das roupas femininas ou algo do gênero", disse. A Gallery Dept. foi criada espontaneamente em 2016, quando Thomas vendeu um poncho jeans costurado à mão para o estilista de Johnny Depp.

Na época, Thomas estava concentrado em fazer beats e ser DJ, mas, depois de vender todas as peças que desenhou para um pequeno desfile em Chateau Marmont, ele percebeu que havia encontrado um novo caminho criativo. O projeto tinha menos a ver com os ponchos, que não apareceram nas coleções seguintes, e mais com um remix de roupas antigas feito no calor do impulso artístico, com o mínimo possível de reflexão.

Com a ajuda do alfaiate veterano Jesse Jones, Thomas começou a fazer uma série de peças sob medida para clientes que, em muitos casos, não faziam ideia do que os esperava. "Estávamos criando as peças enquanto as vendíamos", contou. Trabalhando com camisas antigas, casacos com capuz, bonés de caminhoneiro, jaquetas bomber e com o que mais estivesse à mão, Thomas frequentemente pintava o logo da marca com silk-screen e acrescentava tinta e outros adornos de acordo com sua disposição no momento.

Agora, a linha também inclui camisetas de manga longa, calças de moletom e meias. Além disso, Thomas começou a abrir um pouco a silhueta das calças Levi's 501 e das calças de trabalho Carhartt para deixar as bocas ligeiramente mais largas, acrescentou alguns patches e reforçou a costura, o que resultou em uma releitura streetware dos clássicos jeans boot-cut. Thomas batizou seu estilo de jeans de "LA Flare".

Embora o jeans tenha, historicamente, sucumbido às categorias de "masculino" e "feminino", o LA Flare está antenado com o espírito de nossa época e seus modelos são "unissex". As peças da marca têm preço de itens de luxo. A versão básica começa em US$ 395, mas ajustes sob medida e toques adicionais feitos por Thomas podem elevar o preço a até US$ 1.200. Um fã dos jeans, Virgil Abloh, vê as "edições" feitas por Thomas como o próximo capítulo na história desse clássico.

Abloh acredita que o que Thomas faz para a moda equivale à arte "ready-made", e lista Shayne Oliver, da Hood by Air, como um contemporâneo distante. Para ele, Oliver e Thomas vêm de uma linhagem de estilistas negros que ainda estão passando pelo processo de autodefinição.

"Josue é o exemplo perfeito de alguém que cria o próprio caminho a partir de uma comunidade que, tradicionalmente, não participava do mundo da moda. Acredito que ele esteja criando um cânone próprio e mostrando do que o design negro é capaz", disse Abloh. Thomas não contrariou essa afirmação. Mas também estava preocupado demais com o que fazia naquele momento para se perder em pensamentos.

Afinal, o futuro da marca depende de sua capacidade de se manter na crista da onda. "As pessoas querem coisas que não sejam artificiais", afirmou, mostrando a própria camiseta para comprovar seu argumento. "Esta tinta veio do meu trabalho. Eu queria recriar essa sensação. Mas, quando a coisa é artificial, você consegue perceber imediatamente, e então acabou. Só se pode explicar até certo ponto." 

The New York Times Licensing Group – Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times.

Conforme o número de lojas abandonadas e pontos comerciais fechados não para de aumentar, a atividade anteriormente corriqueira de comprar em uma loja física pode dar a sensação de que alguma coisa está fora do eixo – como se se tratasse de ficção científica. À medida que esse sombrio novo normal se torna, afinal, a norma, outros sinais de vida podem ser igualmente desconcertantes. Um bom exemplo disso são duas vitrines na Beverly Boulevard, em West Hollywood, na Califórnia.

Há pouco tempo, elas nos faziam lembrar de uma loja de móveis de luxo, agora fechada. Então, em agosto, as vitrines começaram a exibir uma série de objetos aparentemente desconexos: calças jeans empilhadas em uma montanha de mais de um metro de altura, uma espreguiçadeira estofada em jeans, um manequim de macacão com um enorme olho no lugar da cabeça em meio a um oceano de panos de chão sujos de tinta.

Josué Thomas, o fundador do Gallery Dept., em seu novo empório em Los Angeles. Foto: Maggie Shannon/The New York Times

Cartazes pintados à mão na outra vitrine revelavam que essa loja de 557 metros quadrados, cheia de produtos estranhos e que só atende "com hora marcada", é o domínio da Gallery Dept. Apesar do nome, a Gallery Dept. não é galeria nem loja de departamentos, mas uma marca híbrida que, no diagrama de Venn, ficaria em algum lugar entre marca de streetwear, ateliê de jeans, oficina de costura de bairro e brechó.

Em outras palavras, você poderia dizer que a Gallery Dept. é o projeto de arte pessoal de seu fundador, Josue Thomas, designer cujos anseios criativos são igualmente desconexos e cheios de camadas. Com tantas marcas pequenas vivendo um processo de retração este ano, a de Thomas não apenas resistiu a essas condições esmagadoras como cresceu.

Em menos de dois anos, a Gallery Dept. saiu de uma oficina lotada, a algumas quadras da Beverly Boulevard, para o novo espaço, em parte graças às jaquetas com capuz, às camisetas com logos, aos anoraques e aos jeans de corte largo – todos criados e pintados à mão por Thomas a partir de roupas usadas ou de ponta de estoque –, que se tornaram improváveis objetos de arte no mercado saturado do streetwear.

Esse nicho da indústria da moda está saturado e, nos últimos anos, muitas colaborações e edições limitadas foram lançadas em ritmo industrial. A Gallery Dept., por outro lado, oferece algo sob medida: conceitos básicos do streetwear agraciados pelo toque singular de um artista (Thomas, no caso).

Thomas começou a cortar jeans e a confeccionar camisetas de silk-screen de uma hora para a outra, em 2017, e, desde então, a Gallery Dept. passou de uma pequena marca cultuada entre os colecionadores a uma marca influente, usada por Kendall Jenner, LeBron James, Kendrick Lamar e dois dos três Migos (Offset e Quavo).

Em toda a loja iluminada pelo sol, pinturas abstratas e textos assinados por Thomas ocupam os espaços entre os mostruários de roupa e as prateleiras de latão brilhante repletas de agasalhos com capuz e de moletons da marca. Thomas disse, durante um passeio pela loja, que o novo espaço da Gallery Dept. foi financiado com o dinheiro proveniente das vendas on-line , e não com a ajuda de capitalistas de risco ou de investidores externos.

Essa liberdade permite que ele e a marca, que emprega 12 pessoas, funcionem de acordo com os próprios termos. Nos provadores da loja, não há espelhos para ver o caimento. ("A gente vai te dizer se ficou bom ou não", explicou). As roupas também não têm etiqueta de preço. "Se a primeira coisa que você olha é o preço, isso muda sua percepção da peça. Prefiro que as pessoas se envolvam primeiro com a roupa", explicou.

Usando calças de carpinteiro cortadas e uma camiseta branca, ambas salpicadas de tinta colorida, Thomas se parecia com um artista arrancado de seu fluxo criativo, com as mãos sujas de tinta e cada unha pintada de uma cor.

"Eu gostava das roupas dos meus pais quando era criança. Na adolescência, consegui usar a jaqueta de couro do meu pai. A aparência envelhecida que ela tinha era perfeita e percebi que aquilo era um estilo pessoal. Era algo que não se podia comprar em uma loja", afirmou. Thomas, de 36 anos, nunca estudou moda ou modelagem e não sabe usar uma máquina de costura. Mas esse filho de imigrantes da Venezuela e de Trinidad viu os pais usarem suas habilidades imaginativas para criar uma vida em Los Angeles.

Agora, ele usa esses mesmos talentos como artista e designer: pintando cartazes à mão ou fazendo tie-dye e silk-screen. Durante um breve período, seu pai, Stefan Gilbert, chegou até a montar uma pequena marca de roupas femininas. Da mesma maneira, quando tinha 20 e poucos anos, Thomas trabalhou na Ralph Lauren. Como um dos poucos negros que ocupavam funções criativas em uma empresa predominantemente branca, ele logo percebeu que a única maneira de sobreviver na indústria da moda teria de ser com o desenvolvimento de um projeto próprio.

reference

"Eu era o cara negro descolado, mas não havia lugar para mim. No melhor dos casos, eu seria responsável por escolher os botões das roupas femininas ou algo do gênero", disse. A Gallery Dept. foi criada espontaneamente em 2016, quando Thomas vendeu um poncho jeans costurado à mão para o estilista de Johnny Depp.

Na época, Thomas estava concentrado em fazer beats e ser DJ, mas, depois de vender todas as peças que desenhou para um pequeno desfile em Chateau Marmont, ele percebeu que havia encontrado um novo caminho criativo. O projeto tinha menos a ver com os ponchos, que não apareceram nas coleções seguintes, e mais com um remix de roupas antigas feito no calor do impulso artístico, com o mínimo possível de reflexão.

Com a ajuda do alfaiate veterano Jesse Jones, Thomas começou a fazer uma série de peças sob medida para clientes que, em muitos casos, não faziam ideia do que os esperava. "Estávamos criando as peças enquanto as vendíamos", contou. Trabalhando com camisas antigas, casacos com capuz, bonés de caminhoneiro, jaquetas bomber e com o que mais estivesse à mão, Thomas frequentemente pintava o logo da marca com silk-screen e acrescentava tinta e outros adornos de acordo com sua disposição no momento.

Agora, a linha também inclui camisetas de manga longa, calças de moletom e meias. Além disso, Thomas começou a abrir um pouco a silhueta das calças Levi's 501 e das calças de trabalho Carhartt para deixar as bocas ligeiramente mais largas, acrescentou alguns patches e reforçou a costura, o que resultou em uma releitura streetware dos clássicos jeans boot-cut. Thomas batizou seu estilo de jeans de "LA Flare".

Embora o jeans tenha, historicamente, sucumbido às categorias de "masculino" e "feminino", o LA Flare está antenado com o espírito de nossa época e seus modelos são "unissex". As peças da marca têm preço de itens de luxo. A versão básica começa em US$ 395, mas ajustes sob medida e toques adicionais feitos por Thomas podem elevar o preço a até US$ 1.200. Um fã dos jeans, Virgil Abloh, vê as "edições" feitas por Thomas como o próximo capítulo na história desse clássico.

Abloh acredita que o que Thomas faz para a moda equivale à arte "ready-made", e lista Shayne Oliver, da Hood by Air, como um contemporâneo distante. Para ele, Oliver e Thomas vêm de uma linhagem de estilistas negros que ainda estão passando pelo processo de autodefinição.

"Josue é o exemplo perfeito de alguém que cria o próprio caminho a partir de uma comunidade que, tradicionalmente, não participava do mundo da moda. Acredito que ele esteja criando um cânone próprio e mostrando do que o design negro é capaz", disse Abloh. Thomas não contrariou essa afirmação. Mas também estava preocupado demais com o que fazia naquele momento para se perder em pensamentos.

Afinal, o futuro da marca depende de sua capacidade de se manter na crista da onda. "As pessoas querem coisas que não sejam artificiais", afirmou, mostrando a própria camiseta para comprovar seu argumento. "Esta tinta veio do meu trabalho. Eu queria recriar essa sensação. Mas, quando a coisa é artificial, você consegue perceber imediatamente, e então acabou. Só se pode explicar até certo ponto." 

The New York Times Licensing Group – Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito do The New York Times.

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