THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - A Mulher-Hulk surgiu em 1980, em um quadrinho intitulado A Selvagem Mulher-Hulk. Dotada de uma superforça e de arroubos sensacionais, tinha bíceps enormes, pele cor de azeitona e a relação cintura-quadril de uma modelo de lingerie. Dá para encarar? Claro.
Como a mais recente personagem da Marvel a ir das páginas para a tela, ela recentemente fez sua estreia na televisão em Mulher-Hulk: Defensora de Heróis, comédia de meia hora no Disney+. A série é estrelada por Tatiana Maslany, atriz ganhadora do Emmy, mais conhecida pelo thriller sobre clonagem Orphan Black, que também interpretou papéis difíceis no palco e participou de um punhado de filmes independentes. Maslany descreveu a personagem Mulher-Hulk - gigante, verde - como “estranhamente, a coisa mais próxima da minha experiência que já fiz”.
Isso foi em uma manhã recente, quando Nova York lembrava um forno. Maslany, de 36 anos, que tinha vindo de Los Angeles, onde mora com o marido, o ator Brendan Hines, havia sugerido caminhar pela Ponte do Brooklyn. Esse era seu trajeto diário, geralmente de bicicleta, quando atuava na Broadway na versão de Network de Ivo van Hove. O percurso a acalmava, canalizando sua inquietação e sua intensidade. “Realmente, tenho dificuldade de modular a energia necessária para me abrir diante das pessoas. Ao mesmo tempo, isso faz com que eu me sinta viva.”
Maslany transborda essa vivacidade, que se manifesta em brincadeiras, atenção, intensidade. É uma mulher pequena, mas afiada. Mostrou-me uma tatuagem no braço, um desenho aleatório de uma criança que seu marido tinha feito. “É um bebê durão”, disse com aprovação.
Naquela manhã, a atriz vestia short de ciclismo amarelo e uma camiseta com a foto de uma bicicleta enlameada, e seu cabelo levemente loiro, encaracolado, estava meio preso. Ninguém pareceu reconhecê-la na ponte -tributo, talvez, à sua habilidade de desaparecer na personagem. Em Orphan Black, ela interpretou uma dúzia de clones que se diferenciavam pelo cabelo e pela maquiagem, mas também pela extraordinária plasticidade de expressão de Maslany. E, embora Hollywood estabeleça certas expectativas quanto ao aspecto e ao comportamento das atrizes, ela raramente se curva a isso, na tela ou fora dela: “Nunca interpretei uma bombshell.”
Mas a Mulher-Hulk é uma bombshell. É também o alter ego de Jennifer Walters, advogada com uma vida amorosa apática e uma paixão pelo isolamento no local de trabalho. Quando Jen recebe uma transfusão acidental de seu primo Bruce Banner (o Hulk original da Marvel, interpretado por Mark Ruffalo), ela de repente se torna a Mulher-Hulk. Enquanto o Hulk de Bruce é um bloco de cimento - ou, como diz Maslany, “um rato de academia superdesenvolvido” -, a transformação de Jen, desencadeada pela raiva, é diferente. Apenas alguns músculos crescem. Os seios também. A cintura se estreita. O cabelo fica liso: “Ela se encaixa no estereótipo do corpo feminino, mesmo sendo muito alta e verde.” (Os telespectadores perceberam isso no trailer e criticaram as proporções voluptuosas da personagem.)
Criada em uma cidade de médio porte em Saskatchewan, no Canadá, Maslany nunca se interessou pela fama: “Havia, tipo, um movimento na direção oposta, fazendo de tudo para não acabar lá.” Ela adorava atuar, mas não se entusiasmava com o mundo das celebridades. No entanto, acabou ficando razoavelmente famosa. Assim, a resistência de Jen em se tornar a Mulher-Hulk - “A ideia de ser uma super-heroína não me atrai”, afirmou Jen - reproduzia a da própria atriz. Maslany não precisava imaginar como se sentiria caso se tornasse uma figura pública praticamente da noite para o dia, sendo analisada por sua aparência e suas realizações: “Essa associação me vem facilmente.”
As filmagens começaram em 2021, em Atlanta, na Geórgia. Como Jen, Maslany interpretou uma versão de si mesma, embora tenha mencionado que nunca usou tanta maquiagem para interpretar uma personagem supostamente discreta. (“Estou realmente usando cílios postiços. Estou sendo modelada até não poder mais. Essa ideia de Jen ser indesejável é absurda.”) E, como Jen mantém sua consciência mesmo em forma de super-heroína, a Mulher-Hulk é uma versão dela também - embora seja alcançada quase inteiramente por meio de efeitos digitais.
Quando a Mulher-Hulk aparece com toda sua sensualidade, Maslany atua com uma roupa prateada, para capturar seus movimentos, e um capacete. “Eu me sinto como uma criança de pijama.” No entanto, Ginger Gonzaga, que interpreta Nikki, a assistente jurídica de Jen, sempre conseguia dizer como quem ela estava atuando: “Quando ela é a Mulher-Hulk, tem essa fisicalidade que muda instantaneamente, muito depressa. Tem uma atitude orgulhosa e uma postura elegante.”
Maslany descreveu o porte de sua personagem como mais pesado, menos inquieto, mais centrado na pélvis: “O peso da Mulher-Hulk tem um centro de gravidade diferente.” Essa pode ser a maneira como uma mulher se moveria se se sentisse segura no mundo, se soubesse que ninguém poderia machucá-la. Mas “A Mulher-Hulk” sugere uma fantasia adicional, que é indiscutivelmente ainda mais incrível que a ficção científica de “Orphan Black”. Esse novo programa sugere que uma mulher pode ter raiva e que o mundo de fato gostaria disso.
Perguntei a Maslany qual foi a última vez que ficou brava. “Meio que está sempre lá”, confessou. Mas ela raramente se permite expressar esse sentimento na vida pessoal. “Eu adoraria ser capaz de ficar com raiva, mas não, tipo, tremendo e chorando” - como acontece com a Mulher-Hulk. “Ela se transforma em uma versão hiperbonita e hiperfeminina que pode ser mais palatável em meio à raiva. É louco. É superlouco”, comentou Maslany ao sair da ponte e entrar na confusão de Manhattan.
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